De um lado os que optaram pela defesa do governo, de outro os que optaram por não defender. A nós tudo é justificado, a eles tudo é repudiado, mesmo quando as ações são iguais ou quando produzem um mesmo resultado. Por Karina

8Não fui às ruas sob o coro de não vai ter golpe e em defesa da democracia, o que, apesar das tentativas de ressalva, é uma defesa do governo petista e continuo não indo. Contudo, não nego que em vários momentos hesitei, um “mas e se” por vezes emergia. E o que me preocupa são os que justamente em um momento de tamanha instabilidade estejam tão convictos do que está acontecendo e do que é necessário fazer.

Um dos motivos desta hesitação é que foram raros os momentos de efetivo diálogo entre a esquerda. Pois em geral está todo mundo dizendo sem efetivamente se escutar, dizendo somente para seus pares, dizendo sem efetivamente nada dizer. E se a gente não conseguir superar essa incapacidade de comunicação – a propósito, a dificuldade da esquerda de se comunicar para além de si daria um texto por si só – os tempos sombrios, as visões arrepiantes se concretizarão.

Dos governistas convictos nada espero se não a defesa a todo custo do governo petista, logo, é evidente que não estamos do mesmo lado e quando os interesses são opostos não há diálogo, há combate. Por isto quando falo dos que optaram pela defesa do governo não me refiro a eles, me refiro a esquerda (extrema ou não) que efetivamente é oposição ao governo, mas que nesse momento específico achou necessário defendê-lo.

Nesse espectro – que os governistas não entram – formou-se dentro da esquerda uma outra polarização além da oposição coxinhas x governistas, ainda que juramos todos que estamos fugindo desta polarização. De um lado os que optaram pela defesa do governo, de outro os que optaram por não defender. Este inclusive é um dos perigos da polarização, ela tende a engolir tudo ao seu redor. E sua inerente consequência é a simplificação de fenômenos complexos e a divisão de mundo entre dois lados; nós, os bons, e eles, os maus. A nós tudo é justificado, a eles tudo é repudiado, mesmo quando as ações são iguais ou quando produzem um mesmo resultado.

E no momento é evidente que as ações tanto dos que optaram pela defesa do governo quanto dos que não optaram está levando a um mesmo resultado; a não construção de uma organização combativa para fazer frente aos ataques que já estão vindo e que se intensificarão, em última instância se continuar assim por vias diferentes, ambas levarão à nossa derrota.

De um lado uma esquerda crítica ao governo que efetivamente combateu as suas medidas nefastas. Endossaram as greves nas federais, lutaram contra a copa do mundo, denunciaram a intervenção militar do exército na periferia e a lei antiterrorista, dentre várias outras lutas. Sua oposição não é retórica vazia, é real e se dá no cotidiano. Foram também vítimas do governo petista, sabendo deste modo que o Partido dos Trabalhadores e a classe trabalhadora não estão do mesmo lado. Logo, o debate a ser travado com estes não é se o PT é um partido da classe trabalhadora ou não, ninguém fora a esquerda governista está dizendo isso, mas é esse o debate que a extrema-esquerda vem insistentemente e inutilmente tentando travar. Limitando-se a dizer o que todo mundo já sabe e muitas vezes em uma perspectiva moral e por vezes até ressentida, soando mais como uma retórica de auto-afirmação – sou revolucionário, não defendo partido conciliador de classes – do que efetivamente uma análise concreta da situação atual, isto é, analisando a origem, os desdobramentos e os agentes dessa disputa envolvendo o impeachment.

O debate posto pela esquerda que optou defender o governo possui dois eixos centrais; há um golpe em curso e independentemente de golpe, a saída de Dilma implicaria numa intensificação de medidas antipopulares. Como em última instância tais análises são para defender a permanência do governo petista no poder, elas são incapazes de ir até o extremo da crítica ao governo. Esse é um dos seus limites intransponíveis.

4Neste debate falta muitas vezes a conceituação do que é golpe, não raro caindo mais em um apelo emocional fundamentado no medo – usando Bolsonaro e outros políticos, falas de militares, apelo ao golpe de 64, etc. Sendo muitas vezes utilizado o argumento mais no sentido de que há um avanço conservador, e a isto chamam golpe.

Desde Collor houve 61 tentativas de impedimento de presidentes a maioria feita por cidadãos comuns, mas várias feitas por partidos de oposição, como 4 pedidos petistas para o impedimento de FHC. Collor foi inocentado de todas as acusações que embasaram a abertura do impeachment (aqui e aqui). Essas duas afirmações apontam para um mesmo sentido: o impeachment é um instrumento político, não jurídico. O aspecto jurídico entra somente enquanto uma justificativa, uma vez encontrada tal brecha, todo o resto do processo é político. E, diga-se de passagem, que o impeachment é um instrumento político recorrente e que o PT tentou usar, mas só não conseguiu porque não se deparou com um ambiente tão favorável como o que sua oposição encontrou. A propósito, se um partido de esquerda encontrasse uma brecha institucional e um momento econômico e político favorável para iniciar um processo de impeachment de um governo extremamente antipopular, qual seria o papel da esquerda diante disto? Iria endossar o pedido, iria denunciar o golpe, argumentando sobre a supremacia do voto dos milhões de brasileiras e brasileiros? Quando o jurídico deve se sobrepor ao político?

Sabemos que as brechas institucionais são inerentes ao próprio Estado Democrático de Direito. É o que permite, por exemplo, a prisão de Rafael Braga por portar pinho-sol em uma manifestação. O que diferencia estas medidas cotidianas próprias do Estado Democrático de Direito com o que está havendo agora? De que maneira tal brecha institucional, sendo que a mesma já faz parte do nosso cotidiano, irá refletir em nós? Parece-me que o debate a ser travado é em torno destas questões, mas guiado por um pragmatismo deixa de sê-lo. O debate tende a ir para um simplismo perigoso em que a lógica é basicamente esta, se até os poderosos são vítimas, logo, se intensificará para os de baixo. Uma relação de causa e efeito bastante rasa.

Golpe ou não, a partir do momento que o PT entrou neste jogo político do impeachment e o priorizou em detrimento de outras medidas – greve geral, ocupação, fechamento de vias, afinal era agora que a cooptação dos movimentos sociais e sindicatos seria bem apropriada para fazer uso – ele legitimou o impeachment. Tentou desesperadamente jogar o jogo, mas vem se mostrando menos eficaz que seus opositores. Nomeou novos ministros, buscou novas alianças, prometeu novos cargos. A partir do momento em que o PT jogou todos suas apostas nas medidas institucionais deixando as manifestações como apêndice e não trabalhou com propostas mais combativas – esperar isso do governismo é demais, eu sei – ele a legitimou, definindo que o determinante seria o jogo político dos de cima, não o dos de baixo. E se fez tal escolha é porque acreditou que poderia ganhar seja no imediato ou em uma projeção para 2018 embasada no discurso de golpe. Não foi só o PT que demonstrou expectativa com a institucionalidade e seus jogos políticos, a esquerda também. Não houve nenhuma articulação de greve geral, de ocupações, de fechamento de vias. A esquerda limitou-se a atos ordeiros de rua que mais se assemelhavam a comícios. Ainda que não rompesse com a legalidade, era possível uma diversidade de medidas que a base governista e os que se somaram a ela neste momento seriam capazes de efetivar ou ao menos tentar construir. Se mediante a certeza de um golpe em curso, com tempo hábil de organizar uma resposta, os atos ordeiros, no maior estilo comício, forem a única resposta que a esquerda é capaz de dar, levaremos quantos golpes a direita quiser dar. Essa é uma das consequências da disputa parlamentar, tornar-se incapaz de uma ruptura com a ordem. Isto é, a esquerda governista, mesmo diante da assertiva de um golpe em curso não é um bom aliado, seu pacificismo e aposta no reerguimento do PT em 2018 limita suas ações, tornando-as 6ineficazes para barrar qualquer avanço conservador, sua utilidade no máximo é na retória de que há uma parcela significativa que defende o governo e certamente para o uso de imagens para a campanha de 2018. Assim, apesar da retórica, o PT e a esquerda que o apoiou jogaram as cartas na institucionalidade e no seu jogo político. Em um suposto golpe em andamento é no mínimo curioso deixar a decisão deste justamente para os golpistas, o que leva a pensar que a crença no golpe não é de fato tão real assim.

Ao priorizar o jogo político, o segundo eixo defendido pelo “apoio crítico” ao PT – que surge sempre nos momentos decisivos para este, vide eleição e agora – cai por terra, afinal, o jogo político sendo determinante, que tipo de acordos políticos seriam necessários para a manutenção do PT no poder?

É real que o PT criou medidas de direitos sociais fazendo com que milhões saíssem da extrema pobreza, é real também que os lucros dos bancos no governo petista foram históricos. Contudo, um dos poucos consensos nas diversas análises sobre a situação atual é que tal política de conciliação de classes chegou ao limite, sendo que tal esgotamento vem se mostrando há um tempo. Para o nosso lado, o que há e a criminalização massiva dos setores combativos, como nas ações contra a Copa do Mundo e as Jornadas de Junho, envio do exército para as favelas, retirada de direitos trabalhistas mediante pouca resistência. O esgotamento já estava se mostrando, o limite era para nosso lado. Talvez nosso erro foi não ter rompido desde já com esse governo, tal como fizera os empresários quando o limite acenou para o lado deles. Diferentemente de nós eles não aceitaram perdas. Assim o esgotamento da política de conciliação foi decretado.

A aposta de quem defende o PT é que tal política se manterá. Contudo, nas análises predominantes paira um elemento místico no ar. Afinal, essa política tendo chegado ao esgotamento e sendo o PT um partido que implementa medidas neoliberais enfrentando menor resistência que os demais, cumpre questionar quais os elementos que possibilitam afirmar que tal política se manterá? Sobretudo em um contexto de instabilidade econômica, ruptura com o empresariado e com a base aliada, em que tanto o empresariado como a classe trabalhadora estão insatisfeitos. É possível neste contexto manter direitos sociais e trabalhistas e ao mesmo tempo manter os lucros exorbitantes das empresas? Por fim, dado o contexto em que o PT está no precipício e empurrá-lo ou puxá-lo cabe à oposição, de que maneira é possível o PT sobreviver sem fazer as alianças mais espúrias? Assim, a partir do que neste momento pode-se afirmar que a permanência do governo do PT seria “menos pior” que outros? É justamente esta fé no PT que garante alguma possível negociação que o salve do precipício. Se ele ainda possui alguma moeda de troca é a garantia de intensificação de suas medidas neoliberais sem uma oposição radical.

2Do outro lado há uma extrema-esquerda que negou a defender o governo, seja por analisar que não há um golpe em curso, seja por achar que esta não é uma luta nossa. Mas é incapaz de oferecer qualquer alternativa e ter qualquer relevância neste cenário. Cenário não só de polarização e de impeachment, mas de ataque a direitos sociais básicos e trabalhistas e avanço dos setores conservadores. Incapacidade que se reflete não só na prática como nas próprias análises. Análises que de tão genéricas poderiam, cortando uma ou outra palavra, serem usadas em distintos contextos. São análises universais que não fazem relação com a singularidade desse caso ou, quando fazem, o fazem de um modo bem fraco. Diversas análises que são incapazes de saírem do óbvio, limitando-se a afirmação do Estado enquanto um instrumento de dominação capitalista, sobre o nefasto histórico do PT sobre a classe trabalhadora e sobre a necessidade de trabalho de base e da luta nos espaços de trabalho. Embora em alguns casos é importante reafirmar o óbvio, neste momento limitar-se a ele é não só inútil, como acaba gerando um certo dogmatismo, seu único produto é uma limpeza de consciência e uma diferenciação de “nós” os revolucionários e “eles”, os reformistas.

Nesse tipo de análise, a resposta está dada antes mesmo da pergunta. Críticas engessadas e análises prontas que somente são aplicadas aos mais distintos contextos, abstraindo e negando suas singularidades. Se for sobre o Estado não nos interessa e a saída é trabalho de base (como se esse setor da extrema-esquerda soubesse da relevância do trabalho de base). É basicamente esse o eixo central de muitas análises da extrema-esquerda, principalmente a autônoma. Sendo que a questão posta é: na ausência de um trabalho de base efetivo e na emergência de medida antipopulares, o que é possível fazer? A curto prazo qual a resposta que a classe trabalhadora deve – e é capaz – de dar? Se a esquerda que optou por defender o governo vem errando pelo imediatismo, boa parte da esquerda combativa vem errando justamente pela incapacidade de pensar no imediato.

O alcance dessas críticas não poderia ser outro que não sua limitação a seus pares, pares que se retroalimentam em autoafirmações. Boa parte da extrema-esquerda vem criando e alimentando certa identidade revolucionária, mesmo que o custo disso seja a inconsequência com os conflitos reais.

Esse discurso do tanto faz a qualquer custo é inconsequente e não encontra respaldo na própria realidade. Uma coisa é afirmar que a disputa eleitoral não é estratégica – e na verdade antagônica – para uma via revolucionária. Outra é afirmar que a disputa eleitoral não incide no cotidiano. O debate a ser travado é de que maneira a permanência ou queda de Dilma incidirá no cotidiano. Sua queda implicará em retrocessos em relação a direitos sociais e trabalhistas? Sua permanência garantirá seus avanços ou ao menos o não retrocesso? E isso implica uma análise não só histórica como também conjuntural, ou terá perdido boa parte da extrema-esquerda combativa a capacidade de análise conjuntural?

1Já que uma de nossas características é o não imediatismo, neste momento será que não seria o nosso papel vislumbrar para além da resistência e pensar em ofensivas? É necessário esperar os “pacotes de maldades” virem? Não seria nosso papel buscar construir uma luta efetiva de resistência e apontar saídas para estas que ampliem nossos direitos e que façam o empresariado pagar pela crise? A nossa constante limitação à resistência, a impedir que determinadas ações negativas prossigam, no máximo vem conseguindo que elas atrasem ou venham menos pior do que a proposta original. Não basta, neste momento, o contra isso e aquilo. É necessário uma ofensiva, uma ação propositiva. Se não é com corte de direitos trabalhistas e sociais que se deve lidar com a crise econômica é com o que? Que ataquemos o empresariado.

Essa incapacidade de ofensiva incide também em um problema atual da esquerda combativa, que é sua ausência de organização ou no máximo organizações minúsculas que só são capazes de atuar mediante pautas imediatas, sendo incapazes de buscar uma construção a médio e longo prazo, e menos ainda uma articulação nacional, nos limitando àquilo que tanto denunciamos ao imediatismo. A consequência disto é que quem define nossas pautas é o inimigo, de modo que somos sempre só oposição, incapazes de qualquer ofensiva, incapazes de proposição. Mas isto é um tópico que valeria a pensa desenvolver em outro texto.

Outra incapacidade analítica dos setores combativos é a de analisar que há um avanço do conservadorismo. É evidente que comportamentos conservadores vêm se intensificando no cotidiano, como o aumento da intolerância, os ataques a minoria políticas, o aumento da repressão policial e mesmo a defesa da tortura. A tolerância da presença de pessoas como o deputado federal Jair Bolsonaro em manifestações em que a direita mais moderada como Aécio e Alckmin foram expulsos é sintomática neste sentido. E o que se vê em boa parte da extrema-esquerda combativa é uma negação de que isto está acontecendo, uma certa tranquilidade que não deveria existir. Não deveríamos ao invés dessa forçada despreocupação estar pensando qual a origem desse avanço? O ataque ao PT, embora tenha origens em seu limite hoje aos lucros do empresariado e a oportunismo político, não teria também elementos de um ataque simbólico ao que ele supostamente representa ( trabalhadores, negros, mulheres, LGBT)? De que maneira esse avanço conservador se relaciona com o PT? A permanência do PT no poder o fará retrocer? Ele se intensifica com o ataque ao PT ou com a instabilidade econômica? Como iremos nos defender e atacar esse conservadorismo?

Assim, um dos pontos importantes para debatermos é por que hoje o PT é tão perigoso – talvez até mais – para a luta da classe trabalhadora do que os outros partidos? Um debate real e para fora, não restrito a nossos pares.

Não falo aqui de respostas prontas e acabadas. Mas de tentativas de construção, o que se dá por meio da luta, da reflexão e de debates. Mas se a gente se limitar a essas análises genéricas que acabam tendo como única função a autoproclamação, o sectarismo e o óbvio continuaremos sendo irrelevantes e contribuindo passivamente aos ataques neoliberais que se intensificarão.

5Faz-se necessário um debate real que vá até seu limite, em que se aponte e se admite as suas próprias contradições e limitações. É necessário a crítica e mais do que nunca a auto-crítica, tanto a esquerda que optou por defender o governo quanto a que não. Um debate em que as pessoas efetivamente se escutem e saia desse nível panfletário. Caso contrário, prosseguiremos uns engolidos pelo governismo outros imobilizados pela insignificância. Para isso faz-se necessário análises capazes de articular as generalizações com a singularidade deste momento, uma atuação estratégica que rompa com o sectarismo e uma ruptura com o governismo.

Só assim conseguiremos romper com o som do silêncio.

Caso contrário, nós não governistas continuaremos alimentando o jogo que juramos não estar jogando. A defesa contra os retrocessos só será efetiva a partir disto. Neste momento o que nos une é maior do que o que nos separa – lembrando que não falo aqui de governistas – já que o que está em jogo é principalmente a resistência a ataques a direitos sociais e trabalhistas.

O ponto comum é: a política de conciliação de classes chegou ao limite, o PT não é um partido da classe trabalhadora, medidas nefastas virão.

A partir dai o que mais é possível fazer?

As imagens que ilustram este artigo são do artista Niki Feijen.

13 COMENTÁRIOS

  1. As marchas contra o fascismo foram iniciativas práticas que vão de encontro a este texto. Muito bom, conseguiu tirar um pouco da confusão da minha cabeça.

  2. “Se a teoria não corresponde à realidade, pior para a realidade”

    Pelo andar da carruagem, com direito a bloqueio total e irrestrito do Watts Apps, toda a cantilena de alguns pós-doutorands que assumem escrever para este PP, e que negam de pés juntos que não estamos vivendo uma situação de Proto Fascismo, imagino que terão de voltar “às suas fontes teóricas”.

    Enquanto isso, secundaristas provam da “tese” de alguns no PP, segundo a não temos uma situação “clássica” de emergência do Fascismo.

    Eu só espero que não apareçam novos pós-doutorandos a afirmar que nossa percepção da realidade está “contaminada”.

  3. Controle sobre a internet e repressão à luta de base! Tudo mudou de uns 4 anos para cá!
    Será que o preço das commodities tem algo a ver com o fascismo? Busquemos a série histórica do preço do petróleo entre 1900-30. Entrego de mãos beijadas o tema do próximo pós-doc.

  4. PELO ANDAR DA CARRUAGEM ou RESSENTIMENTO:
    Se os pés não estão juntos, mas as mãos estão untas, nem tudo está perdido…

  5. Moral do texto: temos que ser propositivos e fazer uma análise de conjuntura bem embasada. Propostas do texto: zero; análise de conjuntura bem embasada: zero. É por aí que se vai.

  6. Tenho uma só observação: fazer os capitalistas pagarem ou também pagarem pela crise é uma proposta, por exemplo, do Bernie Sanders. Basta acompanhar a campanha presidencial nos Estados Unidos. A bandeira deve ser desenvolver lutas nos locais de trabalho, acima de tudo mais. Esse tipo de proposta, fazer o empresariado pagar pela crise, demanda justamente o contrário, que o Estado intervenha de cima a baixo em favor dos trabalhadores. É uma solução de Estado.

  7. ENQUADRANDO A CRISE ou PSTU
    Estado intervindo “de cima a baixo em favor dos trabalhadores” é mais do que “uma solução de Estado”. É a quadratura política do círculo econômico.

  8. Ricardo, também acho que as marchas antifascistas tem essr potencial,contudo,o desafio é essa articulação continuar para além das marchas.

    Leitor atento,a proposta do texto é elucidar alguns apontamentos que acho que estão sendo esquecidos na maioria dos debates.

    Fagner lutas reivindicativas reivindica-se para alguém, geralmente patrão ou Estado. A questão me parece é como esta luta é travada,por exemplo, se a delega para um governante ou se se organiza de baixo para cima para forçar os de cima a fazer as medidas reivindicadas.

  9. Fagner,

    desenvolver lutas nos locais de trabalho não é bandeira, é método.

    Bernie Sanders se diz socialista e defende o socialismo, isso não faz do socialismo uma política estatal (necessariamente).

    Quando estudantes ocupam escolas contra a precarização da estrutura e o corte da merenda, o que eles estão dizendo é que não aceitam pagar pela “crise”. E assim também os trabalhadores que se mobilizam (nos locais de trabalho ou não) contra demissões, arrochos salariais e precarização das condições de trabalho.
    Os capitalistas pagarem pela “crise” não é apenas retórica de campanha eleitoral, ela vem das práticas de lutas dos trabalhadores e de seus interesses.

  10. Karina e Leo Vinicius,

    1. Sim, as lutas reivindicativas, com todas as suas limitações, reivindicam-se perante alguém, patrão ou Estado, e as mesmas reivindicações podem ser reivindicadas de modo radical ou não. Quando, porém, as reivindicações são incorporadas, nesse exato momento elas perdem radicalidade, e não é por outro motivo que um candidato do Partido Democrata dos Estados Unidos (mas será somente ele?) está levantando essa reivindicação no momento.

    2. Quando eu me referi a uma “solução de Estado”, eu não quis dizer que o socialismo é uma “solução de Estado”, eu quis dizer que essa reivindicação específica não pode ser realizada senão pelo Estado, pois como é que os trabalhadores vão fazer os capitalistas pagarem pela crise? A única forma de fazê-los pagar pela crise é recorrendo ao Estado, pois é o Estado que determina que parte da mais-valia produzida pelos trabalhadores será destinada a cada capitalista em particular. Ou os trabalhadores tomam logo o controle direto dos meios de produção em toda parte, ou o Estado intervém de cima a baixo, redistribuindo valores concentrados pelo empresariado em favor dos explorados. O Estado pode ser forçado a fazê-lo, mas no fundo é o Estado a única entidade capaz de fazê-lo.

    3. Quando se fala em “pagar pela crise”, se está fazendo menção a uma entidade acima de duas classes específicas (a burguesia e o proletariado) que, percebendo os desequilíbrios cíclicos do sistema produtivo, intervém para restabelecer o equilíbrio. Não há horizonte senão o da preservação do capitalismo e do poder de Estado.
    Isso pode ser chamado de bonapartismo, mas também pode ser associado a um tipo de prática desenvolvido pela classe dos gestores.

    4. Lutas dos trabalhadores nos locais de trabalho e também fora deles, contra demissões, arrochos salariais, precarização das condições de trabalho, entre outras coisas, quando não se resumem a reivindicar a intervenção do Estado, que é uma prática das classes exploradoras, apontam não para a recusa em pagar pela crise mas para a rejeição do próprio sistema de relações sociais.

  11. Fagner,

    A princípio a defesa de uma pauta,até então popular, por um burocrata é uma tentativa de cooptação, por si só não garante sucesso na cooptação. O que determina o sucesso desta tentativa é como a classe irá lidar com tal tentativa, se irá se sustentar neste burocrata igualando suas propostas e delegando a ele o papel que deveria ser da luta ou se independente deste irá continuar com sua proposta e fazendo a luta debaixo, pressionando e forçando os de cima, enfrentando e jamais não se aliando a eles. Lembrando que reivindicar uma coisa não implica em reivindicações equivalentes, pois na parte do como implantar estas medidas geralmente diferem bastante as propostas dos burocratas e da classe trabalhadora.

    Então, Fagner, toda luta reivindicativa não é pela supressão dos de cima, que são evidentemente os únicos que podem implementar as reivindicações pedidas. Lutas por aumento salarial, contra aumento da tarifa, contra o fechamento e terceirização de escola, contra retirada de direitos, etc, não reivindicam a supressão do Estado, tampouco, dos capitalistas. E nenhuma luta reivindicativa faz isto.

    Me parece que você está indo numa lógica perigosa em que a radicalidade da luta não se dá por suas potencialidades, mas unicamente pela sua pauta, neste sentido, as lutas que não pautam revolução não são revolucionárias e convenhamos que revolução não é pauta. É um tudo ou nada e que acaba mesmo é no nada, uma vez que em períodos não revolucionários as pessoas se pautam por suas necessidades imediatas e é a partir destas que novas relações sociais emergem, que se dá um salto qualitativo de consciência de classe e abre a possibilidade de um avanço da luta para além daquele setor que inicialmente a começou, podendo emergir revoltas populares e possibilidades que a gente nem imagina. Em última instância são lutas por direitos sociais que garantem direitos básicos que melhoram e garantem as condições de vida das pessoas exploradas e oprimidas, inclusive a possibilidade de organização,afinal de contas, pra podere lutar precisamos todos termos garantidas nossas possibilidades de reprodução da vida.

    Ainda que a luta seja pela intervenção estatal a rejeição pelo sistema de relações sociais pode se dar. Se dá pela forma horizontal e coletiva de decisão, pela superação da passividade cotidiana, por forçar o Estado a tomar uma posição favorável a classe trabalhadora, etc.

    Não é uma luta aparentemente radical por pautar questões radicais como a apropriação dos meios de produção, mas que naquele momento histórico não dialoga com ninguém se não um ou outro militante de extrema esquerda que é uma luta radical. Radical é a luta que incide diretamente no interesse concreto da classe trabalhadora, na qual ela coletivamente e horizontalmente decide seus rumos – criando os embriões da nova sociedade – e que a luta tenha e crie capacidade de massificar-se e superar sua própria pauta inicial.

  12. Eu não afirmei que “a radicalidade da luta não se dá por suas potencialidades, mas unicamente pela sua pauta”. No ponto 1, eu afirmei que “as lutas reivindicativas, com todas as suas limitações, reivindicam-se perante alguém, patrão ou Estado, e as mesmas reivindicações podem ser reivindicadas de modo radical ou não”. Eu reconheço, portanto, que as lutas reivindicativas podem ser radicais, o que não decorre automaticamente de suas pautas.

    O que eu estou querendo dizer é que (1) as pautas possuem uma história: quando a oportunidade passa, uma pauta perde seu potencial, e é exatamente por isso que o capitalismo a incorpora (é claro que ela pode recobrar seu potencial logo em seguida, mesmo porque a história conhece reviravoltas e o capitalismo possui uma dinâmica cíclica). Há, porém, (2) pautas que pressupõem, desde o início, sua incorporação ao capitalismo (compare-se, por exemplo, as diferentes pautas levantadas pelo MST ao longo do tempo: http://www.passapalavra.info/2012/03/53997). Sendo assim, eu concordo que as lutas reivindicativas podem ser radicais, mas não independentemente de suas pautas. A radicalidade não decorre automaticamente da pauta, mas ela também não é independente da pauta. Existem pautas que não são radicais, mas podem dar origem a lutas radicais, e existem pautas que não são radicais e não podem dar origem a lutas radicais. A reforma agrária não é uma revolução, mas o tipo de reforma agrária defendido pode apontar para a revolução. E há ainda as reivindicações que são essencialmente revolucionárias, mas sem encontrar uma prática que as sustente acabam não passando de palavras.

    Eu também não afirmei que não é na luta por melhorias cotidianas que conseguimos gerar novas relações sociais e massificar as lutas radicais. Isso é algo que eu venho defendendo desde muito tempo, inclusive publicando um artigo sobre o assunto neste site, intitulado “Autonomia x Reformismo”. Nesse artigo, eu polemizava com pessoas que diziam que a luta autônoma contra o aumento da tarifa do transporte coletivo não era e não poderia ser revolucionária. Para mim, no entanto, uma pauta, para ser revolucionária, não pode ter sido já enquadrada dentro dos limites e possibilidades do capitalismo, devendo ainda apontar para uma outra sociedade.

    Eu tenho estudado o Mário Pedrosa, que era um leitor de André Gorz, e há um conceito formulado por Gorz e desenvolvido por Pedrosa que é o de “reformas anticapitalistas” (Pedrosa as chamava “reformas revolucionárias”). Segundo Gorz, a “reforma anticapitalista” é aquela que é “reivindicada não em função do que é possível no quadro de um sistema e de uma gestão dados, mas do que deve ser tornado possível em função das necessidades e das exigências humanas”, “ela não se determina em função do que pode ser, mas do que deve ser”. E Gorz contrapunha esse tipo de reforma às “reformas reformistas”, a “reforma reformista” como aquela que “subordina seus objetivos aos critérios de racionalidade e possibilidade de um sistema e de uma política dados” (conferir André Gorz, “Estratégia Operária e Neocapitalismo”, Rio de Janeiro, Zahar, 1968; as citações acima podem ser encontradas na página 13). Pedrosa desenvolveu esses conceitos e apresentou, para os países de capitalismo desenvolvido, as “reformas revolucionárias” como aquelas que apontam para que “as funções gestionárias sejam coletivas”, realizadas pelos próprios trabalhadores “como produtores, com sua experiência, seus conhecimentos, seu ângulo de visão próprio” (conferir Mário Pedrosa, “A Opção Imperialista”, Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1966; as citações acima podem ser encontradas na página 438).

    Ou seja, para esses autores, as reformas possuem um potencial anticapitalista e revolucionário, se não estão já enquadradas pelo próprio capitalismo e se apontam para a autogestão, pois não há horizonte anticapitalista e revolucionário se nossas lutas não apontam já hoje para a autogestão, que é exatamente a antítese do capitalismo e do Estado capitalista.

    No que se refere, porém, à reivindicação de “fazer o empresariado pagar pela crise”, ela não possui potencial anticapitalista e revolucionário, porque não apenas prevê a manutenção do capitalismo (“pagar pela crise”) como também demanda a intervenção do Estado capitalista para a sua realização.

    Pedrosa incluía o New Deal rooseveltiano exatamente entre as “reformas contrarrevolucionárias”, aquelas que não apontam para a autogestão e não respondem às necessidades e exigências humanas, mas que são impostas de cima para baixo pelo Estado capitalista, observando os limites impostos pelo capitalismo, para salvar o capitalismo de suas crises. Ao lado do New Deal, Pedrosa situava o fascismo e o stalinismo. Se fôssemos colocar em termos gramcianos, o New Deal, o fascismo e o stalinismo seriam tidos como “revoluções passivas”, e é exatamente o que faz Marcos del Roio em “O império universal e seus antípodas: a ocidentalização do mundo” (São Paulo, Ícone, 1998).

    Enfim, um dos grandes problemas na esquerda é viver a afirmar: “vamos fazer a mesma coisa, mas de um jeito diferente”.

  13. Cara karina,

    Concordo com a maior parte do seu texto. Mas gostaria de dialogar com a parte em que desenvolve a crítica do que chamou de extrema esquerda. De fato aí reina um certo dogmatismo panfletario que precisamos superar. Porém o que signifuca fazer autocritica? Considerando que esse processo deve ser no ambito coletivo amplo e não apenas nos limites pwrsonalistas de individuos autocrítica é muito mais que um mero mea culpa do estilo: vou parar de repetir os jargoes revolucionarios e ler mais jornais. A auticrituca signifuca pensarmos o que compreendemos por revolução hj. Analisar profundamente o que raios deu errado na experiencia soviética, chinesa, cubana. O que é e como vive objetuva e subjectivamente a classe trabalhadora em todas as suas facetas (e o q causa um embroglio teorico enorme). Aqui temos uma historia muito mal digerida, que faz con que continuemis a reproduzir palavras de ordem do inicio do seculo xx sem perceber que um século se passou. Por que? Indivíduos preguiçosos? A tal wxtrema esquerda ainda me parece que terá q amargar por um tempo essa pequenes e esse isolamento. Muitas fixhas nao caíram. E essa condição no tempo e espaço, essa ausênciade trabalho de base, essa fragmentação em grupelhis esparsos não é opção de ninguém. É fruto da desagregacao decorrente da tragedia que ocorreram com a tríade historicamente organizadora da coasse trabalhadora brasileira. Isso não é vontade, é condição historica. E aí? Aí, o que fazer dentro dos limites impostos por estas condicoes? Como construir caminhos para rompe-la (e isso é bem a longo prazo, nada de imediato!)? Acho que nessa parte final do texto Karina falta isso, entender que essa condição da extrema esquerda é fruto de uma história que temos ainda que encarar de frente. E podemis Até tentar pensar em acções mais imediatas, sem esquecer que somos uma esquerda em franngalgos distante dos trabalhadores (em comparação com o quao próximos ja fomos) e em pequenissimos grupos. Pra sair disso temos que cobseguir é pensar a longo prazo, em construir um processo. E nao decretar de pronto mais uma suposta futuramente grande organização que tenderá a novamente reproduzir. O mais do mesmo qye mais alimentou do que atacou o sistema que pretendia eliminar.

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