Leo Vinícius Liberato
Esta é a parte final do artigo. Leia também a primeira, a segunda e a terceira parte.
A saúde que não se vende… e o patrão que não governa [1]
Assim como o mapa de risco, o chamado modelo operário italiano, no campo da saúde do trabalhador, teve inserção em terras brasileiras, ambos produtos das lutas operárias italianas de quase meio século atrás. Na Itália ele é denominado modelo sindical (de controle e negociação da nocividade). Chegou ao Brasil via membros da CGIL – central sindical italiana ligada ao Partido Comunista – e posteriormente pela publicação da obra Ambiente de Trabalho: A Luta dos Trabalhadores pela Saúde [2]. Além da valorização do saber operário, o modelo assenta sobre três princípios: o grupo operário homogêneo, a não delegação e a validação consensual [3].
Os movimentos e ações coletivas nos quais o mapa de risco e o modelo ganharam existência são por demais ricos, e de relativa longa duração, para podermos neste espaço traçar mais do que algumas linhas gerais sobre eles. Mas é importante ressaltar que essas práticas de uma classe operária foram marcantes na história do capitalismo ocidental; pela forma, conteúdo, duração e dimensão [4], tendo seu auge em 1969, seu declínio na segunda metade dos anos 1970 e seu fim costumeiramente apontado ao ano de 1980.
Como vimos, uma nova composição da classe operária, formada por jovens migrantes que saíam do sul rural indo ao norte industrializado, com uma nova subjetividade e relação de estranhamento ao trabalho industrial, repúdio ao ritmo e às condições de trabalho na linha de produção taylorista, além de uma situação econômica de baixo desemprego, estão entre os principais fatores que levaram ao ressurgimento do conflito de classes no norte da Itália a partir do início dos anos 1960 [5].
Também como vimos, o caráter “espontâneo” das contínuas lutas fizeram as grandes fábricas da Fiat serem consideradas ingovernáveis por volta de 1974. Foram tempos em que a classe operária italiana, principalmente das grandes empresas, criou práticas, formas de luta, demandas, formas de organização e de democracia direta, mudando a correlação de forças em favor dos trabalhadores em importantes fábricas [6] [7]. Entre as características marcantes da emergência desse poder operário no período estão um antiautoritarismo, uma tendência explícita a não delegação e à democracia direta, e a constituição de novas formas de luta ligadas à organização no local de trabalho.
Nas fábricas e locais de trabalho as lutas possuíam um espírito antiautoritário que era particularmente característico do movimento estudantil que emergiu em 1968. Parte desse antiautoritarismo se voltava contra o ambiente despótico no chão da fábrica: os contramestres e supervisores, por serem as autoridades com as quais os operários tinham que lidar diretamente, foram os alvos imediatamente visados, inclusive fisicamente. O espírito e a prática de democracia direta se expressavam, entre outras formas, através do repúdio à delegação de poder e à forma política da representação [8]. É possível dizer que existia de fato uma cultura de recusa da delegação entre os operários [9]. As novas formas de luta, o controle do processo produtivo, a quebra do comando e da hierarquia na fábrica que caracterizaram o período, expressavam e dependiam entretanto de um nível por vezes extraordinário de organização dos trabalhadores no local de trabalho. Redes informais, laços de confiança, disciplina, comunicação entre setores, eram elementos que compunham essa (auto)organização [10]. Exemplo disso era a chamada luta articulada, difundida na época. Como aponta Paolo Virno, se uma greve de 24 horas dependia em boa parte das centrais sindicais, a luta articulada por sua vez era realizada com a articulação das equipes e oficinas entre elas, impactando o cotidiano da exploração no seu âmago, os ritmos, as pausas, e era decidida por todos a cada momento e sem delegação, sendo assim o terreno por excelência da autonomia operária [11].
A relação entre esse movimento operário e as instituições representativas oficiais da classe trabalhadora é outra característica marcante do período. Pode-se dizer que o poder constituinte da classe operária – ou seu poder instituinte, o poder de constituição de instituições em sentido amplo – não era identificável às instituições tradicionais da classe trabalhadora. A luta coletiva daqueles anos foi em grande parte autônoma aos sindicatos. A potência e a força dinâmica, de inovação e das próprias lutas, não estava contida neles. Durante o auge das lutas, entre 1968 e 1969, percebia-se que onde os sindicatos eram mais fracos, as lutas da classe trabalhadora eram mais fortes, e onde os sindicatos eram mais fortes a classe trabalhadora era mais fraca [12]. Os sindicatos no entanto souberam “cavalgar tigre”, e demonstraram grande capacidade de adaptação e renovação, incorporando as novas demandas, e em certa medida incorporando formas de organização e deliberação democráticas. Ao mesmo tempo a mobilização e auto-organização dos trabalhadores nas fábricas propiciou a capilaridade no local de trabalho que os sindicatos não possuíam [13].
Interessa ao nosso tema particularmente a tendência a não separação entre luta pelo controle do processo produtivo e luta pela saúde, nesse período de intensas lutas ativas [14] da classe operária italiana. Elas assumiam ares de revolta contra a organização capitalista do trabalho, como destaca Asa Laurell. A luta pela saúde e pela melhoria das condições de trabalho era ao mesmo tempo uma luta por outra organização do trabalho, pelo controle do processo produtivo. Nas lutas de 1968 e 1969 ainda eram poucas as demandas relacionadas diretamente à saúde e ao ambiente de trabalho, mas elas criaram as condições sociais para que essas demandas pudessem crescer e se generalizar, assim que a transformação e o controle operário do processo produtivo começaram a ganhar facticidade [15].
Outra característica daquele ciclo de lutas, que por sua vez está associado às formas de democracia direta, não delegação e controle do processo produtivo, foi o uso de formas de luta que colocavam em prática a demanda [16]. O exemplo da chamada autoriduzione onde havia produção por peça, iniciada na Pirelli em Milão e transformada numa espécie de patrimônio da classe operária italiana da época, é bastante ilustrativo. Tratava-se da redução dos ritmos de trabalho realizada pelos próprios trabalhadores, a despeito do interesse ou vontade da direção da fábrica. Sua expansão nas grandes plantas envolvia uma notável coordenação e organização dos trabalhadores, requerendo uma rede de representantes não oficiais no chão de fábrica. Ela se constituiu como uma forma de pressão e ao mesmo tempo como realização de uma demanda por melhores condições de trabalho. Essa auto-organização informal dos trabalhadores no processo produtivo minava por sua vez a hierarquia na fábrica e o comando da direção, e também as estruturas verticais dos sindicatos [17].
Em Porto Marghera, um polo de indústrias químicas, outro exemplo de autorredução se constitui quando os trabalhadores passaram a se organizar em turnos para diminuir o tempo que ficavam na fábrica, diminuindo assim a exposição ao ambiente e condições nocivas. Uma prática que também era ao mesmo tempo demanda e realização de objetivo. A autorredução do tempo de trabalho de 40 para 36 horas semanais obrigava a empresa a contratar mais empregados para preencher o novo turno que havia sido criado pelos trabalhadores. Embora essa luta tenha retrocedido após algum tempo em algumas fábricas, em outras os trabalhadores conquistaram permanentemente a redução da jornada de trabalho [18].
As lutas em Porto Marghera eram particularmente autônomas em relação aos sindicatos, mas o que as tornam mais interessantes ao nosso tema é a importância que a questão da saúde ganhava, devido ao adoecimento e mortes pela exposição a agentes tóxicos [19]. Embora seja importante lembrar que a luta na Fiat no histórico ano de 1969 começou com a recusa dos trabalhadores da fábrica de Mirafiori a aumentar a velocidade da produção, possivelmente foi em Porto Marghera que a recusa do trabalho ganhou ares mais claros de prática operária, para além de um mote ou estratégia política [20]. Um dos objetivos da Assembleia Autônoma [dos operários] de Porto Marghera, criada em 1972, era a recusa do trabalho nos departamentos considerados perigosos como meio mais direto de evitar agravos à saúde [21]. A recusa do trabalho significaria ainda para a Assembleia Autônoma o começo da mudança da própria organização do trabalho [22]. A redução da jornada de trabalho por sua vez era vista como uma expressão da recusa do trabalho e da luta contra o trabalho causador de agravos à saúde. No testemunho de Italo Sbrógio, operário da Petrolchimico, o debate sobre a recusa do trabalho começou em Porto Marghera a partir da discussão de que o trabalhador deve produzir, mas precisava questionar “como, o quê e quando” [23]. De acordo com o que vimos antes, trata-se da explicitação do questionamento e da disputa sobre o trabalho que deve ou não ser feito e entregue pelo trabalhador; uma luta também em torno da avaliação de risco.
O modelo operário italiano de controle da nocividade e o mapa de risco surgem e se inserem portanto nesse contexto de constituição de formas democráticas de organização, deliberação e lutas a partir da atividade autônoma da classe operária. Organização e lutas que levaram a um avanço do poder operário no chão da fábrica. A não delegação e o grupo homogêneo, por exemplo, são ao mesmo tempo fundamentos e características das lutas e instituições democráticas constituídas pelos operários. O grupo homogêneo de trabalhadores era o núcleo base dos Conselhos de Fábricas, nascidos no “outono quente” de 1969 e amplamente difundidos nas fábricas do norte da Itália [24]. Andrea Belli ressalta que o modelo ajudou a CGIL a reconhecer e incorporar os Conselhos de Fábrica, justamente pelo modelo e pelos Conselhos terem pressupostos comuns. Da mesma forma, também segundo Belli, a validação consensual, uma das bases do modelo, quando foi formulada continha uma mudança de estratégia sindical que de algum modo antecipava o chamado “espontaneísmo” de 1968 [25].
Assim como a luta pela saúde, e até mesmo por serem resultados dela, o modelo e o mapa de risco também não são separáveis da constituição mais ampla de novas formas de luta, democracia direta, organização, avanço no controle do processo produtivo e de uma determinada composição de classe. Grupo homogêneo, validação consensual, não delegação, não eram meros atributos de um modelo de intervenção em saúde e segurança, mas significações imaginárias [26] instituintes, que estiveram presentes naquela classe operária. Essa não separação também perpassa o grupo de médicos da Câmara do Trabalho de Turim, do qual Ivar Oddone [27] fazia parte. Grupo esse que recuperava explicitamente Gramsci e a tradição conselhista, e que partia do grupo operário homogêneo e da sua capacidade de controlar e modificar o processo produtivo para tentar reconstruir uma “consciência de produtor” [28]. Laurell sintetiza com muita propriedade o processo de constituição do modelo, do qual o mapa de risco é parte:
Os estudos da saúde na fábrica não surgem nem encontram sua metodologia espontaneamente, mas sim da confluência entre a necessidade das massas de fundamentar a luta contra a organização do trabalho imperante e uma proposta teórico-metodológica que permita implementar sua solução. Certamente não se trata de dois fenômenos independentes entre si, já que são manifestações diversas do processo no qual se vai conformando, objetiva e subjetivamente, a classe operária italiana nos anos sessenta [29].
Para além de uma demanda concreta, a questão da saúde era também um meio utilizado pelos trabalhadores para se atingir o fim mais amplo de minar o poder de comando capitalista. Tal instrumentalidade é explicitada em documento divulgado pelo CUB [30] da Pirelli, no qual é afirmado que a luta contra um ambiente nocivo é um meio para se questionar o poder de decisão do patrão:
Não se luta pela regulamentação do trabalho por peça ou por uma melhoria do ambiente de trabalho, mas através da contestação do trabalho por peça ou do ambiente nocivo, se contesta o poder de decisão do patrão (antes das lutas era a Pirelli quem decidia os ritmos ou estabelecia o limite de nocividade; na luta o operário é quem decide ritmos, que recusa o trabalho se esse comporta um dano à saúde etc.) [31].
Não surpreende portanto que, segundo relato de um experiente mineiro brasileiro, operários italianos com quem ele teve contato no Brasil no início dos anos 1980 haviam dito que o mapa de risco surgiu e era usado para mapear pontos estratégicos da empresa. Algo que também indica a indissociabilidade entre Segurança e Saúde no Trabalho e a luta pelo e através do controle do processo produtivo. Não por coincidência o modelo sindical ou operário de controle da nocividade teve sua emergência e declínio respectivamente com a ascensão e declínio das lutas operárias na Itália nas décadas de 1960 e 1970: no final dos anos 1970, quando as lutas entraram em refluxo, o número de investigações com base no modelo diminuiu consideravelmente [32]. O trecho acima reproduzido de um documento do CUB da Pirelli ilustra também, através de uma situação histórica de conflitos explícitos no local de trabalho, que assim como o trabalho que deve ser feito em determinado tempo é resultado de constante luta, sem um critério objetivo que possa determiná-lo, o mesmo se dá sobre o risco e o trabalho que deve ser ou não feito em determinadas condições. Durante as lutas, não era mais a Pirelli que decidia os ritmos e os limites de nocividade, mas os operários.
A Itália foi um laboratório particularmente interessante de conflitos sociais e de resposta a eles. Devido à intensidade das lutas operárias a resposta das empresas foi particularmente rápida, deixando mais vívida as transformações que de maneira global atingiram o mundo do trabalho após os conflitos que, com maior ou menor intensidade, ocorreram em diversos países naquelas décadas, e que expressavam também com maior ou menor intensidade um repúdio à autoridade, à falta de controle ou participação, e à organização do trabalho fabril como um todo.
Como dissemos, a resposta dada ainda nos anos 1970 às lutas nas fábricas italianas foi a reestruturação produtiva: a automatização e descentralização do processo produtivo, com o aumento do setor informal da economia [33]. Era uma resposta correspondente à ingovernabilidade que tomou conta das grandes fábricas, com suas enormes concentrações de trabalhadores. Reestruturação que desestruturou os grupos homogêneos e suas experiências [34], num processo de decomposição de classe – para usarmos um conceito forjado pelos operaístas nos anos 1960. As respostas às lutas operárias conformaram o que tem sido chamado de pós-fordismo ou toyotismo, quanto às relações de trabalho e aos processos de produção e criação de valor.
Notas
[1] O conteúdo desta seção foi publicado anteriormente no artigo: Viradas do Avesso: percepção dos trabalhadores, constituição e existência das ferramentas de SST. Revista Latino-americana de Estudos do Trabalho, Ano 19, nº 32, 2014, pp.39-64.
[2] Cf. ODDONE, Ivar et al. (1986), Ambiente de Trabalho: A Luta dos Trabalhadores pela Saúde. São Paulo: Hucitec.
[3] Cf. BELLI, Andrea (2001). “Delega” e “non delega”: la CGIL davanti all’infortunio e alla malattia professionale. Tesi di Laurea in Storia del Movimento Sindacale. Università degli studi di Firenze. Facoltà di Scienze Politiche “Cesare Alfieri”.
[4] Apenas para ilustrar, o chamado “outono quente” na Itália, em 1969, teve uma das mais intensas mobilizações coletivas da história das lutas dos trabalhadores, com mais de 300 milhões de horas perdidas de trabalho devido a greves, das quais 230 milhões na indústria (GIACHETTI, Diego; SCAVINO, Marco (2005). La Fiat aux mains des ouvriers: L’Automne chaud de 1969 à Turin. Paris: Les Nuits rouges.)
[5] Cabe notar que as condições de estrutura de saúde, moradia, educação e transporte que os imigrantes encontraram no norte eram precárias e contribuíam para uma condição de vida penosa. As lutas dos operários foram além da fábrica nessas duas décadas, e envolveram questões ligadas ao custo do transporte, moradia, energia elétrica, alimentos etc. Cf. GINSBORG, Paul (1990),. A History of Contemporary Italy: Society and Politics 1943-1988. London: Penguin, 1990.
[6] Cf. BARKAN, Joanne (1984). Visions of Emancipation: The Italian Workers’ Movement since 1945. New York: Praeger; BALESTRINI, Nanni.; MORONI, Primo (2003). La Orda d’Oro 1968-1977: La grande ondata rivoluzionaria e creativa, politica ed esistenziale. Milano: Universale Economica Feltrinelli.; LAURELL, Asa C. (1984). Ciencia y experiencia obrera: la lucha por la salud en Italia. Cuadernos Políticos, No 41, México, D.F.: Era, pp. 63-83. Em: http://www.bolivare.unam.mx/cuadernos/cuadernos/contenido/CP.41/CP41.6AnaCristinaLaurell.pdf. Consultado: 09/12/2013; LUMLEY, Robert (1990b). State of Emergency: cultures of revolt in Italy from 1968 to 1978. New York: Verso.
[7] Pode ser ilustrativa dessa mudança na correlação de força nas grandes fábricas a fala de um operário da Fiat em julho de 1969 no encontro nacional dos Comitês de Base (uma criação dos trabalhadores, originada em 1968 na Pirelli de Milão): “Primeiro, Agnelli [presidente da Fiat] não conseguiu reconquistar o controle da velocidade das linhas de montagem, dos tempos, do modo como a produção é planejada para ocorrer. Segundo, ele não foi capaz de reconquistar porque nossa organização está ficando cada vez mais forte dentro da fábrica. Dizemos isso para salientar uma tendência: não que a todo momento Agnelli não consiga acelerar a linha, mas afirmo categoricamente que a partir de agora ele vai achar isso cada vez menos possível” (Anônimo, 1971: 16, tradução nossa)
[8] Cf. Giachetti e Scavino, op. cit.; Lumley, op. cit.
[9] Cf. SACCHETTO, Devi; SBROGIÒ, Gianni. (2012), Pouvoir ouvrier à Porto Marghera: Du Comité d’usine à l’Assemblée de territoire (Vénétie – 1960-80). Paris: Les Nuits rouges.
[10] Cf. Lumley, ibidem.
[11] Cf. VIRNO, Paolo (2003). “Il Lavoro non Rendi Liberi”, in Nanni Balestrini; Primo Moroni, La Orda d’Oro 1968-1977: La grande ondata rivoluzionaria e creativa, politica ed esistenziale. Milão: Universale Economica Feltrinelli.
[12] Cf. Balestrini e Moroni op. cit.; LOTTA CONTINUA (1971). Cultural Revolution. Radical America, Vol 5, No 5, pp.25-31.; Lumley, ibidem.
[13] Cf. Barkan, op. cit.; Giachetti e Scavino, ibidem.; Ginsborg, op. cit.; Lumley, ibidem.; Virno, op. cit.
[14] É pertinente para a discussão aqui proposta a tipologia de lutas apresentada por João Bernardo em Economia dos Conflitos Sociais: luta coletiva ativa; luta coletiva passiva; luta individual ativa; luta individual passiva. As lutas coletivas ativas são aquelas em que há uma participação dos trabalhadores, não como meros votos em assembleias, mas como organizadores e criadores. A comunicação se dá diretamente entre os trabalhadores, de forma horizontal, e não entre trabalhadores e direção sindical. Nessa participação coletiva ativa são criadas “relações sociais de novo tipo”, tendencialmente igualitárias. Já as lutas coletivas passivas são aquelas em geral dirigidas por uma burocracia sindical, sem a participação efetiva dos trabalhadores, sendo o exemplo mais comum a chamada greve de pijama, na qual os grevistas “ficam em casa”.
[15] Cf. Laurell, op. cit.
[16] Idem.
[17] Cf. Giachetti e Scavino, ibidem.; Lumley, ibidem; Sacchetto e Sbrogiò, op. cit.
[18] Cf. SBROGIÒ, Gianni (2006a),. “The struggle is worth it!”, in Wildcat, Porto Marghera: the last firebrands. Em: http://libcom.org/files/firebrands_booklet_2_horizontal.pdf Consultado: 08/12/2013.
[19] O ciclo de lutas em Porto Marghera, desencadeado em torno da questão da saúde e das substâncias tóxicas, adentrou a década seguinte, demandando o fechamento de fábricas até a eliminação da fonte de risco, com a manutenção dos salários dos trabalhadores no período em que estivessem fechadas (Sacchetto e Sbrogiò, ibidem; Sbrogiò, 2006a)
[20] Tendo sido mais profundamente formulada por Mario Tronti no artigo La strategia del rifiuto, a recusa do trabalho foi teorizada e proposta pelos operaístas (intelectuais da nova esquerda italiana) nos anos 1960, tendo supostamente como base e referente a subjetividade dos trabalhadores que compunham a nova classe operária italiana. A recusa do trabalho englobaria a recusa das obrigações na produção, através de greves, sabotagens, absenteísmo etc., e reivindicações salariais cada vez mais altas. A interpretação operaísta dessas práticas de luta operárias do início dos anos 1960 via nelas um meio e tendência dos trabalhadores buscarem a satisfação de suas necessidades independentemente dos requisitos ou necessidades do capital (Lumley, ibidem.).
[21] Cf. SBROGIÒ, Italo (2006b). “The history of the workers’ committee of Porto Marghera”, in Wildcat, Porto Marghera: the last firebrands. Em: http://libcom.org/files/firebrands_booklet_2_horizontal.pdf. Consultado: 08/12/2013.
[22] Uma tradução em português de um manifesto de 1970 intitulado “A recusa do trabalho”, do Comitato Operaio di Porto Marghera, pode ser encontrada nos Cadernos de Ética e Filosofia Política, n.19, FFLCH-USP, 2011.
[23] Cf. Sbrogiò (2006b)
[24] Cf. Lumley, ibidem.
[25] Cf. Belli, op. cit.
[26] Sobre o conceito de significações imaginárias, ver CASTORIADIS, Cornelius (1982). A Instituição Imaginária da Sociedade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2ªed.
[27] Oddone foi o intelectual que mais contribuiu ao desenvolvimento do modelo operário italiano, ou modelo sindical de controle e negociação da nocividade.
[28] Cf. Tonelli (2007, p. 5)
[29] “los estudios de la salud en la fábrica no surgen ni encuentran su metodología espontáneamente, sino de la confluencia entre la necesidad de las masas de sustanciar la lucha contra la organización del trabajo imperante y una propuesta teórico-metodológica que permita implementar su solución. Ciertamente no se trata de dos fenómenos independientes entre sí, ya que sólo son manifestaciones diversas del proceso en el cual se va conformando; objetiva y subjetivamente, la clase obrera italiana durante los años sesenta” (Laurell, ibidem).
[30] Comitati Unitari di Base, organização operária criada sem participação dos sindicatos em 1968-69 e que foi multiplicada em inúmeras fábricas, principalmente do norte da Itália. O CUB da Pirelli foi a experiência mais importante dentre os diversos CUBs. Ver Lumley, ibidem.
[31] “non ci si batte per una regolamentazione del cottimo o per un miglioramento dell’ambiente di lavoro, ma attraverso la contestazione del cottimo o dell’ambiente nocivo, si contesta il potere decisionale al padrone (prima della lotta è Pirelli a decidere i ritmi o a stabilire i limiti della nocività; nella lotta è l’operaio a decidere i ritmi, a rifiutare il lavoro se esso porta danno alla salute ecc.)” (CUB (2003). “Documento del CUB Pirelli”, in Nanni Balestrini; Primo Moroni, La Orda d’Oro 1968-1977: La grande ondata rivoluzionaria e creativa, politica ed esistenziale. Milão: Universale Economica Feltrinelli, p. 292.
[32] Cf. Laurell, ibidem.
[33] Cf. Ginsborg, ibidem.; WRIGHT, Steve (2002). Storming Heaven: Class Composition and Struggle in Italian Autonomist Marxism. Londres: Pluto Press. Storming Heaven: Class Composition and Struggle in Italian Autonomist Marxism. Londres: Pluto Press.
[34] Cf. Laurell, ibidem.
Referências
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As artes que ilustram o texto são da autoria de Tano Festa (1938-1988).
Para a classe dominante é preciso que os trabalhadores não tenham história.
Cada luta deve começar de novo, separada das lutas anteriores.
A experiência coletiva se perde, as lições são esquecidas.
Assim a própria História se torna propriedade privada, cujos donos são também os donos de tudo o mais.
O Brasil tem hoje aproximadamente 20% de sua população adulta – o equivalente a 32,4 milhões de pessoas – que utilizam algum tipo de app para trabalhar.
As greves dos entregadores de aplicativos estouram por toda parte. Buscam sobrevivência imediata, como o proletariado inglês nos primórdios do Capitalismo.
Em sua luta atual, o que os entregadores poderiam resgatar dos anos 1970 com o poder operário na Itália?