Por Passa Palavra

Um atraso de mais de dois meses de salário para os trabalhadores desencadeou o movimento SOS Basileu nas últimas duas semanas em Goiás. A Escola de Artes Basileu França é um Instituto Tecnológico (ITEGO) que teve a gestão terceirizada para a Organização Social (OS) CEGECON desde 2016. Em 2015, alguns professores mobilizados antes das ocupações que impediram a mudança na rede de ensino estadual previam que a mudança de gestão implicaria em corte de custos, diminuição do atendimento e enfraquecimento dos trabalhadores. Era o argumento utilizado pelos secundaristas que começaram um movimento de ocupação das suas escolas na época (divulgado aqui e discutido aqui e aqui). Agora vemos essa realidade na Escola de Artes e os parceiros privados e estatais empurrarem a responsabilidade um para o outro pela situação.

Em resposta a essa situação o movimento SOS Basileu (“geral” e estudantil) lançou a palavra de ordem #NenhumAlunoMenos e #NenhumProfessorAMenos. Entrevistamos um Pai Anônimo que integra o movimento pela manutenção dos trabalhadores e da Escola de Artes para todos os alunos para saber o que ele pensa da atual situação da escola e como anda o movimento.

Passa Palavra (PP): Começou uma greve 29 de outubro. A escola está totalmente parada desde então? Quem puxou a greve?

Pai Anônimo (PA): As mães e os pais estão organizados em um coletivo independente do movimento dos professores e técnicos porque entendemos que não devemos atuar apenas apoiando os trabalhadores. Temos nossas próprias pautas porque, além das questões salariais, a escola está ameaçada de perder a metade dos estudantes com o fechamento de cursos. Isso porque desde 2017, a SED [Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico, Científico e Tecnológico e de Agricultura, Pecuária e Irrigação] fez um contrato inadequado com a OS para a realidade da escola. Nesse contrato está prevista a contratação de 60 trabalhadores e a escola, em 2017, já tinha por volta de 130. Agora, tem em torno de 190. Agora chantageia todo mundo dizendo que se a OS não demitir e readequar o número de trabalhadores, ninguém será pago. Os cursos da área de educação infantil estão especialmente ameaçados porque misteriosamente nem estão previstos no contrato com a OS, embora funcionem há 50 anos. Em relação aos estudantes, eles estão participando das assembleias dos trabalhadores, apoiando as ações e parece que começando a se organizarem em um movimento independente, como os pais e as mães. Mas essa organização ainda está muito no começo. Em 2017, o MP embargou o contrato da OS por irregularidades. Nessa época, trabalhadores contratados pela OS que já estavam sem receber, entraram em greve. Nessa ocasião houve uma organização independente dos estudantes que fizeram reuniões e um ato em defesa da escola.

PP: Qual a opinião dos trabalhadores sobre a gestão por OS da Escola?

PA: Acredito que o movimento esteja dividido quanto a essa questão. A direção da escola, o administrador da OS e o próprio sindicato dos trabalhadores têm defendido a permanência da OS na escola e usam um tom ameaçador de chantagem com os trabalhadores. O que é colocado por essas pessoas é que se a OS for embargada, haverá a rescisão imediata dos contratos. E, por isso, ficarão sem trabalho. No entanto, sabemos que é obrigação da secretaria responsável que assumirá a gestão recontratar os profissionais via edital próprio. E, em tempo hábil, abrir concursos. No entanto, apelando para o medo e uma perspectiva individualista, os gestores e o sindicato dizem que os trabalhadores que não têm qualificação específica não terão garantia de emprego nesse período de transição. No entanto, apesar das ameaças e dos riscos de demissão em se opor à OS, alguns deles falam na assembleia ou em espaços mais seguros que são contra a OS porque o contrato de trabalho com a OS é precário, não tem plano de carreira e eles não receberam o salário em dia em nenhum mês durante 2018.

PP: Como a OS vem reagindo ao movimento?

PA: Publicamente a OS se coloca como apoiadora do movimento dos trabalhadores e diz que não tem culpa de nada. Isso porque não estaria pagando porque não houve repasse da SED. Tem tentado pressionar os trabalhadores a lutar por um aditivo de contrato. Isso porque o contrato inicial, feito em 2017, prevê 60 profissionais para cada ITEGO da região que a OS administra. E a solução que os gestores da OS tem colocado para a questão é pleitear o aditivo de até 30% (o máximo permitido pelo contrato) para garantir a manutenção de mais profissionais. No entanto, mesmo com o aditivo, não chega ao número de profissionais contratados no momento. Então essa não é uma solução para a questão e ainda geraria muitas demissões e corte de cursos. Com base nisso, usam de seu poder de gestor para assediar e tentar direcionar o movimento dos trabalhadores para atender os próprios interesses de ter mais verbas e manter o contrato irregular com a SED. Além da questão dos trabalhadores, a própria SED reconhece que a OS não repassa documentos e não cumpre com suas obrigações.

PP: Quais as perspectivas do movimento? Acham que vão conseguir reverter as demissões?

PA: O sindicato dos trabalhadores informa que está negociando um aditivo de contrato com a SED que viabilize a permanência de todos. No entanto, não existe qualquer garantia disso e o movimento de pais e mães entende que os problemas nunca serão resolvidos com a permanência da OS. São vários problemas. Essa tática parece mais a ideia de que se uma parte pequena da escola for sacrificada, tudo bem. Não concordamos com isso, lutamos por nenhum professor a menos e nenhum estudante a menos. No ano de 2018, os trabalhadores não receberam em dia durante nenhum mês e essa situação vai permanecer. Os professores não têm plano de carreira, os trabalhadores estão sempre ameaçados de demissão e não têm garantia nenhuma de permanência e continuidade de trabalho na escola. Essa é uma escola de educação em artes, que tem a perspectiva de formar artistas que começam com 5 anos. O trabalho é de continuidade e os profissionais vêm e vão sem garantias de direitos e sem poder desenvolver um trabalho duradouro e sólido. Essa precariedade se deve a esse tipo de administração terceirizada. Além disso, a OS demonstra incompetência na administração porque não repassa documentos e não comprovou sequer a qualificação necessária para administrar, conforme o MP. Dessa forma, o movimento de pais e mães entende que a luta é para que a escola volte a ser administrada pelo poder público através da secretaria competente. Acreditamos que assegurar de forma duradoura o trabalho dos professores e técnicos só se dará se a OS deixar de administrar a escola e vamos lutar para isso. As perspectivas do movimento de pais e mães são fortalecer o coletivo que já está organizado fazendo ações que chamem atenção da comunidade para o problema. Além disso, estamos discutindo a melhor forma de atuar para manter a nossa escola. De forma imediata apoiamos o movimento dos trabalhadores e exigimos que os salários atrasados sejam pagos. Além disso, queremos a garantia que nenhum será demitido. E estamos discutindo a melhor forma de garantir que a escola volte para a administração pública porque entendemos que depois que a OS entrou as coisas pioraram muito. A escola vem sendo sistematicamente precarizada com a ameaça de corte de cursos para as crianças e os trabalhadores sequer recebem em dia. O curso de teatro para crianças fechou ano passado, por exemplo.

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