Por José Abrahão Castillero

Mais uma vez fui conversar com os trabalhadores terceirizados da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Soube que os funcionários do serviço de limpeza, da empresa APPA, estariam de aviso prévio para perder seus empregos, por causa que o contrato da empresa estaria acabando. Já é provavelmente a quarta vez que a empresa assina um contrato emergencial, brecha jurídica feita pela UERJ que prorroga por mais 6 meses o contrato, estendendo o caráter emergencial de uma licitação para uma nova empresa que não deu certo, por conta de ausências de documentos fornecidos pelas vencedoras. A transição entre contratos já fez os trabalhadores da limpeza trabalharem por diárias, sem contratos estabelecidos mensalmente, pela própria autarquia da UERJ, que pagava pelo sistema “Fonte 10”, fonte criada para pagar diretamente os trabalhadores terceirizados. Devido ao atraso de meses do pagamento por esse sistema, em 2022 os alunos da universidade fizeram um protesto em solidariedade. Essa memória ainda é sentida por esses trabalhadores. Perguntei em dezembro de 2023 para um funcionário da APPA sobre a situação deles e ele me respondeu:

“Estamos de aviso prévio sim. A gente já assinou e volta dia 2 de janeiro pra ver se renovam nosso contrato e como a gente vai trabalhar. Vai ser sistema fonte 10, né, cara? Aí a gente vai receber quando? Daqui a 4 ou 5 meses? E a gente vem trabalhar como? Pagando a passagem do nosso bolso, porque não vai ter vale transporte. E vamo trazer marmita, né? Não tem o vale-alimentação. E aí a gente fica nessa indecisão cara. Não falam pra gente se vai ter renovação com a APPA ou se vai contratar nova empresa. Não é justo isso. A gente não tem uma previsão sobre isso, quem se ferra é a gente. A gente trabalha é sem uniforme e sem saber se a empresa vai ficar ou não. É complicado.”

Nisso, eu falei:

“Então o contrato da APPA acabou, né? Mas não teve nenhum bafafá sobre isso, sobre a licitação. É bem capaz de eles renovarem com ela de novo só para evitar estresse. Porque trocou a reitoria e a nova gestão foi eleita metendo o pau na anterior por conta de suspeita de desvio de verba e tal. Pegaria mal trocar rápido na empresa assim deixando vocês com risco de demissão ou trabalhar recebendo pela ‘Fonte 10’. O ‘foda’ é que ninguém fala nada com vocês. O foda é que pela ‘fonte 10’ vocês são como que funcionários da UERJ, o que prova que eles poderiam efetivar vocês. Mas aí eles teriam que dar estabilidade, né?, com direitos garantidos, salário e tudo. Ser prioridade nos gastos pagos pela universidade. Isso eles não querem, né? Aí olocam num regime de trabalho pior que o do terceirizado, arece que pra lembrar como vocês são vistos pela instituição. Vocês vão trabalhar sem o vale-alimentação e transporte. Agora entendi melhor.”

O terceirizado me diz:

“É complicado que a gente fica esperando enquanto eles ficam nessa brincadeira de trocar de reitoria, enquanto isso quem sofre é a gente, né? A gente fica esperando pra saber se vai trabalhar ou não. Parece que a reitoria nova quer ser diferente da anterior, que diziam que roubava muito né. Agora essa nova aí, eu só acredito vendo, não boto fé não. Porque a princípio a gente já vai trabalhar pela ‘fonte 10’, que é uma sacanagem. Agora, tinham dito que iam contratar mais gente, que era bom pra dividir nosso trabalho, até porque tão fazendo e construindo mais coisa. Quem disse foi o Celso, o chefe da DESEG, departamento de serviços gerais, que toca os contratos com as terceirizadas pra esses serviços. Mas isso foi antes de demitirem alguns encarregados, nossos subchefes, que diziam que isso ia acontecer.”

O interessante da situação dos terceirizados da limpeza, quando ficam nesse “limbo” que é trabalhar pelo “sistema Fonte 10”, é que, se aparentam estar sendo contratados diretamente pela autarquia, é em condições piores de trabalho, com menos garantias, e ainda podem receber pagamentos com atraso. Isso confirma a tese de que o controle político e a precarização contam mais para a prevalência da terceirização (quando uma empresa faz a gestão no lugar do poder público) do que qualquer possibilidade de mais eficiência no trabalho. Também destrói a crença de que o poder público daria de bom grado as melhorias, pois trata-se de um Estado capitalista, que mantém as relações de mais-valia, onde o tempo de trabalho produzido é sempre fornecido em maior parte para a mercadoria, que é o serviço, e em menor parte, para investir na vida e em melhores condições para a classe trabalhadora. Manter isso em mente evita acreditar que um dia a autarquia irá efetivar esses funcionários, enquanto mantém um estatuto que trata essas contratações e as verbas para auxílios estudantis como discricionários, podendo ser modificados, reduzidos e até atrasados por serem “atividades-meio” ou acessórias. Por outro lado, as verbas para as “atividades-fim”, como de professores e servidores, são consideradas “vinculadas”, sendo invioláveis e não passíveis de atraso, por determinação da administração pública do Estado do Rio de Janeiro, superior à própria UERJ. Isso faz lembrar da mobilização estudantil contra o atraso do auxílio-alimentação e pelo auxílio-moradia, que ocorria junto com os atrasos dos terceirizados. Ficou desnudada a tática do poder público de fragmentar os estudantes, quando viram o nome de membros do Diretório Central dos Estudantes (DCE) na lista de um dos mais de vinte projetos “fantasmas” que estavam sendo investigados pelo Ministério Público, com alunos recebendo 5 mil reais por mês, cuja atividade não era clara e transparente. Mas as assembleias estudantis os viam defendendo a reitoria e a gestão das verbas.

Entender o problema da UERJ é fundamental para entender o problema de cada setor. Mas é possível achar que entendem o problema da universidade ignorando os problema de cada categoria de trabalhadores, conforme se constrói uma cultura política de suposta “defesa da UERJ”. Parece que mesmo mudando a gestão, os atrasos continuam, seja dos auxílios estudantis, seja dos salários. É fundamental uma mobilização entre esses setores construindo uma rede de solidariedade, seja divulgando denúncias de trabalho, seja organizando por setor. É sempre importante que um setor seja ponto de apoio do outro, como já foi pensado como tática do coletivo Invisíveis. Pensando nessa perspectiva, fui conversar com os vigilantes da empresa Magna e soube que estavam com salário atrasado e receberam somente no dia 20 de dezembro, sendo que normalmente recebem dia 5. O comunicado do supervisor Octávio dizia:

“Comunico a todos os colaboradores da empresa Conquistar Vigilância Ltda. que o pagamento referente ao mês de novembro de 2023 será depositado na conta de todos os colaboradores do contrato UERJ na data do dia 20/12/23, quarta feira. Aproveito a oportunidade para externar os meus sinceros pedido de desculpas pelos transtornos causados pelo atraso do pagamento e agradecer a confiança e colaboração de todos.”

Sempre a empresa chamando os funcionários ou trabalhadores de “colaboradores”, um termo que se populariza entre gestores de empresas que atuam sob regime de terceirização desde os anos 1980 para amenizar o mal-estar sentido pelos trabalhadores ao sentirem que colaboram com a empresa e não trabalham num regime de subordinação. Essa perspectiva de não-subordinação remete ao desdobramento do regime “celetista”, onde a perda de direitos e garantias seria compensada com menos cobranças de carga horária ou pressões no ritmo de trabalho. Como os terceirizados são funcionários dentro do regime da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) e trabalham num contrato baseado em horas estabelecidas mensalmente, chamar de “colaboradores” é somente uma retórica quase constrangedora estabelecida entre gestores e empregados. Mas um pouco antes dessa mensagem, soube através de estudantes que alguns vigilantes fizeram uma paralisação antes da inauguração do campus da UERJ no município de Cabo Frio. Assim, fui falar com um vigilante no campus Maracanã:

“Essa paralisação em Cabo Frio, é por causa do atraso de salário, né? E teve atraso outras vezes, né? Aqui os problemas são os mesmos, porque é a mesma empresa, a Magna. Mas você pensam em paralisar também?”

O vigilante responde:

“Então, parece que a empresa Magna tá mudando de nome. Agora ela é Conquista Vigilância e Segurança Patrimonial Ltda. Não sei porque mudaram, só sei que trabalhar aqui é uma merda. Tá tipo no quinto atrasado de salário, o vale-alimentação pagam parcelado todo mês. Demitem por causa de qualquer coisa aqui.”

Eu perguntei: “Esse medo de demissão, é por isso que vocês não paralisaram por aqui?”

Ele responde:

“Cara, não é só isso não. Porque aí qualquer brecha era motivo pra fazer alguma coisa. O problema é que a maioria do povo que tá trabalhando aqui é porque é ‘peixe’, é indicado por alguém que conhece a chefia. E essa pessoa fica na empresa e entrega os colegas que reclamam, fica parada ali ouvindo conversa. Depois conta pra pessoa que ele é próximo. Aí tu acha que o cara vai fechar na paralisação, mas ele é ‘peixe’, entendeu? Por causa disso que o que aconteceu em Cabo Frio não acontece aqui. É muita gente querendo montar no outro e muitos têm medo.”

Eu disse:

“Essa situação dos ‘peixe’, é por isso que os caras terceirizam, né? Assim eles têm garantia que vocês vão obedecer e mantêm uma mafiazinha no controle, tudo amigo dos amigos. Aí vocês não reclamam do trabalho enquanto gastam pouco com vocês, exploram mais. Aí tu vê, antes o trabalho de vocês era feito por servidor, pessoal efetivado. Não tem essa de demitir por qualquer coisa, tem estabilidade. Era mais difícil ter esse controle, né? Agora vocês ficam nessa fragilidade. Uma parada é tentar juntar pessoas na mesma situação e dispostas a apoiar. Vou divulgar a situação de vocês pra todo mundo ficar sabendo. A galera da limpeza tá passando por problema parecido, os ascensoristas também. Os da limpeza tão assinando aviso prévio pelo fim do contrato com a empresa, os ascensoristas tão também com problema de pagamento atrasado. Se reclamam são ameaçados de demissão. Aí pelo menos com a divulgação desses casos, vira algo público e chega na chefia. Pra ela saber que tem gente ligada no que eles tão fazendo com vocês. Isso por si só não muda nada, mas pode dar uma força para vocês se sentirem menos sozinhos, entendeu? Porque o que muda mesmo é a galera se unir e parar essa universidade. Mas para isso acontecer a gente tem que buscar essa força na solidariedade, né? E também essa reitoria nova aí veio falando mal da antiga, que tava envolvida em corrupção ou suspeita. As próprias empresa Magna e a Verde, que era dos elevadores, já foram pegas pagando propina (ver aqui e aqui) pra gestor aqui da UERJ, né? Lembrar o quanto as coisas têm mudado pouco é importante pra causar impacto.”

O vigilante responde:

“É, eu não acredito que as coisas vão mudar. Mas eu concordo que o povo tem que se unir. Mas até lá, parceiro, é um sacaneando o outro. Ninguém se arrisca. Mas vamo ver, tamo junto.”

Depois dessa conversa, fui verificar a situação dos trabalhadores da empresa CNS. Eles trabalham nos elevadores como ascensoristas e em outros serviços, como no atendimento do comércio na editora da UERJ (EdUERJ). Uma das ascensoristas me disse:

“Aqui a gente tem também pagamento atrasado, parcelam o vale-alimentação. Tudo isso acontece com a gente. Só que é difícil também fazer qualquer coisa, né?, a galera não faz nada porque tem medo de demissão, essas coisas. Mas a gente tem uma bronca com a CNS, que parece uma ditadura, uma vigilância constante. A gente vive praticamente um ‘vigiar e punir’, alguns muitos funcionários aqui chamam a empresa disso. É toda uma reclamação em cima da gente, obrigam a gente a usar uniforme. Essa história de não poder botar ventilador, a gente morrendo de calor no elevador, é só uma das coisas que eles proíbem sem explicação. Ela tá pior nisso que a empresa ‘Verde’, que ficava aqui antes.”

Eu respondi:

“Engraçado que a ‘Verde’ também se envolveu no pagamento de propina e era a favorita da DISAO, que é a divisão de serviços auxiliares, parte da DESEG, que é a divisão de serviços gerais, pra assumir o lugar da APPA no contrato da limpeza. Entendi que a CNS entrou depois dessas denúncias, no lugar da Verde. Assim como a reitoria de agora, ela veio quase como solução para as irregularidades.”

A ascensorista disse:

“Mas eu não acredito em melhora não. Essas empresas tão aqui sempre e fazem sempre igual. E ainda piora, a CNS vigia a gente como se gente fosse criança. É uma perturbação. São autoritários demais. E a gente não pode fazer nada, só se parar tudo aqui, como fizeram lá em 2014, quando a Construir e a Verde atrasaram pagamento. Aí teve greve. Os estudantes e os professores vieram junto.”

Como dizem: “falando no Diabo”… Depois disso retornei para conversar com os funcionários da limpeza. Uma faxineira da área hospitalar me disse:

“Tamo aqui esperando e trabalhando pra empresa nenhuma, até a nova entrar. Mas parece que quem venceu a licitação é a Verde e ela é que vai entrar. Foram selecionados 4 funcionários de manhã e 3 à tarde pra trabalhar. Num trabalho que tinha mais de 20 funcionários. A gente vai receber pela ‘fonte 10’, ninguém sabe quando vão pagar. Até a Verde entrar, mas ouvi dizer que essa empresa demora pra pagar, que não paga direito, o vale-alimentação é ‘pingado’ (parcelado), entendeu? Tá todo mundo dizendo isso. E fora a insalubridade, porra, tu tinha que tá lá, cara. Porque ontem teve treinamento, é bem zoado. Muito, muito, muito. O cara lá passando por cima da palavra dos outros, não respeitava ninguém. Disse que não sabia se iam dar insalubridade. Que não sabia se vai ou se não vai ter. Mas a gente tem que receber porque tá na lei, a gente trabalha em ambiente hospitalar e é contagioso, né?”

Eu respondi:

“Cara, a Verde é velha nisso, ela já se envolveu em pagamento de propina em caso de corrupção na UERJ e mesmo assim continuava a atrasar pagamento de salário. Nem faz sentido ele ganhar essa licitação, por causa do histórico dela. Mas se tu ver, a APPA também atrasou a vida de vocês legal, né?”
Ela responde:

“É, a APPA não sai ilesa. É isso aí, Zé. Eu não vejo novidade, a APPA não sai ilesa de situação de atrasar salário, vale-alimentação. Não vejo novidade. Diz que a culpa é da UERJ, porque a UERJ não paga. Não pagava nas vezes que atrasava, né? Eu sei que a Verde é do elevador e da jardinagem. A Verde é velha. Mas, pode ser que, né?, por estar com outra empresa junto, que é a Conquista… Sei lá, de repente porque o contrato é outro. Também não posso dizer o que vai acontecer. Mas que eu fico com o pé atrás, eu fico. Todo mundo, né? A única coisa chata é a gente ir no supermercado e ter só 200 reais, pô. Aí depois tu vai no supermercado de novo com 200 reais. Chatão, né?, deveria depositar de uma vez só. Aí passagem é ‘pingado’, diz que a passagem é 3 vezes. Aí diz que o [vale] alimentação às vezes atrasa lá pro final do mês ou pro meio. A APPA pelo menos pagava. Ou se bem que não, né? Nem sei o que dizer, nem sei. Porque a APPA também atrasava.”

Eu perguntei: “Então a Verde já entrou parcelando o vale-alimentação?”

Ela responde:

“Não, a Verde nem começou ainda. A gente nem sabe o dia ainda. Ontem teve treinamento e os boatos é que atrasam pagamento. Geralmente cai pingado o vale-alimentação. Os seguranças da Magna, é pela Verde, e tão atrasando e parcelando. E a passagem também vem pingada. Tudo atrasa, você sabe.”

Eu fiquei em dúvida: “Ué, os seguranças tão pela Magna, que virou Conquista. Não é uma empresa diferente da Verde, não? Não entendi.”

Ela responde:

“Cara, eu não sei explicar direito. Só sei que a Magna também é pela Conquista, que faz parte da Verde. É um contrato só, acho que eles fazem parceria. Se você olhar no crachá do segurança, tem ali o nome Conquista. Se você olhar no do pessoal da Verde, tem ali o nome Conquista. Entendeu? Pra mim é a merma coisa. É, acho que é parceria o que eles fazem, alguma coisa do tipo. Porque quando eu fui assinar o contrato, tava dizendo não sei o que Verde… Verde Ambiental e não sei o que, Conquista lá não sei das quantas.”

Eu disse:

“Cara, bizarro isso. Já ouvi muita história bizarra da UERJ, dizendo que tem um controle de favorecimento, meio que máfia, que controla cargos de gestão, tipo a DISAO. Aí eu sempre estranhei que empresas como a Magna e Verde, denunciadas em caso de corrupção por pagamento de propina, continuam com a UERJ. E controlam contratos de funcionários. Aí tu me diz que não só a Verde venceu a licitação, como é parceria da Magna… Isso é muito doido e pensar no favorecimento entre essas empresas e a burocracia da UERJ.”

Ela respondeu:

“O difícil é que não tem como provar, ninguém deve ter levantado nada, uma prova assim, concreta, pra mostrar que eles fizeram alguma lavagem de dinheiro ou coisa do tipo. Isso aí é que nem esses casos de política, que a gente vê aí na TV. É uma sacanagem do cacete, a gente nunca sabe de nada. É só boatos e boatos. Nisso rola muito dinheiro. Um amigo meu falou lá que quem fez a sacanagem foi o Celso, chefe da DISAO, tirou a gente da APPA, sendo que a gente poderia ficar mais 6 meses nela. Tirou e botou a Verde. Não sei com que autoridade ele pode fazer isso.”

Eu respondi:

“É. Essas empresas aí, não importa qual seja, elas sempre vão sacanear trabalhador. Mas pesquisando sobre outras universidades públicas, quando trocar a empresa terceirizada, alguns materiais mostram que normalmente os caras burlam direitos trabalhistas. Reduzem vale-alimentação, transporte, não pagam insalubridade. Não tem regra. A APPA também sacaneava vocês. Mas assim não tem regra. O lance é que o Celso pode não renovar o contrato emergencial dela. Mas quando vi essas empresas burlando direitos da galera, eu torci pra não trocar a empresa. Só que pelo que tá parecendo, não importa muito se troca ou não. Parece que tem um círculo de empresas e gestores que se favorecem. Provavelmente o Celso falou pra vocês que a APPA poderia ficar porque rola essa calma pra vocês. Mas o contrato com a Verde agora vai ser mais duradouro, né?, é tipo estável. Mais que os 6 meses do emergencial tava rolando com a APPA.”

Ela respondeu:

“ É, vai ser contrato duradouro. É o que eu tava pensando, e o Celso concordar com a troca de empresa, porque ela vai durar. Ou até a APPA voltar, né? Porque tá tendo boato de que ela volta, ou vai lutar pra voltar. Agora o que você falou aí de perder direito é isso mesmo. Algumas coisas que recebiam, não vai receber mais. E em relação com insalubridade, que é um ambiente contagioso, ambiente hospitalar… O técnico de segurança do trabalho, lá no treinamento, começou a falar de segurança, de luva, uniformes e lá não sei das quantas. E aí a gente perguntou da nossa insalubridade, porque a gente é lá da Faculdade de Ciências Médicas (FCM), né? Aí ele não deu uma certeza que iríamos receber. Eu disse ‘a gente tem que receber insalubridade, uma hora eu achei um rato vivo, de laboratório, dentro do lixo. Teve colega que furou a mão já, a gente mexe com lixo infectante. Essa luva não é eficaz, é aquela de borrachinha, tu sua e fica grudando na tua mão’. Aí ele foi sarcástico, ficou rindo, dizendo que é pra gente ler como funciona o adicional de insalubridade. Disse que aí nos lixos se acha rato de esgoto, se bobear acha até feto. Mas onde a gente trabalha é com um lixo hospitalar. A UERJ é uma faculdade comum, mas a nossa área não tem em experimentos, a nossa área tem parte de corpos. Se for lá no ‘freezer’, tem partes de corpos congelados. Isso ele vai lá olhar. Eu queria que ele fosse na FCM olhar. Na verdade ele tirou a gente de burro, né?, não levou em conta o que a gente fala. Porra, ele saber mais do que eu sobre meu trabalho? Como que a gente não sabe como é pra defender os nossos direitos? Se essa insalubridade não vier agora, eu acho que não vem mais. É o que eu falo, Zé, eles não tão nem aí. Agora, se eu ver ele na [Faculdade de] Ciências Médicas, eu vou falar com ele: ‘já que você tá do nosso lado, bota aí a nossa insalubridade’. Eu não tô errada.”

Sobre a alegação da funcionária de que a Verde Gestão e a Magna Vigilância (atual “Conquista”) atuarem como parceria ou a possibilidade de serem uma empresa só, eu não encontrei comprovações. Mas em mais de um caso elas atuaram juntas, como no caso de lavagem de 361,8 milhões de reais com a gestão ligada ao empresário Edson Torres, caso que levou ao afastamento do ex-governador Wilson Witzel (PSC). Mas essas empresas ainda se mantêm em atividade até hoje no governo Cláudio Castro (PL), prestando serviços e fornecendo trabalhadores para a Secretaria Estadual de Educação (SEEDUC), o Departamento de Trânsito (Detran-RJ), o Departamento de Estradas de Rodagem (DER), a Fundação de Apoio à Escola Técnica (FAETEC), além da UERJ. Durante os contratos com as duas últimas, o Portal da Transparência mostrava em aberto e sem licitação. Isso foi em 2021, quando ocorreram os escândalos e a UERJ declarou que não renovaria contratos com essas empresas. Porém, aqui estamos, com uma nova reitoria renovando contratos com empresas envolvidas em corrupção. Essa mesma que foi eleita com discurso contrário à anterior, que também teve envolvimentos e teve o Ministério Público e o Tribunal de Contas do Estado investigando.

Se esse material começou como apresentação de relatos de terceirizados e buscando formas de resistência e solidariedades possíveis que possam reduzir a exploração e assédio moral contra esses trabalhadores, é possível pensar em como a situação de trabalho específica envolve toda a UERJ e seu funcionamento. Qual a seria a ação possível diante disso? Mobilizar contra a corrupção que envolve as empresas terceirizadas? Mas já sabemos que envolve toda a estrutura da UERJ e seus gestores. Ou uma solidariedade desde abaixo, que construa uma rede de apoio, divulgando denúncias e métodos de organização? Essa lição sobre como é o funcionamento despótico da gestão capitalista pode servir para entender que a luta contra a corrupção gerada por empresas envolvidas com verbas públicas, não é algo moral, mas uma tendência gerada em torno da suposta eficiência que envolve as terceirizações.

 

 

 

1 COMENTÁRIO

  1. Obrigado por esse trabalho e por compartilhar mais essa experiência direta de enquete com trabalhadores.

    Hoje recebi a mensagem abaixo… No Brasil o STF tem acabado de fato com o Direito do Trabalho, e esse monte de mídias progressistas focam nas fofocas palacianas e agem praticamente como se não existisse mais trabalhador no mundo.

    “Bom dia, turma! O STF pautou a reclamação constitucional da RAPPI para ir ao plenário do STF no próximo dia 08/02/24. Se decidirem, em reclamação constitucional, que o trabalho por meio de aplicativos tem natureza civil ou comercial e, com isto, retirar a competência da Justiça do Trabalho, teremos uma avalanche de processos que irão da JT para a Justiça Comum e isto não se limitará aos casos das empresas de aplicativos. Em várias áreas da economia, empresas têm adotado o trabalho flexível para afastar a natureza trabalhista do vínculo contratual ou determinado aos trabalhadores que constituam MEI (pejotização). A decisão do STF terá efeito cascata de retirada de direitos trabalhistas e perdas enormes com o não recolhimento do FGTS, contribuições previdenciárias etc. Não é exagero dizer que caminharemos para o fim do Direito do Trabalho ou, na melhor das hipóteses, para a sua existência como residual. Quem acompanha as decisões do STF, antes mesmo da Reforma Trabalhista de 2017, sabe que é disto que se trata: retirada da proteção constitucional e legal do trabalho e dos trabalhadores. É preciso se mexer… Urgentemente.”

    Uma matéria sobre isso: https://revistaforum.com.br/politica/2023/12/18/decises-do-stf-indicam-fim-da-carteira-de-trabalho-dos-direitos-trabalhistas-no-brasil-149671.html

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