Por Victor Hugo Viegas Silva
Ato antifascista em Goiânia agora na praça cívica. A praça foi sitiada, a PM aborda e ameaça todos que chegam para o ato, bope, hicoptero, sirenes et., tentarem impedir um grupo de chegar ao ato, mas recuaram e o grupo conseguiu chegar. A grande maioria dos manifestantes insistiram e se juntaram ao ato, mas a praça está sitiada com muita cavalaria e tropa de choque. Algo que nunca vi antes. É uma guerra de nervos.
Foi assim que descreveram ao vivo o primeiro ato antifascista e antirracista em Goiânia, cidade que teve mais de 60% dos votos a favor de Bolsonaro. Enquanto acontecia, a polícia também enquadrava pessoas que se aproximavam nas avenidas próximas sem identificação e sem máscara. Outro grupo também distribuía máscaras, álcool gel e repercutia essas denúncias nas redes sociais. Esse trabalho miúdo continua depois da manifestação, na espera de próximos atos antirracistas no único estado que não divulgou mortes por policiais. Conversei com Ana Vitória que puxou a vaquinha de compra dos materiais de proteção para os manifestantes, uma forma de participação para os que não podiam comparecer ao protesto.
Victor: Você é militante de alguma causa? Por que decidiu se mobilizar por meio de uma vaquinha?
Maria Victoria: Eu me considero militante ativa da luta feminista, seria o movimento político no qual eu mais me mobilizo e faço parte ativamente. Mas sempre que vejo uma luta pela qual eu me identifico e acho que vale a pena fazer eu parte tento ser ativa e tento sensibilizar outras pessoas também.
Eu decidi juntamente com outras amigas me mobilizar por uma vaquinha e outro meios de arrecadação porque foi uma forma de conseguir fazer parte do movimento sem estar lá presente. Devido a pandemia e por ter pessoas que moram comigo parte do grupo de risco eu optei por não ir a manifestação, mas queria ajudar de alguma forma e daí surgiu a ideia.
Victor:A vaquinha era para arrecadar o que? Qual o motivo para compra dos materiais?
Maria Victoria:A princípio nós estávamos arrecadando álcool e máscara para manter a segurança dos militantes em meio a pandemia, mas aos poucos foram surgindo outras necessidades, como por exemplo primeiros socorros caso houvesse alguma repressão militar ou desentendimento que virassem brigas e etc, então redirecionamos uma parte do dinheiro para kits de primeiros socorros também. O motivo da compra dos materiais foi justamente esse, manter a segurança pensando em tudo que poderia acontecer, tanto em relação a pandemia quanto em relação a desavenças e repressão militar. O nosso objetivo sempre foi proteger e apoiar os manifestantes.
Victor:Você acha que protestos durante a pandemia são razoáveis? Por que a quarentena pode não ser seguida em dias de protestos?
Maria Victoria:Eu acho sim que são razoáveis. Estando num governo onde não existe um governante descente é extremamente compreensível a vontade da população em fazer alguma coisa, em ir para as ruas e tentar lutar pelos seus direitos. Acredito que a quarentena pode não ser seguida em dias de protestos porque está indo na contramão do que é necessário para ser uma quarentena, isolada e em casa. Entretanto, tentamos achar algum meio de não existir uma proliferação de casos durante os protestos.
Victor:Você acha que esse tipo de vaquinha virtual e a entrega dos materiais implica organização coletiva física? Ou é só ativismo digital?
Maria Victoria: Acho que pode ser os dois, depende de quem faz e depende para onde e como vão direcionar todas as arrecadações. No nosso caso foi uma organização coletiva que está seguindo até hoje. Tivemos uma ótima arrecadação e sobrou uma parte do dinheiro que estamos direcionando para famílias mais necessitadas. Estando em situação de rua, muitas pessoas não têm acesso a higiene básica, comida e enfim, direitos extremamente básicos, então estamos direcionando esse dinheiro para cestas afim de tentar suprir um pouco dessa necessidade.
Victor:Surpreendeu a arrecadação? Por que as pessoas se comoveram?
Maria Victoria: Demais!!!! Muita gente se comoveu e tentou ajudar com o que pôde. Tivemos muitas doações que seguirão sendo úteis para a nossa população. A realidade do que estamos passando está escancarada, só não enxerga quem não quer. Estamos sem liderança, o descaso para com as pessoas pobres no país, pessoas morrendo o tempo todo e nada acontece? Tem alguma coisa errada. Com as manifestações dos Estados Unidos acredito que muita gente viu o que pode acontecer se todo mundo se reunir, mas como estamos num momento de pandemia muita gente não teve coragem de ir, mas queria estar lá de alguma forma, a doação foi então essa forma. Se sentir parte de um movimento mesmo não estando lá, sentir que está fazendo parte de algo maior. Eu sinto muito que não tenha sido uma grande manifestação, somos capazes de fazer algo muito maior que isso.
Victor: Você se inspirou ou se motivou pelo exemplo da luta nos Estados Unidos?
Maria Victoria: Eu percebi que no ato tinha duas lutas, uma pela democracia e outra pelas Vidas Negras Importam, de certa forma as duas lutas andam de mãos dadas pelo óbvio, mas sim, foi inspirado na luta dos Estados Unidos e também pelo que acontece aqui no Brasil diariamente. Como eu mencionei, estamos sozinhos e devemos nos unir para proteger os nossos. Sabendo ainda do que comumente acontece nas manifestações aqui no Brasil, – sendo vistos como inimigos por pedir nossos direitos – foi importante toda essa mobilização afim de nos proteger.
Victor:Se houver mais protestos, que dica você daria pros manifestantes que tão sem saber como se organizar para protestar de forma segura?
Maria Victoria: Acho que a princípio é tentar pensar em tudo que pode acontecer. Estamos num momento em que, de certa forma, não podemos nos dizer contra o governo, não podemos ir para rua lutar pelos nossos direitos ou então somos inimigos. Não dá para convergir e o Estado não está do nosso lado, claramente. Então não temos apoio dos governantes, somos nós por nós e qualquer repressão pode acontecer, temos que pensar nisso. Estamos numa pandemia temos que pensar em como manter nossa saúde e higiene. Então a minha dica é essa, ficar atento ao que pode acontecer e se mobilizar conjuntamente para todas as situações. Isso que tentamos fazer mesmo estando longe.
Victor:Você acha que é possível vencer?
Maria Victoria: Acho que é possível desde que as pessoas se organizem e foquem no que é realmente necessário para todos. Infelizmente senti uma falta de movimentação e organização na manifestação. Para isso ganhar força temos que mobilizar mais gente. Mas sim, é possível vencer. As pessoas não sabem da força que têm até começar a usá-la em casos assim. Eu acho que está fadado a acontecer, não é atoa que estamos numa democracia. Se estamos infelizes é nosso dever manifestar e gritar pelo que queremos.