No dia mundial do circo, trabalhadores da cultura, contrários à Lei Rouanet, ocupam o prédio da Funarte, em São Paulo, e exigem uma outra política pública de incentivo à cultura. Por Passa Palavra
No dia mundial do teatro e do circo, 27 de março, cerca de 300 trabalhadores da cultura ocuparam, por volta das cinco horas da manhã, o prédio da Fundação Nacional de Artes (Funarte), localizado no centro da capital paulistana. Os manifestantes do Movimento 27 de Março, formado por 55 grupos de trabalhadores da arte de São Paulo, exigiram um diálogo efetivo com o governo no tocante aos rumos de uma política pública e democrática para o setor.
Eles não admitem discutir a reforma da Lei Rouanet proposta pelo governo federal, pois a entendem como uma forma de privatização da cultura, na qual há a transferência de recursos públicos para o empresariado da indústria de entretenimento, que pode renunciar a impostos e «transforma[r] a cultura e as artes em produtos sem valor além do consumo imediato, sem poesia e sem reflexão sobre o que somos como cidadãos e como sociedade […] o que não contemplaria a cultura mas somente grandes empresas que não fazem cultura».
Dessa forma, «o dinheiro público vai para o negócio privado que não produz cultura e o governo transfere suas funções para o gerente da grande corporação [empresa]. Diminuir a porcentagem dessa transferência ou criar normas pretensamente moralizadoras não muda a natureza do roubo e da omissão do governante no exercício de suas obrigações constitucionais. Não se trata de maquiar a Lei Rouanet (incentivo fiscal); trata-se de acabar com ela em nome da cultura, do direito e do interesse público, garantindo-se que o mesmo dinheiro seja aplicado diretamente na cultura de forma pública e democrática», sendo que «esse discurso único não se impõe apenas à política cultural. É ele que confunde uma política para a agricultura com dinheiro para o agronegócio; que centra a política urbana na construção habitacional a cargo das grandes construtoras» [1].
Em contraposição, os manifestantes entregaram a Lei de Fomento ao Teatro Brasileiro e reivindicam dotação orçamentária própria, com recursos garantidos por lei e participação paritária nas comissões de seleção, de representantes escolhidos pelo governo e representantes escolhidos pelos participantes dos determinados editais [2].
Depois de o prédio já haver sido cercado por efetivos policiais que não deixavam entrar nem alimentos e nem água e com quase 12 horas de ocupação, o Movimento 27 de Março deixou o local após conseguir marcar uma assembléia com o Ministério da Cultura para o dia 02/04, às 14h, na própria Funarte. Nesta ocasião, segundo afirmou um de seus representantes: «vamos discutir a nossa pauta [Lei de Fomento ao Teatro] e não a deles» [3], visto que são os próprios trabalhadores que, por atuarem na área, deveriam ter, portanto, autonomia para pensar e propor políticas culturais.
Os manifestantes, ao compreenderem que «o trabalho enquanto artista não é gerar lucro, mas sim gerar linguagem, debate, discussão, pesquisa com a comunidade» [3], têm claro que leis de renúncia fiscal não irão contemplar grupos de pesquisa e trabalho continuado e que, sobretudo, reafirmam o potencial crítico e emancipador da arte.
Segue abaixo modelo de moção, elaborado pelo 27 de Março, para ser enviado para o email do movimento (movimento27demarç[email protected]), o do Ministro da Cultura (Juca Oliveira: [email protected]), o da Secretaria do Estado ([email protected]) e o da Secretaria Municipal: ([email protected]).
Moção de Apoio:
Nós apoiamos o Movimento 27 de Março de trabalhadores da cultura, pois entendemos que suas reinvidicações são legítimas e do interesse de todo o povo brasileiro, pois lutam em favor de políticas públicas e contra a privatização da cultura. Os atuais governos federal, estadual e municipal devem dizer um basta à política de privilégios, à entrega do Estado à iniciativa privada, à perda dos direitos dos trabalhadores e ao fisiologismo [oportunismo] político que trata as questões da soberania nacional como uma bolsa de valores sem nenhum outro horizonte a não ser luta pelo poder. Todo apoio à ocupação da Funarte!
Endereço da Funarte: Alamenda Notmann, 1058, Campos Eliseos (próximo do metrô Santa Cecilia ou Marechal Deodoro – Linha Vermelha).
[1] Carta dos ocupantes da Funarte.
[2] Carta pública em defesa da cultura, distribuída no ato.
[3] Ouvir aqui a entrevista do Passa Palavra com um integrante do Movimento 27 de Março.
Está em debate no Ministério da Cultura uma proposta para alterar a Lei Rouanet, responsável pela regulamentação do fomento à cultura. Após o termino do prazo para receber contribuições da sociedade, o Ministério irá encaminhar a proposta ao Congresso Nacional.
Debate:
A Nova Lei de Fomento à Cultura
Com Gustavo Vidigal – Secretário Adjunto do Ministério da Cultura
Quinta-feira – 16/abril – 19h
Local: Diretório Zonal de Pinheiros
Rua Lisboa 489 (Próximo à Praça Benedito Calixto)