Por Jan Cenek

Em carta enviada para Aleksandra Khotiaíntseva, em 1897, Anton Tchékhov afirmou: “quanto mais alegre eu vivo, mais sombrios saem meus contos.” É uma questão interessante que, não raro, manifesta-se pelo avesso para os leitores. Quando leio textos sombrios, fico alegre.

Costumo retornar aos meus escritores preferidos em tempos de tristeza e angústia, interrompo a leitura da vez e retorno a Carlos Drummond de Andrade, Machado de Assis, Ernesto Sabato, Albert Camus, Milan Kundera, André Comte-Sponville. Às vezes recorro a Enrique Vila-Matas, Manoel de Barros, Eduardo Galeano ou algum outro. Mas, quase sempre, é aos meus escritores preferidos que retorno em tempos de tristeza e angústia. Revigora. Não digo que funcione para todos em todas as situações, nem com os mesmos textos, mas, funciona.

É estranho porque meus escritores preferidos são, em geral, pessimistas. Mas as lapadas de desesperança são agradáveis. “A pena da galhofa e a tinta da melancolia” reconfortam com vantagem.

No romance A brincadeira, Milan Kundera fez o personagem Ludvik provocar a namorada, Marketa, que “era uma dessas mulheres que leva tudo a sério” e que havia trocado um encontro amoroso por um curso de formação do partido. Quando recebeu uma carta de Marketa dizendo que no curso de formação do partido “reinava um espírito sadio”, Ludvik respondeu num cartão-postal: “O otimismo é o ópio do povo. O espírito sadio fede a imbecilidade. Viva Trotski.” Era uma brincadeira, mas ocorreu na antiga Tchecoslováquia, foi parar nas mãos dos burocratas estalinistas e não terminou bem. Ludvik foi julgado e condenado, mesmo não sendo trotskista.

Já foi dito, contra Kundera e Ludvik, que “o pessimismo é o ópio da intelectualidade.” Pode ser. Mas não resolve a minha questão. Não é exatamente o pessimismo que me encanta nos meus escritores preferidos. É a tinta da melancolia, mas também a pena da galhofa, como se o desespero libertasse o cômico. É a angústia, a tristeza o humor e algo a mais. O quê? Por que retorno aos meus escritores preferidos em tempos sombrios?

Esses dias reli o primeiro livro do filósofo André Comte-Sponville, Do corpo. Encontrei um aforismo que dialoga com a constatação de Tchékhov. Por que Tchékhov escrevia contos sombrios quando estava alegre? Porque:

“Toda criação é uma alegria – pelo aumento de ser que ela supõe. Isso não significa que não haja grandes obras tristes; mas elas não são conformes ao impulso que as suscitou.”

Alegria criativa do artista, alegria contemplativa do público. Ainda mais nas releituras, devido à possibilidade de reparar nos detalhes e nas entrelinhas, na arquitetura e no acabamento do texto.

André Comte-Sponville, também no livro Do corpo, arremata com um aforismo que resolve a minha questão. Por que retorno aos meus escritores preferidos em tempos sombrios?

“Nos piores momentos de angústia ou de tristeza, nas fases de desgosto total e de extrema lassidão, quando náuseas de desespero oprimem nosso peito, quando gostaríamos de chorar ou de vomitar, ler uma frase bem construída, sólida, limpa, verdadeira, faz bem, como uma lufada de ar puro, uma bofetada de vento. Uma frase, uma só, e já nos sentimos melhor. O estilo é tônico.”

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