Por Leo Vinicius

“No verão de 1969, a imprensa capitalista não era mais capaz de ignorar o fato de que algo estava começando a acontecer na Itália”

Com as palavras acima, Ed Emery introduz o capítulo 19 do livro, por ele organizado, chamado The Book of Fiat: Insurrection, insubordination, occupation, and revolutionary politics at the FIAT motor company – 1907-1982 [1]. O capítulo consiste num excerto da revista britânica The Economist de julho de 1969, o qual é reproduzido abaixo.

Como o leitor poderá perceber, eram tempos em que a esquerda revolucionária conseguiu gerar identificação e se tornar referência para a juventude da classe trabalhadora. Conseguiu instigar e apresentar canais para a revolta. Revolta essa que, durante pelo menos uma década, colocou em xeque a ordem e o poder capitalista. Para isso, necessariamente passou por cima das instituições mantenedoras dessa ordem, como os sindicatos e partidos políticos.

Como já é quase senso comum pelo mundo, hoje é a extrema-direita que canaliza a revolta social, com as implicações funestas que disso decorre. A existência de uma esquerda da ordem, a esquerda eleitoral, institucionalizada, burocrática, pode ser um fator que dificulte que a revolta social seja canalizada para movimentos e práticas socialistas. Mas isso não explica a incapacidade de uma esquerda revolucionária, no momento atual, de criar laços de identificação com os trabalhadores de hoje e constituir canais de expressão da revolta.

Por ora, olhar o museu das revoltas sociais nos serve para não esquecermos que elas costumavam ser de esquerda, isto é, uma ameaça à ordem capitalista.

“A nova esquerda revolucionária italiana recebeu seu batismo de fogo na porta da FIAT, em Turim, em 3 de julho. A manifestação ocorreu durante uma greve geral de 24 horas convocada pelos sindicatos em protesto contra o aumento dos aluguéis, mas logo assumiu um caráter antissindical. A polícia impediu que os manifestantes marchassem pelas áreas da classe trabalhadora de Turim, para que os distúrbios não se espalhassem significativamente. Porém as barricadas foram levantadas e levou toda a tarde e a maior parte da noite para restaurar a calma.

“Os revolucionários da Itália ainda são uma pequena minoria, mas seu progresso é evidente. Nos últimos dois meses, greves não oficiais têm desacelerado a produção da FIAT. Poucos trabalhadores da FIAT participaram do motim, mas mesmo os mil que estavam lá não teriam tido nenhum interesse há seis meses. A noção de que estudantes e trabalhadores não conseguem encontrar um terreno comum foi refutada quando ao núcleo duro de estudantes revolucionários se juntou nas barricadas grandes grupos de jovens trabalhadores. Até mesmo trabalhadores leais ao sindicato notam que os aumentos salariais obtidos por meio de greves não oficiais são muito maiores do que as conquistadas após negociações regulares entre a administração e os sindicatos.

“Os revolucionários pedem o apoio de dezenas de milhares de operários em todo o país. Um congresso nacional de grupos operários revolucionários será realizado em breve em Turim para ‘delinear os objetivos de uma nova fase da luta de classes que deve afetar todo o tecido da sociedade capitalista”. Parece um jargão marxista tradicional, mas funciona. A inquietação está se espalhando para outras fábricas da FIAT e para muitas outras fábricas além delas.

“Para os líderes oficiais do movimento sindical isso significa um desastre. Repetidamente eles tentaram cavalgar o tigre revolucionário juntando-se às greves não oficiais e proclamando grandes greves nacionais. Porém essas greves não conseguiram conquistar os trabalhadores mais jovens. Elas recebem apenas um apoio morno, enquanto paralisações não oficiais e, possivelmente, manifestações violentas, despertam entusiasmo. Em Turim, as coisas chegaram a um ponto em que os dirigentes sindicais não ousam entrar em certas oficinas”.

The Economist, 12 de julho de 1969

Nota

[1] Vários capítulos foram disponibilizados por Ed Emery aqui: http://www.geocities.ws/the_book_of_fiat/index.htm

As fotografias do artigo foram retiradas daqui.

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