Por Victor Villarreal Cabello
No dia 5 de março de 2025, o Coletivo Guerreiros Buscadores de Jalisco encontrou um centro de treinamento e extermínio dentro do Rancho Izaguirre, em Teuchitlán, Jalisco, no México. Os membros do coletivo haviam recebido ligações e mensagens anônimas frequentes que diziam que havia algo perto de Teuchitlán. Cerca de 40 pessoas chegaram nesse dia ao Rancho Izaguirre, cientes de que seis meses antes a Guarda Nacional mexicana havia tido um confronto com criminosos e que a promotoria havia realizado algumas investigações (Brooks, 2025). Assumiram o risco de que, ao entrar no local, pudesse haver pessoas armadas. No local, foram encontrados 400 objetos pessoais, como sapatos, mochilas e roupas. Também foram encontrados restos ósseos (Sudouest.fr e AFP, 2025).
O local foi cenário de uma operação realizada pela Guarda Nacional e pelo Exército Mexicano em setembro de 2024, que resultou em 10 pessoas presas e na libertação de 2 pessoas sequestradas (El Financiero, 2025). O caso é controverso porque, de acordo com a Guarda Nacional e a Promotoria de Jalisco, já haviam sido iniciadas buscas no local. No entanto, o Coletivo Guerreiros Buscadores encontrou centenas de restos sem muito esforço.
Raúl Servín, um pai pertencente ao coletivo que entrou no rancho em 5 de março, declarou: “É o mais triste. Que a Promotoria tenha percorrido o terreno por dentro e não tenha percebido que havia restos queimados. Eles devem ter pisado neles. Para nós, só de caminhar ali já foi um indício” (Brooks, 2025).
Ao investigar um pouco mais, a verdade se distorce. No dia 19 de março, diversos grupos: Guerreiros Buscadores de Jalisco, Famílias Unidas pelos Nossos Desaparecidos em Jalisco, Luz e Esperança, Mães Buscadoras de Jalisco e representantes de coletivos de Nayarit entraram novamente no Rancho Izaguirre e se queixaram de não encontrar indícios do que havia sido visto pela primeira vez. “Estão zombando da nossa dor”, exclama uma mulher dos coletivos que buscam seus familiares (Grupo Fórmula, 2025). Rosa Sandoval, integrante do coletivo Ágape de Nayarit, afirmou que um vídeo mostra que o solo tem depressões e que é provável que haja mais corpos sob aquela terra (Redação AN/KC, 2025).
O coletivo afirmou ter encontrado valas comuns e crematórios, mas o procurador-geral da República, Alejandro Gertz Manero, declarou que é necessário verificar se o local realmente funcionou como crematório. O ponto em que tanto o coletivo quanto as autoridades concordam é que o local serviu como centro de treinamento para recrutar pessoas para as fileiras do narcotráfico (Martínez, 2025).
Alguns falam de um “Auschwitz mexicano” (Pardo Vegalara, 2025). Há um livro de Agamben que trata do significado da palavra Auschwitz, que remete à ideia de sacrifício (Agamben, 2014). É um dos nomes mais dolorosos e lamentáveis para se referir a um ato de violência. No caso mexicano, assim como no caso judeu, trata-se de uma tragédia marcada pelo massacre sistemático de pessoas.
A forma como esses grupos criminosos operam segue um modus operandi já conhecido. Por meio das redes sociais os cartéis oferecem empregos falsos e as pessoas movidas pela necessidade se aproximam, e esses campos, são treinadas sob ameaça de morte para integrar as fileiras dos cartéis (Turati, 2025).
Teuchitlán é um exemplo de que a Guerra contra o Narcotráfico foi uma estratégia com repercussões históricas (Herrera Camarillo, 2023). Nossa violência tem raízes profundas e esse fato é apenas uma amostra da violência que se vive no interior do país. Além disso, o governo mantém uma campanha de difamação contra os grupos organizados que apenas buscam seus familiares, algo que já foi denunciado pelo Exército Zapatista de Libertação Nacional, pelo Conselho Nacional Indígena e por outras 150 organizações de todo o mundo (Radio Zapatista, 2025). Argumentam em uma carta pública que o crematório clandestino de Teuchitlán-Jalisco: “é um centro de extermínio a serviço do capital, o mesmo que sustentam e protegem aqueles que dizem governar este país” (Radio Zapatista, 2025).
A indignação é nacional e internacional e rende-se luto pelas vítimas (Xantomila e Laureles, 2025). O governo não parece ter nenhum papel protagonista no momento de garantir justiça. Pelo contrário, parece ocultar os fatos que já são de conhecimento popular. É perigoso falar em narco-governo, ainda mais quando os Estados Unidos declaram os cartéis como grupos terroristas (U.S. Department of State, 2025), mas o que importa, quando:
“Primeiro vieram buscar os socialistas, e eu me calei porque não era socialista.
Depois vieram buscar os sindicalistas, e eu não falei porque não era sindicalista.
Depois vieram buscar os judeus, e eu não disse nada porque não era judeu.
Por fim, vieram me buscar, e já não havia ninguém para falar por mim” diz Martin Niemöller.
Referências:
Aganben, G. (2014). Lo que Queda de Auschwitz: El archivo y el testigo. Homo sacer III. Pre-Textos.
Brooks, D. (2025). Cómo los Guerreros Buscadores de Jalisco realizaron el terrible hallazgo de un centro de “adiestramiento y exterminio” en el Rancho Izaguirre, en el oeste de México. BBC Mundo, 14 de março. https://www.bbc.com/mundo/articles/c4g972j2gn7o.
El Financiero (2015). Caso Teuchitlán: ¿Hubo disparos de la Guardia Nacional en el operativo en el rancho Izaguirre?. El Financiero, 20 de março. https://www.elfinanciero.com.mx/nacional/2025/03/20/caso-teuchitlan-hubo-disparos-de-la-guardia-nacional-en-el-operativo-en-el-rancho-izaguirre/.
Grupo Formula (2025). Guerreros Buscadores denuncian maltrato en Rancho Izaguirre. You Tube, 20 de março. [Minuto 1:10]. https://www.youtube.com/watch?v=4D4m-7MNbL8.
Herrera Camarillo, L. (2023). Violencia en México, historiador nos explica por qué aumentó en los últimos sexenios. Ibero Ciudad de México, 21 de fevereiro. https://ibero.mx/prensa/violencia-en-mexico-historiador-nos-explica-por-que-aumento-en-los-ultimos-sexenios.
Martínez, R. (2025). Colectivo asegura a FGR existencia de crematorios en rancho de Teuchitlán: “No es un montaje, no es una invención”|Videos. INFOBAE, 20 de março. https://www.infobae.com/mexico/2025/03/20/colectivo-asegura-a-fgr-existencia-de-crematorios-en-rancho-de-teuchitlan-no-es-un-montaje-no-es-una-invencion/.
Pardo Vegalara, D. (2025). Rancho Izaguirre: “Dicen que somos el Auschwitz mexicano, pero Teuchitlán no es el culpable de ese horror”. BBC, 15 de março. https://www.bbc.com/mundo/articles/cx2g4kpz3nvo.
Radio Zapatista (2025). Carta del Congreso Nacional Indígena, grupos, colectivos, organizaciones, movimientos y personas individuales de México y el Mundo, y el Ejército Zapatista de Liberación Nacional a las madres, padres y familias buscadoras de Jalisco y todo el país. Radio Zapatista, 23 de março. https://radiozapatista.org/?p=50367.
Redacción AN/KC (2025). Teuchitlán | Buscadoras exigen inspección del suelo y paredes en el rancho Izaguirre. Aritegui Noticias, 21 de março. https://aristeguinoticias.com/2103/mexico/teuchitlan-buscadoras-exigen-inspeccion-del-suelo-y-paredes-en-el-rancho-izaguirre/.
Sudouest.fr e AFP. (2025). Narcotrafic au Mexique : des ossements humains retrouvés, ce que l’on sait de l’affaire de Teuchitlán. Sudouest.fr, 14 de março. https://www.sudouest.fr/faits-divers/narcotrafic-au-mexique-des-ossements-humains-retrouves-ce-que-l-on-sait-de-l-affaire-de-teuchitlan-23634018.php.
Turati, M. (2025). “Teuchitlán forma parte de un circuito desaparecedor”. Pie de Página, 18 de março. https://piedepagina.mx/teuchitlan-forma-parte-de-un-circuito-desaparecedor/.
U.S. Department of State (2025). Designation of International Cartels. U.S. Department of State, 20 de fevereiro. https://www.state.gov/designation-of-international-cartels/.
Xantomila, J. y Laureles, J. (2025). Rinden luto nacional por víctimas de Teuchitlán en el Zócalo de CDMX. La Jornada, 15 de março. https://www.jornada.com.mx/noticia/2025/03/15/politica/recrean-centro-de-reclutamiento-de-teuchitlan-en-el-zocalo-de-cdmx.
Notas:
Com profunda tristeza pelo ocorrido e com o estômago embrulhado, escrevo estas palavras com muito respeito às pessoas desaparecidas e às pessoas que têm um familiar desaparecido. Escrevo este texto com o intuito de comunicar o que acontece em nosso país, minha intenção não é ofender ninguém.
Não seria o caso de falarmos que o Brasil vive uma via mexicana do neoliberalismo? Tendo os morros milicianizados funcionado como a ponta de lança de um novo tipo social, religioso e ideológico que tomou – ou está em vias de tomar -o Brasil? . Na qual, a eleição de Bolsonaro foi uma guerra de movimento, desses grupos que a anos, décadas, vem se estabelecendo, se acotovelando nas periferias de todo país. As milícias e facções, é sabido, Fazem o trabalho de ditadura aberta da burguesia para a burguesia cheirosa não ter de sujar as mãos, ou os coturnos.
Vi em algum lugar, quando falarem em anarcocapitalismo, olhe para os morros dominados pelas milícias do Rio de Janeiro, esse é o modelo social que produziu Bolsonaro.