Por Granamir

O janonismo cultural

De qualquer forma, nosso objetivo não é fazer uma análise completa do bozismo, apenas mostrar como os seus procedimentos estão sendo imitados, com atraso considerável e eficiência duvidosa, pelo campo lulista. Na era das redes sociais, as celebridades da indústria cultural e os políticos do Estado burguês compartilham um mesmo caráter intercambiável, passam a ser uma mesma coisa, competidores em busca de audiência. Para os influenciadores, a disputa eleitoral é mais um nicho a ser conquistado, uma forma de se colocar no mercado, entre outras. Isso vale tanto para os partidos da direita como os da esquerda do espectro eleitoral. Não faz mais diferença o partido, o projeto de sociedade, o programa de governo, apenas as personalidades e os discursos. As ideologias se diluem em bandeiras vagas e superficiais, que as pessoas adotam sem considerar a conexão com processos históricos e perspectivas de classe.

A diferença entre os dois campos, esquerda e direita, se dilui em uma guerra de identidades, que se enfrentam como torcidas nas “redes sociais”. As duas torcidas têm a certeza de que representam o bem e de que o lado oposto é o mal absoluto, de modo que os métodos também se tornam intercambiáveis: escândalos, denúncias, cancelamento, pânico moral, conspirações, deboche, falácias, etc. A campanha lulista adotou, com quatro anos de atraso, as mesmas formas de discurso da campanha bozista. Inclusive, o mesmo indivíduo que foi eleito deputado federal em 2018, na onda de contestação dos partidos tradicionais, André Janones, se tornou um reforço de última hora da campanha lulista, ajudando a garantir a vitória eleitoral petista de 2022. Os Janones de hoje são, para a esquerda, o que eram os burocratas sindicais de 40 anos atrás. São influenciadores/empreendedores políticos, que se jogam nas disputas discursivas das redes sociais, conseguem audiência e uma massa de seguidores, para depois se lançarem como candidatos.

O fenômeno não é exclusivo do Brasil e encontra paralelos em outros países. Nos Estados Unidos, na campanha presidencial de 2016, Alexandria Ocasio-Cortez foi uma das ativistas que organizou a campanha do pré-candidato Bernie Sanders, correndo por fora da máquina oficial do partido democrata. Dois anos depois, ela própria se lançou candidata a deputada e se elegeu também contra a máquina do partido, usando os mesmos métodos de capilarização, financiamento coletivo e engajamento informal das redes sociais. Essa nova forma de fazer política no século XXI inutiliza a figura tradicional dos militantes/funcionários e burocratas dos partidos e organizações dos movimentos sociais.

O influenciador/candidato pode se dirigir diretamente a seu público, com uma equipe extremamente enxuta de especialistas em “social mídia”, sem a necessidade de se centralizar pelas estruturas partidárias, pela hierarquia burocrática dos velhos caciques, que detinham o controle sobre quem podia concorrer, a quais cargos, com quais verbas. Essas estruturas, antes, no caso dos partidos de esquerda, tinham alguma relação com a participação em movimentos sociais, que exigiam uma longa carreira, também meritocrática num certo sentido, como aquelas carreiras de Estado que os empreendedores bozistas aprenderam a burlar.

Na forma antiga de fazer política, um burocrata precisava adquirir credibilidade perante uma certa base de trabalhadores ou de algum movimento social, e usar essa credibilidade como cacife para se sentar à mesa para negociar concessões do capital e do Estado. Uma vez tendo adquirido o lugar à mesa, o burocrata usava a sua notoriedade para dar um salto ao próximo degrau e se projetar na disputa eleitoral. O seu sucesso dependia da capacidade de equilibrar um certo nível de aceitação entre os trabalhadores do movimento que representava, por meio de uma certa imagem de combatividade; e ao mesmo tempo, um certo nível de aceitação entre os setores empresariais e autoridades estatais com os quais negociava, por meio de uma certa imagem de comedimento e responsabilidade. Um pouco de radicalismo na agitação de reivindicações, de um lado, ou um peleguismo muito descarado na hora de aceitar acordos, de outro, podiam pôr tudo a perder.

Esse tipo de trajetória, meritocrática à sua maneira, que precisava ser cuidadosamente construída em muitos processos delicados de enfrentamento/negociação, como forma de aspirar a uma carreira de cargos no Estado, se tornou dispensável. Agora, no campo da esquerda, a estrela ascendente de André Janones mostra o caminho a seguir, que é o mesmo dos influenciadores empreendedores bozistas, ou seja, furar a fila. O influenciador é um “advogado do povo” que usa a tribuna das redes sociais para criar pressão sobre as instituições para que ajam numa determinada direção. Os influenciadores agem, as instituições reagem, o que mostra que o poder de Estado foi erodido e parcialmente cedido às plataformas como meio de comunicação que oferece a sua tribuna aos influenciadores. Uma tribuna bem mais instável e difícil de controlar do que as da antiga mídia, como atesta a dificuldade do STF para fechar a torneira de chorume das “fake news” bozistas.

Claro, o Estado pode ceder a pressões desde que não estejam relacionadas àqueles tópicos fundamentais da economia e se limitem a esferas como a da representatividade e do discurso. Questões como o valor dos salários, condições de trabalho, direitos sociais, serviços públicos, estão blindadas e entregues à alçada dos segmentos não eleitos da burocracia do Estado. Não podem ser debatidas porque isso significaria interferir nos lucros do capital, o que está absolutamente fora de questão para as forças que estão atualmente em condições de participar da disputa. A política nas redes não pode entrar nesses temas e não é coincidência que tenha reduzido o horizonte de alternativas à disjuntiva que opõe bozismo e identitarismo.

Quando se trata das comunicações, as formas costumam trazer em si o próprio conteúdo. A forma da disputa política nesse novo ambiente das redes sociais favorece que o conteúdo seja ideologicamente conveniente e em nada disruptivo em relação à sociabilidade do capital. O individualismo, a meritocracia, a competitividade, a concorrência de mercado, a propriedade privada, a acumulação de espectadores, seguidores, interações e engajamentos, que se convertem depois em dinheiro, são pressupostos ideológicos de tudo o que circula nas redes. A política nas “redes sociais”, reproduzindo implicitamente esses mesmos pressupostos, oscila entre um tipo de entretenimento e um tipo de campanha frenética de “conscientização” sobre questões ad hoc ou cancelamento dos adversários da vez. O formato das redes é intrinsecamente hostil e o espaço muito reduzido para quem queira discutir qualquer coisa que vá além da forma de sociedade atual e que negue os seus pressupostos.

Não há vagas

O período anterior da luta de classes já tinha acostumado a esquerda à prática do aparelhamento e naturalizado a burocratização. A trajetória comum do militante que se destacava em alguma luta era se tornar profissional do partido (caso houvesse estrutura grande o suficiente para isso), ou ser profissionalizado artificialmente para aplicar a política do partido ocupando cargos em sindicatos, direção de movimentos sociais, ONGs, departamentos universitários, assessorias parlamentares, cargos comissionados em órgãos do executivo, e no ápice de tudo isso, mandatos eletivos. A forma organizativa da esquerda tradicional é a de uma pirâmide hierárquica, que vai dos militantes de base aos dirigentes e figuras públicas, mas o conjunto da pirâmide já se colocava desde o começo como algo situado por fora e acima do restante dos trabalhadores, com perspectivas de vida e “planos de carreira” orientadas para essa competição pelas posições do topo, ou seja, pela condição de burocrata. Essa pirâmide de burocratas desenvolve interesses separados e opostos aos dos trabalhadores, já que, para que a sua existência seja justificada, é preciso que a negociação da compra e venda da força de trabalho nunca se encerre, para que sigam desempenhando o papel de intermediários. A burocracia jamais vai defender o fim do trabalho assalariado, já que depende da continuidade dessa relação para seguir negociando o valor dos salários e dos direitos sociais administrados pelo Estado.

No entanto, como vimos, a burguesia brasileira optou por dispensar essa intermediação e asfixiou financeiramente os sindicatos. A queda de 99% de arrecadação pela extinção do imposto sindical mostrou que essas entidades não contavam mais com o mínimo respaldo dos seus representados, pois não foram capazes de repor as perdas mediante contribuições voluntárias dos trabalhadores. Da mesma forma, os demais movimentos sociais se reduziram a antessalas e serviços de triagem e cadastro para o guichê dos órgãos públicos que distribuem verbas para beneficiários de direitos focais, com muito pouco espaço para projeção de lideranças e agitadores. Uma vez que essas vias iniciais de acesso à carreira de burocrata foram cortadas, restou aos aspirantes a políticos profissionais o método revelado pelos bozistas, ou seja, furar a fila. Começaram a surgir então, tardiamente e com muito menos sucesso, por enquanto, os influenciadores de esquerda nas redes sociais.

Essa nova figura possui algumas diferenças e algumas semelhanças em relação aos antigos burocratas. A antiga burocracia tinha um papel de ajudar a perpetuar e gerir o capitalismo de forma indireta. Precisava ter uma relação cotidiana com os movimentos dos trabalhadores e processos de luta, para ser capaz de impedir a eventual aparição de processos autônomos e radicais (isso não quer dizer que esses processos estejam sempre prestes a acontecer e os trabalhadores sempre dispostos a aderir a eles, mas que a burocracia está sempre a postos para atuar preventivamente e impedir que aconteçam). E precisava ter a anuência da burguesia e do Estado burguês para ter esse papel de intermediação reconhecido, e isso só acontecia se de fato a burocracia ajudasse a reduzir atritos e desinflar potenciais conflitos com os trabalhadores, de modo geral os conflitos cotidianos e de baixa intensidade, colaborando para que a exploração pudesse fluir mais desimpedida. Essa posição é sempre precária, pois, como acabamos de ver no Brasil, a burguesia pode optar por dispensar a intermediação de burocratas e administrar a força de trabalho diretamente por meio de jagunços, fardados ou não.

Os novos influenciadores de esquerda não têm qualquer relação necessária com processos de luta e qualquer papel intermediário como negociadores. Surgem como parte direta do aparato ideológico capitalista. São empreendedores e aspirantes que vendem uma mercadoria, o seu conhecimento da esfera alienada da política. Para serem bem-sucedidos, os influenciadores de esquerda precisam se adaptar às regras das plataformas que administram as redes sociais, que são as mesmas da indústria cultural em geral. Os conteúdos precisam se pautar pelos assuntos do momento, pela concorrência com os veículos da ideologia burguesa e influenciadores de outras correntes, pela mediação dos algoritmos que decidem o que terá ou não terá visibilidade, numa espiral descendente de despolitização que leva inevitavelmente ao sensacionalismo e à monetização do ódio.

A noite em que todos os gatos são pardos

É assim que, por exemplo, para se contrapor aos influenciadores bozistas que defendem o uso das armas contra esquerdistas e minorias, vemos o aparecimento de influenciadores de esquerda que ressuscitam o stalinismo e o maoísmo como versões admissíveis do projeto socialista, que reabilitam os gulags e a luta armada como instrumentos preferenciais de transformação social. Os influenciadores de esquerda precisam ter algo a oferecer aos seguidores que pareça também “radical”, para que o público alvo, composto principalmente de jovens, não seja seduzido pela iconoclastia bozista. Quando se adere a uma lógica em que a política é reduzida a uma guerra de torcidas nas redes, é preciso oferecer algum atrativo para que o público alvo que se quer atrair seja seduzido pelo time da esquerda, mesmo que seja travestir as tragédias do stalinismo como vitórias. Ninguém quer torcer para um time que não seja campeão, e como a esquerda não ganha nada há muito tempo, precisa falsificar a história, passada e presente, para ter trunfos a apresentar. Stalinismo, identitarismo, ambientalismo, terceiro-mundismo, nacionalismo, pós-modernismo, reformismo, em versões puras ou em combos ecléticos, a gosto do freguês, existe oferta para todas as preferências na prateleira das redes. A coerência entre discurso e prática, meios e fins, fica em segundo plano quando o que importa é ganhar “likes” e seguidores para monetizar o canal.

Um outro aspecto é o fato de que, como empresários, os influenciadores/empreendedores de esquerda precisam guardar o segredo das suas fontes, precisam “fatiar o salame” e vender aos poucos os seus conteúdos, segmentar em partes uma teoria ou conceito para ter algo a vender no próximo episódio, sem fornecer a visão do todo. O problema aqui não é de que alguém que esteja oferecendo um curso de marxismo ou de feminismo na internet seja alguém “vendido” para o capital. Esse tipo de crítica não faz muito sentido, já que, neste planeta, todo mundo vive da venda da sua força de trabalho, a não ser os que forem realmente burgueses, proprietários de meios de produção, e burocratas associados à gestão do sistema. O problema não é que seja “moralmente” questionável que estejam vendendo conhecimento, em especial esse tipo de conhecimento, o problema é que não se pode classificar essa atividade como militância. A militância precisa ser algo separado do trabalho assalariado, seja do trabalho que se faz para empresas e instituições ou do que se faz para plataformas. Precisa buscar a superação das formas de alienação prevalecentes na sociedade atual, como a mercantilização e as hierarquias sociais, o que é impossível quando se adota a postura de vendedor, mesmo que se trate dessa mercadoria sui generis, o conteúdo político. O capital e a mercadoria são formas que se notabilizam por prevalecer e dissolver os conteúdos.

Até aqui temos falado genericamente de influenciadores de esquerda, mas essa categoria, como a de influenciadores em geral, tal como referimos mais acima, não tem por enquanto muita precisão e contornos definidos. Ela pode incluir desde militantes com alguma formação teórica ou acadêmica, que fazem o trabalho de distribuir textos e comentários em espaços das redes, para algumas centenas de contatos; até aqueles que já tem titulação acadêmica e publicações em editoras prestigiadas, perfis monetizados e públicos de milhares de seguidores. Na estrutura das redes, que tende para a empresarialização de toda atividade humana, os primeiros são vistos automaticamente como aspirantes à condição dos segundos, como concorrentes menores no grande espetáculo geral, competidores que atuam como empresários de si submetidos à lógica de mercado.

Para ter algum sentido transformador, a militância precisa lutar para reproduzir relações de sociabilidade não pautadas pela forma mercadoria, coisa que, nas “redes sociais”, é impossível. As chamadas “redes sociais”, na verdade, são antissociais, são plataformas tecnológicas desenhadas para segregar nichos de mercado e públicos segmentados para os converter em alvo de publicidade direcionada. São instrumentos de atomização social, de isolamento e enquadramento dos indivíduos. Elas dissolvem os vínculos sociais preexistentes, sejam familiares, profissionais, culturais ou de classe, na uniformidade homogênea dos “amigos” de Facebook e contatos. As empresas que administram as plataformas não são ideologicamente neutras, elas exigem a adesão aos pressupostos da sociabilidade do capital, tais como uma individualidade concebida como sujeito monetário, concorrencial, programado geneticamente e psicologicamente para servir à acumulação de capital. Participar das “redes sociais” significa aceitar as regras desse jogo, legitimar plataformas que não são capazes de admitir a crítica radical da atual forma de sociedade e seus traços de desumanidade.

Assim que um perfil individual ou coletivo se torna uma ameaça suficientemente preocupante para a hegemonia ideológica prevalecente, ele pode ser facilmente banido pelos moderadores das plataformas com o simples clique num botão e pode ser assim sumariamente excluído do debate público. E de certa forma, é exatamente isso que deve acontecer, os perfis revolucionários podem e devem ser sistematicamente excluídos e recriados. Fazendo uma comparação com as eleições, um partido político que fosse revolucionário, ao participar de um processo eleitoral, deveria defender na sua campanha a dissolução do Estado tal como ele existe, o fim das instituições atuais, das forças armadas, polícia, judiciário, constituição, mandatos executivos e legislativos, etc., e sua substituição pela autogestão social. Ao fazer isso, esse partido seria imediatamente posto na ilegalidade, mas essa seria exatamente a única forma possível de propaganda revolucionária através das eleições, fazer estardalhaço em cima do ato da própria exclusão da disputa.

Isso não é praticado no Brasil porque, assim como os sindicatos eram dependentes do imposto sindical, os partidos de esquerda são dependentes dos mandatos e das verbas do fundo partidário. São anexos parasitários da burocracia do Estado, sem qualquer independência para fazer a crítica radical do sistema, sem vida orgânica que não esteja vinculada ao aparato institucional. A sua participação eleitoral não expõe o Estado como ditadura de classe, não defende a sua dissolução, portanto não faz sentido: se não é para ser nem sequer subversivo, não é possível ser de fato revolucionário. Da mesma forma, um perfil revolucionário nas redes sociais deveria defender a expropriação das próprias redes, ou medidas revolucionárias que sejam consideradas violação das “normas da comunidade”. Esse perfil teria de estar a serviço da divulgação e incentivo às lutas que interfiram com os tópicos fundamentais da economia, o que seria intolerável para as plataformas, levando provavelmente à sua exclusão.

As plataformas, é sempre importante repetir, são propriedade de empresas capitalistas, são instituições inimigas, possuem a função de veicular diariamente a ideologia do sistema, etc. Qualquer participação nesses espaços deve ser encarada sempre como um ato de guerrilha e uma expressão do fato de que as organizações anticapitalistas não possuem infraestruturas e veículos próprios de comunicação. As redes antissociais existentes nunca serão o espaço preferencial de construção de uma perspectiva anticapitalista. A inexistência ou escassez dramática de espaços de comunicação, veículos ou perfis anticapitalistas é a verdadeira questão de fundo, da qual se foge quando se tenta desenvolver uma intervenção nas plataformas capitalistas que não seja clandestina e de guerrilha. Esse é justamente o caso do tipo de intervenção que aceita tais espaços como disputáveis, como a que é feita pelos influenciadores.

Isso significa que não faz sentido existir um perfil individual de influenciador de esquerda nas plataformas das redes, do ponto de vista de uma crítica revolucionária dos meios de comunicação em poder dos capitalistas. O único tipo de perfil que faz sentido é o de um coletivo, dedicado a difundir ideias e práticas políticas. Evidentemente, esse perfil coletivo, sendo suficientemente combativo e radical nas suas posições, será também excluído pela moderação das plataformas. Mas o que importa não é fixar uma marca ou logotipo, e sim um conjunto de ideias e práticas, que serão veiculadas por outro perfil coletivo recriado, e assim por diante.

O propósito da intervenção anticapitalista nas redes não pode ser o de criar uma referência fixa, seja indivíduo ou organização, que tenha as pessoas como seguidores, como público, como base, ou seja, como massa de manobra. O propósito deve ser sempre fomentar ideias e práticas que conduzam à autonomia e organização coletiva. Esse último ponto toca em mais um aspecto, que diz respeito ao modo como os influenciadores de esquerda são semelhantes aos antigos burocratas, o elemento de personalismo. Tanto um burocrata quanto um influenciador se colocam como referência individual, o que reproduz a forma hierárquica de organização social, característica da sociedade de classes. A esquerda que se organiza de modo hierárquico, com dirigentes, figuras públicas, influenciadores, burocratas, quadros, etc., está reproduzindo na sua forma de organização a separação entre trabalho intelectual e trabalho braçal característica da sociedade de classes. Enquanto essa separação permanecer, a superação da divisão de classes será impossível, pois os meios com que se busca lutar pela emancipação devem ser compatíveis com os fins emancipatórios que se busca alcançar. Isso já era válido na época dos burocratas e segue sendo também na dos seus sucessores em redes sociais.

21/04/2023

As obras que ilustram o artigo são da autoria de Chiharu Shiota (1972-)

 

Leia aqui a primeira parte do artigo

 

3 COMENTÁRIOS

  1. Ótimas reflexões, Granamir. Observava esse fenômeno de forma atenta, mas não tinha conseguido elaborar um debate público sobre o tema. O seu artigo contempla, responde inquietações que possuía e oferece caminhos para pensar na militância política virtual. Para que possamos construir essa militância política (autogestionária, anarquista, autonomista, etc.) devemos nos servir de outros meios, estratégias e métodos, opostos à estratégia da militância política partidária, reformista. Além disso, precisamos combater teoricamente esses intelectuais e burocratas da “pseudoesquerda” que buscam conquistar adeptos, cabos eleitorais, etc., com um suposto discurso revolucionário e assim reforçam a manutenção dessa sociedade miserável que vivemos.

  2. Conhecida influencer youtuber e intelectual acadêmica (ou vice-versa, dá na mesma) está na Palestina ocupada, dedicada à causa e dando exemplo de militância (ao menos é como supõe).
    Mas ao vivo tudo é diferente e sempre muito pior.
    Num tuíte se refere à responsabilidade de produzir documentários na Palestina. No tuíte seguinte já entregou os pontos: 《não produzo outro nunca mais》.
    https://twitter.com/safbf/status/1657852846165860354?s=20

  3. 《Nesse mundo do excesso de informações, não existem ideias, assim como não existem no tremendo fluxo de dados da Internet, porque as ideias sempre foram perigosas.》
    《Agoniar-nos com informações e bloquear as ideias é lucro para o sistema, por isso proponho pensar o uso que os de cima fazem da Internet como uma grande política contrainsurgente. Em contrapartida, os progressismos usam e abusam da comunicação para oferecer uma narrativa de suas supostas virtudes, nunca para dialogar em pé de igualdade com as pessoas comuns. Reproduzem a relação sistêmica sujeito-objeto que dizem combater, colocando seus próprios eleitores na condição de receptores passivos de seus discursos.》
    Raúl Zibechi
    https://www.ihu.unisinos.br/628859-a-mente-pensa-com-ideias-nao-com-informacoes-artigo-de-raul-zibechi

    • A informação é apresentada como a base do pensamento, enquanto que, na realidade, a mente humana pensa com ideias, não com informações.
    • A informação é apresentada como a base do pensamento, enquanto que, na realidade, a mente humana pensa com ideias, não com informações.
    • Por isso, todo o empenho do sistema com nossos jovens consiste em obstruir suas experiências de vida e submetê-los a um bombardeio constante de informações que não contribuem para nada, mas criam uma gigantesca nuvem de confusão.
    • As ideias são padrões integradores que não derivam da informação, mas da experiência. 

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