Com o crescente processo de taylorização da função acadêmica, motivado, em boa medida – infelizmente é verdade – pelo pouco apreço pela função, o trabalho se torna cada vez mais pobre em seus objetivos e métodos. Desta forma, aqueles que não se submetem ao que os orientadores pretendem pesquisar não encontram espaço para desenvolver seus trabalhos. Apesar disso, espantosamente, ainda existe quem, mesmo fazendo pós-graduação, acredita que isto é trabalho de burguês. Seria um modo de justificar a si mesmo a própria apatia e assim viver tranqüilo e em paz? Passa Palavra

6 COMENTÁRIOS

  1. Trabalho de burguês? Só no dicionário Aurélio da língua portuguesa existe mais de 20 verbetes com definições de trabalho: trabalho de parto, de erosão do solo, de magnetismo, de funções orgânicas etc. Quando aplicada estritamente como uso de energia e força psíquica e física para transformar a natureza no sentido de humaniza-la, o trabalho é humano, quer dizer, é um exercício de violência. Disciplinar o crescimento e o amadurecimento do animal humano, dos animais domésticos, dos animais de criar, recria e engorda, das plantações em lavouras e das plantas domésticas sempre foi uma prática de violência. E vai continuar a ser, como antes da palavra e da encarnação da visão de mundo burguesa, ad infinitum. Na visão de mundo burguesa há na encarnação da palavra trabalho um sentido que é estreito, hermético, compartimentado e, a bem da verdade, mixuruca: o animal humano é apenas econômico e o trabalho é somente o que aparece produzido em forma de mercadoria. Nesse caso a violência é banal, gratuita, covarde, porque não é aplicada no sentido de humanizar, mas no sentido de desumanizar.
    O trabalho acadêmico também é violência quando praticado no sentido de humanizar, aperfeiçoar os sentidos e a percepção para permitir a coexistência na luta pela realização das formas humanas de existir. Quem não se sente um ser humano melhor quando se percebe diferente em meio a estupidez pasteurizada do meio social? E pra isso não se tem de fazer ginástica? Permanecer horas na cadeira escrevendo, lendo, tomando notas de leituras em fichas, levantando dicionários, pagando R$ 2,70 no transporte privado da cidade para evitar chegar na aula pingando, isso não é um exercício de disciplina, para tentar corrigir distorções de ideias, de atitudes diante da vida que se leva?
    O trabalho acadêmico torna-se banal, violentamente banal, quando acontece só para preencher papeis necessários ao depósito bancário de bolsas e de fundamentação científica para a reprodução de um único modo de existência humana, que no caso é a capitalista. É banalização da violência, só para lembrar a ex-namorada do “cão filósofo”, praticar o trabalho acadêmico só para produção de “escravos modernos” sofisticados, que passeiam nos campus e nas praças da cidade com seus sandalhões e cabelo ao vento, ouvindo música enlatada que uma industria produziu exatamente pra ele poder viver “esse momento”. E também é violência banal oferecer vagas para orientação só para “contratar” operariosinhos de biblioteca, que no final não sabem se são fungos ou traças, mas que se sabem “funcionários” de orientador. E depois que esse tipo é aprovado no concurso pra docente, tendo sido disciplinado sob os auspícios da banalidade, com suas experiências de vida banalizadas no cotidiano, o que se pode esperar, senão mais banalidade ainda.
    A pergunta é mais que oportuna. Historicamente sim, o indivíduo que alega ser o trabalho acadêmico um trabalho burguês está submerso numa atmosfera tal que se vê banalizado em seu mundo e se acha protegido imitando a lagarta. Em busca de si mesmo acredita que pode se encontrar no baixo ventre, e só levanta para ficar de cócoras. Sequer consegue entender que do lado de fora das academias de laureados bacharéis existem doutores em pesquisa científica, que trabalham academicamente mesmo não estando dentro da academia. Fazem isso com ou sem bolsa, que pode ser uma herança ou uma oportunidade efêmera. O trabalho acadêmico não pode, assim como qualquer tipo de trabalho, ser reduzido ao universo paralelo da visão de mundo excludente do capitalismo.

  2. Pior é a mulherada da educação, peãozada de chão de sala, mas que se representa para o mundo e para os alunos como se fossem madames. Aquelas olheiras e se julgam requintadas do Rotary Club.

  3. A universidade é internamente estruturada por relações clientelistas. O central de tudo está em quais redes de contato a pessoa está inserida, em quais são as relações, a quem serve…

    Nesse processo, é crucial, mesmo que poste alguma coisa no Facebook ou vá assistir alguma assembleia nunca tomar postura ativa em nenhuma luta, nunca enfrentar de frente algum dos chefes, alguma das donas de grupo de pesquisa….ai você irá para a panela, será salvo do “ressentimento”

  4. “os intelectuais tenham o hábito de falar assim tão alto quando estão assim tão baixo, e que falhem sempre no momento decisivo, o único que teria restituído um sentido às suas existências mas que os teria também posto à margem da sua profissão.”

    Soa estranho o Passa a Palavra reverberar tal desespero sobre o destino da Akamedia, mesmo -e sobretudo -àquela voltada ao ensino. Todos sabemos que o deserto já é o mundo do ensino e do trabalho do precariado acadêmico. Não há autoengano, apenas deserto. O precariado que trabalha no ensino, e na academia, já agora é “parte de parte alguma”, um misto de zumbi dos escombros do mundo do trabalho assalariado, com um pé num número sem fim de bicos, sobre-trabalho executado com constrangimentos diversos.
    Nesse deserto, “orientadores e orientandos” desfilam seus próprios papéis, imaginando-se como se ainda existisse alguma retorquida relevância, ou, “uma rejeição do capitalismo estão impregnadas deste amor pela escola” .

  5. Só para recordar…

    A política de panelas acadêmicas de corredor universitário e a publicação a qualquer preço de um texto qualquer se constituem no metro para medir o sucesso universitário. Nesse universo não cabe uma simples pergunta: o conhecimento a quem e para que serve. Maurício Tragtenberg (1929-1998).

DEIXE UMA RESPOSTA

Please enter your comment!
Please enter your name here