Na Guerra Civil Russa, os anarquistas encararam um sério dilema: qual lado apoiar? Por Paul Avrich

Apresentação do Tradutor: pequeno texto sobre as diversas tendências anarquistas, seus posicionamentos e destinos na guerra civil russa. Paul Avrich (1931-2006) foi um historiador sério do movimento anarquista, tendo escrito “Kronstadt, 1921”, um dos livros definitivos sobre o assunto, e “The Russian Anarchists”, que é de onde o texto abaixo foi condensado. As notas, salvo em caso de N. do T., são do original.

Aos primeiros tiros da Guerra Civil Russa, os anarquistas, assim como os outros partidos da oposição de esquerda, encararam um sério dilema. Qual lado apoiar? Como libertários convictos, não simpatizavam com as práticas ditatoriais do governo de Lênin, mas a perspectiva de uma vitória dos Brancos parecia ainda pior. Uma oposição ativa ao regime soviético poderia favorecer os contrarrevolucionários. Por outro lado, o apoio aos bolcheviques poderia fortalecê-los demais, tornando difícil sua derrubada após o perigo da reação. Era um dilema sem soluções simples. Após muita reflexão e debate, os anarquistas adotaram uma variedade de posições, desde a oposição ativa aos bolcheviques até a neutralidade passiva e a ardente colaboração. Uma maioria, no entanto, investiu suas fichas no regime soviético. Em agosto de 1919, no clímax da Guerra Civil, Lênin estava tão impressionado com o zelo e a coragem dos “anarquistas soviéticos”, como seus camaradas antibolcheviques os chamavam, que os contou entre “os mais dedicados apoiadores do poder soviético”[1].

Alexander Berkman

Um excelente exemplo foi Bill Shatov, um ex-agitador da IWW [Industrial Workers of the World] nos Estados Unidos que havia retornado à sua terra natal após a Revolução de Fevereiro. Como oficial do Décimo Exército Vermelho durante o outono de 1919, Shatov engajou-se na defesa de Petrogrado contra o avanço do general Yudenitch. No ano seguinte ele foi chamado para a cidade de Chita para tornar-se Ministro do Transporte na República do Extremo Oriente. Antes de partir, Shatov tentou justificar sua posição colaboracionista a seus camaradas libertários, Emma Goldman e Alexander Berkman. “Eu só quero lhes contar”, disse ele, “que o Estado Comunista em ação é exatamente aquilo que nós anarquistas sempre dissemos que seria – um poder firmemente centralizado ainda mais fortalecido pelos perigos da Revolução. Sob tais condições, não se pode fazer o que quer. Não se pode apenas pular num trem e seguir, ou até andar nos para-choques como eu fazia nos Estados Unidos. Necessita-se de permissão. Mas não se enganem: não sinto falta das minhas ‘bençãos’ americanas. Sou pela Rússia, pela Revolução e seu futuro glorioso”. Os anarquistas, disse Shatov, “são os romancistas da revolução”, mas não se pode lutar apenas com ideais. No momento, a principal tarefa era derrotar os reacionários. “Nós anarquistas devemos permanecer verdadeiros a nossos ideais, mas nós não deveríamos criticar agora. Nós devemos trabalhar e ajudar a construir”[2].

Shatov era um entre um pequeno exército de anarquistas que pegou em armas contra os Brancos durante a Guerra Civil. Outros aceitaram postos menores no governo soviético e exortaram seus camaradas a fazerem o mesmo, ou que pelo menos evitassem práticas hostis à causa bolchevique. Yuda Roschin, ex-terrorista do grupo Estandarte Negro e inimigo implacável dos marxistas, agora surpreendia a todos saudando Lênin como uma das grandes figuras da era moderna. De acordo com Victor Serge, Roschin até tentou elaborar uma “teoria anarquista da ditadura do proletariado”. Falando perante um grupo de anarquistas moscovitas em 1920, ele exortou seus colegas a cooperar com o partido de Lênin. “É o dever de todo anarquista”, ele declarou, “trabalhar de todo o coração com os comunistas, que são a guarda avançada da revolução. Abandonem suas teorias, e façam trabalho prático para reconstruir a Rússia. A necessidade é grande, e os bolcheviques lhes dão boas-vindas”[3].

Mas os ouvintes de Roschin não ficaram impressionados. Acolhendo seu discurso com vaias e assobios, dispensaram-no como outra perda para o “anarquismo soviético” e um traidor da causa de Bakunin e Kropotkin. Pois até em tais circunstâncias precárias, um grande e militante segmento do movimento anarquista não dava espaço a seus adversários bolcheviques. A Federação Anarquista de Briansk, por exemplo, apregoou a imediata derrubada dos “Vampiros Sociais” no Kremlin, que sugavam o sangue do povo. Traduzindo o apelo em ação, uma organização terrorista em Moscou conhecida como Anarquistas Clandestinos juntou suas forças aos SRs [socialistas revolucionários] de esquerda e bombardeou os quartéis generais do Comitê do Partido Comunista, matando doze de seus membros e ferindo outros cinquenta e cinco, entre eles Bukhárin.

No Sul, onde a autoridade do Estado estava totalmente destruída, a violência anarquista achou seu solo mais profundo. Bandos de saqueadores, operando sob nomes como “Furacões” e “Morte”, apareceram em todo canto, prontos para tomar cidades ou vilarejos quando a oportunidade aparecesse. Os Guerrilheiros Bakunin de Katerynoslav cantavam sobre uma nova “era da dinamite” que encontraria opressores de todas as estirpes, Vermelhos e Brancos:

Fedor Shus, comandante makhnovista

Abaixo o barulho dos sinos das igrejas!
Haveremos de soar um novo alarme,
Com explosões e gemidos na terra
Haveremos de construir nossa própria harmonia! [4]

E em Carcóvia um círculo de anarco-futuristas fanáticos proclamaram “Morte à civilização mundial!” e instou as massas obscuras a pegar seus machados e destruir tudo em vista.

Anarquistas de uma vertente mais pacífica denunciavam esses grupos como “bandidos sicilianos” que usavam a capa do anarquismo para esconder a natureza predatória de seus atos. Para os moderados, roubos e terrorismo eram caricaturas grotescas das doutrinas anarquistas que serviam apenas para desmoralizar o movimento e desacreditá-lo aos olhos do público. Renunciando à ação violenta, os anarquistas moderados armaram-se com nada mais letal que pena e tinta e engajaram-se no ataque à ditadura soviética. Um grande tema de suas críticas foi que a revolução bolchevique tivesse substituído o capitalismo privado por um “capitalismo de estado”, que um único grande dono tivesse tomado o lugar de diversos donos menores, de maneira que camponeses e trabalhadores encontravam-se agora sob o comando de uma “nova classe de administradores – uma nova classe nascida do útero da intelligentsia[5]. Na sua visão, o ocorrido na Rússia guardava grande semelhança com as revoluções anteriores na Europa Ocidental: logo que os fazendeiros e artesãos oprimidos da Inglaterra e da França haviam removido a aristocracia agrária do poder, a ambiciosa classe média aproveitou a deixa e construiu uma nova estrutura de classes consigo no topo; de maneira similar, os privilégios e a autoridade uma vez gozados pela nobreza e burguesia russas haviam passado para as mãos de uma nova classe dominante composta por oficiais partidários, burocratas governamentais e especialistas técnicos.

Na medida em que a Guerra Civil se intensificou, o governo tornou-se menos e menos tolerante com tais críticas e começou a reprimir os grupos anarquistas em Moscou e em Petrogrado. Como resultado, iniciou-se um êxodo de anarquistas para a Ucrânia, o éden perene dos fugitivos das perseguições do governo central. Na cidade de Carcóvia uma nova organização, a Confederação Nabat [Alarme], apareceu em 1918 e logo se espalhou pelas principais cidades do sul. Como é de se esperar, os membros da Nabat eram extremamente críticos à ditadura soviética, mas acreditavam que a tarefa imediata do movimento anarquista fosse defender a revolução contra a investida dos Brancos, mesmo que isso significasse uma aliança temporária com os comunistas. Para salvar a revolução, puseram suas esperanças num “exército guerrilheiro” organizado espontaneamente pelas próprias massas revolucionárias.

Como o núcleo mais provável de tal exército, os líderes da Nabat olharam para os guerrilheiros liderados por Nestor Makhno, cujos seguidores consideravam o novo Stenka Razin ou Pugachev enviado para realizar seus antigos sonhos de terra e liberdade. Viajando a cavalo e em carrinhos camponeses (tachanki) equipados com metralhadoras, Makhno e seus homens moviam-se rapidamente na estepe aberta entre o Dnieper e o Mar de Azov, transformando-se num pequeno exército e inspirando terror no coração de seus adversários. Grupos guerrilheiros até então independentes aceitaram seu comando e lutaram por sua bandeira negra. Vilarejos providenciavam comida e cavalos novos voluntariamente, permitindo à Makhnovshchina viajar longas distâncias com pouca dificuldade. Repentinamente eles apareciam onde menos se esperava, atacavam a pequena nobreza e as guarnições militares, e então desapareciam tão rápido quanto vieram. Com uniformes capturados, infiltravam-se nas fileiras inimigas para descobrir seus planos ou para atirar-lhes à queima-roupa. Quando encurralados, os makhnovistas enterravam suas armas, voltavam aos vilarejos e trabalhavam no campo, aguardando o sinal para pegar em armas e aparecer novamente em lugares inesperados. Os insurgentes de Makhno, nas palavras de Serge, revelaram “uma capacidade verdadeiramente épica para organização e combate”[6]. Mesmo assim, eles deviam grande parte de seu sucesso às qualidades excepcionais de seu líder. Makhno era um comandante ousado e versado que combinava uma vontade de ferro com um rápido senso de humor e ganhou o amor e a devoção de seus seguidores. Em setembro de 1918, quando derrotou uma força muito superior de austríacos no vilarejo de Dibrivka, seus homens deram-lhe o afetuoso título de batko, seu “paizinho”[7].

Por um tempo, a relação de Makhno com os bolcheviques permaneceu razoavelmente amigável, e a imprensa soviética o exaltava como um “guerrilheiro corajoso” e um grande líder revolucionário. As relações estiveram em seu pico em março de 1919, quando Makhno e os comunistas concluíram um pacto de ação militar conjunta contra o Exército Branco do general Deníkin. Tais gestos de harmonia, no entanto, não puderam esconder a hostilidade básica entre os dois grupos. Os comunistas não simpatizavam com o status autônomo do Exército Insurgente de Makhno porque ele exercia poderosa atração às suas fileiras camponesas; a Makhnovschina, por seu lado, temia que cedo ou tarde o Exército Vermelho tentasse acabar com seu movimento. Conforme as tensões cresciam, os jornais soviéticos abandonaram os elogios e começaram a chamar à Makhnovschina de “kulaks” e “anarco-bandidos”. Em maio, dois agentes da Cheka enviados para assassinar Makhno foram capturados e executados. No mês seguinte, Trótski, Comandante Chefe das forças bolcheviques, colocou Makhno na ilegalidade, e tropas comunistas realizaram uma operação relâmpago nos quartéis generais em Huliáipole.

Nestor Makhno, general insurgente ucraniano

Naquele verão, contudo, a frágil aliança foi apressadamente retomada por causa da ofensiva de Deníkin em direção a Moscou. Em 26 de setembro de 1919, Makhno lançou-se em contra-ataque no vilarejo de Peregonivka, perto da cidade de Uman, cortando as linhas de fornecimento do general branco e criando pânico e desordem na sua retaguarda. Esse foi o primeiro revés significativo na dramática ofensiva de Deníkin ao coração da Rússia e um grande obstáculo no seu ímpeto em direção à capital bolchevique. Pelo final do ano, uma contraofensiva do Exército Vermelho havia forçado Deníkin a recuar até as margens do Mar Negro.

A Makhnovschina alcançou seu auge nos meses seguintes à vitória em Peregonivka. Durante Outubro e Novembro, Makhno ocupou Katerynoslav e Alexandrovsk por várias semanas e então obteve a primeira chance de aplicar suas concepções de anarquismo à vida na cidade. O objetivo de Makhno era eliminar as dominações de todos os tipos e encorajar a autodeterminação social e econômica. Assim, quando os ferroviários de Alexandrovsk reclamaram que não haviam sido pagos por semanas, Makhno os aconselhou a tomar o controle das linhas e a cobrar o preço que achassem justo dos passageiros e dos trens de carga. Tais projetos utópicos, entretanto, não conseguiram conquistar mais que uma pequena minoria de trabalhadores, pois, ao contrário de fazendeiros e artesãos dos vilarejos, que eram produtores independentes acostumados a administrar seus próprios negócios, trabalhadores fabris e mineiros operavam como partes independentes de uma complicada máquina industrial e estariam perdidos sem a orientação de supervisores e especialistas técnicos. Além do mais, os camponeses e artesãos podiam trocar os produtos de seu trabalho, enquanto os trabalhadores urbanos dependiam de salários regulares para sobreviver. Makhno ainda gerou confusão quando reconheceu todo papel-moeda impresso por seus predecessores – nacionalistas ucranianos, brancos e bolcheviques. Ele nunca entendeu e nem se predispôs a entender as complexidades de uma economia urbana. Ele detestava o “veneno” das cidades e amava a simplicidade natural do ambiente camponês no qual havia nascido. De qualquer modo, Makhno teve pouco tempo para implementar seus mal definidos programas econômicos. A Makhnovschina, nas palavras de um dos associados do batko, era a “república sobre tachanki… Como sempre, a situação instável impediu o trabalho positivo”[8].

No final de 1919, Makhno recebeu instruções do Comando Vermelho para transferir imediatamente seu exército para a frente polonesa. A ordem tinha o único objetivo de afastar os Makhnovistas de seus territórios, deixando-os livres para o estabelecimento do governo bolchevique. Makhno recusou-se. A resposta de Trótski foi firme e sem hesitação: colocou os Makhnovistas na ilegalidade e enviou tropas para combatê-los. Desenrolaram-se oito meses de ardente combate com grandes perdas dos dois lados. Uma severa epidemia de tifo aumentou o sofrimento das vítimas. Os guerrilheiros de Makhno evitavam batalhas abertas, preferindo as táticas guerrilheiras que haviam aperfeiçoado durante a Guerra Civil.

As hostilidades foram encerradas em Outubro de 1920, quando o barão Wrangel, o sucessor de Deníkin no sul, lançou uma grande ofensiva em direção ao norte, partindo da península da Crimeia. Mais uma vez o Exército Vermelho recrutou a ajuda de Makhno; em retorno, os comunistas concordaram em anistiar todos os anarquistas presos na Rússia e a garantir liberdade de propaganda aos anarquistas, desde que não pregassem a derrubada violenta do governo soviético. Menos de um mês depois, no entanto, o Exército Vermelho havia se fortalecido o bastante para assegurar a vitória na Guerra Civil. Então, os comunistas romperam o acordo com Makhno. Não apenas a Makhnovschina tornara-se indesejável como parceira militar, mas na medida em que o batko ficasse livre, o espírito do anarquismo primitivo e o perigo de uma jacquerie[9] camponesa continuariam a rondar o instável regime bolchevique. Assim, em 25 de novembro de 1920, os comandantes de Makhno na Crimeia, recém-vitoriosos na batalha contra o exército de Wrangel, foram capturados e imediatamente fuzilados pelo Exército Vermelho. No dia seguinte, Trótski ordenou um ataque aos quartéis generais de Makhno em Huliáipole, enquanto a Cheka prendia os membros da Confederação Nabat em Carcóvia e invadia clubes e organizações anarquistas ao redor do país. Durante o ataque em Huliáipole, a maioria do estado-maior de Makhno foi capturada e presa ou sumariamente fuzilada. O próprio batko, no entanto, junto a uns poucos camaradas remanescentes de um exército que fora de dezenas de milhares, conseguiu esquivar-se dos perseguidores. Após peregrinar pela Ucrânia por quase um ano, o líder guerrilheiro, exausto e ainda sofrendo de ferimentos não curados, cruzou o Dniester em direção à Romênia e finalmente tomou o caminho de Paris.

Comandantes insurgentes ucranianos

A queda de Makhno marcou o início do fim do anarquismo russo. Três meses depois, em fevereiro de 1921, o movimento sofreu outro grande golpe quando Piotr Kropotkin, com quase oitenta anos de idade, morreu de pneumonia. A família de Kropotkin recusou o enterro cerimonial de Estado oferecido por Lênin e um comitê de anarquistas foi designado para organizar o funeral. Lev Kámenev, presidente do Soviete de Moscou, permitiu a um punhado de anarquistas presos um dia de liberdade para participar da procissão. Encarando o duro frio do inverno moscovita, 20.000 marcharam no cortejo ao monastério Novodévichy, a tumba dos nobres ancestrais de Kropotkin. Eles carregavam cartazes e bandeiras negras defendendo a libertação de todos os anarquistas presos e palavras de ordem como “Onde há autoridade não há liberdade” e “A libertação da classe trabalhadora é obra da própria classe trabalhadora”. Um coral cantou Memória Eterna. Enquanto a procissão passava pela prisão Butyrka, os presos bateram nas grades e cantaram um hino anarquista aos mortos. Emma Goldman discursou ao lado do túmulo, e estudantes e trabalhadores colocaram flores em seu caixão. A casa de nascença de Kropotkin, uma mansão no quarteirão aristocrático de Moscou, foi dada à sua esposa e camaradas para ser usada como um museu para seus livros, papéis e pertences pessoais, supervisionado por um comitê de eruditos anarquistas e de admiradores de todo o mundo[10].

No funeral de Kropotkin a bandeira negra do anarquismo foi hasteada por Moscou pela última vez. Duas semanas depois, a revolta de Kronstadt explodiu e uma nova onda de prisões políticas varreu o país. Livrarias anarquistas, copiadoras e clubes foram fechados e os poucos círculos anarquistas restantes foram dissolvidos. Mesmo os pacifistas seguidores de Tolstói – dos quais alguns foram fuzilados na Guerra Civil por se recusarem a servir no Exército Vermelho – foram presos e banidos. Em Moscou, um círculo de influentes “anarquistas soviéticos” conhecido como Universalistas foi preso sob falsas acusações de “banditismo e atividades ilegais”, e sua organização foi substituída por um novo grupo chamado “Anarco-Blocosmistas” [Anarcho-Blocosmists], que juravam total apoio ao governo soviético e declararam solenemente suas intenções de fazer uma revolução social “no espaço interplanetário, mas não no território soviético”[11].

A repressão continuou inalterada nos meses que se seguiram. Em setembro de 1921, a Cheka executou dois anarquistas famosos sem julgamento ou acusações formais. Emma Goldman ficou tão ultrajada que considerou fazer um escândalo à maneira das sufragistas inglesas, acorrentando-se a um banco no salão onde o Terceiro Congresso do Komintern acontecia, além de gritar seus protestos aos delegados. Ela foi dissuadida por seus amigos russos, mas pouco depois ela e Berkman, profundamente decepcionados com o rumo que a Revolução havia tomado, decidiram sair do país. “Cinzas são os dias que passam”, Berkman registrou em seu diário. “Uma a uma as brasas da esperança se apagaram. Terror e despotismo esmagaram a vida nascida em Outubro. Os slogans da revolução foram perjurados, seus ideais sufocados no sangue do povo. O fôlego de ontem está condenando milhões à morte; a sombra de hoje suspende-se como um lençol negro sobre o país. A ditadura está pisando no povo. A Revolução está morta; seu espírito grita no deserto… Decidi deixar a Rússia”[12].

Notas
[1] V.I. Lenin, Sochineniia [Obras], 2nd ed., 31 vols., Moscou, 1931-1935, XXIV, 437.
[2] Emma Goldman, Living My Life, New York, 1931, p.729; Alexander Berkman, The Bolshevik Myth (Diary 1920-1922), New York, 1925, pp.35-36.
[3] Victor Serge, Mémoires d’un révolutionnaire, Paris, 1951, p.134; Berkman, The Bolshevik Myth, p.68.
[4] M. N. Chudnov, Pod chernym znamenem (zapiski anarkhista) [Sob a bandeira negra (nota anarquista)], Moscow, 1930, p.53 *Down with the noise of church bells!/We shall sound a different alarm./With explosions and groans in the land/We shall build our own harmony!“
[5] Vol’nyi Golos Truda [A Voz Livre de Trabalho], September 16, 1918.
[6] Serge, Mémoires d’un révolutionnaire, p.135.
[7] P. Arshinov, Istoriia makhnovskogo dvizheniia (1918-1921 gg.) [História do Movimento Makhnovista (biênio 1918-1921)]], Berlin, 1923, pp.57-58.
[8] Voline, La révolution inconnue (1917-1921), Paris, 1943, pp.578, 603.
[9] N. do T.: Jacquerie, levante camponês na França em meados do śeculo XIV, durante a Guerra dos Cem Anos.
[10] O museu foi fechado em 1938 após a morte da viúva de Kropótkin. Em 1967 o autor visitou a casa e descobriu que ela estava sendo usada para algo que Kropótkin certamente aprovaria: é uma escola para crianças das embaixadas Britânica e Norte-Americana, com um parquinho no jardim e um interior cheio de livros infantis e arte.
[11] G.P. Maximoff, The Guillotine at Work, Chicago, 1940, p.362.
[12] Berkman, The Bolshevik Myth, p.319.

Bolcheviques “Libertadores” da Ucrânia, em 1918.

Traduzido por Macário e revisado pelo Passa Palavra a partir do original disponível neste link. Este artigo faz parte do esforço coletivo de traduções do centenário da Revolução Russa mobilizado pelo Passa Palavra. Veja aqui a lista de textos e o chamado para participação.

2 COMENTÁRIOS

  1. Gostaria de uma leve explicação sobre a questão da historiografia do movimento anarquista para o site ou tradutor. Ou seja qual a historiografia é séria e qual não é e porque.
    Grato!

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