Por Marcelo Tavares de Santana
Expropriação, ação ou efeito de privar alguém de sua propriedade [1]. Esta palavra me faz pensar onde está o valor das redes sociais, por que elas valem bilhões se basicamente contêm conteúdos que as pessoas criam? Uma parte da resposta está na capacidade das redes expropriarem nossos conteúdos, o texto é nosso, a imagem é nossa, mas fica guardada dentro da rede social atraindo mais pessoas, com poucas garantias a nós mesmos; algumas empresas até entregam ferramentas muito úteis em contrapartida a nossa produção criativa, mas não nos relembram que ela é nossa propriedade intelectual. Espero que algum dia existam governos que obriguem as redes sociais a colocar um botão para baixarmos todo conteúdo num formato que possamos levar para outra rede social ou simplesmente guardarmos em nossos equipamentos, conforme nossa própria vontade.
Enquanto isso não acontece, vamos pelos menos buscar ter independência de formatos de arquivos nos equipamentos dentro de nossas casas. Como dito no artigo anterior, migrar conteúdo antigo para formatos livres ou abertos é um grande desafio e toma tempo. No entanto, algumas decisões podem facilitar essa migração. A proposta aqui é começar classificando o conteúdo em atual ou legado, esse último é composto pelo conteúdo que dificilmente precisará ser editado, por exemplo, tudo que for mais antigo que seis meses será considerado conteúdo legado. Após essa classificação é preciso testar se todo conteúdo legado pode ser acessado e se todo conteúdo atual pode ser editado.
Com base na lista de formatos abertos na Wikipédia [2], vamos agrupar nossos conteúdos em Áudio, Escritório (texto, planilha e apresentação), Imagem, Vídeo e Outros. Para os quatro primeiros grupos, na lista abaixo temos sugestões de aplicativos livres que podem servir ao propósito de acessar o conteúdo legado:
- Áudio: VLC <https://www.videolan.org/vlc/>;
- Imagem: nomacs <https://nomacs.org/download/>;
- Escritório: LibreOffice <https://pt-br.libreoffice.org/baixe-ja/libreoffice-novo/>;
- Vídeo: VLC <https://www.videolan.org/vlc/>.
Para descobrir outros aplicativos livres que permitam acesso a arquivos desses grupos pode-se ir ao site AlternativeTo [3]. Esse site também é útil para descobrir programas livres para abrir arquivos do grupo Outros, ou seja, qualquer outra coisa que não se enquadre nos grupos anteriores. Um exemplo são os arquivos salvos pelo aplicativo de desenho vetorial CorelDRAW, que dificilmente serão lidos corretamente por aplicativos livres, mas através dele é possível salvar as criações no formato livre SVG, que pode ser lido pelo Inkscape [4]. Em último caso, o conteúdo legado pode ser salvo como uma impressão em formato PDF pelos aplicativos utilizados na criação original.
Para o conteúdo atual as decisões de mudança podem ser mais difíceis. O primeiro passo é começar a não produzir mais conteúdos em aplicativos que salvam em formatos proprietários, o site AlternativeTo também pode ser usado para esse propósito. Há grande probabilidade do conteúdo atual ser aberto pelos programas livres que escolher, mas se não for possível o próximo passo é verificar se o programa proprietário salva em formatos livres ou abertos, e salvar cada arquivo importante através desse programa. Se não existir a opção de salvar as criações em formatos compatíveis com aplicativos livres, o último recurso é salvar o conteúdo como impressão em PDF e editar novamente o conteúdo num programa livre.
Com a seleção de aplicativos para acessar conteúdo legado e editar conteúdo atual, é necessário preparar o espaço para onde migrar todo conteúdo; esse é um ótimo momento para criar volumes criptografados [5] para guardar os dados, se possível em duas cópias distintas. Se a intenção for migrar seu equipamento para um sistema operacional (SO) livre, pode-se usar uma versão live que funciona a partir de um pendrive USB, para fazer o acesso a arquivos, a seleção de aplicativos e a cópia em volumes criptografados.
Usar um SO live não é tarefa facilitada pelos fabricantes de hardware: primeiro é preciso habilitar a inicialização (boot) por pendrive e em seguida desabilitar o chamado secure boot, um método de autenticação de SO embutido no hardware que normalmente só reconhece Windows como software permitido a ser carregado ao ligar microcomputadores. Para fazer isso será necessário consultar a documentação do fabricante, mas geralmente consistem em usar alguma tecla (ESC, DEL, F9 etc.) para acessar o Basic Input Output System (BIOS), também chamado de setup, e depois procurar onde configurar os dispositivos para boot, e desabitar o secure boot; fóruns de comunidades são ótimos locais para tirar dúvidas sobre cada equipamento.
Existem várias distribuições de SO live, muitas delas são Linux e são baixadas num formato de arquivo de imagem de CD com a extensão ‘.iso’ – uma espécie de cópia física bit-a-bit. Deixaremos a sugestão de usar do Debian Live com firmwares non-free, e interface gráfica Cinnamon: escolha o arquivo que finaliza com ‘cinnamon+nonfree.iso’ no endereço <https://cdimage.debian.org/images/unofficial/non-free/images-including-firmware/current-live/amd64/iso-hybrid/>. Para criar o pendrive USB inicializável é preciso utilizar um aplicativo como o Rufus (para Window, <https://rufus.ie/pt_BR/>) ou gravar o arquivo de imagem (.iso) direto no pendrive; o dispositivo deve estar livre, sem arquivos, pois o conteúdo será sobrescrito pela imagem e perdido.
Não temos dessa vez alterações no nosso Mapa de Segurança Digital, mas fazer uma migração de arquivos para formatos livres e auditáveis, segue uma proposta de ação:
- Semana 1: instale aplicativos livres para acesso a conteúdo legado;
- Semana 2: faça cópias do conteúdo atual, instale e teste aplicativos de edição;
- Semana 3: prepare dispositivos (criptografados) de backup;
- Semana 4: experimente um ou mais CD lives de Linux.
Tem alguma dúvida específica, como arquivos de desenho industrial, ou sobre edição de conteúdo com aplicativos livres, deixe a dúvida nos comentários. Até mais!
Notas