Por Passa Palavra
Em tempos de vacas magras em termos de mobilização autônoma dos trabalhadores, cabe observar o que pensa a esquerda com representação no Congresso Nacional sobre a reforma da previdência. Vejamos. Levaremos em conta apenas aqueles partidos cuja trajetória está ligada, de uma forma ou de outra, à trajetória do PT, a força de esquerda hegemônica no país.
O PT denuncia que a reforma proposta por Paulo Guedes, ao invés de combater privilégios, será feita às custas daqueles que recebem até dois salários mínimos, os trabalhadores mais suscetíveis ao desemprego, à precarização do trabalho e à redução da renda média. No entanto, mesmo com o PT fazendo coro com quem denuncia a “mentira montada para convencer os desavisados”, os governadores do partido manifestaram apoio público à reforma, e Wellignton Dias, governador do Piauí, disse às claras: “Exatamente [vou apoiar]. O meu partido tem uma posição de que o Brasil precisa encontrar uma regra que dê equilíbrio na Previdência”.
A Rede Sustentabilidade, por sua vez, afirma que “a Reforma da Previdência Governamental coloca o sacrifício aos mais pobres” e recomenda “o apoio de forma pacífica e cidadã às mobilizações […] na defesa de um Brasil Sustentável”.
Da parte do PCdoB, vieram, de um lado, a promessa de que a bancada comunista “fará o possível para impedir a votação do texto que classifica como ‘cruel e fiscalista’ e que ‘retira o direito de se aposentar’ de parte da população” e, de outro, a denúncia de que o governo pretende “arrochar o bolso do trabalhador e poupar os grandes sonegadores”. A posição do seu quadro de maior destaque, Flávio Dino, governador do Maranhão, é característica dessa posição: “A reforma da Previdência é uma necessidade. Há consenso em relação isso. Precisamos de novas regras previdenciárias. Concordamos com isso. Queremos dialogar. Porém, não nesses termos. Não podemos imaginar que seja razoável retirar R$ 1 trilhão dos direitos do mais pobres. Com isso, não concordamos”.
Já o PSOL, mais assertivo, apresentou 4 propostas “para resolver a crise econômica sem atacar sua aposentadoria”, sob a forma de emendas ao projeto de reforma do governo. As emendas à emenda são as seguintes: “eliminação da isenção da taxação de lucros e dividendos e da permissão de dedução dos juros sobre o capital próprio”, “instituição do imposto sobre grandes fortunas”, “majoração da alíquota máxima do imposto sobre grandes heranças” e “criação de cobrança do Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) para aviões e embarcações de passeio”. Na prática, são quatro contrabandos legislativos que fogem ao objeto da PEC do governo; ou seja, propostas que não só poderão ser descartadas facilmente no debate parlamentar como sequer parecem ter sido colocadas para serem realmente debatidas.
Por sua vez, o PDT, em um esforço de parecer uma “oposição consciente”, apresentou uma proposta “alternativa”, mas o próprio líder do partido esclarece: “não acredito que nossa proposta seja a aprovada, mas esperamos aprovar vários pontos que atenuam os efeitos maléficos da proposta original”.
Existe uma pressão mais vigorosa pela reforma da previdência há mais ou menos três anos, desde a crise que levou ao impeachment de Dilma e ao início do governo Temer. Ora, mesmo com toda a impopularidade da proposta do governo, será que esses partidos estão realmente engajados em impedi-la? O fato de Bolsonaro a ter entregue já sinalizando para a possibilidade de alterações drásticas no seu alcance pode ter sido tanto estupidez quanto consciência da impopularidade das medidas encaminhadas e dos descompassos de interesses econômicos e políticos que alguns pontos da reforma explicitam, criticados pelos mais distintos segmentos. Essa impopularidade mesmo entre os congressistas foi atestada no relatório da Comissão Especial da Câmara dos Deputados, que analisou a reforma da previdência proposta pelo governo: entre os pontos retirados pela comissão estão os mais duros para os trabalhadores mais pobres, as mudanças no Benefício de Prestação Continuada (BPC), pago a idosos e deficientes de baixa renda, e na aposentadoria rural, e, surpreendentemente, também a adoção do regime de capitalização, um item manifestamente central da reforma defendida por Paulo Guedes. Aparentemente parte dos gestores não está disposta a pagar o preço de uma reforma dessa magnitude. E a parte que fica à esquerda?
Apesar de toda a argumentação sobre a “farsa do déficit” e de que a reforma é inaceitável, quando a esquerda parlamentar convocou os trabalhadores ao protesto e à greve geral, manteve todas as manifestações e mobilizações na mais absoluta falta de radicalidade, impondo manifestações ordeiras, pacíficas, inclusive colaborando com os agentes da repressão no isolamento daqueles que porventura quisessem radicalizar os atos. O que ela diz sobre a gravidade do projeto do governo, sobre as condições funestas às quais a classe trabalhadora poderá estar submetida, não condiz, assim, com sua prática bem comportada. Do mesmo modo, apesar de a classe trabalhadora parecer estar preocupada com a reforma proposta pelo governo, essa preocupação não alcançou proporções suficientes para convencê-la a se mobilizar junto à esquerda, haja em vista a baixa participação popular na recente “greve geral”. A ideia de que o Estado está quebrado e de que alguma reforma é necessária parece ter força entre os trabalhadores, legitimando, na ausência de alternativas reais em debate, a aprovação da reforma “pragmática” que está sendo proposta por Maia.
Oficialmente, os partidos de esquerda dizem ser radicalmente contra a reforma da previdência, mas tudo indica que querem que alguém a faça. Talvez eles queiram que passe a reforma de Guedes ou de Maia, acreditando, no rastro da direita, que assim as contas públicas serão “equilibradas”, para que no futuro, novamente no poder, possam pôr as mãos no volante uma vez mais e repetir o modelo lulista de governar. Talvez tenham esquecido da ampla gama de fatores econômicos conjunturais (e internacionais) que permitiram que aquele modelo funcionasse. E enquanto a esquerda aspirante a gestora do Estado assim sonha, a realidade para os trabalhadores parece impor desafios ainda maiores. Em um cenário de congelamento dos gastos primários com a Emenda Constitucional 95, uma crônica baixa produtividade do trabalho, estagnação da arrecadação e amplo desemprego, dificilmente será possível para os trabalhadores construir um cenário favorável de melhoria de condições de vida e trabalho sem colocarem em marcha um amplo e radical movimento, que articule empregados e desempregados para de fato afetar a produção e lutar por outras saídas para essa situação, construindo, então, alternativas para a crise econômica que não estejam vinculadas ao rebaixamento dos salários e à perda de direitos.
Ora, esse movimento não existe. E nenhum dos partidos de esquerda pretende ou tem capacidade para ajudar a construí-lo. Tampouco outras organizações dos trabalhadores (sindicatos, movimentos sociais, coletivos etc.) demonstram empenho e capacidade de mobilização à altura dos atuais desafios. Que alternativa resta, então, para os partidos da esquerda brasileira? Pelo modo como têm atuado, apenas uma: que o ônus da reforma da previdência recaia sobre o atual governo de direita, para que futuros governos de esquerda possam ter mais recursos desvinculados dos “gastos sociais” e construam, novamente, uma política social de cima para baixo, sem risco de derrota ou insubordinação. Se assim for, há uma confluência de interesses entre direita e esquerda parlamentares, na medida em que ambas de fato acreditam que a reforma da previdência, afinal de contas, de fato é necessária e está sendo apresentada em termos razoáveis, que resultarão em ganhos para “o Brasil” e maiores margens de ação para quem estiver guiando a máquina estatal.
Que a reforma da previdência de Guedes e Bolsonaro é inconveniente para os trabalhadores, já sabemos. No entanto, não são poucos os sinais de que ela parece ser conveniente para a esquerda parlamentar em seus anseios governistas.
As imagens que ilustram o artigo são fotografias de instalações de Carmela Gross
O grande problema da esquerda que, com sinceridade, não com demagogia, pretende negar a necessidade econômica das reformas é o fato de ela querer, num evidente paradoxo, que os capitalistas apoiem política e economicamente um capitalismo que não lhes interessa, ou não lhes interessa mais, situação ainda mais paradoxal quando a esquerda demagógica, ou parlamentar, finge opor-se às reformas para marcar uma posição, com o que pretende lucrar eleitoralmente no futuro, ao mesmo tempo em que intervém para afastar toda a radicalidade das mobilizações dos trabalhadores. Este texto acerta em reconhecer o oportunismo desta esquerda demagógica, mas falha, na minha opinião, em reconhecer aquele paradoxo muito comum na esquerda bem intencionada.
Em primeiro lugar, é evidente que há déficit; a previdência social é um problema econômico em todos os lugares do mundo e basicamente os países que precisam fazer reformas com menos frequência e conseguem manter a previdência que reflita em torno de 10% de seu PIB, são, idealmente, mais economicamente saudáveis. Não são, claro, os únicos indicadores; contudo, é real que a previdência brasileira está na casa dos 80% do PIB do país.
A farsa é achar que reduzir o custo da previdência trará: (i) investimento estrangeiro; (ii) mais dinheiro alocado para outros gastos sociais; Quanto ao primeiro ponto, é simples: que investidor internacional está, nesse momento, acompanhando a previdência brasileira para investir aqui? Isso é uma bobagem que o mercado financeiro daqui gosta de acreditar. O segundo é simples: o governo balancear quanto gasta com a previdência é ótimo, se houvesse, por exemplo, um proposta de reforma da previdência alinhada com nova reforma trabalhista, que trouxesse mais seguranças ao trabalhador.
Um interessante estudo do banco mundial, de 2005, aponta que as reformas paramétricas (emenda 286 do Governo Temer) são insatisfatórias para conter o déficit, e o sistema de capitalização tem a desvantagem do largo déficit criado na transição, pois os mais jovens pagam pelo sistema de repartição atual, e para o sistema de capitalização que já integrarão; o sistema sueco, por exemplo, de contas virtuais, teria a vantagem da capitalização, pois a contribuição é definida e transparente (mais complexo criar distorções e privilégios), assim como impediriam propostas políticas absurdas e irrealizáveis na prática, acerca do benefício.
As principais críticas desse sistema seriam de que ele nada mais é que o sistema de repartição com benefício definido (como o nosso), e que tudo pode ser alcançado no sistema de contas virtuais, é perfeitamente alcançável por medidas no sistema de repartição. De qualquer forma, o sistema de contas virtuais se mostrou uma experiência significativamente bem sucedida, pois se olharmos a saúde fiscal dos Estados que o implementaram, vemos que o custo desse sistema é significativamente menor.
Nada disso resolve o fato de que a população jovem diminui, e os velhos vivem mais tempo; esse dilema econômico permanece em aberto.
Apesar disso tudo, a questão é que nesses países social-democratas, a rede de benefícios ao trabalhador e o alto subsídio estatal (somado aos impostos vigorosos), garantem que a qualidade de vida dessas populações permaneça estável e em alto nível. Ou seja, na prática, a discussão sobre o que fazer como dinheiro poupado pela previdência é o que realmente deveria preocupar a esquerda, pois as duas coisas precisam ser consideradas em conjunto.
É impossível pensar que o sistema previdenciário brasileiro não precise ser reformado a pensar também na saúde fiscal do país, afinal, não somos o Japão e não gozamos da capacidade econômica e desenvolvimento para ter uma dívida interna de 4x o valor do PIB.
Assim, é também importante entender que dívida pública não é uma dívida como as nossas, como gostam alguns liberais e Ciro Gomes de contar; pagar uma dívida pública é algo idiota, pois ela não é ruim, é só um instrumento do Estado para controlar a economia (inflação, despesas, investimentos futuros, etc.). Assim, a questão do custo da previdência, que é
Portanto, ler a idiotice do PSOL, que tem pessoas com ensino superior capacitadas em fazer uma análise minimamente razoável sobre a situação fiscal e a previdência, e propor, para além das típicas reformas que, apesar de importantes, são fiscalmente irrelevantes para o orçamento do governo, é estarrecedor.
O fato de tudo ser político não significa que tudo é relativizável, mas sim que para fazer política tudo deve ser considerado, e de maneira rigorosa; podemos propor reformas inteligentes, que realmente sejam para o povo, que melhorem a condição do trabalhador, mas precisamos antes dominar as ferramentas disponíveis para fazê-las e, se essas ciências se mostrarem insuficientes, podemos bem contestá-las, descartá-las e mesmo inventar novas, que abarquem o problema de maneira mais ampla, complexa.
O que realmente não é possível é se abster de entender e discutir a previdência por uma pura preguiça do tema.
E não dá pra esquerda esperar seus parlamentares proporem uma reforma; é necessário que a classe trabalhadora e a intelectualidade aliada à esquerda pensem em projetos concretos de reforma alinhados aos interesses do proletariado.
Simplesmente se recusar a propor e negar o que vem é a fórmula do derrotismo.
Quero fazer uma correção, já que não posso editar meu comentário: a dívida bruta está em 80% do PIB, a dívida líquida 55% (descontando os ativos do estado brasileiro), e a previdência compõe, nesse sentido, despesas da ordem de 800 bilhões, 25% da dívida líquida. O problema é que a previdência está acelerando seu déficit numa velocidade insustentável.
Ademais, é importante frisar que, mesmo adotando a tese de que o desequilíbrio das contas veio das taxas abusivas de juros, e não do déficit previdenciário, o nosso sistema nunca fui justo para começo de conversa, com uma parcela pequena da população engolindo valores exorbitantes que deveriam ser distribuídos para a população mais pobre.
1. Insinuar que o conjunto dos partidos de esquerda que possuem representação parlamentar desejam a aprovação da reforma, é no mínimo uma prática de má fé. Esse tipo de prática manipulativa e baixa não surpreende quando vêm de setores das classes dominantes e de seus lacaios da direita, e, a bem da verdade, também não surpreende quando vêm da ultraesquerda. Ademais, além de não generalizar o conjunto dos partidos de esquerda – o que o texto de fato não fez, pois pontuou separadamente sobre cada um – é necessário também não tomar uma fala individualmente de alguma figura do partido e generalizar para o conjunto deste. A posição oficial do PT, PCdoB, PSB e PdT é contrária a reforma de previdência. Entretanto, sabemos que o PdT e o PSB são bagunçados e sem muito centralismo – logo não é de se surpreender caso algum parlamentar deles vote a favor. Já no PT, além de ser um partido também não tão centralizado, é sabido que há uma certa distancia entre suas figuras públicas e a militância partidária – mas é importante pontuar que todos seus parlamentares declaram voto contrário a reforma da previdência. Já a posição do partido comunista me parece mais firme, contrária a reforma do Guedes – a fala de Flavio Dino que vocês citaram, inclusive, não desmente em nada a posição do partido.
A ambiguidade que me parece ser o ponto mais fraco deste texto do passa palavra, e que é explorada diversas vezes, é o fato de ao falar de “reforma da previdência” não se específica se se refere a destruição da previdência publica proposta por Guedes, ou a toda e possível reforma na previdência. Pois, quando alguém da esquerda diz que seria bom alguma reforma da previdência, não me parece algo lá equivocado – poderia ser uma reforma pra melhorar a previdência (como mais ou menos os comunistas chineses estão fazendo).
2. Sobre a greve geral:
– Vocês erram ao afirmar uma suposta baixa participação na greve geral. Talvez num esforço de diminuir a força da mobilização popular dirigida pela esquerda – como a direita e a midia burguesa também o fizeram e fazem – o texto nega a realidade, pois, a greve geral foi forte, afetou diversas categorias dos mais diversos estados da pátria;
– É igualmente equivocada a compreensão do texto sobre “ações radicais”. Queimar buzão ou tacar pedra em vidro de banco são ações muito menos radicalizadas do que parar a produção fabril, ou os transportes de grandes cidades. Esse tipo de fetichismo infantil e ingenuo é algo que se faz necessário ser abandonado pra ontem. Ademais, o centro do dia era a paralisação da produção e do transporte, não as manifestações de ruas – isso era um bônus a mais.
3. Sobre o trecho: “Em um cenário de congelamento dos gastos primários com a Emenda Constitucional 95, uma crônica baixa produtividade do trabalho, estagnação da arrecadação e amplo desemprego, dificilmente será possível para os trabalhadores construir um cenário favorável de melhoria de condições de vida e trabalho sem colocarem em marcha um amplo e radical movimento, que articule empregados e desempregados para de fato afetar a produção e lutar por outras saídas para essa situação, construindo, então, alternativas para a crise econômica que não estejam vinculadas ao rebaixamento dos salários e à perda de direitos.”
Sim e não. Sim, é necessário e urgente a organização popular dos trabalhadores brasileiros, entretanto pra de fato construir alternativas isso não, não basta. É necessária a tomada do poder e a construção de um projeto soberano, nacionalista e socialista especificamente brasileiro. Uma esquerda que renuncia a ter como horizonte um projeto nacional de poder, é uma esquerda condenada à derrota.
Algumas considerações adicionais:
1. A esquerda demagógica a que me referi no último comentário inclui a burocracia do sindicalismo e dos movimentos sociais que orbitam a esquerda eleitoral — melhor falar em esquerda eleitoral que em esquerda parlamentar, abarcando com isso muito mais que a mera atuação parlamentar.
2. Quem comanda o capitalismo são os capitalistas. Eles estabelecem as condições nas quais os trabalhadores haverão de lutar.
3. Os trabalhadores podem influir favoravelmente nas condições acima referidas, mas para isso são necessários movimentos proletários de massa dotados de radicalidade (não confundir radicalidade com o fetiche do enfrentamento à polícia e da destruição de objetos inanimados). E movimentos derrotados, pois quando forem vitoriosos não haverá mais capitalismo nem condições menos desfavoráveis para a luta.
4. A esquerda eleitoral e seus satélites — sindicatos e movimentos sociais — aceita ou apoia ativamente nos bastidores o núcleo das condições impostas pelos capitalistas aos trabalhadores; publicamente, no entanto, encena um verdadeiro teatro, alimentando o paradoxo a que me referi no meu primeiro comentário. Nos bastidores, realismo e convicção de necessidade de reformas que satisfaçam ao empresariado (seu aliado de sempre); publicamente, demagogia.
5. Os capitalistas certamente preferem materializar suas aspirações sem que sejam obrigados a estimular conflitos de classe; se agora se veem forçados a fazê-lo, é porque estão atentos à objetividade da dinâmica econômica. Para seu alívio, entretanto, existe uma esquerda capaz de colocar a classe trabalhadora — e especialmente suas vanguardas — na passividade, ao mesmo tempo em que, atenta à objetividade acima referida, tece acordos de bastidores que poderão beneficiá-la no futuro.
6. Essa esquerda só consegue apropriar-se da tarefa de mitigar — de modo bastante limitado, diga-se de passagem — as condições desfavoráveis aos trabalhadores impostas pelos capitalistas porque os próprios trabalhadores são incapazes de desenvolver uma verdadeira autonomia.
7. Grande parte da classe trabalhadora, contudo, é consciente da farsa da esquerda eleitoral e seus satélites e por isso se desilude, se ressente e se revolta: depara, portanto, com condições favoráveis à sua atração pelo fascismo.
Não me parece um bom caminho para a esquerda reforçar o discurso do déficit fiscal sem pensar o mercado de trabalho. Quase 40% da força de trabalho está no mercado informal. 13% está desempregada. Isso falando de Brasil.
Segundo a OIT, cerca de 61% das pessoas que compõem a força de trabalho no mundo atuam de maneira informal. Se existem contas que não batem, elas estão aqui. Os sindicatos e partidos burocratizados estão pensando nessa parcela da classe trabalhadora?
Num sistema que tende a rifar parcelas cada vez mais crescente da força de trabalho, num cenário de crise, (em que as finanças buscam garantir fatias da mais valia criada pelo mundo) e exigem reformas estruturais dos estados nacionais (daí todo o debate sobre os desmontes das direitos sociais pelo mundo)… qual é a proposta da esquerda anti-capitalista?
Cenário de pleno emprego não está no horizonte. E sabemos que a história não nada pra trás.
Mas e se a esquerda começasse a desvincular a defesa da universalidade dos direitos sociais do trabalho? As pessoas merecem uma renda (merecem sobreviver e ter dignidade) por que são seres humanos. Enfim, alguma ideia precisa começar a ser plantada para não ficarmos rodeando em falso nas expectativas e decepções com a esquerda partidária e sindical.
A verdade é que nenhum partido de esquerda esta disposto a comprar briga com o funcionalismo publico, por isso se cala quanto à necessidade de corrigir as distorções que permitem que alguns segmentos dessa categoria receba valores elevados de aposentadoria, sem ter contribuído para isso. Aliás, o projeto do Paulo Guedes faz isso em parte mas o forte lobby dos altos salários vai conseguir preservar parte dos seus privilégios. Também não se fala sobre a contribuição do agronegócio, muito inferior a dos demais empresários. As isenções tampouco foram atacadas mas ninguém chama a atenção. Os maiores prejudicados serão os trabalhadores urbanos do setor privado pois o atual sistema só vem apresentando deficit por causa do desemprego e da recessão, de forma que medidas no sentido da retomada do crescimento da economia certamente zeraria o deficit. Basta ver que havia superavit nesse segmento até 2015, quando o desemprego ainda era baixo. O tal deficit só é estruturalmente relevante no setor publico, militares e rural, devido à baixa contribuição do agronegócio, mas esse é um setor privilegiado para o atual governo e conta com uma bancada forte. Não vejo a esquerda fazendo barulho sobre esses pontos. Afinal, qual é mesmo o projeto da esquerda para o país?
Articulista, as disputas internas nos partidos de esquerdas é constante. Há os liberais, querendo puxá-los para a direita [coma desculpa eterna de na verdade puxá-los para o centro], mas há os que de fato querem trazê-los para a esquerda e fazer essa política. Na direita, o mesmo fenômeno está acontecendo, na disputa entre ultraliberais e ultraconservadores [que acham que a bandidagem estatal de farda merece benefícios que aqueles que são vítimas de suas balas não podem ter].
Os sindicatos e centrais que se engajaram devem fortalecidos e suas posições defendidas, o mesmo com os partidos, ora a proposta do PSOL ao que me parece desloca e tenta colocar a conversa em outros termos: vamos cobrar de quem tem muito. Obviamente, quem tem muito não está querendo dar espaço à essas posições, as rádios, TVs e jornais nem sequer levam quem é contra a Reforma para debates, o debate se dá nó qual a dimensão dela.
Há que se ter uma agenda negativa e outra positiva, os sindicatos oferecem a negativa, resistência ao ataque, e as propostas do PSOL a positiva, de colocar uma discussão, de propor.
Se o texto pretendia ser instrumento contra a reforma e contra o capitalismo financeiro, seria mais útil falar disso também, mostrar que há paralisia de setores, mas há resistência e avanço em outros, apresentar a possibilidade de avanço, ao invés de lamentar apenas as posições de retrocesso. E, o que seria mais, apresentar outras possibilidades de avanço que não estão até agora debatidas.
Como lamento, é um bom texto. Mas é um lamento tão paralítico quanto a posição daqueles que o texto trata.
Olá a todos,
Penso que há um ponto importante que, de uma forma ou de outra, aparece marginalmente na fala de quase todos. Quero apenas colocá-lo no centro da discussão em forma de síntese: O que significa ser contra a reforma? Manter tudo como está? Isto interessa à quem? Nem aos Capitalistas nem ao movimento de trabalhadores. O que estava aí, seja em termos de causar déficit ou seja em termos de defesa de direitos ao trabalhador, não interessa mais a ninguém, está morto, é um Zumbi.