Professor de uma universidade federal há uns bons anos, se considera de esquerda e tem um longo currículo que comprova seu engajamento com as pautas atuais da inclusão e da diversidade. Quando alguns bolsistas do projeto que ele coordenava — ganhando um bom dinheiro para tanto, enquanto os estudantes, quem de fato tocava o projeto, não recebiam nem meio salário mínimo — cruzaram os braços por falta de pagamento das bolsas, ele reuniu todos e disse: “No meu projeto eu não aceito greve! Vocês estão achando que isto aqui é uma fábrica?” E então cortou a bolsa e desligou do projeto todos os que haviam cruzado os braços. Passa Palavra

4 COMENTÁRIOS

  1. “No meu projeto eu não aceito greve! Vocês estão achando que isto aqui é uma fábrica?”

    não é “meu”, é nosso (e até dos que vieram antes, cujo legado científico possibilita o projeto de agora)
    “greve” é uma coisa q essencialmente não depende da “aceitação” de ninguém, a não ser a maioria em assembleia: o patrão não a aceita, obviamente, e inclusive alguns dos grevistas não a aceitam, e quando tentam furar greve sofrem as consequências.
    “fábrica”1: o professor considera que grevistas são apenas os de fábrica?
    “fábrica”2: sim, a universidade é uma fábrica, de força de trabalho qualificada

    Curiosamente, o comentário russo acima coincide com a visão mecânica do próprio professor, na medida em que parte de uma visão determinista da consciência pelo local ocupado na estrutura produtiva, de modo que um professor é burguês ainda que “pense” que não

    ulisses, se o escracho e a destruição de reputação ainda não veio deve ser um professor de exatas ou biológicas, pois nas humanas já teríamos a notícia indignada da horda e até a indicação de listas de autoras negras para citar no lugar do escrachado.

  2. Como a esquerda tem uma forte composição estudantil, de estudantes com nenhuns ou precários vínculos empregatícios, tudo o que os professores universitários fazem pode acabar virando opressão, exploração e assédio. Não que essas coisas não existam, aliás muito pelo contrário, mas tudo vira pretexto para denúncias e escrachos. No fundo a lógica é, de um lado, a dos aspirantes à elite, que para ocuparem o lugar dos que já subiram devem providenciar-lhes a queda; por outro lado, certos professores, muitos deles esquerdistas (ou ex-esquerdistas) ressentidos e derrotados, viram-se de costas para o futuro e reproduzem o passado, tentando redefinir o estatuto social dos estudantes em direção a uma estranha mistura do escravo doméstico com o aprendiz medieval, com todas as consequências daí advindas. Fechando o ciclo, os estudantes “oprimidos”, “explorados” e “assediados”, que hoje escracham professores “opressores”, “exploradores” e “assediadores”, serão eles mesmos os “opressores”, “exploradores” e “assediadores” de amanhã. Mas engana-se quem vê aí uma oposição professores-burgueses-gestores vs. estudantes-proletários. É a boa e velha concorrência entre trabalhadores no mercado, pelos melhores postos de trabalho (proletários vs. proletários), com pitadas de conflitos intergeracionais, aspirações elitistas e disputas de egos, tudo intensificado pela mentalidade típica da “classe média” brasileira, retrógrada e escravocrata.

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