Por Zé Al
Enquanto a nossa coluna não regressa à actividade, pedimos um poema sobre a falta de dinheiro. Passa Palavra
dinheiro intermitente
escoado líquido
estranha gaveta da economia capital
onde tudo se deposita e se desfaz
gaveta de fundo falso, cofre boca-de-lobo –
quando a pessoa de carne e ossos vai lá,
só encontra metáforas
dinheiro efêmero
estava aqui, já não está mais
matéria fugaz, de comprar o gás com quem o controla
vou esquentar minha comida, depois a cabeça
calcule aí: quanto é que volta?
depende dos donos, de suas vontades,
o dinheiro que eu busco e que muda de sentido
conforme a quantidade, o poder, a intenção:
compra leite, livro, legumes;
elimina, extingue e submete
dinheiro alienado, afastado
estranhamento constante
matéria que flui à revelia
de todo interior para qualquer exterior
vou costurá-lo no bolso,
no forro da minha bolsa –
para que dela não fuja
para bolsa de valores estranhos
já que eu, professora, enfermeira, musicista,
vejo o dinheiro escapar de minha mão,
evaporar do chão, da mata,
do cartão enfiado nos dentes da máquina –
e agora vejo também enganarem meu filho
numas aulas de ilusão financeira.