Este é um artigo-resposta a João Bernardo, assim como para aqueles que pensam que tentar compreender a relação entre mundo natural e o ser humano é reproduzir discursos conservadores. Por Mix
Volta e meia aparecem textos e pessoas escrevendo sobre o campesinato: a mitificação e romantização do campesinato, como eles contribuem diretamente para a reprodução do capital, etc. João Bernardo, em uma série publicada no site do Passa Palavra, trata o mundo agrário, o mito da natureza, o bom selvagem, o campesinato no fascismo italiano e no nazismo alemão, como também a questão da agricultura familiar e da agroecologia. Algumas de suas críticas são válidas; contudo, quando nos propomos a falar de tantos temas, como assim o fez Bernardo, corremos o risco de cometermos enganos e, ao meu ver, a generalização é um deles.
Em certa medida este é um artigo-resposta a João Bernardo, assim como para aqueles que pensam que tentar compreender a relação entre mundo natural, como diria Élisée Reclus, e o ser humano é reproduzir discursos conservadores. Ou que pensar a campesinidade e a vida camponesa, não pensando-as como entrave ao avanço do desenvolvimento humano, é mitificá-las e, mais que isso, é querer conservar intocada uma forma de existência.
O capitalismo desde que surgiu tem sido capaz de absorver muitas práticas contestatórias, como o fez – também e não só – com a questão ecológica, mas não podemos compreender esta questão, assim como a agroecologia, somente pela visão capitalista e seu decorrente discurso do desenvolvimento sustentável. Não podemos e nem devemos colocar tudo no mesmo saco e dizer que é tudo a mesma coisa, tudo é igual, isso se torna bem problemático, as generalizações.
O ser humano historicamente e espacialmente tem se relacionado de forma direta com o mundo natural porque depende dele para reprodução de sua vida, para sua criação, etc. Assim, o ser humano estabeleceu, durante séculos, relações diversas com este meio, que nem sempre se constituíram de maneira harmoniosa. A questão é que a sociedade hegemonicamente capitalista possibilitou a constituição de uma sociedade outra, a urbanizada, pautada por outros valores, que, além do domínio do mundo natural, elimina-o. Nos é difícil apontar para um equilíbrio da natureza e da sociedade se não podemos falar de uma única sociedade, mas de sociedades, no plural. Cada qual se relacionando com o mundo natural de uma forma diferente ou, muitas vezes, de igual maneira.
Por isso, os casos que João Bernardo menciona em seus artigos são casos específicos (Alemanha e Itália), que podemos apontar outros tantos em que o campesinato foi um dos impulsionadores de revoluções socialistas libertárias, e nos parece que o contexto em que o autor está inserido não é o latino-americano, nem o brasileiro, que, portanto, conserva similaridades, mas também muitas particularidades. Desta maneira, torna-se mais complicado compreender o mundo agrário brasileiro pela ótica europeia.
No Brasil, o caipira, o caiçara, o sertanejo são os que vão constituir o campesinato, mas não podemos deixar de mencionar os quilombolas, ribeirinhos, que fazem parte deste mundo agrário.
Não se trata de dizer que estes grupos são revolucionários por excelência, nem intencionar conservar suas culturas intactas. Tanto porque tudo se transforma, na sociedade, na vida cotidiana, no mundo natural; tudo está em constante transformação, as espécies se misturam, algumas surgem, outras desaparecem e outras se transformam. Mas trata-se de compreender o campesinato, sua cultura e relações sociais, por eles próprios, não com o olhar daquele que vem do mundo urbanizado ou intelectual, mas se reconhecendo como parte do outro, enquanto ser humano. No Brasil, a sociedade urbanizada teve um grande papel em reduzir o camponês e a camponesa àquele que é o atraso do desenvolvimento econômico e social, com suas tradições primitivas, e nós, enquanto militantes que assumimos o lado daqueles que não mais querem ser explorados, precisamos cuidar para não reafirmar discursos deste porte, necessitamos construir sim a crítica, analisar, mas não anular a luta daqueles que estão morrendo na luta contra concentração de terra, contra o controle das sementes, entre outras lutas mais.
O capitalismo e o Estado, no decorrer da história, foram tomando o controle não só do trabalho, mas também dos aspectos cotidianos de nossas vidas, e ainda o tentam. O trabalho, o conhecimento, a educação, a saúde; fomos perdendo nossas faculdades e nossa autonomia em diversos aspectos, e estes atribuídos a terceiros. Assim, não temos mais a sensibilidade do trabalhar a terra (sem dizer a sensibilidade do trabalho propriamente dito), compra-se alimentos cada vez mais envenenados, o cuidado com a saúde diz respeito ao Estado, aos grandes planos de saúde e à indústria farmacêutica. Aqui em São Paulo, até pouco tempo, os e as avós conheciam remédios naturais para o tratamento de diversas doenças, os partos eram realizados em casa por parteiras que transmitiam seu conhecimento geração após geração, hoje nos deparamos com a crescente medicalização da vida. Isso, em certa medida, possibilitava espaços de autonomia em relação ao capitalismo e ao Estado, eram aspectos da vida que se tinha controle individual e coletivo. Como já colocado anteriormente, não se trata de romantizar a cultura camponesa, ou de se colocar contra os ditos “avanços” da ciência, mas de ressaltar que em nome dessa sociedade moderna urbanizada-tecnológica-científica, deixamos de ser sensíveis a outras culturas, não enxergando a importância que essas culturas têm, em termos de conhecimento, se queremos realmente uma sociedade sem Estado e sem capitalismo. O pior é que, para além da sensibilidade de enxergá-las, as anulamos. Elas persistem em (re)existir apesar do capitalismo, mesmo que inseridas nesse sistema hegemônico e com suas constantes transformações, insistem em incomodar os grandes proprietários de terra, as grandes indústrias e supermercados. O controle social também passa pelo controle da vida cotidiana (pública e privada).
João Bernardo diz que novas tecnologias surgiram para resolver desequilíbrios, tal como o carvão para resolver o desequilíbrio provocado pelo regime senhorial (madeiras usadas para construções e fabrico); eu diria que o carvão não aparece para resolver um desequilíbrio, mas para agilizar a produção capitalista, pois sabe-se que o carvão mineral chega a temperaturas maiores que o carvão vegetal, tornando possível o manuseio do ferro, por exemplo. Além disso, essa resolução do desequilíbrio não veio de uma necessidade da parte explorada da sociedade, mas de uma parte que necessitava reproduzir e acumular seu capital.
A indústria não existe per si, ela precisa da matéria-prima retirada do meio natural; o problema é que se produz mais que o necessário, se criam sempre novas necessidades e novas mercadorias “indispensáveis” à vida de cada um, ou melhor, daqueles que podem comprar (e daqueles que não podem também, o cartão de crédito está aí para isso). E assim, em nome dessa indústria, desse avanço e progresso, que não é realizado para a reprodução da vida, mas para acumulação de capital, é que estão acabando com o mundo natural, estão acabando com as pessoas.
Por isto, encontrei bem problemática a comparação que se fez dos povos pré-históricos e sua intervenção no mundo natural. Os povos pré-históricos, até onde conhecemos, eram nômades, esgotavam tudo que necessitavam de um local e partiam para outro, colocavam fogo na mata como meio de “caçar” animais, etc. Naquela época o mundo parecia infinitamente utilizável, além de haver a possibilidade de recuperação “natural” daquele mundo. Diferente deste mundo pretérito, com o qual nos deparamos atualmente. A cultura (no seu sentido mais amplo) é cumulativa, como já dito, as sociedades não são imutáveis, a natureza não é imutável, ela acumula, se transforma, se complementa, se torna outra coisa.
Assim, não queremos romantizar a vida camponesa, que, inserida neste mundo mais amplo, também é cheia de problemas; mas também não queremos romantizar e valorizar a vida urbanizada, nem a “evolução” científica, tal qual como nos é disposta; mas pretendemos denunciar o controle, muitas vezes, silencioso do Estado e do capitalismo não somente em nossas vidas, mas também social, que direciona a economia e as sociedades para aquilo que lhes interessa. É por isso que muitas vezes eles conseguem se apropriar de lutas e discursos, como foi e é a questão ecológica. A ideia hegemônica é a do desenvolvimento sustentável, da agricultura familiar e orgânica, o capitalismo em sua co-ação com o Estado é capaz de se apropriar de lutas revolucionárias anticapitalistas e de transformá-las em lutas reformistas. Isso é uma falha que é nossa também. Murray Bookchin já dizia que seria impossível uma sociedade realmente ecológica dentro do capitalismo. Élisée Reclus falava da importância do camponês e de seus conhecimentos, ao mesmo tempo em que se colocava contra essa sociedade capitalista e controlada pelo Estado. Mas o discurso colocado nos quatro cantos do mundo é o da sustentabilidade dentro da sociedade da exploração.
No contexto brasileiro, os homens e mulheres do campo podem ser muitos, porque este conceito é muito generalizante. Pode ser um grande proprietário que possui 450 alqueires de terra com monoculturas, com irrigação por pivô central e uso de agroquímicos, como também pessoas que arrendam a terra para reprodução da vida ou que recebem um pedacinho de terra para sua plantação do grande proprietário; estes plantam parte do que comem, produzem leite e queijo para eles mesmos, sendo o excedente trocado ou vendido no armazém da vila ou na cidade. Casos que encontramos no campo paulista. É importante também compreender que o campesinato brasileiro não se restringe ao MST, e que a direção nacional do MST não são aqueles que constroem a luta no seu dia a dia, apesar de diversas questões que poderíamos apontar em relação a um movimento hierárquico, mas que podem ficar para um outro momento.
Ainda neste conjunto de três artigos, João Bernardo expõe dois casos, o da Itália fascista e o da Alemanha nazista, e como estes Estados usaram a ideia do tradicionalismo camponês e da agricultura familiar nesse contexto do fascismo e do nazismo (vale a pena ler os artigos). Em contrapartida, gostaria de recordar outros casos e experiências em que foram os camponeses e camponesas aqueles que acenderam a primeira faísca, aqueles que se levantaram contra o poder estabelecido e, se não realizaram, contribuíram de maneira essencial para o estabelecimento de revoluções sociais que tornaram possíveis outras formas de viver e organizar-se socialmente, quase que concomitantes aos citados por Bernardo. É preciso lembrar, assim acredito eu, que as transformações sociais só são e serão possíveis de se realizar se ocorrerem no conjunto da sociedade concomitante à construção de um novo ser humano.
O socialismo, ao contrário do que diz João Bernardo, não nasceu “da compreensão de que a produção industrial de massa e a aplicação dos princípios da indústria ao campo proporcionam a satisfação de todas as necessidades materiais e tornam possível o desenvolvimento de uma civilização em que ficará ultrapassada a luta pela sobrevivência.”, mas sim como produto de uma sociedade brutalmente desigual que foi se estruturando na medida em que o capitalismo se desenvolvia em sua forma industrial, numa sociedade moderna com valores pautados pela industrialização e pela busca desenfreada do desenvolvimento e do progresso.
Por isso referenciamos a Revolução Mexicana de 1910, levada a cabo por camponeses indígenas em conjunto com operários. Luta que serviu de base para o levante zapatista de 1994. A Revolução Russa, que, antes de passar às mãos dos bolcheviques, foi colocada em prática pelos soviets e mir numa Rússia essencialmente agrária; lembremos dos camponeses e camponesas ucranianas, mas também do campesinato que, cansado das injustiças sociais sofridas tanto pelo império quanto pela república, fez sua revolução, tomando terras, produzindo, coletivizando. E, claro, não poderia deixar de mencionar a Revolução Espanhola, levada a cabo no conjunto da sociedade por camponeses e operários, que foram capazes não só de lutar contra o poder estabelecido, mas de construir uma outra sociedade; terras e fábricas foram coletivizadas, autogeridas, trabalhos coletivizados, em algumas províncias o dinheiro foi abolido, assim como o princípio de propriedade privada e herança. Eram camponeses que viviam a exploração e encontraram um outro sentido na coletivização, que mesmo antes da Revolução já era praticada nos pueblos espanhóis; eles já experimentavam, pela necessidade, outra forma de relação interpessoal, mostrando que outro mundo era possível, e que este mundo não se restringia simplesmente ao âmbito, mas cultura como um todo; lembremos que ali foi o berço das Escolas Modernas. Do desenvolvimento de uma cultura que se diferenciava do restante da Europa ocidental.
Essas Revoluções servem para conhecermos, mas, mais que tudo, para aprendermos; muitas lutas podem ser apropriadas pelo capitalismo. Muitas derrotas podem ocorrer quando se está lutando contra o poder estabelecido, mas para além disso, essas Revoluções, que não têm muito lugar na história, na sociologia, na geografia, etc, serviram para provar que para lutar contra a exploração, contra o poder hierarquizado, não existe um momento exato, não é aquele do tempo futuro, mas o hoje, o tempo presente.
Muitas das críticas apontadas por Bernardo, como o mito do bom selvagem, esse conservacionismo do indígena pela antropologia, “o mito da natureza intocada”, nos colocamos de acordo; mas, por um outro lado, a generalização, seja dos conceitos, das sociedades, das formas de vida, torna-se um limitante para não perceber aspectos de resistência na ecologia radical e libertária, no campesinato, apesar daquilo que o capitalismo e o Estado têm feito. Não se trata de dizer que a crítica não deve ser realizada, mas deve-se tomar cuidado para não se anular aquilo que, pela sua existência, também aparece como parte da resistência.
Em um certo momento você diz que a agroecologia seria “condenar a população a escassez”. Mas, de fato, de que população você está falando? Da população do continente africano? Da população palestina? Da população nordestina e indígena brasileira? Dos milhares de miseráveis existentes pelo mundo? Porque estas pessoas já estão condenadas à escassez há centenas de anos; quando o conseguem, reproduzem sua vida no limite.
Pensar que a “agroecologia se identifica com um socialismo da miséria” também é um equívoco, talvez de alguém que pouco tenha lido sobre o assunto, ou visto e realizado práticas na agroecologia. Esta possibilita o plantio sem uso de agroquímicos, sem a contaminação das sementes, mais que isso, a agroecologia limita o controle da alimentação e das sementes pela indústria de agroquímicos, que é farmacêutica e alimentícia ao mesmo tempo. O camponês e a camponesa podem não ter em sua casa comida congelada sempre, ou ir a restaurantes com vários tipos de comida para poder jantar fora aos finais de semana, mas muitos vivem bem com o que produzem, têm diversidade de folhas, frutas, vegetais, alguns leite e queijo.
Não podemos pensar em qualquer transformação social se não levarmos em conta os outros muitos aspectos dos quais depende tal transformação. A mudança de relação entre as pessoas, entre nós e a terra, entre nós e os animais. A monocultura serve ao capitalismo, mas não às pessoas e a uma sociedade com outros valores. Ela só é possível por conta das transgenias produzidas em laboratório e dos agroquímicos. É isso que queremos reproduzir? A indústria de produção de mercadorias homogêneas e em massa serve a acumulação de capital, mas não a um outro mundo. Pouco tenho a intenção de defender uma revolução mundial, porque estas algumas vezes também conservam uma generalização e uma homogeneidade, mas as Revoluções acontecem porque respondem às necessidades e rebeldias individuais e sociais. E nisto estou com os zapatistas, eu desejo “um mundo onde caibam outros mundos”, ou como dizia Élisée Reclus: um lugar onde as necessidades e expectativas de todos e todas sejam ouvidas.
Nos falta enxergar um pouco mais aquilo que é pequeno, que é menor que quase tudo, mas ir se afastando para não se esquecer que este pequeno faz parte de um todo maior e que tampouco pode ser esquecido.
Falar do campesinato, pondo de lado a história das suas lutas ao longo dos séculos dos servos contra os terratenetes é omitir uma luta tenaz e duradoira que está desmentida pelos acontecimentos. Não só a Espanha, mas também a Alemanha provocaram levantamentos insurrecionais de camponeses. Depois na Revolução Russa, como se sabe a aliança do proletariado com o capesinato foi fundamental para derrubar e consolidar pela 1ª vez na História o poder burguês. Há ainda a salientar a revolução Chinesa que graças à táctica da Longa Marcha arrastou consigo 200 milhões de camponeses que conduziram o PCC ao poder em 1 de Outubro de 1949.
Em Cuba, julgo eu, também os camponeses tiveram um papel fundamental na entrada triunfal de F. de Castro e Che Guevara em Havana no ano de 1959.
correlacao de forcas no passa-palavra?
Lendo este texto concluo que o PP é na pratica um espaço da livre expressão de anti-capitalistas sinceros. Agora, não sairemos do (péssimo) lugar onde nos encontramos se adotarmos como estratégia de enfrentamento a um sistema mundializado como o capitalismo priorizar atuar sobre aquilo que o próprio capital vai fazendo sumir do mapa ou, na melhor das hipóteses, transformando em resquicíos de um passado que nunca virará futuro.
Fazer o pequeno, pensando no grande é muito diferente de fazer o pequeno com intenção de deter o movimento da história para perpetuar formas (mentais, de produção, de relacionamento, etc.)…
Oxalá, um raio seja enviado na cabeça do Capitão Planeta, por Zeus que ajunta as nuvens.
Penso que a “Humanidade” fracassou.
Penso que o sistema capitalista é melhor, com suas contradições intrínsecas.
Penso que tecnologia não é algo bom ou ruim, mas alguma técnica que deva ser aplicada às nossas vidas com responsabilidade.
Penso que o ser humano só conhece suas ações após serem feitas.
Penso que dualidade homem-natureza é algo simplista para ter como esquema, pois a natureza é a própria ação humana.
Estou pensando demais? O.K.
Mas, poupa-me deste, como posso dizer? Capitão Planeta criado a leite com pêra e ovomaltine na geladeira.
Boa Discussão. Estou ainda mais convencido das minhas suspeitas ao texto do Bernado depois desta resposta. Já havia comentado no 1° texto do Jão:
“PRECISAMOS ENCONTRAR A TECNOLOGIA QUE NÃO SE SUBMETA AO CAPITAL, TENDO ELA UM ALTO DESENVOLVIMENTO OU SENDO(de aspecto) TRADICIONAL, O QUE IMPORTA É ESTA NOS SERVIR E NÃO A PRODUÇÃO EM SI – MAIS PRECISAMENTE;O CAPITAL”
A caneta e a enxada
Certa vez uma caneta foi passear lá no sertão
Encontrou-se com uma enxada, fazendo uma plantação.
A enxada muito humilde, foi lhe fazer saudação,
Mas a caneta soberba não quis pegar na sua mão.
E ainda por desaforo lhe passou uma repreensão.
Disse a caneta pra enxada não vem perto de mim, não
Você está suja de terra, de terra suja do chão
Sabe com quem está falando, veja sua posição
E não se esqueça a distância da nossa separação.
Eu sou a caneta dourada que escreve nos tabelião
Eu escrevo pros governos a lei da constituição
Escrevi em papel de linho, pros ricaços e pros barão
Só ando na mão dos mestres, dos homens de posição.
A enxada respondeu: de fato eu vivo no chão,
Pra poder dar o que comer e vestir o seu patrão
Eu vim no mundo primeiro, quase no tempo de Adão
Se não fosse o meu sustento ninguém tinha instrução.
Vai-te caneta orgulhosa, vergonha da geração
A tua alta nobreza não passa de pretensão
Você diz que escreve tudo, tem uma coisa que não
É a palavra bonita que se chama educação!
quem é mix? por favor se apresente. se vc citou o joao bernardo que pelo menos se apresentasse com nome e apelido.
Se apresentar para que? Acho que não precisa não. O PP está de parabéns por abrir espaços para o debate e para a polêmica. Os comentários do afonsomanuel também são interessantes. Valeu!
Ao contemplar o artigo
aspirei por um momento,
para além das verves do meio virtual,
que também passássemos a cultivar outras terras…
Que estas palavras escritas acima
possam inspirar a gente descer e plantar nossa comida à vera!
Aí sim passaremos a acreditar que palavra dá em árvore.
Mesmo porque companheirxs e hermanxs sabemos bem que
o pão nosso de cada dia não cai do céu
e sim da tal engrenagente do Kapeta.
Mãos bolivianas pro gás ou carvão,
argentinas pra enxada ou maquinário,
nordestinas pra fornalha ou pro balcão,
tlim $…
Ah sim, antes de partir, queria agradecer de coração
o alento que trouxeram com essa reflexão
(à Mix que teceu e àquelxs que fizeram espaço).
A publicação deste texto pelo Passapalavra significa um declínio e uma covardia. Se sujeitou a publicar uma porcaria (não se aprende nada com o texto) provavelmente por medo de ser tido como não democrático ao recusar a publicação.
Mais uma romantização ignorante (desconhecimento dos fatos) do passado na velha linha anarquista “havia o éden e então surgiu o capitalismo”. A autora me fez rir muito quando diz que vale a pena ler o texto que ela desejava criticar rs…
flora h. eu queria sim é que vc escrevesse mais! essas outras terras eu imaginei …. porque a utopia está bem aqui, pertinho de todxs nós! Contra a engrenagem do Kapeta e do P …ateta!
Para Zé,
Bem Zé, muitas vezes subestimamos que as pessoas são capazes de se construir politicamente a partir de uma dada situação.
O socialismo foi assim, não? A partir das revoltas e revoluções surgidas a partir da industrialização foi possível aparecer o socialismo e daí suas vertentes.
A história não se move sozinha, ela se constrói a partir de relações sociais e com o meio natural. Quando juntos, somos mais do que aquilo que achamos que somos.
Então, em nenhum momento eu tratei de dizer que tal ou qual luta é mais importante que uma ou outra, mas também não trato de anular a luta de pessoas que dão sua vida por essa luta. Mesmo sofrendo com a tentativa do estado e do capitalismo de fazê-los desaparecer, passados pouco mais de 200 anos, ainda (r)existem.
Grata Flora, lindo poema! :)
Muito obrigada Zeca por me avisar que era autorA. Quando li o texto não tinha percebido ou será que dava pra ver? Bem que a Ana Maria já tinha comentado da correlação de forças no Passa Palavra… só alguém de dentro do PP pra ter essa informação, né? Ainda bem que nem todos aí pensam como vc… mas uma coisa te dou razão, tá bem difícil de manter uma crítica de textos falando dos próprios limites desses textos… não é impossível, mas é bem difícil, opino que a tese-chave criticada não dava pra ser retomada, o exercício é bonito esse de não criticar textos na sua totalidade, mas as vezes, só as vezes a ruptura total faz bem, né? Enfim, o caminho do diálogo nem sempre é possível, resta saber quando se pode dialogar ou melhor partir pra outras coisas…Por isso convidaria pessoas como a mix pra escrever de tantas coisas políticas de autonomia, de horizontalidad, de uma crítica a criação de ´´divos´´ dentro dessa autonomia… deve ser essa necessidade nossa de ter deuses, alguém pra ´´escutar´´… criticamos tanto ao povo de partidos políticos e é foda reconhecer que tem muita gente que ´´adora´´ e não tem nenhum problema em ser guiada, não sei se isso já aconteceu com vcs mas comigo já… enfim compas já tá passando da hora de autocríticas…. ou talvez seja pedir demais desse site que tem um linha editorial meio academica demais, mas que é injusto da nossa parte pedir outras coisas e na verdade pode ser queo problema esteja no fato de nós não criarmos outras coisas… fico pensando nisso, inclusive acho que o PP é interessante, mas cansa muito algumas vezes… mas enfim, tomara que existam mais sites como esses pra gente ter menos carencia de espaços e/ou pedir coisas a um site que ele – sem sacanagem- não pode nos dar…(como abrir espaços que poderia colapsar a sua linha editorial). Enfim, vamos conversando agora ou num outro momento porque tem sim a opção que muitos já fizeram de não entrar nesse site… mas essa, pelo menos, nós que perdemos o nosso tempo comentando e lendo estes textos e comentários, (ainda) não foi a nossa escolha…
Aline Santana,
sinto se não conseguiu perceber principalmente pelos comentários (“correlação de forças”), que se tratava de uma menina. Conselho: não preste concurso para investigador de polícia pois não possui muito talento para a área. Também errou quando diz que sou do Passapalavra. Não sou, por isso estou reclamando.
Mas critiquei o texto não por ser mulher mas porque é ruim mesmo. Já disse isso em outros textos, o último foi o do Henrique. Me perdoe mas parece que a autora aceitou, ao publicar o texto, que poderia ser criticada. Ela própria não reclamou. Eu critico, outros elogiam. Faz parte do debate. Não venha com coitadismo, essa não foi a postura da autora e se fosse o caso ela teria me respondido. Bom dia para você. Paz.
Companheiro Zeca, como é que se percebe o sexo de alguém pela expressao ”correlação de forças”??? Nossa, gostaria de saber, como dizem muitos psicólogos por aí, deve ser ´´projeção(além de detetive tb sou terapeuta kk). Nao tava criticando a sua crítica pelo genero, eu nem sabia que sexo tinha mix, só percebi pelo seu comentário e depois pela resposta dela do ´´grata´´. Enfim companheiro, fiquei muito interessada nas sus outras críticas ao site PP, aproveitando que é ´´de fora´´ acho que seria muito enriquecedor vc aproveitar ´´a deixa´´ e expor aqui com mais detalhes.
ps: Espero que o ´´ruim mesmo´´ do texto não tenha sido porque ele não tem linguagem academica… por falar nisso, não tinha comentado que adorei o fato do texto nao ter citaçoes tipo academicas.
ps2: Como responder a este seu: ´´na velha linha anarquista “havia o éden e então surgiu o capitalismo”. se vc se animar, poderia nos presentear com mais comentários para este comentário…já que autonomia e anarkismo possuem conexoes íntimas…acho que poderia estimular muito o debate…tomara..
Axé pra nóis!
Companheiríssima Aline Santana, não disse que tinha críticas ao PassaPalavra, disse que critiquei alguns textos, tanto de corpos penianos quanto de corpos vaginianos. Por mim nem este nem alguns outros teriam sido publicados, mas em todos os casos houve quem achasse os textos bons. Esse ai acho que saiu do alvo porque o do JB criticava o mito da natureza porque não existe uma natureza assim como não existe um deus, estas categorias absolutas que as pessoas amam e veneram para ter um escape para o vazio. Ao que parece é você e outr#s (vou usar um símbolo novo) que possuem as tais críticas. Podiam aproveitar o espaço ai e fazer, assim se livram deste peso na consciência. Sinceramente, a não ser como infantilidade, não sei que valor tem uma tal ameaça de boicote ante um site visto por algumas centenas de pessoas somente num oceano virtual em que portais acumulam milhões de visitas. Não vai fazer diferença, a extrema esquerda é já uma minoria fragmentada em centenas de minorias internas, grupinhos que quase se confundem com a rede de amigos (problema mortal do meio).
O problema não está no antiacademicismo está no centro, na fundamentação do texto; Não existe uma natureza, não existe uma natureza, não existe deus, não existe nenhum absoluto que nos fundamente ou inspire uma moral. Existe nós, experimentos e mais experimentos, devir e mais devir flutuando sem rumo no universo. Depois morremos. Até agora morremos…
O igualitarismo é um projeto para hoje, do presente. A situação é bem difícil, muito dura mesmo, mas há uma minoria significativa propondo algo diferente. É o hoje, o agora, toda a linha de romantização do passado não nos auxilia em nada. De nada adianta dizer que os Hussitas foram a maior experiência revolucionária do passado,aboliram a família, a propriedade até das roupas do corpo, instituíram o sexo coletivo como padrão etc. porque nós não somos eles. O nosso navio é outro, as águas são outras, outros tripulantes, outros conceitos, outros desejos.
Obrigado pela companhia. Até.
Perdão por entrar no papo, mas ando acompanhando a conversa e acho que dá para ser ampliada ou pelo menos que não seja tão interna que já me perdi. Já passamos do socialismo, depois para o anarquismo e agora que não existe uma natureza. É isso? Aí voltamos para o texto Será o camponês um mito? Quem é JB? Perdão que tou começando a me familiarizar com o site agora, vocês todos devem se conhecer, mas eu não. Valeu se puderem esclarecer.
Companheiro Zeca, muito obrigada por revelar a sua ´´identidade´´. Que bom que o ´´tom´´ mudou. Quando alguém fala que um texto é ´´uma porcaria (não se aprende nada com o texto)´´ e muda para ´´o problema não está no antiacademicismo está no centro, na fundamentação do texto; Não existe uma natureza´´ já existe uma diferença. Enfim, ´´aprendi´´ kk com o seu texto´´, grata por me ´´iluminar´´. Fiquei imaginando, pela sua linha de pensamento, o que vc poderia admitir que talvez, só talvez esteja errado… mas enfim, isso não é uma pergunta. Por falar na rede de amigos, melhor leio os seus textos ou os dos seus amigos que já sei quais são… ou melhor não, que preguiça. Uma pena vc não ter me feito nenhuma pergunta, algo que caracteriza o ´´acompanhamento´´ (forma e conteúdo), até poderíamos continuar esse diálogo, mas como parece que vc nao dialoga, vc ´´fala para um público´´ …
ps: nao tive a intenção de fazer uma ´´ameaça de boicote´´ ao PP, era justamente ao contrário. por falar em sectarismo de esquerda que somos todos (aqui me incluio e a vc Zeca), que delicadeza e muito pouco sectária a resposta da Mix pra vc. O seu e-mail nao foi uma crítica, nem provocativo, foi para ´´ofender´´ mesmo… deveríamos as duas (eu e vc no feminino) olhar mais para figuras como a Mix… enfim, outra auto-crítica. E olha que posso ´´aprender´´ com ela sem que ela me peça ou quando nem a conheço. Obrigada de novo por revelar ou pela sua projeção que era Ela ou um Ele que se coloca como Em todo caso, ela…
Companheira Aline,
isso ai não é ofensa. Ofensa é o que estão fazendo com o Pinheirinho. Mas agora chegou na extrema esquerda, com toda a facilidade que uma militância covarde de Facebook permite, aquela geração que cresceu assistindo Capitão Planeta, Meninas Super Poderosas, comendo danone…Amam os animais e a natureza. Qualquer canalha é capaz de amar os animais e a natureza. Aliás é um bom recurso psicológico para quem não gosta muito de gente. E para essa turminha afetada, incapaz de arrumar o próprio quarto e lavar a própria louça e que chega aos 30 ou mais vivendo nas costas – explorando – os próprios pais tudo vira psicanálise, agressão. Nunca antes teve tanto mentiroso e covarde no meio, devo me acostumar.
Já disse que não sou quem insinuas ou pensa que sou. Façam a crítica que querem fazer, não me usem como pretexto nem acusem outros pelo que escrevi. Chega de coitadismo. Vou trabalhar. Paz!
Mix,
Discordo da linha de seu texto como perspectiva estratégica, mas me encontro contigo na perspectiva de mudar profundamente as coisas como estão. Nesse sentido, pela fraternidade em que se situa nossa divergência, detalharei um pouco o que quis expressar.
Não se trata de “anular a luta de pessoas que dão sua vida por essa luta”, quanto a isso minha posição é clara: me solidarizo e me integro com esses em tais momentos mesmo tendo a clareza que são lutas perdidas historicamente. Estou convencido que uma subjetividade que luta contra os efeitos do capitalismo, não necessariamente luta contra o capitalismo. Uma coisa é ser incomodado pelo desenvolvimento capitalismo, outra é perceber que esta sociedade nunca trará sossego para as maiorias.
Penso que o capitalismo deve ser substituído por uma sociedade na qual esteja assegurado um máximo de tempo livre e uma jornada mínima de trabalho. Nestas condições, comer o que se planta, morar na casa que se construiu, pendurar na parede um quadro que se pintou, podem ser opções perfeitamente plausíveis como escolhas de pessoas que gostem de plantar, colher, construir ou pintar. Ou seja: o artesanato terá o seu lugar no futuro como forma opcional de preenchimento de tempos livres das pessoas. Não como necessidade para se comer, morar, ou ter prazer artístico. Levar uma vida mais urbanizada ou mais ruralizada deve ser escolha, e não falta de escolha.
E podemos atuar no sentido de conservar o que a cada dia menos se conserva ou gastar nossas poucas energias naquilo que será predominante: no caso do campo, podemos priorizar a luta por terra para quem não a tem (democratizar a propriedade privada) ou por melhores condições de vida para os assalariados rurais. É questão de estratégia de transformação social.
Te digo Mix, levo uma vida urbana mas venho de um meio rural (minha primeira mulher disse certa vez, corretamente, que minha essência é caipira, risos), e a vida que vi no campo não a desejo para ninguém, mas admito que alguém queira levá-la desde que não seja obrigado a tal.
No terreno das opções tudo é permitido, mas é preciso que existam condições para se optar em igualdade.
Zeca,
Não entendi o conteúdo de sua crítica de verdade!
Se você perceber, no texto uso pouco o termo natureza, justamente questiono o uso deste termo. Por isso usei muitas vezes o termo meio natural.
Enfim,
Seguimos o debate!
Salud!
Mix
Zé,
Estamos de acordo em vários pontos!
“Estou convencido que uma subjetividade que luta contra os efeitos do capitalismo, não necessariamente luta contra o capitalismo.”
Claro está para mim isto que disse. Mas é aí que se dá a construção das pessoas politicamente. E isso depende de nosso envolvimento.
Eu vivo na cidade, mas critico o modo de cidade que se constitui, porque vejo a possibilidade de existir um outro tipo de cidade. Em todos os sentidos, meio natural, a própria gestão da cidade mesmo.
Infelizmente acho que a grande maioria dos que vieram para a cidade, não tiveram escolha. E alguns outros escolheram, porque nestas cidades, nas grandes, é onde se acaba centralizando as decisões econômicas e políticas, a questão das artes, musica etc.
Se trata de questionar justamente a vida urbanizada, tal qual está constituída, mas também de pensarmos juntos possiveis respostas e práticas para construir efetivamente uma sociedade igualitária e com liberdade.
Daí não acredito que deva priorizar uma ou outra luta. Mas integrar, se conversar. Os problemas são tantos, que as pessoas passam a militar em seus locais de trabalho, no bairro, ou onde tem mais afinidade ou onde as condições práticas os levam!!!!
Salud!
que bom que voltamos para o debate do texto…
Saudações a todos. Este é meu primeiro comentário no passapalavra, muito embora já tenha acompanhado algumas intervenções e principalmente textos do João Bernardo, sou mais conhecido por publicar e postar no Indymedia – CMI Brasil.
Com relação ao texto, tanto quanto aos comentários que o seguiram, creio que é aquele tipo de polêmica em que todo mundo está certo e errado simultaneamente. Não sei se o objetivo do texto foi alcançado e se a crítica atinge o que realmente o João Bernardo quis dizer em algumas das suas análises. O que vale a pena é questionar este rótulo de “camponês”, como se fosse uma classe social extracapitalista, pré-capitalista ou anticapitalista. A própria existência dos camponeses enquanto tais é questionada do ponto de vista do capitalismo: há séculos que o assalariamento rural (em dinheiro, em espécie, ou com parte da produção) já é exercido em todo o planeta – inclusive no Brasil.
A figura do camponês pequeno proprietário, minifundiário ou que vive em uma espécie de subsistema sócio-econômico à parte é altamente questionável e também seria uma tentativa de aplicar mecanicamente um rótulo da transição do feudalismo ao capitalismo para o capitalismo atual.
Quanto aos quilombolas, ribeirinhos e caiçaras,trata-se de proletários, excluídos e periferizados, desprovidos de meios próprios de sobrevivência (daí a necessidade muitas vezes da venda nas cidades, o que já é uma sujeição à lei do valor). E isto tanto é mais real quanto cada vez mais são sitiados pelos grandes proprietários, empresas , grileiros e especuladores que querem submetê-los a formas mais sofisticadas e monetarizadas de exploração. A luta que empreenderam e empreendem contra o “progresso” capitalista é sem dúvida uma luta contra um avanço na exploração e como tal, deve ser defendida por todos os defensores da liberdade. Mas não deve ser interpretada como uma luta por formas retrógradas de capitalismo, aliadas a mecanismos tradicionais de exploração e opressão ou a uma miséria mais ou menos remediada e sujeita às variações do ambiente e do mercado que garantem uma escassez mais ou menos vampiresca que ataca as regiões onde sobrevivem.
A proletarização dos despossuídos é a marca registrada do capitalismo e como tal, nem teria como existir, sejam tais despossuídos empregados ou desempregados, do campo ou da cidade. Daí a necessidade de impor, ao máximo possível de pessoas que o capital e o Estado necessitam e ao máximo de tempo que ambos demandam o trabalho, em sua variante assalariada.
Portanto, são insustentáveis afirmações do tipo “o capitalismo deve ser substituído por uma sociedade na qual esteja assegurado um máximo de tempo livre e uma jornada mínima de trabalho”.O trabalho é e sempre foi a subordinação da vida a terceiros, a exploração teleguiada por quem paga e a perda da vida em troca da sobrevivência (a origem etimológica de “trabalho” na maioria dos idiomas é negativa…ex: no latim “tripalium” e “trabaculum” carregam significados de instrumento de tortura ou instrumento para prender animais). Uma sociedade verdadeiramente comunista significa a abolição do trabalho e de todas as falsas mediações da sociedade estatal, classista e burguesa (incluindo aí a escola, a família, a pátria, a cidade, a distinção campo-cidade, etc.). A atividade vital livre, coordenada, solidária e criadora pode e deve ser a única forma de vida em um mundo livre, onde o homem tenha realmente se reencontrado com a natureza e com os outros homens.
Concordo com a crítica de Mix a um movimento reacionário e oportunista como o M$T. O pior de tudo não é só seu aspecto hierárquico, mas seu sonho de criação de uma pequena burguesia rural, de uma reforma agrária pilotada pelo estado burguês ao invés de uma coletivização expropriadora promovida pelos protagonistas da transformação social,de ser como sempre foi um tentáculo rural do PT, o nacionalismo que o caracteriza, etc, etc…
Movimentos reformistas e até fascistas podem manobrar a questão de um campesinato original, tradicional, para implantar um autoritarismo mais aguerrido dentro do estado burguês ou para trocar de governo mantendo tudo como está. Mas isto pode ser feito com qualquer classe social ou com qualquer setor de classe. Isto porque a pregação da burguesia, suas táticas de infiltração e manobra política, ainda que privilegiem este ou aquele ator social (a pequena burguesia – vulgo “classe média”, os setores mais marginalizados do proletariado, chamados pejorativamente de “lúmpen”, etc…dependendo da circunstância) para um golpe de estado ou para uma vitória eleitoral, por exemplo, ambicionam o controle de TODA a sociedade. Logo, uma política para cada classe e para cada setor de classe é desenvolvida pelas facções do capital. Isto pode ser feito por facções reformistas, pelo estado jogando um setor contra o outro (o arrebanhamento, pelo governo mexicano, de batalhões operários, com a anuência de anarco-sindicalistas contra a revolução de 1910-1911- os “batallones rojos” ou “federales” que viraram bucha de canhão contra Zapata e Pancho Villa em troca de leis trabalhistas…as manobras de Mao e Fidel Castro sobre setores de trabalhadores rurais extremamente aguerridos e explorados, onde o reformismo agrário marxista-leninista – de armas na mão – se implantou com grande facilidade, levando à contra-revolução burguesa dita “comunista” em ambos os países).
O nazismo desenvolveu, sem dúvida, esta retórica de tradicionalismo rural, da “comunidade originária” “camponesa” e teutônica contra a revolução. Mas foi também o nazismo, mais do que ninguém quem teve toda uma preocupação trabalhista com o operariado urbano, quem transformou o 1º de maio em feriado e quem levou muito a sério as intervenções militantes entre operários urbanos (às vésperas do golpe de 1933, vários operários acusados de “esquerdismo” estavam sendo mortos por operários nazistas em fábricas e subúrbios alemães).
Tudo isto, entretanto, não desqualifica a luta dos trabalhadores do campo contra o capital e o Estado, muitas vezes mais aguerrida e mais feroz do que algumas “lutas urbanas”, como são chamadas. Agora, existe toda uma confusão de alhos com bugalhos em parte do texto e nos comentários.
Ex: dizer que a revolução no México em 1910, feita contra a propriedade, o Estado e a sociedade de classes tem alguma ligação com a ideologia conciliadora, reformista, nacionalista e ongueira da pseudo-guerrilha do comandante Marcos. Dizer que o papel do mir (já em extinção no final do século XIX) e dos soviets foi igual na revolução russa de 1917 (os soviets tiveram um peso muito maior) e ainda mais, dizer que a Rússia era “essencialmente” agrária (quando as concentrações industriais nos grandes centros urbanos em nada devia às da Alemanha ou da França). Outra confusão foi a de jogar todas as comunidades primitivas no rótulo de “nômades”.
“Não podemos pensar em qualquer transformação social se não levarmos em conta os outros muitos aspectos dos quais depende tal transformação. A mudança de relação entre as pessoas, entre nós e a terra, entre nós e os animais.”
Ainda bem que os escravos não seguiram a máxima da MIX e decidiram se revoltar contra a escravidão sem que tivesse mudado “a relação entre nós e a terra, entre nós e os animais”.
Galera, quase falei ´´amém´´ depois de alguns comentários, eu tinha um amigo troskista que falava exatamente como alguns por aí, isso é um elogio já que o troskismo tem umas coisas bem interessantes. Quase acredito na segurança que muitos querem passar. Proponho suicídio coletivo ou me avisem quando poderia me incorporar ao movimento que muitos devem ter. O texto da MIX não é dos melhores, pode ser criticado, mas o povo aproveita para se masturbar. Estou entendendo porque nunca conseguimos fazer nenhuma revolução no Brasil e estamos cada vez mais longe disso. Enquanto nós falamos de revoluções alheias, falar de revolução aqui é mais irreal que chegar a júpiter, encontrar um e.t. na esquina, exemplos existem milhões. Quando vamos parar de ter inveja histórica de outras países e pensar que a nossa trajetória é marcada pela negociação? Uma experiência anticapitalista por esses lados também está meio difícil. Mas continuem a catarsis coletiva aí que todos aqui temos suficiente tempo e interesse para ler.
Paulo,
deveria ser objeto de reflexão que este texto tenha suscitado uma resposta e centenas de outros não. Existe hoje, muito forte, uma disputa por pautas onde vários grupos e movimentos colocam claramente que o central não é a luta contra a exploração mas a luta pelos direitos dos animais, a luta pela afirmação feminina, a luta pela preservação da natureza. E a coisa vai a um ponto tal que assassinar um cachorro gera mais comoção social do que as chacinas cometidas pela ROTA, a derrubada de uma árvore toca mais do que a remoção de 1.600 famílias e um xingamento feito Rafinha Bastos dá mais revolta do que saber dos milhões de mulheres sem creche. O marxismo e anarquismo fazem parte do passado, as pessoas hoje estão engajadas na luta pela natureza, pelos animais, pelas mulheres (as eleitas, não as domésticas). Outros até falam da exploração mas vão criando um raciocínio em que a pauta vai se enchendo até que a questão da exploração fique em segundo plano e ocorra um roubo de pauta, vindo a preocupação com as baleias, com o jacarandá e com a fofoca do dia sobre qual ator maltratou quem (claro, as domésticas sempre esquecidas).
Isso é para mim fonte de reflexão e preocupação. Há realmente toda uma classe média e até membros da elite propondo que os trabalhadores esqueçam a luta contra a exploração e se engajem em bandeiras que são pró poder e afirmam a ascensão de novos grupos, ecocratas, especialistas em animais, enfim. As domésticas, por lei, continuam tendo menos direitos mas só se fala de mulheres da elite quando não é o caso de futilidades mesmo propagadas pela TV; trabalhadores nos morros e se fala é da vegetação, fala-se dos animais mas nada dos moradores de rua e, que tal, dos explorados nas grandes clínicas veterinárias, zoonoses, enfim…
Há uma disputa por pauta e setores pró poder querendo engajar o povão em bandeiras que servem, em última instância, para mantê-los a parte dos seus interesses. A ecologia, os direitos dos animais (animismo?), o feminismo são hoje grandes meios de se fazer com que os explorados se engajem em lutas para promover novos grupos ao poder ou, de todo modo, se esqueçam do que é mais urgente: igualdade jurídica para as domésticas, mesmo direitos para as domésticas, sentir como mais preocupante a retirada de famílias do que das árvores, mais doloroso o assassinato de crianças do que de animais…
Ana,
entendo as suas preocupações, apesar de voc colocar no mesmo ´´saco´´ lutas diferentes. O Franz Fanon gostava de pensar e eu também o que ´´poderia detonar´´ uma mudança social… o grande problema é que acho que deslegitimar algumas lutas não leva a nada. Tenho certeza que algo em comum você, os defensores da ecologia, eu, os defensores dos animais temos, as feministas mais progressistas…enfim, é um palpite, eu iria mais nessa linha em termos de ´´trabalhos políticos´´. Mas a coisa anda tão geopoliticamente boa para o capital, que não podemos nos dar o luxo de ficar cansados, apesar de que tudo cansa, eu sou um ser cansado me animando todo o tempo principalmente se saímos da nossa redoma de ´´militantes´´ e vemos que as pessoas querem consumir mais, querem trocar de celular todo ano e dependendo do estado em que morar a melhor discussão é que ´´o fhc foi tão bom que implantou o plano real´´ e o ´´povão´´ como falou não fará nada se tiver alguma coisa bem concreta que ganhar e perder. Perder tipo um ´´bolsa família´´ é uma coisa bem concreta, só um exemplo. E isso de ´´vamos fazer a revolução e depois fazemos o resto´´ já não dá mais. Enfim, acho sinceramente que o Brasil é um lugar pouco interessante para pensar essas coisas porque o ´´modelo brasileiro´´ tende a consolidar e eu, usando a linguagem de alguns marxistas, estou interessado em fazer mais ´´trabalho de base´´ justamente por isso. Estamos tanto numa redoma, que o mundo tá foddo aqui e lá fora e no Brasil quando se tenta falar de crise, dizem alguns, ´´ainda bem que isso não chegou aqui´´. Não sei se também é o seu caso, mas nem isso eu posso comentar com a minha família porque a classe ´´c´´ está louca para se tornar classe ´´a´´ que poderiam me colocar no hospício (literal). E com a classe ´´a´´ já não dá para falar mesmo, incluindo o que se chamou de ´´classe média´´, que agora é tão variada, enfim, sou o que antigamente se chamava ´´classe média baixa´´ (agora com internet). Enfim, estamos sós, cada vez mais sós e nós mesmos os mais interessados por uma mudança estamos sinceramente convencidos muitas vezes que já ganhamos muito -nisso o pt foi foda. Eu agora vou me recolher nas lutas que dá para fazer porque os tempos estão difíceis… para me animar penso no que o borges uma vez escreveu: quem não viveu em tempos difíceis? Mas enfim, me inclino ao pessimismo histórico apesar deu ter vontades muito otimistas. Se tiver algumas palavras sobre o que você acha que temos em comum, me interessaria muito, ando pensando nisso. Não é possível que não tenhamos nada em comum. Só das pessoas estarem organizadas em alguma coisa isso poderia ser algo em comum, por exemplo. Eu também te poderia falar o que não tenho em comum com um monte de gente da classe ´´c´´ também.
Caro Paulo,
poderia me alongar mas vou ser bem sintética. A luta da Luana Piovani com o Dado não é minha luta, a minha é a das domésticas, das presas, das mulheres na fila do SUS, das atendentes de telemarketing. Então não se trata de deixar coisas para depois mas saber que o meu corte é o popular e não interessa o feminismo do poder nem as futilidades de TV que o feminismo de holofotes divulga. Você olha hoje os principais blogs e elas viraram ombudsman de TV: o tema é o BBB, o CQC, enfim, tudo que possa bombar o blog, mídia. A vida real das mulheres trabalhadoras fica no limbo. Da mesmo forma, não estou aqui para lutar por outra relação com a terra e\ou com os animais, isso é bandeira de patricinha que não pega o trem para trabalhar às 5 da matina, que não passa o dia todo em um ônibus rodando feito louca e cobrando passagens. A minha luta é a luta da sobrevivência, do povo, da periferia. E se essas patricinhas conseguem enganar alguns escondendo o cinismo com os pobres ao declarar amor ao jacarandá e às tartarugas não é a mim que irão enganar e sinto muito, muito mesmo, quando alguns pobres caem nesse estelionato ideológico: colocar pautas de classe média no centro ostentando um sofrimento que não possuem para, por fim, tentar engajar uns pobres em lutas que não são as suas. Não caio em papo de gente que desaloja pessoas pra salvar árvores nem de feministas que promovem juízas e professoras universitárias em detrimento das domésticas que, aliás, limpam a casa delas enquanto elas teorizam. Beijo
Quer dizer que alguns camponeses até têm acesso a leite e queijo? Que maravilha! É o espetáculo do socialismo agroecológico!
Ana, acho que entendi o seu ponto de vista: você é das feministas resgatáveis. Mas, sinceramente que ´´uns pobres´´ consegue encajar o feminismo liberal? Deve ser ´´umas pobres´´ porque apesar de ter uma bandeira muito legítima, o feminismo ´´pegou pouco´´ nos movimentos sociais. Acho que a sua crítica é ´´interna´´, se entendi bem. Mas pensando no que comentou, então você estaria muito próxima -pelo aspecto popular- da luta do movimento de mulheres camponesas (deve conhecer) e a luta de mulheres dentro do mst, imagino pelo seu comentário que é do contexto urbano, mas… e a luta das camponesas, por ser popular, também me aproxima porque a minha luta é também popular (não gosto muito da expressão de ´´os pobres´´ porque dependendo como é usado é super clasista, é povo da classe média sem ser pobre falando de pobre). Mas enfim, chegamos você, a camponesa e eu em algum ponto em comum – o fato de termos lutas populares. Tem os dois elementos, de muitos que podemos pensar: 1) estamos organizados, 2) nossa luta é popular… (se alguém pensar em mais por favor avise!)
Quero comentar que falar no MST aqui parece que virou polêmico. Apesar de concordar em todos os pontos da ´´carta dos 51´´ e com certeza temos mais pontos, a minha grande crítica a carta é que esse povo super resgatável saiu do MST, putz apesar de entender totalmente me deu vontade de chorar. Enfim alguns deles e um monte de gente que continua no MST fazendo ´´trabalho de base´´, nós, eu- imagino que você também- nos aproximaríamos desses. E também nos aproximaria dos ecologistas- se tivessem alguns elementos mínimos de aproximação. Até, digamos dos ´´defensores das baleias´´ da ásia, digamos um caso-extremo. Tudo isso para comentar que, apesar também de uma lista de críticas ao texto da Mix, o que parece super resgatável é essa tentativa de não fazer hierarquia das lutas, acho que deslegitimar algumas lutas não leva a nada justamente porque esse texto me ajudou a pensar o que a gente poderia ter em comum. Por isso, quis acompanhar o debate. Entendi isso como: ´´seres progressitas não-liberais do mundo pensemos juntos´´ (se não for assim, Mix- me corrija), ou seja, ficar marginando outras lutas que também tem potencial popular não leva a nada para mim porque na verdade temos coisas em comum que valem mais a pena serem discutidas -na verdade, as patricinhas e as academicas que você citou pouco interessam aqui (ufa, ainda bem). Ficar brigando é perder tempo enquanto o capital está se reproduzindo com suas todas as suas contradições. Mas enfim, talvez seja eu me masturbando com essas ideias. Mas sinceramente prefiro ´´perder meu tempo´´ conversando sobre esses temas, mas dizem que é mais difícil se entender entre os mais próximos porque os futuros senhores que desejam ser eike batista estão se fodendo para nós … quando não querem nos matar (literal).
Azul,
Este também é o primeiro texto do PP que eu me dedico a debater, porque eu já esperava que o texto do João Bernardo
fosse receber este tipo de refutação que a Mix lhe dirigiu, e também porque estou farto de ver o MST ser enaltecido como movimento contra o capitalismo.
Estamos do mesmo lado quando você demonstra o caráter pueril do texto da Mix, a impostura do zapatismo, e o caráter reacionário do MST. Mas não posso concordar contigo quando afirma que “O trabalho é e sempre foi a subordinação da vida a terceiros, a exploração teleguiada por quem paga e a perda da vida em troca da sobrevivência”. Aqui você toma a forma histórica do trabalho no capitalismo (Trabalho ASSALARIADO)como o conceito de trabalho EM GERAL (relação do ser humano com o meio, produzindo e reproduzindo as suas próprias condições de existência). É perfeitamente plausível imaginar a abolição de qualquer forma histórica que o trabalho assumiu (assalariado, escravo, feudal, etc.), imaginar que o trabalho perderá a centralidade, que não tem caráter ontológico, até aí tudo bem. Agora, imaginar que uma sociedade “verdadeiramente comunista” será uma sociedade sem trabalho, e que uma “atividade vital livre, coordenada, solidária e criadora” dispensa 100% o trabalho é fazer um jogo de palavras pois a própria coordenação dessa atividade vital já implica em limitações à liberdade. Além do mais, se essa atividade vital não é relação do ser humano com o meio para assegurar a materialidade da vida (do estômago à fantasia), como chagaremos a este estágio? eu adoraria abolir o trabalho EM GERAL, mas infelizmente nós humanos podemos apenas abolir as suas formas históricas concretas. E podemos dispor de 90% de nosso tempo (ou mais até, desde que menos de 100) para utlizarmos da forma como melhor nos aprouver.
Por fim, queria dizer que estas discussões tem para mim um caráter prático, como é a proposta do PP. Por isso tento ser muito conciso em meus comentários, seja em quantidade e em qualidade. Desculpe se me alonguei.
O que a luta ambiental tem de oposição à luta de classes? Porque uma coisa obrigatoriamente exclui a outra? Isolar as lutas dentro de filões militantes como se fossem causas separadas e opostas não seria um problema?
O que determina a aproximação do combate é o eixo de classe: quando mais se luta contra a discriminação, contra o desemprego, contra a poluição, contra o especismo, contra os despejos, contra o terrorismo policial (que no litoral de Sp está na ordem do dia)…mais encontramos os mesmos inimigos por detrás de tudo isto.Por que será?
Ana, o nome não é “animismo” é “animalismo”.
E que negócio é este de “exemplo brasileiro” (como se aqui não existisse luta de classes, e nas formas que o capital impõe ao mundo inteiro)? E mais ainda de que a trajetória das lutas de classes no Brasil é “marcada pela negociação”? Onde? Em Canudos? No Quilombo de Palmares? Na onda grevista de 1917-19? Nas insurreições indíenas do século XVI? Na Cabanagem (talvez a maior guerra de guerrilhas da história brasileira)?
Essas “negociações” são feitas por vanguardas autoproclamadas de rabo preso com os dominadores (partidos, sindicatos, ongs, “movimentos” do tipo M$T ou MPL, etc.), que dizem falar em nome dos dominados para fazer acordos nas costas dos que lutam e depois dizer que foi uma decisão de “todo mundo”. A coisa repete o exemplo de outros lugares na ordem capitalista: eliminar os revolucionários (que sempre são os “loucos”, os “briguentos”, os “extremistas”), manipular o restante com eleições, assembleias e outras maracutaias de tipo populista e por fim cooptar algumas figuras de holofote (talvez pré-cooptadas) para que tudo continue como era antes. Aí sim, quando toda a indignação foi neutralizada, as assembleias foram esvaziadas ou robotizadas, é que se “negocia”. Estas “negociações” não são tão “fáceis” assim…
Concordo integralmente com a afirmação do Paulo “deslegitimar algumas lutas não leva a nada justamente porque esse texto me ajudou a pensar o que a gente poderia ter em comum. Por isso, quis acompanhar o debate”. O diabo é saber como fazer estas lutas chegarem a um denominador comum…
Também concordo com a Ana com fato de que muito despejo é feito em nome do “meio ambiente” (mas não é por amor aos animais e sim para que empresas e empreendimentos graúdos tomem as regiões cobiçadas – só tem “poluição” nestes locais quando tem trabalhador morando). E também concordo com sua crítica a um tão exaltado “feminismo” que nada mais faz que promover as vedetes da ordem capitalista, partindo para uma falsa igualdade através do trabalho: as mulheres hoje podem dirigir trator, vender drogas ou serem seguranças de supermercado. A imprensa podre vende tudo isto como uma “grande vitória” do “gênero” feminino (categoria artificial que sequestra a classe social do contexto em questão) e todos batem palmas, como se o dia-a-dia de uma Marilena Chauí, fosse por exemplo o dia-a-dia de uma cortadora de cana.
Gostaria de salientar, que em nenhum momento coloquei o MST como movimento reacionário, mas sim que o campesinato não é o MST, e nem que MST é sua direção. Nos assentamentos existem muitos e muitas que respeito muito!
Cara Ana,
A ideia deste texto não é fazer acusações pessoais, muito menos fazê-los contra João Bernardo. Porém tenho uma visão diferente dos apontamentos dele. Da mesma forma em que me posicionei que o debate ecológico, ou qualquer que seja a reivindicação, seja feminista, sindical, etc, deve ter política (no sentido de classes sociais mesmo) e que também não deve ficar restrito a reivindicações momentâneas, mas para a construção de uma sociedade efetivamente diferente, como apontei antes. Enfim….. é o debate. Seguimos!
Gente, o que é esse título ´´É preciso que certa extrema-esquerda tenha caído muito baixo para apresentar um programa como o que Mix propõe´´. Que resposta é essa? Já parei de ler o texto aí só pela frase. O cara é tao sectário que se o texto da Mix for de extrema esquerda ele conseguiu ser de ´´extremíssima esquerda´´. Enquanto o Paulo e o Azul ficam aqui pensando nos interessantes e necessários ´´denominadores comuns´´, tem gente tao preocupada em ser ´´mais revolucionaria´´ que todas as demais, em sempre ter razao. Pessoas que escrevem textos desse jeito nao tao nem um pouco interessadas em ´´denominador comum´´, pois todos que pensam diferente ou sao ´´conservadores neoliberais´´ou ´´extrema-esquerda´´. ´´Ë preciso ser muito ególatra para responder assim”. Foda. Mas enfim, ainda bem que tem gente interessada em realmente trocar ideias aqui e ainda bem que seus outros seguidores sectarios sao bem pouquinhos….
Outro denominador comum: 3) NAO somos de partidos políticos, talvez até muito de nós tenham essa formação, mas agora ninguém aqui imagino seja ´´filiado´´. Até esse momento: nossa luta é popular, estamos organizados, não pertencemos a partidos políticos… Galera, vamos que vamos…. estamos fazendo um debate PRÁTICO como comentou o Zé. O que mais poderíamos pensar? Quero ler vocês, por favor continuemos nessa linha de não fazermos ataques pessoais. Valeu.
Caro Leonardo,
Faça assim, leia o texto, depois venha para a discussão, ué!
Caro Carlos,
só existe ACUSACAO no outro texto. DISCUSSAO é aqui com os nossos comentários. Coloquei as palavras acima para discutir AQUI com as pessoas que estao discutindo AQUI. Nao sou PLATEIA de ninguém!
Caro Intolerante,
Quem diz: “Quer dizer que alguns camponeses até têm acesso a leite e queijo? Que maravilha! É o espetáculo do socialismo agroecológico!” É você! Se voltar ao texto, pode ver que o que estou dizendo é que muitos além dos vegetais, frutas, etc, também produzem queijo, leite, etc, para o autoconsumo ou troca, de forma relativa, fora do mercado. Saudações!
Que bom! Para troca fora do mercado! E em termos de conhecimento também temos que regredir ao nível camponês? Pensamento mágico ou talvez alcançar as vertigens do arrazoar por analogia renascentista! Por falar em eurocentrismo, os camaradas iranianos andam a ser enforcados por autoridades “tradicionais” e chegam ao ponto de promover materialistas burgueses como o Dawkins como armas de arremesso. Ser comunista no Irão é f,,,!
http://freethoughtblogs.com/maryamnamazie
No Iraque o proletariado morde da mesma maneira que em Paris:
http://libcom.org/library/ten-days-shook-iraq-uprising-1990-1991-wildcat
Só queria comentar que para um texto ter 43 comentários, no mínimo, ele é interessante, para gerar tanta discussão. Galera, está mais que claro que se discutirmos ´´detalhes´´ não vamos chegar a nada. Aqueles que estão atacando aqui realmente querem só atacar, ou é inconsciente, ou na verdade só podem construir conhecimento-prático dessa maneira? Um espaço como esse merece que a gente mantenha e aceite algumas diferenças de opinião, mas com ´´bases mínimas´´ talvez possamos discutir, o que temos feito, de um modo precário, mas temos feito até agora.
Outro fator em comum: 4) SOMOS ANTICAPITALISTAS (agora isso significa um monte de coisas, somos socialistas, somos anarquistas, somos comunistas, somos libertários, etc)… todos sabemos a diferença de um ´´comunista´´ para um ´´anarquista´´ … enfim galera se a gente ficar discutindo diferenças, na verdade, melhor ficarmos ´´seguros´´ nos nossos espaços de militancia, o que acham?
ps: a palavra ´´anticapitalista´´ eu gosto porque isso pode abre a gente poder pensar a relação com o ´´ESTADO´´ de maneira diferente porque se formos discutir isso aqui com certeza não vamos chegar a nada, não é?. Até mais.
Sou filho de carvoeiro e agricultor e de carvoeira e agricultora, hoje doméstica, do norte de Minas, terra cruzada pelo Jequitinhonha. A primeira vez que minha mãe viu um vaso sanitário ela tinha já tantos anos e quando veio para a cidade ficava tão deslumbrada que colecionava as caixinhas de remédio – coloridas, bonitinhas, ao invés de as jogar no lixo. Minha vó me falava de mulas sem cabeça e de rapazes que viravam bicho porque tinham batido nos pais, dizia que crianças pegavam quebranto e que olho gordo era uma coisa mortal. Narrava histórias de servidão cruel, de homens assassinados por senhores de poder, fazendeiros ou capatazes de maior proeminência. Já na cidade, o peso da formação rural se fazia sentir. Quando criança, tínhamos galos e galinhas, plantávamos andu, batata, couve e outras coisas embora já tivesse iniciado a proletarização. Dor de cabeça se tratava colocando galhos de arruda na orelha e o maledeto chá de boldo servia para tudo. Minha mãe lavava roupa no rio e a gente tirava água do poço, muitas vezes ia eu com meu irmão carregar latas de água de uma bica distante. Me lembro da luz de velas e de como tínhamos medo de cobras e de chuvas fortes…
Ler o texto da MIX me fez recordar esses anos da infância e de como nós, os filhos, a primeira geração totalmente formada na cidade e totalmente proletarizada lutamos com todas as garras e forças para fugir da possibilidade de talvez ter algum leite e queijo ou acabar na clientela de algum dono de terra. Me fez lembrar dos milhões de migrantes, não só de Minas, que para a cidade vieram ocupar aquele espaço – meio campo, meio cidade- que são as periferias, os subúrbios. O mundo por ela descrito com certa nostalgia e profundo romantismo é o mundo do qual fugimos. Certamente, daria uma boa conversa um encontro entre e MIX e minha mãe. Uma falando das qualidades de um mundo arcaico e outra narrando os horrores do mesmo mundo e de como foi árdua a fuga.
Engraçado. Esse papo todo de camponês me lembrou da história de minha família paterna.
Meu pai, já falecido, mostrava certo orgulho nos olhos quando me dizia pela enésima vez como havia fugido de Castro Alves (BA) ainda bem novo, enfiado num caixote de cebolas dentro de um trem, para começar a vida na Salvador da década de 1950. Fugia de uma família de treze irmãos (outros três haviam morrido ainda jovens) filhos de um pai e de uma mãe analfabetos que tiveram a boa ideia de colocar os filhos para estudar pelo menos para escrever o próprio nome e saber a tabuada. Tomava surra toda vez que reclamava da falta de comida.
Ao chegar aqui, continuava meu pai, foi pro Exército, depois foi cobrador de ônibus, engraxate, feirante, radialista, policial, de tudo um pouco, até que terminou os estudos num supletivo, passou num concurso para perito de acidentes de veículos, estabilizou-se, cursou Filosofia e Direito, tornou-se advogado e professor universitário e assim viveu até morrer.
Foi o único da família a escapar da terra sem sair da Bahia. Seis outros tios e tias foram para São Paulo ainda na década de 1970 trabalhar na construção civil, e só agora seus filhos e filhas, meus primos e primas, conseguem ser outra coisa além de manicures e atendentes de telemarketing. Todos os demais irmãos e irmãs de meu pai, meus tios e tias, que ficaram em Sapeaçu (BA) viveram isolados numa terra de fundo, longe vários quilômetros da estrada. Só vieram a conhecer luz elétrica em casa há cerca de seis anos, e ainda bebem água de poço. Nas vacas magras e quando a safra não dava, viviam da ajuda que seus parentes na cidade mandavam.
Por que ele me contava a história da vida dele? Havia uma coisa em que ele insistia, que ele reforçava quase às lágrimas: “nunca queira viver o que eu vivi. Faça tudo o possível para não passar o que eu passei. Eu já estou te dando um começo de vida, não me invente de querer jogar tudo isso fora, trabalhe pra melhorar, e não para passar pelo que eu passei. A vida é dura, meu filho”. Além de reforçar a ideologia do esforço individual e do trabalho — ele nunca levou em conta que passou num concurso exatamente porque a máquina burocrática dos militares estava em pleno processo de expansão por força das necessidades do desenvolvimento econômico do “milagre” da década de 1970 — outra mensagem era clara: vida de camponês é um inferno.
Não acho que Mix saiba disso. E nem todos quantos idealizam a vida no campo. Falta pegar mais no cabo da enxada dezesseis horas por dia e depois ver a safra destruída por uma praga qualquer. Falta viver botando os meninos para agachar em cima de uma bacia com leite quente para ver se as lombrigas saem. Falta andar doze quilômetros descalço e de bainhas arregaçadas nas calças até a cidade, porque todo o caminho é de lama e não se pode estragar a roupa de festa. Falta depender da prefeitura local para movimentar a economia, pois do contrário as pessoas não têm dinheiro para comprar o que se produz e é-se obrigado a vender na feira por muito menos que o necessário para pagar o transporte. Entre outras coisas do modo de vida camponês de que Mix não trata.
Vejo que a discussão gerou muitos debates. Parabéns pelo debate aqui exposto.
Ao mesmo tempo que não podemos colocar no saco toda e qualquer tecnologia e mitificar o modo de vida das sociedades arcaicas não podemos por outro lado aceitar este modelo de desenvolvimento como o trânsito inevitável da “marcha das forças produtivas”, que me parece tão metafísico quanto a mitifação multiculturalista.
Uma se apóia num passado perfeito, edênico, outra se apóia numa marcha hegeliana do tempo, do encadeamento da razão…
Ainda estou lendo os textos e digerindo-os…
A publicação deste texto aqui mostra que o Coletivo têm uma política de abertura ao diálogo e à divergência.
Já que falamos de um ponto de vista revolucionário, a primeira coisa a observar é o equívoco teórico de tomar um fenômeno de um contexto histórico-geográficos muito específicos, no caso o nazifascismo europeu, e daí generalizar, quase que apenas xingando todos os movimentos camponeses de “fascistas”, o que é uma bela banalização da palavra. Ora, o fascismo europeu não era um movimento camponês. Sua base social de militância era a classe média conservadora e decadente, organizada em partido financiado por oligopólios industriais e financeiros. A idealização do camponês não foi inventada por eles, vêm do romantismo. Mesmo antes disso, é possível observar essa idealização na poesia de um Tomás de Antônio Gonzaga, poeta ligado ao Iluminismo e ao Arcadismo.
O que um movimento camponês autônomo teria a ver com tudo isso? Também me pergunto. Faria tanto sentido relacioná-los (aos MSTs, zapatistas e cocaleiros, sem esquecer os camponeses russos, chineses, mexicanos, cubanos, nicaraguenses, vietnamitas, etc.) ao nazifascismo quanto relacioná-los à poesia bucólica, ou mesmo aos versos de Horácio sobre a vida pastoril. O mistério é só entender com qual intenção a pessoa escolheria um, e não o outro. Deixo isso em aberto.
A impressão que eu tenho é que, apesar de todo o seu radicalismo, o João Bernardo está preso a ilusões do consenso liberal-conservador hegemônico na nossa época. Esse discurso anticamponês pode facilmente ser visto nos artigos dele ou nas páginas da The Economist, Veja, Financial Times, etc. Comparar movimentos revolucionários com os partidos fascistas também é um conhecido clichê liberal-conservador. A associação da agricultura familiar e ecológica atraso já foi refutada por pesquisas empíricas que demonstram a produtividade superior da agricultura familiar no aproveitamento do solo, quando comparada ao agronegócio. Sobre a ecologia, nem me dou ao trabalho. Acusar de “fascistas” quem se preocupa com o alerta da comunidade científica sobre os efeitos da poluição sobre o clima, a água, os ares, etc. e tenta pensar um desenvolvimento sustentável chega a soar como uma piada de mau gosto.
O que as acusações de “mito do bom selvagem”, entre outros bonecos de palha, encobrem é a realidade do latifúndio monocultor e exportador, agora transfigurado no agronegócio resultante da modernização conservadora do campo. Encobre também a realidade da luta, por vezes heroica, do camponês contra o monopólio da terra por uma pequena elite ruralista associada aos oligopólios transnacionais e pelo direito à terra e ao trabalho.
Bem, as reflexões acerca do texto prosseguem e realmente é interessante observar alguns comentários, principalmente o do Manolo, que mostra como a desposessão de meios de subsistência agrava a vida dos trabalhadores rurais em aspectos mais sofridos que muitos trabalhadores urbanos. O custo social da reprodução da força de trabalho é menor para os burgueses rurais (fazendeiros)e portanto, maior para os trabalhadores rurais que têm uma dependência muito maior de certos recursos intrínsecos á reprodução da própria condição de explorado. Também é mostrada a monetarização da vida dos proletários rurais, indicando uma despossessão muito maior e uma ofensiva do mercado, cujo ponto máximo é a sofrível venda do excedente ou a dependência do estado burguês para a integração local no subsistema urbano do capitalismo (o que só ocorre quando é do interesse do capital, em termos de produtividade e especulação alimentar e fundiária…).É aí que ocorrem as “modernizações” do campo, com sua leva de migrantes, e redução exponencial do contingente de trabalhadores que permanece nas regiões rurais.Sempre com o mínimo necessário em termos de infraestrutura, o que faz de um proletário rural assentado alguém com azar não inferior ao de um morador de periferia. Embora o estado sempre faça campanhas publicitárias e fogueteiras do tipo: “estamos levando luz elétrica ao campo!”, etc.
Replicando a Mix, afirmo que Mix fez uma crítica (incompleta) ao M$T, que sem dúvida é reacionário e oportunista, a despeito de Mix não chegar a esta conclusão.Pessoas respeitáveis existem em quaisquer facções, o que não é excusa para levar os revolucionários a apoiar ou ficar de rabo preso com organizações do capital, por mais pintadas que estejam de vermelho (ou de preto). A ilusão com os “militantes de base”, considerados “inocentes” e “puros” comandados por direções malvadas (conforme a teoria trotskista dos sindicatos, infelizmente comprada por muitos “anarquistas” hoje), leva setores inteiros da militância revolucionária a não romper com tais organizações, esquecendo-se que por trás das ilusões basistas e assembleístas, esses militantes “puros” são justamente a infantaria do oportunismo, cujo estado-maior são as próprias organizações e chapas que as comandam. É uma necessidade ganhar camaradas equivocados, mas assinar embaixo de tudo o que as organizações onde estão fazem com a desculpa de tê-los na luta seria suicídio. As organizações do capital sempre usaram estes militantes de base, principalmente os que aparentam ser “radicais”, como forma de se promoverem e dizerem que não são tão reacionárias assim. E muitas vezes conseguem travar as lutas, graças a este tipo de militância que não avança nem deixa ninguém avançar (cf.assembleias, frentes populares e políticas de compromisso onde os mais combativos sempre acabam imobilizados).
De fato, muitas das afirmações do Paulo procedem e assino embaixo, todavia o rótulo de “Anticapitalista” é demasiadamente elástico e inclusive propõe o abandono das experiências e lutas históricas dos trabalhadores contra o capital, o estado e a exploração. Qualquer grupo ou organização reformista hoje se intitula “anticapitalista”, rótulo que até setores neonazis e tradicionalistas católicos reivindicam. A pretensa “diferença” entre comunismo, socialismo e anarquismo, inventada pela contra-revolução, oculta o principal: eliminação revolucionária da sociedade estatal, dividida em classes, exploradora, alienante, autoritária, etc… Longe de ser uma “discussão de detalhes” é uma forma de mostrar como as facções do capital jogam com esses “detalhes” contra a revolução – daí a necessidade dos “espaços de militância”, igualmente alienados, igualmente imobilistas.
Por fim, falta observar a manobra conceitual do Zé – herdada do esquerdismo tradicional e da sociologia – em defesa do trabalho. É necessário responder a essa afirmação porque a defesa do trabalho, que sempre foi uma ideologia da sociedade de classes (no ocidente, reforçada pelo cristianismo), é mais ainda um mito do capitalismo com fortes consequências sociais.
Quase todos os acadêmicos e tradicionalistas sustentam que o trabalho seria uma espécie de “segunda natureza”, de tarefa fundamental do homem, de relação humana com a natureza (ou sua “humanização” para falarmos em termos metafísicos e especistas), de ação sem a qual o homem não seria homem. Essa identificação antropológica com o trabalho neglicencia que: 1) O trabalho não existiu em toda a história, e tampouco em todas as sociedades; 2) O trabalho aparece quando existe a possibilidade de apropriação privada da produção material coletiva, o que pressupõe relações de poder/dependência entre proprietários e despossuídos deserdados de tudo e logo, a existência de classes sociais; 3) O trabalho é definido pela parte possuidora de meios de subsistência – ou por quem paga – e em conformidade com seus interesses, a parte que se submete a trabalhar vai guiada pela premente necessidade de sobreviver (logo, o trabalho é um fator de coerção); 4)O trabalho é indissociável da alienação: seus fins não são definidos por quem o executa (por “melhor” que se sinta ao fazê-lo), o que implica um desligamento da vida ou uma vida desligada…as pessoas vivem para “ganhar a vida”; 5) Não é uma atividade que tenha por fim ela mesma (é para ganhar um prato de comida, uma parte da colheita do feudo, ou um salário);6) Não é uma atividade onde haja apropriação direta e coletivizada dos resultados pelos seus executores: a estes cabe uma apropriação fracionada, mediada por formas arbitrárias de medida (tempo de trabalho, peças produzidas, terra arada, parcela do produzido, etc.), estipuladas pela parte proprietária, que açambarca a maior parte, enquanto a parte trabalhadora multiplica riqueza e reproduz sua miséria – no capitalismo isto é agravado com a mercantilização de tudo e com a produção de riqueza que vai gerar mais trabalho e explorar mais trabalhadores (sem contar a concorrência entre eles); 7) O parasitismo do trabalho na vida social gera um “tempo morto” que é garantia da sua extensão/reprodução/permanência : é a miséria existencial que hoje chamamos de lazer, “vida privada”, “entretempo”, “descanso”. No capitalismo, esta mutilação da vida além de ser complemento e extensão do trabalho, torna-se seu reforço, não só em termos físicos, mas em termos ideológicos (basta pensar na dieta televisiva ou nas peregrinações aos shoppings e “baladas”, tão em moda hoje).E também atividades profissionais onde milhões de trabalhadores são explorados (indústria do lazer, do entretenimento, etc.).
O trabalhador se desgasta para poder gastar…e a coisa prossegue.
Isto é radicalmente diferente de sociedades onde ocorre o inverso do que foi exposto: além da identificação entre a ação e sua finalidade, entre produção e apropriação, entre necessidades e os meios de atendê-las, a liberdade é condição para tal existir. Diversos antropólogos, com seus horizontes limitados de ideólogos burgueses tentaram “provar” que em algumas comunidades nativas seus integrantes “trabalhavam”. A tentativa fracassou porque tendo a natureza à sua disposição, não era necessário destruir hectares de florestas ou induzir o aumento de algumas espécies em detrimento de outras, de uma forma predatista ou latifundiário-industrial. Quando o nativo tinha fome, por exemplo, lá ia ele e pegava um fruto da árvore, sabendo que a árvore dali não sairia, que a terra era de todos e os frutos também. Não eram necessárias plantações transgênicas, pesticidas ou grandes monoculturas. Isto não é trabalho, é uma atividade vital livre e isenta de relações de classe ou impostas por exploradores.
Quem é o jogador das palavras, Zé? Desde quando a cooperação é falta de liberdade? A não ser que para você “liberdade” só possa existir no individualismo totalitário, a ditadura do eu contra os outros eus (dogma da ideologia burguesa desde o renascimento), a liberdade só pode ser exercida na ação comum, na solidariedade. O fato de se atender necessidades e esforços serem necessários para tanto não faz desta atividade um “trabalho”, tanto quanto a existência de comunas anárquicas não faz delas “estados”, por mais que tenham existido diversas formas de estado (o estado burguês atual é uma delas, o que nunca isenta tal instituição de ser um órgão de dominação de classes e reforço da exploração…ou você sonha com “estados operários”, como faz a tradição reformista?).
O maior problema também ligado à alienação promovida pelo trabalho e por 5 milênios de sociedade de classes é a reprogramação mental que a ideologia dominante faz através de violência simbólica. De tanto martelarem em nossas cabeças que agir, fazer e trabalhar são a mesma coisa e de tanto o capitalismo reduzir a vida coletiva ao trabalho e à mercantilização, a maioria pensa: é impossivel viver de outra forma. Como a linguagem é cheinha de estruturas discursivas, com influências ideológicas, a classe dominante quase sempre aproveita para passar os significados que ela quiser, modelando o imaginário social e a “produção de verdades” em seu benefício. O resultado é cair em armadilhas como pensar dentro dos modelos e padrões teóricos burgueses sem sair deles, ainda que aparente ser de oposição. É o que se pode concluir inclusive de algumas passagens dos textos de João Bernardo onde: há uma defesa do “progresso” e do tecnicismo capitalista, separando-o do seu conteúdo social e da imposição que lhe é inseparável (principalmente em termos de custos sociais e ambientais em grande parte irreversíveis dentro da lógica onde se formaram, o que é comprar o mito da civilização, sem o qual a sociedade não chegou onde chegou); há um rechaço da proposta coletivizadora e da própria luta de classes, uma vez que propostas “comunitárias” são invenções do romantismo alemão e do fascismo (o que além de a-histórico destroi o próprio método usado por João Bernardo em termos de sociologia descritiva: é como a cobra em movimento circular que devora a si própria).
Daí a necessidade da desmistificação ideológica e a observação dos significados como campo onde ocorre a luta de classes.
O folclore esquerdista (da esquerda do capital) quase sempre opõe capital a trabalho, pregando que o segundo tem que ser “libertado” do primeiro. Acontece que trabalho e capital se pressupõem: ambos são vetores da ditadura da lei do valor. O trabalho valoriza, multiplica e atualiza o capital, na medida em que o último nada produz sozinho e é o trabalhador quem remunera o capital toda vez que produz lucro. O capital sequestra a vida do trabalhador através do trabalho: transformado em mercadoria que produz outras mercadorias, ele nunca consegue pagar o resgate por tamanho sequestro. A necessidade, a dependência, a coerção fazem do sacrifício diário um poço sem fundo, onde não só o que o trabalhador faz é um meio para o seu patrão lucrar e ele seguir respirando. O trabalhador é um meio para o capital e o trabalho é o que subordina o meio ao fim.
É por estas e outras que o capital é uma relação social que consolida a violência da exploração e se alicerça na desigualdade, progredindo para a sofisticação e acirramento de ambas. A sofisticação e o acirramento estão na ditadura do valor e no princípio da lucratividade. Sem o dínamo do trabalho, ambos estariam desligados. Sendo fator de socialização e condição de existência do trabalhador e de toda a sociedade, o trabalho é o capital fazendo-se vivo na vida de todos, quando o viver passou a ter valor somente em sua utilidade lucrativa. Sem meios de subsistência e com uma vida a perder, o trabalhador “vive” através dos recursos e do poder que o alugam, por não poder subsistir sem a perda de si no crescimento da riqueza e do poder que não tem.
Logo, capital e trabalho são bicondicionais e mutuamente inerentes. A classe trabalhadora só pode se libertar destruindo ambos.
Obs: nada do que foi afirmado tem qualquer coisa a ver com teorias modernosas que falam do “fim do trabalho”, “economia do ócio” ou “aumento do tempo livre”. As três expressões são sem dúvida verídicas, sob o ponto de vista da escalada do desemprego.
Espero não ter sido excessivamente chato e prolixo.
“… tendo a natureza à sua disposição, não era necessário destruir hectares de florestas ou induzir o aumento de algumas espécies em detrimento de outras, de uma forma predatista ou latifundiário-industrial. Quando o nativo tinha fome, por exemplo, lá ia ele e pegava um fruto da árvore, sabendo que a árvore dali não sairia, que a terra era de todos e os frutos também.”
Vemos, através das palavras de azul, a descrição do Jardim do Éden. Mal-aventurados os homens que comeram do fruto proibido, pois lhes restou apenas o trabalho para satisfazer suas necessidades.
Claro, só numa cabeça cristã pode existir o jardim do éden. Embora os cristãos radicais de hoje (principalmente a “Cutting-Edge”), acreditem com os idólatras do progresso que a sociedade industrial é mais “paradisíaca” do que isto.
Em momento algum se pode negar que no comunismo primitivo uma existência à mercê das intempéries e de certos fenômenos naturais tinham um aspecto de catástrofe para muitas comunidades. Sem contar a prática de eugenia e exclusão dos idosos. Eu gostaria de imaginar que hoje o capitalismo nos libertou de tudo isso, não é verdade Jovair?
Hoje coisas como a poluição, tsunamis, degelo dos pólos e miséria generalizada são de um passado tão primitivo e arcaico que deveríamos dar graças a deus por não vivermos como os bárbaros incivilizados que rejeitam as grandes e libertadoras conquistas do capialismo industrial não acha?
Valeu lasagna pelos comentários esclarecedores!
Gente, estamos no fim do túnel mesmo pra ter esse j.bernardo como ´´ídolo´´. Há mais de 500 anos atrás… Mais uma vez obrigada Passa Palavra por publicar o texto da Mix, adorei!
Depois de evocar o gênesis, chegamos ao apocalipse capitalista e ao juizo final ecológico, já que esse modo de produção é apresentado como causador até de tsunamis.
Mas as formas de sobrevivência e de subsistência de comunidades primitivas, continuam sendo tratadas como uma “atividade livre vital”, e não como atividades laborativas, as quais decorre a seleção de espécies mais adequadas ao consumo humano e todo tipo de conhecimento que tal atividade acarreta.
O erro permanece no fato de ter comido o fruto plantado por deus.
Para a Aline, com carinho.
Umas poucas palavras de um mestre:
“As ideologias só falam da sua própria prática. A polémica ideológica é sempre uma utopia, porque o terreno do choque e do confronto só pode ser a prática e nunca as ideologias decorrentes de cada uma dessas práticas e, por isso, distintas, isoladas e autoreferenciadas. A única forma por que uma ideologia critica outra é a reafirmação da sua posição. Em cada ideologia existe somente a repetição incessante do seu próprio discurso. (…) Não é ao nível das ideologias, mas da ação prática, que as ideologias se destroem”. (JOÃO BERNARDO. Marx crítico de Marx. Epistemologia, classes sociais e tecnologia em O CAPITAL.(03 volumes) Porto: Afrontamento, 1977 (Vol. 01, p.112-113).
até os ´´ídolos´´ deveriam se destruir …
“Há mais de quinhentos anos atrás…” Grande tirada inspirada da mitologia nacionalista mais rasteira. O que é importante é termos meios para resolver desafios colocados agora mas que permanecerão também se superarmos o capitalismo, e um deles é a alimentação. A defesa de métodos agrícolas baseados em misticismo não é solução. É preciso que as pessoas de esquerda tomem conhecimento que grande parte da versão “ecológica” sobre agricultura que costumam ingerir no café da manhã está cheia de falsidades. Ou ignoram os resultados da pesquisa científica ou usam-nos de maneira selectiva e mesmo enganosa. Nesse meio, é usual repetir-se rumores há muito desacreditados tal como acontece exactamente no campo da chamada medicina alternativa. Porque se haveria sequer de defender uma mal chamada agricultura ecológica? Um pesticida deve avaliar-se pelos seus efeitos, independentemente da sua origem. Porque existirão essas modalidades de agricultura baseadas em categorizações que escapam a uma escolha racional de critérios e se baseiam antes em crítérios místicos ou ideológicos? Porque não usar uma tecnologia transgénica se ela for mais ecológica e mais produtiva? Apenas porque segundo certos gurus irracionalistas toda e qualquer tecnologia transgénica é um mal? Quem disse isso, a ciência ou algum guru religioso? Porque os militantes do natural fazem questão de estar sempre a apresentar exemplos desacreditados de crimes devidos aos transgénicos e escondem problemas relacionados com a agricultura orgânica que essa sim tem produzido mais problemas em termos de saúde pública? Porquê essa resistência em meio esquerdista em relação a estudos objectivos sobre a comparação entre os vários tipos de agricultura?
Porquê esconder que os agricultores na Índia fazem questão de usar transgénicos e de maneira nenhuma estão a ser forçados a adoptá-los, bem pelo contrário, recorrem mesmo a meios ilegais para os obter, ao contrário da narrativa irracionalista anti-tecnologia, que se desenvolve e difunde em organizações não-governamentais onde existem muitos funcionários pagos por advogar esse tipo de coisas, ao mesmo tempo que difundem uma visão do mundo hostil à ciência e em defesa de irracionalismos tradicionais ou pós-modernos.
http://www.biotech-now.org/food-and-agriculture/2012/02/greenpeace-founder-biotech-opposition-is-crime-against-humanity
É incrível o número de malabarismos verbais usados pelos anarcocapitalistas para defender as suas queridas empresas transnacionais.
Quem discorda é “nacionalista conservador”, retrógrado, mitológico, etc. E, é claro, reacionário, pois progresistas mesmo são as empresas capitalistas, o deus-mercado. Os camponeses que dão a vida pela reforma agrária são taxados de nazifascistas, sem nenhum pudor.
A retórica anarcocapitalista é assim: engraçada. Mistura o estilo dos “blogs pelegos” com o da “imprensa golpista”. Mistura pseudomarxismo com apologia do imperialismo capitalista.
anarcocapitalista eu nunca tinha escutado…
Interessante texto, tou chegando um pouco atrasado no debate, que foi bastante produtivo.
hoje em dia – quando a extrema-esquerda embarcou com mala e cuia no discurso místico da agroecologia e tem gente se mudando para o campo pra plantar batata e vender isso como revolução – esse comentário que o Manolo fez deveria ser posto em uma moldura na sala.
sério.