Para o poder proletário, nem a direção colegiada nem a individual são o princípio único e incondicional da construção organizativa. Por Nikolai Osinskii, T. Sapronov e V. Maksimovskii.
Este documento, redigido por Valerián Valeriánovich Obolênski (pseud. Nikolai Osínski)[1], Timofêi Vladímirovich Saprônov[2] e Vladímir Nikoláevich Maksimóvski[3], é originalmente intitulado Tezisy o kollegial’nost i edinolicii (K IX S“yezd RKP). Apareceu primeiramente em Yekonomicheskaya Zhizn’ (Экономическая Жизнь, “Vida Econômica”), nº 68, 28 mar. 1920. Foi traduzido originalmente para o alemão e depois para o espanhol a partir dos Deviatii S”yezd RKP(b). Mart-aprel’ 1920. Protokoly (Девиатии Съыезд РКП(б). Март-апрель 1920. Протоколы, “IX Congresso do Partido Comunista Russo (Bolchevique), março-abril de 1920. Protocolos”). Moscou, 1934, pp. 537-539, e do espanhol para o português a partir de KOOL, Fritz; OBERLANDER, Erwin (orgs.). Documentos de La Revolución Mundial 1: democracia de trabajadores o dictadura de partido. Madri: ZYX, 1971, pp 115-117. Seus três autores integravam a corrente bolchevique conhecida como Gruppa Demokratitcheskogo Tsentralizma (Группа демократического централизма, “Grupo do Centralismo Democrático”), que existiu como agrupamento de esquerda interno ao partido bolchevique entre 1918 e 1927.
1. Para o poder proletário, nem a direção colegiada nem a individual são o princípio único e incondicional da construção organizativa. Em partes distintas da direção, para diferentes órgãos e sob diversas condições históricas, pode ser diferente o significado de um ou outro princípio [4].
2. Nenhum dos dois princípios tem vantagens técnicas absolutas. A direção individual não é, em geral, a forma mais simples de direção, no entanto, a direção colegiada tem a seu favor um equilíbrio total de decisões. Sob determinadas condições, a atividade de um colegiado (organização colegiada) é tão precisa, rápida e enérgica como a atividade de um único administrador.
3. Do ponto de vista sociopolítico, a direção colegiada possui algumas vantagens que fazem dela o mais importante princípio de construção organizativa soviética, e fomentam, no atual período de trabalho militante, sua perseverança e consolidação. A direção colegiada é o grau mais alto da escola da direção estatal. Somente ela ensina a resolver questões especiais relativas aos interesses da totalidade. O trabalho colegiado é, igualmente, também o melhor método para recuperar os antigos especialistas burgueses por meio de um trabalho conjunto no novo estilo de camaradagem e para impregná-los de psicologia proletária. É também o melhor método para controlar os especialistas burgueses enquanto estes não superarem seus velhos costumes e psicologia anterior. Finalmente, e isto é o mais importante, só a direção colegiada preserva os funcionários responsáveis de alienarem-se em trabalhos especiais demasiadamente rígidos e solitários, e de fazerem-se empregados com uma visão estreita. Nesta ou naquela forma, nesta ou naquela medida, a direção colegiada proporciona os fundamentos necessários para o sucesso do sistema do centralismo democrático, assim como as melhores armas contra a ressurreição da mentalidade estreita de funcionário e a burocracia inamovível no aparato dos sovietes. O sucesso e fortalecimento da direção colegiada é a garantia do êxito em nossa luta econômica, que somente pode se realizar na conexão dos métodos militares com a iniciativa criadora dos trabalhadores conscientes.
4. Inclusive se o PCR limita a direção colegial frente às condições do momento atual e se decide por seu caráter militar, o que garante precisão, rapidez e intensidade ao trabalho, não deixa de reconhecer, sem reserva alguma, a direção colegiada como princípio de organização de todos os fundamentos que dá unidade ao aparato da ditadura proletária.
Por isto:
a) Todos os órgãos da direção administrativa aos quais correspondam decisões principais e de muita responsabilidade (por exemplo, comissários, presidências de comitês executivos, seções e instituições igualmente importantes) se organizam, de acordo com a decisão do VII Congresso dos Sovietes, sobre bases de direção colegiada limitada. As organizações de menor importância no aparato de sovietes, que por indicação dos órgãos diretivos realizam simples funções técnicas, se atêm ao princípio da direção única.
b) Todos os órgãos cimeiros da direção econômica seguirão os mesmos princípios (presidência do conselho econômico supremo, seções, comitês principais e centros, conselhos de economia de governo e suas seções, alta administração e administrações zonais das fábricas industriais).
c) A direção única das fábricas e obras, em vista das atuais relações técnicas, econômicas e sociais inseguras, e da incompetência dos melhores diretores técnicos na resolução das novas e complicadas tarefas econômicas e sociais que surgem de uma mudança revolucionária, não garante de modo algum uma direção precisa e eficiente. Fábricas e obras, que são centros naturais das massas proletárias e escolas naturais para o aprendizado da arte da direção, devem conduzir-se segundo o princípio da direção colegiada limitada. Para os órgãos submetidos à direção da fábrica vale o princípio da direção única. Observação. Será permitido, de acordo, com os correspondentes centros econômicos e sindicais, a direção única para pequenas fábricas e para alguns serviços militares. No último caso, pressupõe ser imprescindível que os serviços tenham os dirigentes que mais se sobressaem e uma organização correta do aparato técnico e de aprovisionamento.
5. Para dar ao trabalhador de todos os colegiados precisão, rapidez e intensidade, será dada uma instrução especial sobre seu trabalho e sobre as formas e métodos de realizá-lo, sendo necessário um controle contínuo para vigiar a realização de tudo. Igualmente, se criarão todos os órgãos que dirigem a formação dos colegiados, começando pelo comitê central do PCR, para prestar uma maior atenção à escolha de fins e manutenção em forma do pessoal componente dos colegiados, e, finalmente, para dirigir dito pessoal em todas as considerações técnicas pertinentes.
Notas
[1] Valerian Valeriánovich Obolênski (pseud. Nikolai Osínski). Nascido em 1887, economista por formação, uniu-se aos bolcheviques em 1907, desempenhando atividades clandestinas em Moscou, Tver e Carcóvia enquanto prosseguia seus estudos em economia junto com Nikolai Bukhárin, tendo publicado dois livros acerca de economia agrária antes de 1917. Depois da revolução, foi o primeiro presidente do Conselho Supremo de Economia da Rússia, em dezembro de 1917, mas renunciou ao cargo em março de 1918. Participou da primeira Oposição de Esquerda (1918), do grupo Centralismo Democrático (“decistas”, 1919-1927) e da Oposição Unificada (1927), mas rompeu com a esquerda bolchevique ainda em 1927. Exerceu vários cargos de médio escalão até 1937, quando foi preso. Sentenciado à morte e executado em 1 set. 1938. Segundo Eduard Dune em seu artigo sobre o grupo decista, era “um escritor por natureza, economista por formação, com um largo vocabulário frente a um pequeno círculo de pessoas, mas sem palavras diante de uma audiência grande e desconhecida (…) dolorosamente modesto, tanto em público quanto em sua vida privada. Um enorme volume de leitura, erudição, sensibilidade pessoal e modéstia nas relações com os outros, atraíam-lhe as pessoas que conseguiam conhecê-lo intimamente”.
[2] Timofêi Vladímirovich Saprônov. Nascido em 1887, foi um trabalhador da construção civil, pintor de casas. Filiou-se ao Partido Operário Social Democrata Russo (POSDR) na revolução de 1905. Foi preso e exilado como organizador sindical dos trabalhadores da construção civil de Moscou. Durante a guerra, no período entre 1914 e 1916, viveu ilegalmente sob o nome de Alexandrov e trabalhou na fábrica Provodnik (“Explorador”) em Tushino, perto de Moscou. Até fevereiro de 1917 organizou na fábrica um grupo do POSDR(b) e uma organização sindical sob o disfarce de uma caixa de assistência de saúde. Segundo Eduard Dune em “Centralismo Democrático”, era “um homem sem educação, mas com uma mente brilhante e sóbria, e uma vontade férrea (…) corajoso o suficiente para abandonar o partido ao qual devotara décadas de sua vida ao estar convencido de que ele conduzia a classe trabalhadora não para um futuro melhor, mas para outro pior”. Tornou-se presidente do soviete provincial de Moscou, presidente do comitê de concessão, presidente do Pequeno Sovnarkom e secretário do VTsIK após a reorganização do CEC da URSS. Neste ponto terminou sua carreira de sovietnik. Já em 1918 fez parte da primeira Oposição de Esquerda, e depois integrou a tendência Centralismo Democrático, da qual foi um dos principais organizadores e que defendeu no IX Congresso do partido, em 1919, que os sovietes guardassem independência do partido. Os decistas formaram uma frente com os trotskistas e os zinovievistas entre 1923, quando assinaram conjuntamente a Declaração dos 46, e 1927, quando foram todos expulsos do partido em seu XV Congresso. Saprônov foi deportado para a Crimeia em 1928, preso novamente em 1932 e viveu desde então a maior parte do tempo no isolador político de Verkhneuralsk, até sua execução por fuzilamento em 1937.
[3] Vladímir Nikoláevich Maksimóvski. Nascido em 1887, foi um professor aderente aos bolcheviques desde 1903, quando era um secundarista em Kolomna, cidade próxima a Moscou, sendo responsável por atividades clandestinas nesta cidade e também em Tula, Moscou e Carcóvia até 1907, quando emigrou para a Suíça. Retornou no mesmo ano, sendo preso várias vezes. Depois da revolução de fevereiro de 1917 ocupou vários cargos militares e em órgãos educacionais, mas suas atividades junto ao grupo Centralismo Democrático e à Oposição Unificada levaram à sua prisão em 1937; morreu provavelmente na prisão, em 1941. Dele, Lênin disse uma vez, ainda que ironicamente: “O camarada Maksimóvski é mais experiente que eu em questões de organização” (Заключительное слово по докладу ЦК на IX съезде РКП(б) / Zaklyuchitel’noye slovo po dokladu TSK na IX s“yezde RKP(b). Полноые собраниые сочинениы / Polnoye sobraniye sochineniy, vol. 40, p. 262).
[4] Trata-se aqui de um ataque dissimulado a Lênin, único dirigente frente ao qual se postula uma direção colegiada, existente atualmente [em 1971] no interior da URSS. (Nota do tradutor espanhol).
Traduzido pelo Passa Palavra, este texto integra o esforço de traduções de 100 anos da Revolução Russa (confira aqui o chamado e a lista completa de obras).