Mais um exemplo da total promiscuidade entre os cargos políticos e as administrações bancárias. Miguel Cadilhe pretende aparecer agora como um quadro superior impoluto que teria ajudado a resolver o imbróglio do BPN. Não é bem assim. Por Mizé
O actual escândalo do Banco Português de Negócios (BPN), que implicou já a nacionalização do banco e um apoio do Estado português de quase 2 mil milhões de euros, e que é alvo de uma acidentada investigação parlamentar, vai sendo, também, exemplo da velha técnica dos bodes expiatórios: encontrando um ou dois culpados (como Oliveira e Costa ou Dias Loureiro), concentra-se neles toda a atenção do público e da justiça, deixando de fora todos os outros e evitando qualquer apreciação de fundo ao sistema que lhes permite cometer os crimes económicos.
Um exemplo disso é Miguel Cadilhe, que foi ministro das Finanças nos governos do actual presidente da República, Cavaco Silva. Nos últimos meses antes da derrocada do BPN, Cadilhe foi apresentado como o homem íntegro que iria colocar aquele banco “nos eixos”. A acreditarmos nos médias dominantes [na mídia dominante], a sua passageira administração terá sido decisiva para detectar e denunciar as “irregularidades” cometidas no BPN.
Porém, olhando mais de perto, esse “acto de coragem” de Miguel Cadilhe, preocupado com “os interesses dos depositantes, dos pequenos accionistas e dos trabalhadores do banco”, propiciador da “regulação do sistema”, teve pormenores menos falados mas bem significativos.
Segundo dados que há muito circulam nos jornais e na internet, o seu salário anual (no BPN) era de 1 milhão de euros, recebendo os restantes sete administradores apenas 700 mil euros anuais. E exigiu, e foram colocados à sua disposição, dois carros: um BMW 735 e um Mercedes classe S.
Para saltar do BCP para o BPN, este teve de compensá-lo pela perda da reforma [aposentadoria] do primeiro. Mas isso não foi feito integrando-o simplesmente no fundo de pensões do BPN (neste caso a recapitalização do fundo teria de ser da ordem dos 9 milhões de euros). Cadilhe exigiu, em vez disso, um PPR/Renda vitalícia [PPR é um fundo pessoal de poupança-reforma com isenções fiscais] que se verificou ser mais caro em 3 milhões do que a solução anterior. Mas atenção: Cadilhe não é parvo, e por isso exigiu que esse PPR em seu nome fosse constituído fora do grupo SLN/BPN que ele já sabia estar em maus lençóis…
Algumas mentes torcidas insistem em lembrar, a propósito, o incidente de Cadilhe com o imposto da sisa [imposto sobre as transacções de bens imóveis], quando era ministro das Finanças de Cavaco Silva. Ele alterou o limite de isenção desse imposto de 5 mil para 10 mil contos [25 mil e 50 mil euros, respectivamente] mesmo a tempo de beneficiar da nova isenção na compra do seu apartamento nas Amoreiras [zona cara no centro de Lisboa]. E, logo a seguir, restabeleceu o anterior patamar de isenção em 5 mil contos. Além disso, conseguiu “isenção de imposto municipal” declarando esse apartamento como sua habitação principal, com o argumento de que, sendo ministro, tinha de ter casa em Lisboa. Mas a sua habitação principal é no Porto, no bairro chique da Foz.
Por essas e outras, há aí gente que agora chama a Miguel Cadilhe o “coveiro rico”.
Brutal. O compadrio é impressionante, e nem se preocupam em disfarçar! Maldita a hora em que eu não me filiei num qualquer partido político para poder lamber as botas aos meninos de bem que um dia querem ser ministros. Ainda me arriscava a arranjar um tacho bem pago! Bem, fica para a próxima!