Falta hoje tal concretude na campanha Fora Temer, engolida em uma disputa ideológica incapaz de aglutinar as camadas populares. Por Karina
A esquerda hegemônica tende a construir uma política assujeitada que busca se distanciar de tudo aquilo que é cotidiano, busca sempre a grandiosidade espetacular, nas ações e nas pautas. A consequência disso é um fazer político completamente distante da vida cotidiana, tornando-se ininteligível ou indiferente para a maioria das pessoas. É o que acontece hoje com o Fora Temer.
Este é a princípio um mote claro, simples e concreto: deseja-se a saída do presidente Temer. A questão que se perdeu é a clareza do porque Fora Temer, e tal ausência implica na perda de concretude da pauta levando-a a planos abstrato.
Resgatando a história recente, têm-se indiscutivelmente uma polarização social, anti-Dilma/PT/pró-impeachment, de um lado, e pró-Dilma/PT/anti-impeachment de outro. O primeiro por mais conservador que seja conseguiu aglutinar a aversão ao PT sobre um ponto muito comum, a corrupção. A aversão ao PT, ao menos no plano aparente, torna-se consequência do combate a corrupção, não causa dela.
A aversão à corrupção é algo inserido já nossa cultura com significativo apelo moral: furar fila, alterar a carteira de identidade, roubar dinheiro público. Não importa de que forma ela se manifeste, há de antemão uma oposição à mesma – ou no mínimo um incômodo – e uma noção clara que ela implica um prejuízo imediato para alguém. Se furam a fila em que estou, eu demoro mais a chegar. Simples, direto, imediato, concreto. Ninguém em sã consciência é a favor da corrupção. Ao centrar o ódio e combate ao PT – e a toda esquerda de bônus – na corrupção cria-se uma pauta unitária, aparentemente acima das disputas ideológicas em que ao mesmo tempo faz-se uma associação direta entre esquerda e corrupção. Dá-se então um fundamento muito claro ao combate ao PT, de tal maneira que PT e corrupção igualam-se, e combater um implica combater o outro. Não coincidentemente, esteve a corrupção também como questão central que levou a população às ruas na campanha do Fora Collor. A esquerda não conseguiu tamanha concretude e unidade. Sob a direção de grupos governistas e mesmo do próprio PT, a esquerda manteve-se entre a enaltação do governo petista – ainda que apelo ao governo petista como sinônimo de políticas sociais já não convença mais – e a denúncia do golpe, não desenvolvendo nada unitário, concreto (ou ao menos com a aparência de) e imediato como a corrupção. Ao fazer isso restringiu-se à esfera ideológica, acirrando a polarização (polarização de que falei melhor aqui)
Quando, na prática política, priorizam-se questões ideológicas em detrimento de pautas concretas, têm-se rachas, conflitos e sectarismo. Questões que, quando trabalhadas em sua ordem prática, permitem, a princípio, unidade, tal como luta contra o aumento da passagem, defesa do direito de moradia, contra o fechamento de escola, quando levadas ao plano ideológico levam a disputas estéreis insuperáveis; anarquistas vs comunistas, coxinhas vs enroladinhos, etc. As questões ideológicas estão sempre presentes, mas deve-se sempre que possível deixá-las somente enquanto plano de fundo. Saindo disso, divisões desnecessárias serão inevitáveis.
Tal polarização só beneficiou a direita. Ela minou as possibilidades de aproveitar o momento de instabilidade política e fortalecer as organizações populares (que o PT apassivou e desorganizou) e, ao mesmo tempo, criou condições férteis para certos ataques de direita. Não é por coincidência que o Escola Sem Partido ganha força logo nesse momento. Um nome singelo auto-explicativo que defende uma escola livre de doutrinação política, uma escola em que a(o) professora não doutrine nossas queridas crianças. O nome é genial. Cria de antemão um engôdo para a esquerda, em que a simples oposição ao projeto, que mantém na aparência um caráter neutro, implica justamente na comprovação da denúncia: a esquerda quer mesmo doutrinar as crianças. Engôdo semelhante criaram ao relacionar o PT com a corrupção. Abstrato a ponto de ocultar que o combate é um claro combate a ideologias tidas como de esquerda; concreto a ponto de fazer-se entender imediatamente e mobilizar. Simples, direto, imediato.
Falta hoje tal concretude na campanha Fora Temer, engolida em uma disputa ideológica incapaz de aglutinar as camadas populares – tanto que, em números, as manifestações pró-impeachment foram muito maiores do que a anti-impeachment, e ao menos que se diga que há um número majoritário de elites no Brasil, esta diferença revela algo significativo. Iniciadas ainda em 2015 não houve nenhum grande aumento da quantidade de pessoas nas manifestações pró-Dilma, mesmo após o impeachment. Manifestações que, em seu ápice, em São Paulo, giram em torno de 100 mil pessoas, com caráter ordeiro, festivo, com grandes carros de som com falas enormes enaltecendo o PT e com pouco enraizamento social. Manifestações que foram incapazes de fazer uma oposição à altura das manifestações pró-impeachment, que não conseguiram fomentar a organização popular e que só terminaram por fim em fortalecer o PT. Ou seja, não só não conseguiram pressionar o suficiente para a permanência de Dilma como não conseguiram fortalecer as organizações populares para uma oposição às medidas de ajuste fiscal.
O Fora Temer já mostrou o que pode fazer e não é suficiente nem pra derrubá-lo, nem para opor-se as políticas neoliberais radicais que virão, tampouco para fortalecer a organização popular. Neste momento a mobilização em torno do Fora Temer já começa a dar indícios ao que está servindo de fato, ao fortalecimento de organizações burocráticas de esquerda. Algumas destas já estão sentando nas mesas de negociação com Temer e buscando o seu pedaço de bolo e fazendo coro, ou mesmo garantindo, a caçada aos “Black Blocs”, o que se entende como caçada a todas aquelas e aqueles que não se submeterem ao controle de tais organizações. Se as mobilizações continuarem a centrar-se no Fora Temer, sob ainda o comando e controle de tais organizações, é certo o fim delas, a direita sai fortalecida, organizações burocráticas de esquerda saem fortalecida e mesmo o PT sai fortalecido, enquanto as organizações autônomas e a classe trabalhadora seguem enfraquecidas.
Para romper com esse trágico roteiro o jeito é sair desse engôdo que a esquerda entrou, é sair da briga abstrata ideológica e voltar para a realidade concreta. Voltar para os problemas materiais que incidem diretamente no cotidiano. É a luta unificada pela oposição a ter que trabalhar mais para ter o direito de aposentar, a luta pela permanência dos concursos públicos, a luta pela permanência do ensino superior gratuito e contra os cortes etc. Fortalecimento das lutas locais articuladas entre si e entre setores. É, por exemplo, a luta na universidade que fundamenta-se na organização dos próprios cursos articulados entre si que relacionam questões imediatas e concretas com as questões maiores como os cortes de verba no ensino superior. E, então, articulação destes com outros setores, tal como saúde e organizações trabalhistas.
É a partir da constatação de prejuízos imediatos que as pessoas se mobilizam, é compreendendo uma relação direta entre uma medida e a sua vida. É o preço do feijão, da energia, da passagem que mobiliza, não brigas distantes entre dois lados que em nada parecem dizer sobre a vida cotidiana.
Não coincidentemente, como questão central na Revolução Francesa esteva a luta pelo pão, na Revolução Russa também não foi diferente, com o lema bolchevique Pão, Paz e Terra. Oras, eu preciso do meu pão para viver, e se há um Luís, Nicolau, Dilma ou Temer me impedindo de ter um pão então que caiam. Se há um Temer entre mim e meu pão, então é guilhotina nesse Temer. O Fora Temer, ao inserir-se nesse contexto de polarização entre forças políticas, perdeu esta relação com a imediaticidade, foi para esferas ideológicas e tornou-se distante da realidade social da classe trabalhadora.
Não se trata de limitar-se à imediaticidade, nem de negar a priori as pautas amplas, tampouco, de um refúgio nas pautas imediatas. Trata-se de assumir que até agora a centralidade na pauta Fora Temer tem sido incapaz de criar uma alternativa às políticas neoliberais e em fortalecer o poder popular, e só fortaleceu os inimigos. Trata-se de assumir que a permanência neste mesmo roteiro será incapaz de opor-se às medidas de ajuste fiscal que virão, a centralidade neste mote é a certeza de permanência e fortalecimento de movimentos burocratizados distantes da base e de grandes atos sem construção de nenhuma alternativa efetiva.
Se é verdade que uma outra alternativa não se constrói do dia para a noite e que a luta é urgente, é também verdade que as medidas até agora têm sido pouco – ou nada efetivas neste sentido. Trata-se então de voltar onde devíamos ter começado desde o começo, a vida cotidiana. Assumir as necessidades desta, assumi-la enquanto ponto de partida, ir além dela para então voltar a ela. É a partir da falta de bebedor na universidade que podemos avançar para a ausência de democracia na universidade e transparência, cortes de verba na educação, terceirização etc. É partir do pragmatismo e imediatismo do pensamento e da prática cotidiana, para então ir além dele. A partir do combate a questões concretas, sem centralizar questões ideológicas, é que criaremos a possibilidade de um movimento autônomo, massificado e fortalecido, criando possibilidades reais de enfrentamento às medidas que se seguirão pelos próximos meses e anos. Medidas que o Temer intensificará, mas muitas das quais também viriam com o PT. É a partir da vida cotidiana que nos orientamos, é a partir dela que nós vemos o mundo. Se o Fora Temer nada parece dizer da minha vida, e hoje tal pauta, pelo que já foi apresentado, e ainda dada sua banalização encontra-se nesse distanciamento da vida cotidiana, em nada tal pauta me interessa. A partir da luta pelo pão, iniciar uma revolução.
Por fim, ou a esquerda muda sua estratégia ou vai cair de vez no precipício. O roteiro da mobilização do Fora Temer já está dado. Já se sabe a quantidade de pessoas, caráter do ato de antemão e o produto dele. Sabe-se também que as possibilidades de greve geral, dado o distanciamento das centrais sindicais burocratizadas da base, são poucas, sobretudo se centrarem-se no Fora Temer. É só por meio das lutas que evidentemente relacionam-se diretamente com a vida concreta e cotidiana é que será possível mudar tal roteiro e criar verdadeiramente uma mobilização popular capaz de fazer frente às mais nefastas medidas neoliberais, seja do governo que for, e quiça derrubar um presidente, ou quem quer que seja.
Enfim, é só saindo do abstrato, saindo das lutas ideológicas, indo além das ações espetaculares e ordeiras controladas por organizações burocratizadas que romperemos com este roteiro iminente de derrota e criaremos possibilidade de vitória. É assim que criaremos possibilidades de ainda garantir o nosso pão e criar novos horizontes para que um dia não tenhamos que reivindicar pão para ninguém.
PORQUE MERDA NÃO AFUNDA
Eminência Parda e Neossub, respectivamente sogro & genro, sobrenadam no revirão titanicpindorâmico.
Cleptocracia e poder oligárquico: assuntos de famiglia.
Então, vejamos: o atual presidente da câmara baixa é genro do genro do genro de Getúlio Vargas.
NINE FINGERS : RESSACA
-Bebeste muita vodka ontem na festa?
-Много я напился
Acho que o problema vai muito além do que foi pontuado no artigo. Não se trata apenas de transformar a mobilização em torno do Fora Temer numa mobilização pautada em questões concretas. Algumas das considerações abaixo se relacionam com o artigo da Karina, ao passo que outras vão um pouco além.
De certa forma, o artigo propõe um tipo de mobilização bem em sintonia com o que temos visto no “campo autonomista”: um autonomismo com relação a partidos, mas extremamente dependente de políticas públicas ou de decisões tomadas a nível de Estado. E faz parte desse autonomismo a reivindicação de uma unidade pragmática entre os diversos agrupamentos à esquerda do campo hegemonizado pelo PT: o dito “campo democrático-popular” (como se esse tipo de unidade não fosse extremamente volátil). Essa dependência com relação ao Estado (seja para revogar medidas como o aumento da tarifa do transporte coletivo, seja para manter públicas as empresas públicas, seja para manter e expandir o funcionalismo público, seja para manter os investimentos públicos em determinadas áreas, seja para manter intactos certos direitos etc.) é uma das principais deficiências dessa esquerda. E essa deficiência é tanto maior quanto se afirma, a torto e a direito, que governos como o governo Temer representam o “neoliberalismo”, portanto a impossibilidade de realização das políticas públicas demandadas pelos movimentos, já que o Estado seria reduzido e colocado definitivamente a serviço do mercado ou da esfera privada (quando não se recorre ao conceito de “neoliberalismo”, a crítica é focada nas “privatizações”). Ou recorre-se ainda à análise cultural: nos deparamos com uma ofensiva “conservadora”, os “conservadores” estão se apossando das instituições do Estado e voltando-as contra os trabalhadores. Nesse sentido, os movimentos pretendem pressionar o Estado com palavras de ordem como “nenhum direito a menos” etc. Em certa medida, o protesto é também cultural: somos de esquerda e não podemos deixar de opôr à ofensiva da direita gestos, símbolos, rituais, uma linguagem de esquerda. O problema é que, no fim, é o Estado que continua a deter o controle do processo, e os movimentos se resumem a pressionar, seja por meio de protestos, seja por meio de ocupações etc.
Mas, em primeiro lugar, o governo Temer, por exemplo, não representa de fato o “neoliberalismo”, embora seja favorável às privatizações em determinados setores (o mesmo pragmatismo do PT no poder). Hoje em dia não há governo capitalista que não articule, de um lado, a intervenção e a atuação do Estado na economia e, de outro, incentivos à iniciativa privada. Muito se afirmou, por exemplo, que o programa de Michel Temer, “Uma ponte para o futuro”, é “neoliberal” (basta fazer uma busca no Google por “uma ponte para o futuro + neoliberalismo” para conferir várias análises que fazem uma associação entre esse programa e o neoliberalismo). Contudo, conferindo o programa (aqui: http://pmdb.org.br/wp-content/uploads/2015/10/RELEASE-TEMER_A4-28.10.15-Online.pdf) percebe-se que ele continua a depositar no Estado a função ativa de promover o desenvolvimento, não no mercado. Além disso, o Estado continua a se responsabilizar pela distribuição de renda, pela criação de oportunidades para camadas inferiores, para grupos historicamente subalternos etc. “Uma ponte para o futuro” não propõe o Estado mínimo, mas um Estado “funcional”, seja ele mínimo ou não. E, contrariamente ao que se tem afirmado, o novo governo não pretende fazer regredir o Brasil a um patamar de desenvolvimento econômico e social anterior à Era Lula. Pretende, isto sim, resolver a atual crise do modo como os capitalistas costumam resolvê-las: pelo incremento da exploração da força de trabalho, o que não significa necessariamente romper com tudo o que o PT representava.
Na verdade, é a produtividade da economia brasileira que preocupa o atual governo, e o incremento da produtividade depende do avanço da internacionalização da economia; por outro lado, há uma preocupação com a recuperação da capacidade do Estado de promover o desenvolvimento econômico e social, do que depende a resolução da crise fiscal. Numa época em que o desenvolvimento global assenta sobretudo na atuação de grandes transnacionais, e em que são essas empresas que desenvolvem ou patrocinam o desenvolvimento de novas tecnologias e modelos de gestão, é claro que as reformas necessárias para o desenvolvimento da produtividade e o avanço na internacionalização são concebidas a partir do meio empresarial. É isso o que o governo Temer representa, mas seríamos cegos se não reconhecêssemos que o governo Lula e o governo Dilma representaram exatamente o mesmo. A solução que representam é uma solução “dentro da ordem”, articulando Estado e grande capital, e o problema é que, limitando-se a pressionar um Estado que funciona articulado intimamente com o grande capital, para que ele execute políticas que vão de encontro às tecnologias e modelos de gestão concebidos pelas empresas do grande capital, tecnologias e modelos de gestão necessários para que a economia volte a crescer e o Estado recupere a capacidade de promover o desenvolvimento econômico e social, o campo autonomista dá um tiro no próprio pé e não atinge as relações de produção em momento algum. Colocando de outro modo: a introdução de tecnologias e modelos de gestão propostos pelo meio empresarial é condição indispensável para a retomada do crescimento econômico que permite ao Estado intervir, por exemplo, em políticas de combate à pobreza, em políticas de democratização do acesso à universidade, em políticas de estímulo ao consumo das camadas inferiores, em políticas inclusivas para grupos historicamente subalternos, mantendo e ampliando timidamente certos direitos etc., se há de fato uma crise fiscal, como parece haver. Pode-se argumentar, entretanto, que é justamente a retomada do crescimento capitalista e a recuperação da capacidade de intervenção do Estado que se pretende obstar, o que corresponderia à queda do Estado e à crise final do capitalismo, abrindo o caminho para uma nova ordem social. Mas, dadas as condições atuais, na ausência de uma massa de trabalhadores socialistas pronta para estruturar uma nova sociedade, autogerida e capaz de assegurar o progresso econômico e social, o que teríamos seria um vácuo para a generalização da barbárie (os chamados “Estados falidos” nos dão uma noção do que é uma nação onde o capitalismo e suas instituições políticas praticamente deixam de funcionar).
A outra alternativa é a revolução. A questão é que, enquanto a revolução não vem, os capitalistas continuarão a apresentar soluções capitalistas para as crises capitalistas. E, enquanto os movimentos continuarem a conceber o Estado como um instrumento capaz de livrá-los das agruras do capitalismo, as soluções capitalistas para as crises capitalistas sairão reforçadas. Geralmente, o que temos é a esquerda em geral levantando uma outra solução “dentro da ordem” que, para os capitalistas, é inviável. A esquerda parece querer um capitalismo em que os proprietários privados ou coletivos do capital, os capitalistas e os gestores, de bom grado continuariam a conceder serviços públicos, estabilidade no emprego e uma ampla gama de benefícios sociais e trabalhistas, não reclamando nada em troca. Mas, no confronto entre a esquerda e os capitalistas, os segundos têm em mãos não apenas o capital mas também os meios de impôr sua vontade à força, sem contar que, com uma esquerda que fornece de bom grado todas as informações relevantes para a repressão, a coisa fica ainda mais fácil. Portanto, a coisa é muito mais complicada do que simplesmente articular a bandeira do Fora Temer com pautas concretas, e muito mais complicada do que simplesmente promover a unidade pragmática de todos os agrupamentos de esquerda: as tais pautas concretas são, na verdade, obstáculos que os capitalistas pretendem remover. Enfim, com uma esquerda, tanto partidária quanto “autônoma”, que se limita a reivindicar a manutenção de direitos que são, na verdade, recuadíssimos, o único estímulo sobre a classe trabalhadora vai no sentido de manter o mesmo patamar de reivindicações e radicalidade. Se, por um lado, são reivindicações concretas, parciais, que mobilizam os trabalhadores, por outro é preciso que essas lutas pelo menos apontem para reformas viáveis (levando em conta sua plausibilidade e a força e radicalidade da mobilização) capazes de fortalecer a classe trabalhadora enquanto tal, enquanto classe. As reformas propostas pelo campo hegemonizado pelo PT são reformas de outro tipo (quando são de fato reformas, e não tentativas de conservar o que já está dado): são reformas que pretendem integrar, num mesmo projeto de desenvolvimento capitalista, as instituições corrompidas dos trabalhadores e as companhias transnacionais. O desafio está aí.
Agora que o departamento de marketing da CUT está agitando a Greve Geral, acho que é importante debater esses pontos que o texto propõe.
http://www.cut.org.br/noticias/passeatas-greves-e-marchas-e-o-esquenta-para-greve-geral-4db0/
Ao invés da extrema-esquerda buscar o seu pão à reboque das manifestações políticas do campo popular, o que parece que está ocorrendo é que a CUT, um passo a frente, já buscará capturar a Greve Geral para torná-la um “Fora Temer”, ao invés de combater a Greve Geral por meio do “Fora Temer”.
Pois bem. Não existe exatamente um pão (uma paz e uma terra) que unifique hoje a classe, senão muitos, entre reposição salarial acima da inflação (para as categorias que não estão congeladas…), luta contra demissões, ameaça de reformas e ajustes em diversos âmbitos que afetam o emprego mas também o custo de vida, a estabilidade do emprego, a aposentadoria, enfim.
Nesse sentido, se realmente o jogo de cena da CUT abrir a possibilidade de um dia de paralização nacional efetiva, acredito que mais importante do que delimitar um ou outro pão, o mais importante seria que o ativismo de base consiga mobilizar ações diretas mais combativas que rolezinho na av. Paulista com grandes bexigas sindicalistas; que as bases sintam a força objetiva que têm para paralisar o fluxo de mercadorias, seja na produção ou na circulação. Certamente que para que isso ocorra o Fora Temer não será suficiente e a agitação econômica será fundamental para conseguir mobilizar um maior volume de trabalhadores e estudantes para ações combativas.
Agora, com relação ao comentário do Fagner, achei interessante que se mencionou a “massa de trabalhadores socialistas”. Eu estou de acordo com o fato de que sem uma massa de trabalhadores convencidos a respeito da necessidade de construir uma alternativa ao capitalismo, dificilmente uma revolução trará grandes resultados para a classe trabalhadora. E por isso acho que disputar os sentidos de uma paralisação nacional ou greve geral, com agitação e propaganda socialistas, tem muito maior relevância que disputar o Fora Temer, especialmente quando se trata de que os próprios trabalhadores tenham a experiência de seu poder, não tão diferente do que estamos vendo de parte dos secundaristas. Vejo aqui uma questão essencial de revalorização da noção de “poder”, uma superação necessária do que eu posso entender por “campo autônomo” e que entendo ter sido começado a ser questionado por aquele texto sobre o Limite da Tática, a partir das experiências do MPL. (Se esse acúmulo realmente fez eco nos grupos autoidentificados como “autonomistas”, já é outra história).