A pianista Maria João Pires, excelente intérprete de Mozart, renunciou à nacionalidade portuguesa, o que em nada espanta alguns de nós. Talvez seja mais exacto dizer que a situação foi a inversa, e que Portugal já renunciara à pianista. Aliás, durante bastantes anos ela foi subestimada pelos compatriotas, até que a sua consagração discográfica na Alemanha e o êxito obtido em numerosos festivais franceses obrigaram os melómanos portugueses a descobrir que estava ali alguém que não era uma mera artista com mãos pequeninas. Mas que Portugal não se assuste, já que pode empregar com Maria João Pires a receita que aplicou a Camões, enterrado em vala comum, comido pelas minhocas, e para o qual se construiu séculos depois um túmulo vazio no panteon do mosteiro dos Jerónimos. Quando, há alguns anos, o panteon foi transferido para a igreja de Santa Engrácia, as autoridades que zelam sobre os Jerónimos negaram-se a largar mão do túmulo vazio de Camões e os seus concorrentes de Santa Engrácia pensaram, muito logicamente, que se o poeta não estava num lado também não era necessário que estivesse no outro, pelo que agora Camões conta com duas sepulturas rivais, ambas sem ninguém dentro. E porquê parar aqui? O ministro da Cultura propôs que se convertesse Fernando Pessoa num produto de exportação, com mais facilidade ele poderia vender túmulos camonianos no seu país e no estrangeiro. Quanto a Maria João Pires, a solução é evidente: uma perdida, muitas ganhas. Que os empresários portugueses se lembrem de a reproduzir em bonecas insufláveis! Passa Palavra

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