O professor dava aulas de Ciências Humanas em uma ONG que atendia adolescentes pobres, favelados, pretos, pardos. Pensou que o filme que era uma coqueluche entre a extrema-esquerda faria sucesso com seus alunos, afinal era a expressão periférica. Conseguiu uma cópia e passou Branco sai, Preto fica. Os alunos e alunas só reclamavam, não conseguiam se concentrar. O professor falou: – Vocês só conseguem ver filme de Holywood, com narrativa de herói. Qualquer outra coisa já reclamam. Um das alunas respondeu: – Claro! Essa coisa feia a gente vê todo dia. Quando vou no cinema quero ver alguma coisa bonita. Passa Palavra
É a parada que o Eduardo Marinho falou que mais me capturou, nunca tinha percebido isso. Pra esquerda falta vivência! Dizem lutar por um povo que eles não conhecem, não convivem. E eu não me identifico com a direita, nem de muito longe. Mas para muitos de nós que estamos mais à esquerda no espectro falta traquejo e autocrítica.
Eu também não entendi por que virou coqueluxe da extrema-esquerda. Vi o filme e achei chato. E eu até gosto de filme “cabeça”. Mas o filme é ruim simplesmente. Pelo menos pra mim. E claro, eles conhecem aquela realidade. O filme foi feito pra quem não conhece.
Nois curti memo é velozes e furiosos… Todos eles… Especialmente o que filmaram nas nossa quebradas…
Tamo cum Anita, mano! Nois é ostentação, vacilão…!
A genialidade do filme está na recusa de fazer um retrato fiel da realidade. Não é um documentário, não é um manifesto, não é um romance. É um jogo entre memórias, violências, desejos e possibilidades. É a cidade que precisa de passaporte, é o viajante do tempo em busca da reparação dos crimes de Estado, é o cenário apocalíptico, o galpão de partes mecânicas do corpo…
Quando perguntaram a Adirley Queirós “como surge a ideia para realizar Branco sai nesse formato” (https://brasil.elpais.com/brasil/2015/03/20/cultura/1426879114_215283.html), ele respondeu:
“Com os dois atores, já tínhamos a ideia inicial de não fazer um documentário clássico. Queríamos uma coisa mais próxima do apocalíptico, de uma volta do futuro. Aí surge a ideia da ficção. O Marquim, que é cadeirante, me disse que não queria falar sobre ele, contar de novo a história do Quarentão. E para ele documentário não é filme. Disse que se voasse, se tivesse bomba, aí ele faria”.
Enfim, há muita gente que não gosta do filme, faz parte. O problema é tratá-lo como se fosse um simples documentário retratando as obviedades da vida cotidiana periférica e achar que os aplausos vieram por conta do distanciamento da plateia em relação a esta realidade, uma espécie de fetiche da pobreza.
Exatamente! Quem mora na periferia convive com o horror cotidiano. Quer ver outras coisas, novela da Globo. Só a classe média que romantiza as periferias. Romantiza, mas viver no horror não vai. Nem deve, ninguém merece!