"A vítima", Balthus, 1938

Não é surpreendente que setores do Estado empreendam ações que parecem ser progressistas na tentativa de superação da oposição agressor-homem e vítima-mulher, enquanto coletivos feministas e libertários insistem na naturalização deste binômio? Por Suellen e Simone

Enquanto a esquerda discute o machismo e o seu combate a partir de uma perspectiva de certo feminismo, a que reforça a vitimização feminina, e enfatiza a exclusão masculina como método, curiosamente, o terceiro setor, ONGs, institutos e profissionais de saúde têm apresentado propostas e realizado práticas de superação de violências, por meio de ações reflexivo-educativas.

Crianças, Balthus, 1937

Práticas como grupos de discussão para homens e a elaboração de uma política de saúde para o homem, baseadas na compreensão segundo a qual faz-se necessário modificar comportamentos masculinos construídos desde a infância, nas brincadeiras, nos espaços de socialização, esportes e todas as esferas simbólicas, são algumas das ações que instituições estão realizando para lidar com homens autores de violências contra mulheres.

Não é surpreendente que setores do Estado empreendam ações que parecem ser progressistas na tentativa de superação da oposição agressor-homem e vítima-mulher, enquanto coletivos feministas e libertários insistem na naturalização deste binômio?

Heleieth Saffioti já alertava que todos percebem que a vítima precisa de ajuda, mas poucos veem esta necessidade para o agressor. As duas partes precisam de auxílio para promover a transformação da relação violenta. A violência não é fenômeno individual. E certa esquerda que, acreditamos, poderia, além de sonhar, contribuir para desconstruções de velhas relações de dominação, ultimamente tem demostrado ser incapaz de construir novas práticas, na medida em que naturaliza relações que são eminentemente sociais.

Estaríamos todas nós falando em combate ao machismo em favor de uma outra sociedade, com relações isonômicas ou, antes, afirmando velhas relações de poder, só que agora com a inversão dos polos e reproduzindo as relações de mando-obediência?

“O medo de fantasmas”, Balthus, 1933

Ao lidar com situações de machismo quase diárias e ter de presenciar alguém próxima agredida, a criminalização do agressor se torna o caminho mais rápido quando é necessário prestar solidariedade imediata e aliviar a consciência ao resolver um caso isolado. No entanto, na sucessão de expulsões e escrachos que temos acompanhado no campo da esquerda autônoma, é visível a reprodução de práticas autoritárias, baseadas no julgamento unilateral da agredida. Tais práticas, além de circunscrever os homens ao papel “natural” de dominador, colocam as mulheres na condição igualmente “natural” de crianças, infantilizadas e fracas. As práticas autoritárias, contraditoriamente, afirmam o papel da mulher como vítima, portanto, subalterna, tal qual o patriarcalismo que, contraditoriamente, esse feminismo pretende combater.

Quais seriam os limites das expulsões e dos escrachos dos homens agressores para além dos grupúsculos de afinidades? O encarceramento? A pena de morte? Pedir mais Estado?

Não se trata aqui de referendar as ações empreendidas pelas ONGs, profissionais de saúde pública entre outros, mas, sim, de reconhecermos que há limites graves e profundos na atuação desses grupos de esquerda que se baseiam no método de exclusão sumária e linchamento político e subjetivo dos homens que cometeram algum tipo de agressão.

“A vítima”, Balthus, 1938

42 COMENTÁRIOS

  1. Sim, as práticas autoritárias do feminismo sectarista – e sinceramente, atualmente essa forma sufoca qualquer outra — reafirmam o papel subalterno das mulheres e mais, são essas práticas mesmas tutelares, o feminismo funciona ele próprio como uma nova forma de machismo sobre as mulheres, fundamentalmente “ensinando-as a conduzir-se”(o que em alguma medida pode ser aceito em situações específicas de vulnerabilidade feminina, que na maioria esmagadora das vezes não são outra coisa que vulnerabilidade econômica, e aí, a atuação é primordialmente “assistencial”, um socorro de guerra, a política refletida, entretanto, se dá para além do âmbito da emergência) .
    A recondução ao machismo pelo feminismo imposto, aliás, é evidente, porque não há como escapar dele a não ser resistindo à redução e a oposição dos gêneros, que é ideológica, o Outro inimigo é uma invenção do Capital.
    As pessoas menos preconceituosas, menos intolerantes e, portanto, as verdadeiras companheiras de luta não são as atingidas pelo preconceito nem as poupadas, mas, sim, as mais críticas, homens, mulheres, negros ou brancos, que tiveram o privilégio de alcançar um patamar satisfatório de politização. Na família, na escola, entre a mãe e o pai, o professor ou a professora, o menos machista não será necessariamente a mulher e muito menos quem articula o discurso feminista, frequentemente o que se fala é muito diferente daquilo que se faz. Testemunhei isso na minha vida pessoal e aprendi a igualdade de gêneros com uma pessoa que tinha em grande parte valores machistas e me ensinou a usar o corpo para lutar, a medir forças com meninos ou meninas, a conhecer jogos interessantes ao invés de brincar com bonecas, enfim a ousar e a amar a liberdade, enquanto que aquela que tinha o mais ostensivo discurso feminista me preparava para o casamento com um bom partido e me exibia como a mais bonita entre todas as meninas com laço de fita e graciosos vestidinhos, em suma, me ensinava a competir e a amar o prestígio social .
    Por fim, é preciso mencionar esse item particularmente infamante da tutela do feminismo vencedor: ao invés de entendermos que a superação do machismo é necessariamente histórica e que não virá de uma imposição por decreto, o que ocorre é que as mulheres se veem humilhadas pelos @s e xs que não passam de um consolo infantil, um escárnio que em nome do feminismo é imposto a qualquer infeliz do gênero feminino que detestaria ser alvo dessa pantomima. Tanto é assim que esses e outros mimos feministas que a sociedade é levada a nos conceder frequentemente são motivo de ostentação de um escroque qualquer que por trás deles mal esconde o que continua tão retrógrado quanto antes. É um ornamento, e ninguém é bobo de se deixar enganar, com ou sem clareza disso. Pode mudar alguma coisa no nosso imaginário? Pode, como tudo o que é contingente que atua no campo do meramente imprevisível. No plano da reflexão crítica, consequente, da qual depende a luta e a resistência ao fascismo, é um desserviço. E um deboche para uma autêntica revolucionária, para usar uma palavra que continua na nossa garganta.

  2. As feministas ortodoxas erram no exagero de escrachos e linchamentos públicos e em considerar que homens de direita e de esquerda são a mesma coisas…os homens de esquerda são machistas mas estão mais próximo do feminismo e são mais próximos da reconstrução, e superando a socialização machista. Estas feministas erram ao não construírem com os homens de esquerda,novas relações sociais. Os homens normalmente são excluídos dia debates sobre gênero. Infelizmente algumas justificam o triste termo Feminazi…não é com o fascismo, violência e autoritarismos que vamos vencer o patriarcado, sendo estes seus sustentáculos. Ja vi feministas espancarem um senhorvde 60 e gay apos reuniões de coletivo de luta famoso por ai..problematico isso ai..é a logica fascista do linchamento.

  3. Acredito que há uma mão dupla nessa questão. Se de um lado vemos um exacerbamento de escrachos públicos e expulsões, de outro lado, vemos uma resistência imensa na esquerda de escutarem as denúncias e discutirem de forma séria o machismo dentro das organizações e, muitas vezes, tentativas de colocar a questão [mesmo que internamente], já é posta a priori como tentativa de escracho.
    A questão notória para mim é: como quebrar de um lado o punitivismo crescente e, ao mesmo tempo, quebrar de outro o silenciamento sobre machismo na esquerda?

  4. E., acredito que o que o artigo propõe como uma via a se pensar e praticar na esquerda é o que as ONGs vêm praticando, como exposto no texto, adaptado à realidade de cada espaço.

    “Práticas como grupos de discussão para homens e a elaboração de uma política de saúde para o homem, baseadas na compreensão segundo a qual faz-se necessário modificar comportamentos masculinos construídos desde a infância, nas brincadeiras, nos espaços de socialização, esportes e todas as esferas simbólicas, são algumas das ações que instituições estão realizando para lidar com homens autores de violências contra mulheres.”

  5. E. toca num ponto fundamental e que senti falta no texto, aliás o texto toca em um ponto de extrema relevância para se discutir, mas quando começa a ser desenvolvido, ele acaba, deixando várias questões em aberto.

    Do modo como o texto está parece que há uma pré disposição na esquerda e nos agressores a se desenvolverem e aprofundarem nas questões de gênero,construindo novas relações que rompam com o binômio apresentado, o que não é verdade. Se de um lado há essa questão que o texto apresenta sobre a naturalização das relações, do outro há a recusa ao debate e ao enfrentamento deste tipo de questão na esquerda, que via de regra, só avança quando as minas insistem organizadamente na questão. O que se vê é principalmente um imobilismo e que me parece o texto ao não desenvolver melhor as contradições e dificuldade do enfrentamento do machismo na esquerda, acaba recaindo nisso. Se o escracho é de fato algo a ser evitado e no meu entendimento um recurso a ser usado em última instância a fim de garantir a segurança das mulheres, o que além disto pode ser criado? O que eu vejo nestes debates é sempre uma crítica e desconstrução e no lugar somente um vazio de medidas para lidar com esta situação, ou se muito, medidas ideais que ão no plano da consciência, mas que não dá conta de lidar com o caso concreto, o que em última instância recai no imobilismo, o que nem de perto avança no sentido de construção de novas relações, aliás, pelo contrário, beneficia a reprodução e perpetuação da mesma.

  6. Esse comentário da Karina é puramente demagógico e não leva a lugar algum. O texto critica o fato de certo feminismo, que se diz de esquerda ou mesmo libertário, se negar a problematizar a necessidade de amparo ao agressor, apontando para o fato de que o Estado e o terceiro setor estão mais avançados nesse sentido. Em outras palavras, o Estado e o terceiro setor têm sido mais humanitários do que uma parcela da esquerda. Sendo assim, constatar que a esquerda resiste em problematizar as agressões de gênero, como faz a Karina, é conduzir o debate a um círculo vicioso, tendo em vista tão somente demarcar uma posição. A conclusão a que podemos chegar é a seguinte: como a esquerda se recusa a problematizar as agressões de gênero, certas feministas optam por prosseguir uma política de extrema-direita no combate ao machismo no interior da esquerda, em nome de princípios libertários. A mesma esquerda que pretende abolir o Estado “empodera”, sobretudo pelo recurso ao punitivismo reacionário e pela exposição pública do agressor, que em pouco ou nada se difere da exposição pública de criminosos nos programas televisivos policiais.

  7. Um dos problemas em relação ao escracho fundador desse tipo de prática no Brasil, foi impedir a continuidade da reflexão feita no MPL-SP de como lidar com a desconstrução dessas agressões. Parte desse processo foi descrito aqui:
    “Diante da gravidade das atitudes do companheiro, gravidade que este mesmo reconhece, o Movimento colocou condições essenciais para seu retorno como militante: (1) o reconhecimento do seu erro, colocado não como um simples ‘pedido de desculpas’, mas dentro da perspectiva de gênero; e, mais importante que isso (2) – comprometimento de mudança de suas atitudes como parte do processo da retomada de confiança, sendo este processo gradual, conforme estas mudanças vão se mostrando nítidas nas suas práticas; e ainda (3) – a continuidade do tratamento psicológico que o mesmo iniciou aos cometer o machismo verbal e psicológico. Esse comprometimento de mudança não só foi assumido por ele como pelo próprio Movimento que se propôs a também cotidianamente rever-se.”

    Evidentemente, não foi um processo ideal e podem ser apontadas falhas, mas no atual contexto a própria discussão sobre isso foi banida da esquerda.

  8. O texto fala da exclusão e punição do homem que cometeu algum tipo de agressão, então um adendo: o mesmo acontece com o homem que sequer praticou alguma agressão. O homem já é agressor sem agredir, opressor sem oprimir, o que considero ainda mais grave.
    E pior, há ainda a exclusão e punição (do silêncio, do ostracismo) de mulheres que não concordam com essas ideias e prática.

  9. A questão colocada pela Heloísa Flores toca no ponto mais perigoso da biologização das opressões que o feminismo excludente opera, e que aproxima essa esquerda do fascismo. E digo aproxima pq penso nas feministas que defendem e colocam em prática as teorias do feminismo excludente (teoria dos privilégios, do empoderamento etc) de modo mais leve e em certo sentido ingênuo e bem-intencionado, pq as feministas excludentes convictas não estão próximas e sim submersas no fascismo.

  10. Acho importante nominar o feminismo que atua com esse tipo de prática, pois não são todos. Há, além do feminismo ligado à classe média acadêmica, que trabalha muito com escracho, um “feminismo” que combate inclusive as próprias feministas classistas – são as chamadas TERF’s.

  11. Totalmente contemplado pelo texto e alguns comentários, em especial o de Alex quando reforça que esse tipo de feminismo erra ao não propor a discussão e construção coletiva, portanto conjuntamente com os homens, de novas relações sociais. Se a opressão se dá na relação então só poderá ser superada na construção da nova relação, e não na imposição em “contra-corrente” da voz dos oprimidos antes silenciados. Os espaços exclusivos podem até ser importantes a depender dos casos concretos sendo combatidos (por exemplo haver um momento do enfrentamento em que um agressor não esteja presente é muito importante para que algumas mulheres tenha até mesmo a coragem de denunciar a questão, ou mesmo de entender o que está passando), mas não podem de maneira alguma ser os únicos espaços de debate e enfrentamento do problema do machismo. É muito problemático quem defende a primazia desses espaços e a exclusividade das mulheres (ou dos negros, se estivermos pensando a questão do racismo etc) enquanto quem sofre diretamente a opressão e que “portanto” é a única ou o único a poder lutar contra a opressão que “só ele sofre”. E o papo de que quem não sofre diretamente a opressão pode no máximo ser “apoiador” e nunca “protagonista” da luta também é uma bela armadilha que as feministas excludentes usam para legitimar sua posição de poder dentro das organizações pela via do silenciamento dos outros. Primeiro porque a luta não precisa ter e é bom que não tenha essa coisa hierárquica de quem é “protagonista” e quem não é, e muito menos um dirigente, seja homem ou mulher ou branco ou negro ou hetero ou o que for. E segundo que falar sobre o “absurdo que seria” um homem sendo protagonista de uma luta feminista não passa de argumento lógico conveniente para alguns, pois se isso chegasse a acontecer, o que é bastante improvável, e acho mesmo impossível, não haveria problema algum, já que se tal homem chegasse a tal “posição” ele não o teria feito via imposição e sim pq sua prática política logrou tal legitimidade na luta que o coletivo acabou escolhendo-o como legítimo porta voz da luta que trava conjuntamente. Mas isso, repito, se a luta estivesse organizada de uma forma não tão horizontal e ainda existisse essa coisa de dirigente e de “protagonista” e mesmo de “porta-voz”. Ora, o protagonista da luta é quem está lutando, ombro a ombro. Isso devia ser o essencial a se valorizar: o ombro a ombro, e não a biologia. Como se tivéssemos excesso de militantes e pudéssemos nos dar esse luxo de “proibir” alguns de lutar por tal ou qual questão, ou de “continuar a lutar”, no caso dos que são escraxados e expulsos de suas organizações por terem feito nalgum momento uma prática machista ou que são isolados por conta de terem se posicionado contra a visão hegemônica da questão dentro da organização. E aí lembro o que comentou a Heloísa. Soube, por exemplo, de negras isoladas de seus coletivos anti-racistas porque ficaram com brancos. Ou de mulheres que são isoladas e sofrem trashing por querer trazer pro debate a questão de classe e os problemas de certas práticas do feminismo excludente. Aliás isso me lembra o excelente texto da Jo Freeman, de 1976, mas mais atual que nunca: http://passapalavra.info/2014/12/101362.

  12. Talvez o difícil de enxergar (e admitir) seja que o “monstro”, o opressor, o “fascista-coxinha” não é produto apenas da direita mais reacionária, alienada e da mídia manipuladora, mas também pode estar presente em cada um de nós e se reproduzir e fortalecer pelas ações que pretensamente pretendiam combatê-lo.

    Abaixo colo o link (e algumas passagens em aspas) de um artigo que, numa outra matriz – a do direito penal – lança luz aos mesmos caminhos tortuosos que tem levado os movimentos sociais (de direitos humanos; libertários; de esquerda; progressistas etc.) a reforçar a lógica e estrutura punitiva do Estado.

    Os paradoxais desejos punitivos de ativistas e movimentos feministas

    POR MARIA LUCIA KARAM

    http://justificando.com/2015/03/13/os-paradoxais-desejos-punitivos-de-ativistas-e-movimentos-feministas/

    “A brasileira lei 11340/2006, assim como sua inspiradora espanhola Ley Orgánica 1/2004 e leis de outros países igualmente centradas na opção criminalizadora, constitui mais um lamentável exemplo da cega adesão de movimentos feministas ao sistema penal; mais um exemplo de seu paradoxal entusiasmo pela punição.”

    “A adesão ao sistema penal e o entusiasmo pela punição vêm de longe. Já há algum tempo, uma significativa porção de ativistas e movimentos feministas, bem como outros ativistas e movimentos de direitos humanos, têm se feito corresponsáveis pela desmedida expansão do poder punitivo, globalmente registrada a partir das últimas décadas do século XX. Movidos pelo desejo de punir seus apontados ‘inimigos’, têm contribuído decisivamente para o maior rigor penal que se faz acompanhar exatamente pela crescente supressão de direitos humanos fundamentais; pela sistemática violação a princípios garantidores inscritos nas normas assentadas nas declarações internacionais de direitos e constituições democráticas; pela intensificação da violência, dos danos e das dores inerentes ao exercício do poder punitivo.

    O desejo punitivo acaba por cegar seus adeptos e adeptas. Ativistas e movimentos feministas que aplaudem e reivindicam o rigor penal contra os que apontam como responsáveis por violências contra mulheres, acabam por paradoxalmente reafirmar a ideologia patriarcal.”

    “Ativistas e movimentos feministas, como outros ativistas e movimentos de direitos humanos, argumentam que as leis penais criminalizadoras têm uma natureza simbólica e uma função comunicadora de que determinadas condutas não são socialmente aceitáveis ou são publicamente condenáveis. Não parecem perceber ou talvez não se importem com o fato de que leis ou quaisquer outras manifestações simbólicas – como explicita o próprio adjetivo ‘simbólico’ – não têm efeitos reais. Leis simbólicas não tocam nas origens, nas estruturas e nos mecanismos produtores de qualquer problema social.

    O apelo à natureza simbólica e à função comunicadora das leis penais criminalizadoras é a mais recente tentativa de legitimar o falido, violento, danoso e doloroso poder do estado de punir.”

  13. Desconhecia as tais das TERF’s (fiquei assustada com o que li). Mas infelizmente o único contato com feminismo classista não excludente que tive até agora foi com grupos feministas comunistas.
    Mesmo entre as feministas bem intencionadas, que não compactuam com a ideologia de ódio indiscriminado ao homem, eu vejo esses equívocos.

  14. O começo do texto é ridiculo por sí só!
    apesar de achar a disposição das que tem esta prática mais pedagógica boa, não há como negar, a violência machista está no âmbito das relações de poder e não de educação.
    Machos batem, usam, abusam e estupram mulheres não é porque eles estão programado pra isso, é porque eles têm vantagens e se valem da reprodução destes valores.

    Típico texto machista dizendo pras feministas como elas devem se comportar.

    Como o ativismo libertário lida, por exemplo, com crimes cometidos por policiais? vão agora querer abrir uma ong pra construir uma polícia menos repressora? me poupe!

  15. TERF’s ou RadFem são a mesma vertente de feminismo – que se colocam enquanto radicais, mas caem no ganguismo e atacam as transsexuais e as travestis [acreditam que elas foram socializadas como homens, portanto são homens e agressores], atacam as feministas classistas [já fizeram a página Feminismo sem Demagogia – ligada à militantes do PSTU – fecharem a página], trabalham com trashing, printando páginas de feministas para desmoralizá-las.
    Há um embate grande, muito grande dentro do feminismo em relação à essa vertente e à expansão de influências que ela vem tendo.
    Elas defendem em um aspecto amplo o uso de escracho enquanto forma de luta.
    Envio um texto da Judith Oor, do Socialist Review, sobre marxismo e feminismo. Com críticas aos dois lados.

    http://www.pucsp.br/neils/downloads/12-judith-orr.pdf

    Agora, há menos de uma hora, uma página feminista do Facebook [Moça, você é machista], enviou um recado para as Rad.

    Galera Radfem que por acaso esteja na página por engano. Conta pra gente se a luta de vcs é:
    a) provar que trans não são mulheres e não cabem no movimento
    b) tirar do movimento homens que fingem ser mulheres ( essa é o fim de todo resto) e que isso preocupa mais que as milhares de mortes das trans no Brasil
    c) Reduzir a mulher à uma vagina, assim como fazem os machistas
    d) Ditar regras jurando que vamos obedecer
    e) Lutar de vdd pelo fim da violência causada pelo machismo, incluindo a violencia contra mulheres trans
    f) promover um movimento de fundo fascista pra provar que são mais mulheres do que categorias historicamente excluídas…

  16. Em poucas linhas o comentário assinado Bete recai nmum sem número de lugares-comuns da prática das feministas excludentes: na falta de argumentos, acusações vazias “texto ridículo” e “texto machista” e, pra variar, o uso do sarcasmo enquanto tempero preferido de quem não tem argumento. Não bastasse, uma frase que a autora não nota ser autocontraditória: os homens, aliás, os “machos” não são “programados”, mas “tem vantagens”. A violência machista está “nas relações de poder”, mas um texto defendendo a mudança das relações de poder é visto como “ridículo” e “machista”. E o texto, que critica o tipo de feminismo que impõe autoritariamente o que é “feminismo” e o que não é (isolando, reprimindo e expulsando quem pensa diferente), é acusado de querer “dizer pras feministas como elas devem se comportar”. Por fim, tal como todos que não tem argumento, faz uma caricatura do argumento do texto, insinuando sarcasticamente a questão da ong e da polícia menos repressora, como se a defesa da superação conjunta do machismo por homens e mulheres, na instituição de novas relações sociais fundadas na autocrítica coletiva de atos e formas de combate ao machismo, fosse o mesmo de criar uma ong pra apassivar a PM.
    Nos poupe!

  17. Mas devo dizer que acho extremamente complicado chamar feministas de feminazis, assim como colocar que os debates feministas são biologizantes, quando, na verdade, são sociais, são constructos históricos.
    Também gostaria de colocar que o “empoderamento” tão criticado, nada mais é do que a consciência por parte das mulheres de que são sujeitos políticos.
    Por fim, encerrando minha participação e querendo ainda expor sobre machismo na esquerda, utilizo de um trecho da Saffioti, em seu livro “A Mulher na Sociedade de Classes” sobre como machistas na esquerda são traidores da classe trabalhadora.
    Insisto que esse debate é de mão dupla.

    “[…] o domínio masculino sobre as mulheres, não diretamente vinculado à estrutura econômica da sociedade, acaba por servir aos interesses daqueles que detêm o poder econômico. Os homens da classe dominada funcionam, pois, como mediadores no processo de marginalização das mulheres de sua mesma classe da estrutura ocupacional, facilitando a realização dos interesses daqueles que na estrutura de classes ocupam uma posição oposta à sua […]” (p 123)

  18. Eu realmente gostaria de ver exemplos concretos ou ao menos um horizonte em como lidar com esta questão. Legume fez alguns apontamentos bem interessantes no caso do MPL-SP. Mas ainda tem suas limitações ai e que é uma pena que não consta no texto.

    Neste processo de “reclusão” do agressor como fica a vítima? Tanto no sentido de uma segurança física, pois o agressor pode sim atacar novamente tanto na questão psicológica, em ter que continuar convivendo com seu agressor, o que tende a afastá-la dos espaços. É o que se vê quando os grupos e indivíduos não rompem com agressores, as vítimas, pessoas solidárias a ela, e mulheres que possuem medo do agressor deixando de ir em reuniões, manifestações, festas, etc, por conta da presença do agressor. E isso, meus caros, não tem é nada de libertário.

    Além disto, há uma idealização de que o machista de esquerda, busca deixar de sê-lo, os inúmeros casos de denúncias públicas mostram que isso é a mais pura mentira. Pegamos casos famosos como as acusações ao Latuff e ao Idelberg, o que se vê na maioria dos casos é a negação sumária de comportamentos machistas e acusações a feministas de extremistas e afins. Nos casos em que já vi que há uma mea culpa, é quando o acusado tem algo a perder, como a expulsão de um grupo.

    Por fim, constantemente em coletivos que não tem pauta de gênero, estas questões são acusadas de estarem mudando o foco do coletivo, de estarem atrapalhando a luta de classes, enfraquecendo o movimento e afim. Oras, um processo concomitante de cuidado com a vítima e tratamento com o agressor demandaria muuuuito mais tempo e energia, será mesmo que há esta disposição nos grupos de esquerda?

    Faço as questões pra ver se o debate sobre feminismo por aqui vai pra um rumo diferente do que o de sempre, em que o que se vê é predominantemente um monte de cara doido pra bater no feminismo, sem se dar ao luxo de pensar em meios de combater o machismo na esquerda, em construir espaços mais seguros para mulheres na militância e sem nenhum horizonte concreto a oferecer.

  19. O que o feminismo diz de si mesmo não é ponto pacífico,isto é, que ele é a luta em favor das mulheres. Já a luta “das mulheres” ele não pode ser mesmo porque está muito longe de ser legitimado por “todas elas”, pelo despropósito dessa ideia já se vê que há problema aí. A polêmica em relação ao feminismo começa bem antes do que ele afirma de si mesmo, o feminismo é acusado de ser uma forma indireta de machismo, por homens e mulheres que, no mínimo, consideram a sua redução de gênero ideológica. Que autoevidência é esta dos seus próprios princípios? Repito, por acaso todo o gênero feminino considera o movimento legítimo? Ou será que automaticamente toda mulher que repudia o movimento é incapaz e cega? Mais ainda que qualquer companheiro eu, como mulher, me sinto desacatada pelo machismo do movimento feminista. A posição que o feminismo se arroga está sob suspeita, é preciso parar de escamotear isso. O movimento é autoritário e funciona patriarcalmente, humilha e envergonha as mulheres, é uma forma de fascismo e disputa do poder, não vai contra mas, sim, a favor do statu quo e do patriarcalismo. Qual é o movimento que acima da minha própria consciência deve dizer quais são os meus interesses? Devo abdicar da minha autonomia em favor de um movimento que zela melhor por ela? O feminismo é machismo e sua pretensão de falar pelo gênero feminino é espúria!
    É isso que está em questão e é isso que está sendo escamoteado pelo movimento. A única forma admissível de “feminismo” é assistencial, não há política refletida aí.

  20. Karina,
    Considero que as organizações e movimentos sociais da esquerda devem estar voltados para um diálogo com a sociedade e não apenas com aqueles que já são os nossos pares. O machismo existe dentro dos nossos meios e fora deles, consideramos ele danoso para as relações sociais, opressivo e consideramos que ele precisa ser combatido. Quais as estratégias que temos para combater este machismo? Neste momento na esquerda tem predominado a tática da exclusão daqueles considerados machistas; essa tática só teria sentido se pensássemos estes movimentos como isolados da sociedade. Mas se assim fossem também não seriam eficazes no combate ao machismo, por ser esse um fenômeno social.
    Talvez por isso algumas ongs e programas governamentais tenham avançado mais nisso do que nós, pois o trabalho de atendimento de saúde exige que se lide com realidades mais complexas do que as pretendidas pelos grupos de esquerda, por isso requerem ações práticas que levem em conta os diferentes contextos que a violência machista foi cometida.

  21. Em toda a sua argumentação, Karina, você parte do mesmo princípio, justamente aquele criticado pelas autoras: homens são agressores e mulheres são vítimas. O texto adota outra perspectiva: homens agressores também são vítimas e também precisam de amparo.

    Cada caso concreto deve ser tratado separadamente e as pessoas devem avaliar se o agressor representa de fato um risco à integridade física da vítima, e também em que medida a sua presença é causadora de sofrimento psicológico. E é óbvio que isso deve passar pela consulta da própria vítima.

    Um companheiro que gritou com uma companheira durante uma reunião é um risco permanente à integridade física dessa companheira, e também causador permanente de sofrimento psicológico? Pessoas já foram expulsas aqui e ali por bem menos (como se pode conferir aqui: http://passapalavra.info/2014/08/98495). Enfim, cada caso concreto deve ser tratado separadamente.

    Mas eu gostaria de refletir um pouco mais sobre a questão do sofrimento psicológico decorrente da convivência com um agressor: sempre vemos esse argumento ser utilizado por certas feministas para legitimar a exclusão de homens agressores das organizações de esquerda, mas nunca vemos essas mesmas feministas problematizarem o sofrimento psicológico decorrente da convivência com outras mulheres no próprio movimento feminista, como apontado por Jo Freeman (aqui: http://passapalavra.info/2014/12/101362). Parece que a oposição homem-agressor / mulher-vítima reproduz-se também aí: homem-causador de sofrimento psicológico / mulher-vítima de sofrimento psicológico. Não existe mulher-causadora de sofrimento psicológico nem homem-vítima de sofrimento psicológico.

    Sobre o afastamento de mulheres da luta pelas razões que você levanta: será que não é preciso avaliar também quantos homens afastaram-se da luta por causa da atuação das feministas excludentes? Andando pelo campus da UFRJ de Praia Vermelha, é possível ler por toda parte, em pichações nas paredes, a frase “Vou cortar sua pica! – Coletivo Mulheres”. Penso que o mesmo ocorre também em outros lugares. Acho necessário avaliar em que medida esse tipo de feminismo intimida e afasta militantes homens.

    Além do mais, você se queixa de que as questões de gênero são marginalizadas nos coletivos que não têm “pauta de gênero”. Ora, as mesmas feministas que se queixam disso são aquelas que pretendem limitar e subalternizar a participação masculina nas discussões e na luta feminista, sob o argumento de que os homens vão roubar o protagonismo da luta. Eu, particularmente, pretendo lutar numa luta sem protagonistas. Para que os homens se engagem realmente na luta feminista eles precisam poder participar realmente da luta feminista.

    E, se a esquerda no passado e ainda hoje marginaliza a luta feminista, o que vemos atualmente são certas feministas proclamarem abertamente que não haverá luta se a luta não for feminista, o que significa dizer que não haverá luta se as práticas feministas excludentes não puderem ser institucionalizadas por toda parte. Além do mais, com a difusão massiva do ideário pós-moderno e multiculturalista atualmente, fica fácil jogar a luta de classes na lata do lixo em prol das lutas identitárias.

    Enfim, Karina, você só pretende demarcar uma posição novamente: a menos que lhe apontem uma fórmula pronta (e mágica) para colocar em prática um tratamento mais humanitário da questão, você continuará a justificar as práticas feministas excludentes, que a meu ver estão longe de ser de esquerda.

  22. Outra coisa preocupante é a redução do feminismo à defensiva de agressões (que às vezes ainda nem aconteceram). E é importantíssimo um espaço de proteção à mulher agredida e, sinceramente, só vejo isso acontecer materialmente, para todas as mulheres, não só para militantes, através de programas do Estado.
    Mas quando se reduz o movimento a essa defensiva, ao medo, à pre-conceituação do ‘macho’ como agressor, não há defesa alguma, há ataque e exclusão. há o impedimento da ressocialização entre homens e mulheres, portanto, da efetiva igualdade e emancipação sexuais. há hostilidade. você constrói um muro onde o outro é o inimigo antes de sê-lo. é fascismo. e é propaganda. controle pelo medo. o homem pode estuprar, é preciso ser marginalizado. o islâmico pode ser terrorista, tema cidadão norte-americano! “homens estão programados para a agressão”, palestinos estão programados pra serem terroristas, os negros estão programados para serem bandidos e por aí vai.

    imaginem Orwell escrevendo uma distopia feminazi.
    (uso o termo feminazi sim, depois que li sobre essas TERF)

  23. Para se pensar o que fazer, é necessário saber o que não se deve fazer. Se afirmar algo é em si a negação do resto, me parece que ir negando o que não se deve fazer é parte da afirmação do algo novo. Só não vê isso quem ao invés de discutir ideias tem dogmas a defender. E os dogmáticos são o principal entrave ao avanço neste debate.

    O pragmatismo estreito e restritivo, consequência do dogma, é parte importante do problema. A afirmação da suposta eficácia imediata do escracho (que opera como o monstro da lenda, assustando crianças que não ousam ir além dos seus medos), desconsidera as consequências históricas da adoção de práticas punitivistas, que passam, dentre outras coisas, pela naturalização da barbárie, da lei do mais forte enquanto método político. E assim se cria um movimento que opera na lógica do fogo aos inimigos, solidariedade aos pares e achaque aos dissidentes. Qual é a diferença disso com o que se pretende combater mesmo?

  24. Peguemos o “caso” Latuff, como diz Karina.

    Latuff virou “caso”.

    Charlie Hebdo virou “caso” de racismo para a esquerda também.

    Difícil achar que certas posições possam ser conciliadas.

    Latuff virou “caso” porque fez uma charge criticando o tipo de feminismo que tem sido criticado pra alguns e algumas nesses comentários. Latuff virou “caso” pelo que ele pensa, por usar a crítica, aliás, como faz com o sionismo, e os sionistas o transformam assim em antissemita.

    Se Stalin é a encarnação do comunismo, quem não pensa como ele só pode ser contrarrevolucionário. A mesma lógica segue: a “feminista” que se acha a encarnação do “anti-machismo” considera que quem não pensa como ela é logicamente machista. Então Latuff virou “caso”.

    O Passa Palavra já deve ter virado caso também, já que já li por aí que se trata de um site “machista”.

  25. Legume, mas ai são questões para além do feminismo. Relaciona-se com os grupelhos autônomos hoje existentes, o que por conta disto dificulta seu alcance e atividades para além de si mesmo, na inserção social destes grupos, e na dinâmica interna do mesmo. Uma coisa é o debate de como combater o machismo dentro da esquerda, o que embora obviamente é social, não deve ser debatido como fenômeno isolado, tampouco suas medidas devem ser restritas ao grupo, mas o combate ao machismo na esquerda, implica medidas e debates específicos, uma vez que a dinâmica destes é específica e ao que me parece o foco do texto é pensando nessa dinâmica dentro dos espaços de militância, por isso minha questões foram específicas desse espaço.

    Rodrigo, sobre o não fazer é só isso mesmo que vejo, inúmeras reflexões sobre isto e poucas sobre alternativas. Escracho não, expulsão não, denúncias públicas não, não sei o que não… E enquanto isto os casos concretos estão acontecendo e se as medidas hoje existentes são apontadas todas como autoritárias e não sei mais oq e nenhuma outra alternativa é apresentada o que se tem concretamente é um vazio de medidas, é imobilismo, e isso sim é autoritário.

    Léo Vinicius, ao que parece você não acompanhou o caso Latuff, caso tivesse, saberia do post do mesmo sobre feministas e a sua suposta inveja do pênis.

  26. O referido post do Latuff encontra-se aqui: https://www.facebook.com/photo.php?fbid=538028222967013&set=gm.771723492904402&type=1&theater

    O cartum que gerou revolta é este: https://imprensafeminista.files.wordpress.com/2015/01/b4goohmiqaacgyu.png

    Outro cartum gerador de polêmicas foi este: http://41.media.tumblr.com/0ce9242d462a3659aaa1c8463c1a41aa/tumblr_nit76b6lGH1qeafm6o1_1280.png

    No entanto, cartuns como este não geram polêmicas, aparentemente: https://scontent-atl.xx.fbcdn.net/hphotos-xap1/v/t1.0-9/11174946_10152950819123752_1547418236053874608_n.jpg?oh=c70e8e5f0a4a8302260db11dfcb9d696&oe=55D481EB

    Quer dizer, estamos falando em superação de práticas machistas na esquerda e na sociedade e o que realmente incomoda é a postagem de um cartunista de esquerda no Facebook. Talvez porque a esquerda venha se iludindo com a possibilidade de fazer ativismo nas redes sociais e com a relevância dada atualmente ao discurso e ao “poder simbólico” nas relações concretas. Mas, como bem colocado num texto compartilhado acima por @!ex, o simbólico não tem efeitos reais.

  27. Por motivos desconhecidos Karina ignora as medidas apresentadas pelo texto e por motivos que não ficam claros também ignora as experiências e proposições levantadas por Legume no combate ao machismo. Não há uma ponderação sequer sobre as potencialidades e limites de tais propostas, somente uma desqualificação genérica. Só queria fazer notar que o medo e a urgência são também manipuladas para imposição de leis de controle e restrição das liberdades individuais e coletivas, liberdades conquistadas as duras penas pelo suor e sangue de muita gente pelo tempo. Ninguém aqui nega que exista machismo no mundo e na esquerda. A questão é sobre não usar um remédio que deixa o paciente mais doente que a própria doença.

  28. O que alguns aqui estão construindo argumentativamente para não serem criticados por certas atitudes perdeu a linha do bom senso faz dias.

    O ponto é mais simples do que parece:
    Um escravo sofre com a chibata, alguns patrões abolicionistas não querem mais bater tão forte, por vezes o fazem, mas querem curtir a mudança junto com os quilombolas. O movimento negro o ridiculariza por tais condutas no intuito de reforçar sua posição de oprimido justamente para desconstruí-la, escancarando-a. Diz que podem construir novas relações, mas possuem outros pontos de partida na sua atuação.

    O patriarcado é uma estrutura maior que impede que o sofrimento do opressor seja posto ao patamar da oprimida. Evidente que há excessos, evidente que se deve atentar para a fortificação do punitivismo enquanto forma de combate alimentando o temerário poder de punir do Estado e, portanto, da classe dominante, mas isso não torna errado o escracho. Ele é revolta, indignação, o irromper de um grito historicamente silenciado que é contra nós, homens, porque sim, somos opressores ainda que, enquanto comprometidos com a mudança social à uma perspectiva da esquerda, não queiramos mais o fazer. Ocorre que nós, pela questão de gênero, sim temos motivos para não querer desconstruir o machismo da maneira que as feministas o reivindicam porque é uma estrutura que nos dá vantagens sociais ainda que sustentemos sua refutação. Elas existem, nos são impostas e nos beneficiamos delas, ainda que indiretamente. Da mesma forma os abolicionistas brancos, proprietários de terras, privilegiados pela organização vigente, ainda querendo modificá-la, possuíam outro local de atuação na luta contra a escravidão, devemos admitir o não protagonismo nesse processo, justamente para fortalecê-lo. Por fim, sobre os escrachos, é lamentável que aconteçam de forma exacerbada e injusta por muitas vezes, mas, como todo processo revolucionário, se dá enquanto estratégia de difusão da ideia escancarando as conexões entre, discursos, práticas, piadas e violências, bem como transmitindo uma sensação de controle, de que as injustiças cometidas contra às mulheres estão sendo vistas e combatidas. Enquanto houver opressão será necessária a diferenciação entre quem a pratica e quem a sofre.

  29. Camaradas,

    Diante da dificuldade de reflexão e do imobilismo da razão que presenciamos no campo da Esquerda autônoma, especialmente no que se refere ao tema do machismo nos dias atuais, deve-se considerar as razões daqueles e daquelas que se cansaram de discutir, e se retiraram deste debate. Mas a lacuna deixada certamente abre espaço para aqueles e aquelas que vociferam um conjunto de ideias como se fossem unânimes e se pretendem uníssonas no amplo espectro do feminismo.

    O feminismo não é e nem será um ideário da vertente biologizante e exclusivista.

    O feminismo é um campo aberto de luta. E é um campo de luta de todas as indentidades de gênero!

    Não estamos e não queremos oferecer qualquer fórmula e nem respostas para as encruzilhadas impostas à Esquerda pelo multiculturalismo, quando se reafirmam as identidades em detrimento de todas a intersecções socioeconômicas.

    Em nenhum lugar deste texto, nem deste site até hoje, se afirmou que não há machismo na Esquerda. Como também não há no texto nenhuma passagem que ignore a existência de agressões contra mulheres dentro e fora da Esquerda!

    Karina e E. tocaram em pontos importantes aqui para o debate. Mas, quando Karina expõe sua insatisfação sobre o debate que estaria indicando “o que não fazer”, segundo suas palavras, revela ansiedade para que sejamos nós a indicar o que deve ser feito. Só que não pretendemos apresentar aqui nenhuma receita. Todavia, não é impertinente apresentarmos aqui o que consideramos equivocado no campo do feminismo atual.

    Desnecessário, mas não custa dizer: não ignoramos as agressões e o machismo na Esquerda e no mundo. Mas reconhecemos e queremos discutir aqui a pobreza do debate que ora segue quando a maioria dos coletivos autônomos têm limitado a pauta do feminismo a um único aspecto, o da expulsão e do escracho como método. Pior, quando essa pauta limitada parece ser hegemônica.

    Se imputamos à Esquerda a tarefa histórica de erradicar as agressões contra mulheres e o machismo, devemos exigir dela que nos revele quem são estas mulheres, da Esquerda, que têm sido diuturnamente agredidas pelos machistas militantes! Qual a sua classe social, qual o seu grau de escolaridade e, principalmente, em quais relações de poder elas estão inseridas?
    Aquelas mulheres, as de fora do restrito mundo da esquerda, nós as conhecemos, sabemos onde moram, quais os tipos inúmeros de violências que sofrem, qual a sua classe social, seu nível de escolaridade e raça/etnia. Aliás, lidamos com elas, profissional e socialmente.

    Um caso: estudantes da Unesp ficaram revoltadas com um rapaz porque fez uma lista com os nomes de todas mulheres da faculdade que ele teria tido relações sexuais. As mulheres relacionadas ficaram furiosas e tentaram denunciar o episódio, pedindo ajuda a coletivos feministas. Para se defender, o sujeito teria afirmado que as feministas não podiam criticá-lo porque ele é um “lutador social”, da periferia etc.

    Perguntamos: as mulheres teriam ficado indignadas porque tiveram seus nomes relacionados na lista ou porque descobriram ter transado com uma pessoa escrota e sexista? Um sujeito é um “lutador social” porque se autodeclarou e daí, automaticamente, passa a ser considerado de Esquerda?

    Por vezes, estudantes do movimento estudantil ficam bravas porque, durante assembleias, quando não conseguem computar o mesmo tempo de fala do colega homem se sentem ofendidas e mobilizam coletivos para publicar cartas de repúdio. De que Esquerda estamos falando? Que agressões estamos falando?

    Sábado passado, em pronunciamento para a militância de um grande movimento social do campo na américa latina, o MST, o dirigente da nacional afirmou enfaticamente: “não podemos conviver nem aceitar que homens agridam as mulheres no nosso movimento”. As mulheres desse movimento são as que hoje engendram as lutas mais radicais no seu interior.
    Em alguns encontros de movimentos populares, identificamos nas cozinhas, cirandas, mutirões as tarefas sendo assumidas por mulheres e homens. Isto não seria o resultado de algum tipo de reflexão sobre o machismo na Esquerda?

    Vejamos o que essas mulheres falam aqui: https://www.youtube.com/watch?v=Ogbam2tvqW8

    Agora, se não pudermos refletir sobre as formas atuais de punição no âmbito da Esquerda hoje, poderemos nos contentar com ações como a que segue neste link?

    http://www.publico.pt/sociedade/noticia/video-de-13-minutos-de-rapaz-agredido-por-outros-jovens-gera-onda-de-indignacao-1695448

    Gostaríamos que, num debate sincero e fraterno, conseguíssemos refletir sobre o vazio e a fragmentação criada por este tipo de sociedade que formam mulheres e homens frágeis e dependentes emocionalmente; que fazem mulheres e homens se associarem por causa da posição social ou de poder exercido pelo pretendente amante na organização em que milita ou onde trabalha. “E transformar a tão custosa luta – o pessoal também é político – em manipulações de poder”.

    Continuemos a reflexão.

    Abraços,

    Suellen e Simone

  30. As conclusões de lucas são espetaculares: para que o oprimido possa desconstruir a opressão, ele deve escancará-la; e deve fazê-lo mesmo que o opressor esteja disposto a deixar de sê-lo colocando-se ao lado do oprimido. Quer dizer, é preciso evidenciar a opressão mesmo que artificialmente. Brilhante. Para lucas, também não é possível construir novas relações entre oprimidos e opressores, pois cada um parte de um lugar (de fala?) diferente. Como, então, pessoas que partiram de lugares diferentes aboliram a escravidão, e hoje um homem não pode ser legalmente considerado propriedade de outro pela sua cor de pele? Pois, se a escravidão era uma relação, os negros se libertaram porque os brancos deixaram de escravizá-los, não? Será que lucas não consegue pensar usando algo conhecido como lógica (existe a formal e a dialética, lucas, lembre-se disso)? Enfim, para lucas, os argumentos acima perderam a linha do bom senso (ou será que foi a linha do senso comum?), mas foi lucas quem perdeu o senso da razão e do ridículo. E finaliza, o genial lucas: “enquanto houver opressão será necessária a diferenciação entre quem a pratica e quem a sofre”. Enquanto houver opressão na esquerda, teremos que fazer a esquerda convergir com a extrema-direita?

  31. Suellen e Simone
    Vocês tocam em um ponto essencial mais uma vez, quando colocam que “O feminismo é um campo aberto de luta”. Quem tem sua fala feita dentro desse campo, sabe que isso é histórico, tanto entre as mais diversas perspectivas feministas, quanto entre feministas que estão em alguma organização e seus camaradas. Tomo como exemplo a Alexandra Kollontai e os debates que ela trazia à época sobre a exploração das mulheres e os debates que eram suscitados entre ela e seus camaradas.
    A questão é: há de se colocar algo no lugar dos escrachos e expulsões recorrentes. Mas o quê?
    Para isso, algumas questões são essenciais: uma é o feminismo estar ao lado das lutas sociais e se pensar nelas e não só em si mesmo; outra seria acabar com o vazio teórico e classista que se abate sobre os coletivos feministas [o texto da Judith Oor, que postei em um comentário acima traz algumas reflexões nesse sentido]; outra ainda seriam os coletivos saírem da perspectiva da autodefesa constante e,dentro dos coletivos e movimentos sociais termos pautas e conversas francas sobre machismo na esquerda e como superá-los, desconstruí-los e nos responsabilizarmos por ações opressoras, sem nos pautarmos por ações próprias da sociedade da punição em massa que vivemos.
    É, dentro da lógica da desconstrução do machismo na esquerda, coadunada à uma desconstrução da lógica punitivista pautada por diversos coletivos e grupos feministas que o caminho se mostra mais franco.
    E vejo que, quando os coletivos feministas se aproximam das lutas sociais, o punitivismo se desfaz, e observo isso de dentro, de um coletivo feminista que trabalha com frentes de luta, como a extinção da revista vexatória, o genocídio na periferia, a redução da maioridade penal, debates sobre feminismo em escolas, em presídios feminismos, etc.
    É desse lugar que falo e sei que quando as pautas não se fecham em nós, mas se abrem para a luta social como um todo, é que se desfaz esse debate besta, de correr atrás do próprio rabo, entre “esquerdomachos” x “feminazis”.
    Abraço

  32. Quando coloco “seria acabar com o vazio teórico e classista que se abate sobre os coletivos feministas” – estou querendo dizer sobre a falta de uma perspectiva classista. Creio que ficou meio confuso o jeito que escrevi.

  33. Quando a Karina diz que o que ela vê “nestes debates é sempre uma crítica e desconstrução e no lugar somente um vazio de medidas para lidar com esta situação”, ela reproduz um discurso com o qual nos deparamos frequentemente há algum tempo: o dos ditos Black Blocs que surgiram nas Jornadas de Junho de 2013.

    O argumento é semelhante: os ditos Black Blocs, tal como as/os feministas que defendem o método denúncia-exclusão-escracho, e tal como certa vertente do movimento negro, afirmam estar na linha de frente, seja do combate ao capitalismo/Estado (pela via da “ação direta”), seja do combate ao machismo/racismo etc. (pela via da denúncia-exclusão-escracho). O importante é agir e quem questiona a maneira de agir, como não participa da ação e não dá apoio, não tem o direito de criticar. Pior: quem questiona a maneira de agir, por não participar da ação e não dar apoio, é conivente ou colabora com o capitalismo/Estado/machismo/racismo etc. Ou participe e apoie, ou traga uma alternativa pronta e mágica, ou não questione.

    Só tem direito de questionar: (a) quem é mulher/quem é Blac Block/quem é negro etc.; (b) quem está na linha de frente do combate ao capitalismo/Estado/machismo/racismo etc., sendo que estar nessa linha de frente implica agir de uma maneira específica (“ação direta”/denúncia/exclusão/escracho/apoio aos espaços exclusivos identitários etc.); (c) quem apoia quem está nessa linha de frente (quem compartilha a postagem do ônibus em chamas, quem republica a denúncia de machismo contra o fulano da vez, quem apoia a “ação direta”, quem apoia os espaços exclusivos identitários, quem auxilia na propaganda do que tem sido feito e não questiona). Caso contrário, é jogar o jogo do inimigo/encarnar o inimigo/ser o próximo alvo dos que não são coniventes e estão agindo.

    O resultado prático é: como só pode questionar quem já participa de – ou apoia – uma dada ação, e como essas pessoas não vão questionar nada, já que já participam ou apoiam, ninguém pode questionar coisa alguma. Se questiona, está do lado de lá da barricada. É um círculo vicioso perfeito para perpetuar a prática hegemônica e neutralizar a prática dissidente. E isso, companheiros/as, não tem nada de libertário.

  34. O caso o escracho fundador é um bom exemplo. O agressor por fazer terapia e por sentir uma pressão dos seus pares em rever seu comportamento manifestava mudanças, claras. Além disso, vejo que o seu “amor pela militância” e sua vontade de voltar a frequentar os espaços deveria outro estimulo pra ele. Que depois que tomou o escracho sumiu de todos os círculos e quem sabe pode estar praticando outras agressões com outras mulheres não iniciadas no empoderamento feminista; mas pra que sororidade com elas né? Afinal, se esse agressor não esta mais no meu meio pra que me preocupar com outras agressões que ele pode cometer longe?
    Existem dois lados para ver a questão do machismo na esquerda: 1- prevenção a agressões e desconstrução do machismo estrutural nos homens e 2- medidas de responsabilização e reparação em caso de agressões já são cometidas.

    Sobre a prevenção e desconstrução cabe dizer que é suicídio político propor um espaço segura de debate para homens cis discutirem suas questões de gênero, e sim eles tem e muitas. Afinal o clima atual do movimento -vide o lema: vou cortar a sua pica – leva o homem não a se desconstruir mas a reprimir seus impulsos machistas o que os eleva, psicologicamente, a categorias mais perversas. Sendo assim uma boa proposta é a construção de espaço onde homens possas discutir suas questões de gênero como, por ex, a necessidade de ter um relacionamento ou de ficar com muitas pessoas, suas questões com potência ou impotência, sua dor com o fim de seus relacionamentos que terminam de forma conturbada, suas dificuldades histórias em se relacionar com mulheres ou até mesmo o seu medo das feministas. enfim discutir a tal das “male tears” né?
    Cabe ressaltar que esse espaço deve ser seguro. Mudanças de comportamento surgem de espaço seguro ou muito opressivos e acredito que espaços opressivos não devam ser uma opção, embora a frase “você já oprimiu um omi hoje” esteja presente nos jargões que rolam por ai.

    Em caso de agressão: AFASTAMENTO imediado do agressor, e afastamento é diferente de agressão e discussão coletiva sobre o ocorrido sem a sua presença nos espaços auto-organizado de mulheres (caso o coletivo tenha) e com todo o coletivo.
    A vitima deve ser ouvida mas nunca dar a sentença. Se alguém mata o minha mãe não serei eu a dar a sentença por estar emocionalmente envolvido com isso, cabendo a razão e não a emoção encontrar o melhor caminho.
    Karina coloca um questão bem interessante e verdadeira que é o afastamento das mulheres dos coletivos depois de agressões. Vejo que esse afastamento do agressor serve a isso, a sobrevivente tem que ter prioridade nos espaço, isso é claro, mas e se ela não participa de todos os espaços, não existiram outros espaços que essa sobrevivente não participa para que seu agressor se mantenha as vistas do grupo restabelecendo novos laços de confiança?
    Sim, novos laços, afinal os antigos se quebraram. Exatamente como disse a carta do MPL o agressor tem que se comprometer a mudar de atitude a ir se tratar e a ouvir as mulheres. Apenas penso, mas não tenho certeza sobre isso, é que os primeiros a abordar o agressor devam ser preferencialmente homens, afinal se este apresenta uma postura misógena o ideal é que homens o abordem e digam a ele que ele SIM ERROU e folhou com o que ele mesmo diz defender. Mas certamente em um segundo momento o agressor tem que ser confrontado pelas mulheres e ouvir de suas bocas e olhos os efeitos e consequências de suas ações.Além disso acredito que o comprometimento (em um plano ideal com acompanhamento do coletivo) com um processo terapêutico profissional, de preferência com um profissional especialista em questão de gênero.
    Penso que as coisas poderiam caminhar melhor por ai do que excluindo, conheço histórias de agressores que depois de expulsos continuaram com comportamento predatório com mulheres fora do movimento e acredito que manter eles dentro do movimento seja a melhor forma de evitar que “vitimas mais inocentes” também sofram.
    No mais quero parabenizar o passa palavra e os comentários expostos. Pessoalmente as tensões de gênero e o clima de policiamento instaurado me desgastaram muito e são uma das principais razões de um drástico afastamento que fiz.
    Cabê apenas lembrar, como o texto da Joe Freeman coloca muito bem, é que o Passa Palavra “vai ter que dar conta disso dentro do feminismo”, e certamente já sofre com isso. Mas dos textos que acompanho nesse sitio esse é o que tem mais comentários anônimos e isso é bem sintomático.

  35. Suellen e Simone, ainda que tenha dito da ausência de horizontes sobre o que fazer neste texto específico, não quis me referir somente a este, queria me referir a este debate em geral. Tenho a mesma preocupação que vocês trazem no texto, contudo, se a naturalização do escracho e exclusão como única medida em lidar com casos de violência em coletivos e a não ampliação do combate a estes para fora dos ṕróŕios coletivos é algo que deve ser combatido e superado, por outro lado, o que acho tão preocupante quanto é que a absurda maioria dos ditos camaradas que fazem este debate não apresentam qualquer interesse na reflexão que vocês trazem sobre quais mulheres que estão sendo violentadas e as circunstâncias disto, na construção de espaços seguros para mulheres, na superação da divisão sexual da militância, dentre outras questões concernentes a superação da desigualdade de gênero. A preocupação da maioria destes é unicamente na interferência do feminismo na luta de classes e não também nas questões que concernem a desigualdade de gênero e consequente superação deste.

    Então quando eu coloco esta questão da falta do que fazer, é que raras vezes neste debate vejo propostas concretas sobre o que fazer, não é que a crítica deve ser sempre acompanhada de soluções mágicas,mas é quando há um massivo e constante empreendimento somente na crítica e não concomitante a medidas que superem estas, ao que me parece há algo sintomático nisso e explicita determinados interesses. .
    Ao que parece o interesse de boa parte dos caras de esquerda é somente pegar elementos para deslegitimar e enfraquecer todo o feminismo e nisso o trata como um movimento hegemônico, o que é tão absurdo como tratar a esquerda como tal. Pegam um caso específico para generalizá-lo e combater o movimento e todas suas práticas. O que tenho clareza que não é o interesse de vocês, não porque são mulheres, mas pelas publicações que já fizeram por aqui. Dai acho importante sempre buscarmos fazer a crítica pública, mas ao mesmo tempo pontuar as dificuldades de superá-las, o que não parte somente das feministas, mas da própria esquerda e da dificuldades em lidar com estes temas dentro dela, caso contrário a instrumentalização deste tipo de texto por parte de misóginos é extremamente facilitada.

    No mais, eu e uma camarada fizemos um texto a um tempo atrás chamado feminismo e esquerda:azminas e uzomi, abordando melhor esta e outras questões, caso se interessem (tá meio chato de ler devido a configuração do CMI):

    http://www.midiaindependente.org/pt/blue/2015/03/540293.shtml
    http://www.midiaindependente.org/pt/blue/2015/03/540443.shtml

  36. Karina ignora todas as falas desse debate que foram ou que ela supõe terem sido escritas por homens, e com cinismo fala generalizando nos “ditos camaradas” e nos “caras de esquerda”, e ainda diz que tem a mesma preocupação das autoras do texto. Com a mesma razão poderíamos nos referir à Karina como a “dita feminista” que tenta embromar os outros com um discurso demagógico que muda conforme a conveniência e que se fundamenta de cabo a rabo no círculo vicioso apontado no comentário assinado Fagner Henrique. Se a dita feminista Karina tivesse “a mesma preocupação das autores do texto” (e que é a mesma de muitos dos comentadores daqui, pseudônimos, então suponho que sejam pessoas com medo das agressoes que podem sofrer das ditas feministas “radicais”) ela começaria por fazer autocrítica de sua postura excludente e biologizante no debate, e por ter usado os termos “uzomi” e “azminas” num texto que pretende tratar de feminismo e esquerda, etc. Mas a dita feminista Karina tal como muitas outras que se posicionam do mesmo modo que ela (ou pior, daquelas que se acham tão donas da razão que sequer “se dão o trabalho” de vir aqui discutir com a gente, nem mesmo com as autoras), está muito bem obrigada na posição de “feminista pra caramba” que acusa sem dó os privilegiados esquerdomachos que tem a coragem de querer meter a colher na luta feminista, que é propriedade particular das mulheres (e só de algumas, as que concordarem com o bordão excludente e de “minha revolução é cortar picas”, etc). A dita feminista Karina ainda se preocupa com a “instrumentalização deste tipo de texto por parte de misóginos”, sem se dar conta da forte e consciente instrumentalização da própria opressão machista que sofremos todos os dias por parte das feministas excludentes em suas disputas por hegemonia dentro das organizações da esquerda. Mas vamos nos ater à acusação de Karina (insinuando que é o caso dos comentadores desse debate) aos homens de esquerda que só dão atenção ao feminismo pela sua “interferência na luta de classes”, o que os coloca junto ao jeito stalinista de fazer luta política. Estes imbecis existem, claro. E qual a solução genial das ditas verdadeiras feministas para estes e para todos e todas que se posicionam de algum modo desagregador no debate e na prática contra o machismo? A resposta delas, muito conveniente e fundamentada na teoria dos privilégios e todo o lamaçal do multiculturalismo, é instituir do “outro lado” da opressçao algo como uma “contra-opressão”, algo como uma interpretação idiota da genial ideia da historia a contrapêlo: põe em prática um outro stalinismo, o do feminismo excludente que prega o escracho e coisas piores, como se a contraviolência fosse resultar em algo mais que um mero e perverso analgésico moral e temporário ao excesso de rancor acumulado por anos sofrendo o machismo cotidiano. Ah mas vou parar por aqui pq para essas seitas só se pode criticar algo se tiver algo redondinho para propor no lugar, e se o crítico for mulher, e se possível negra, lésbica e morar na “quebrada”.
    Houve um tempo em que a esquerda se preocupava com a fragmentação das lutas, hoje ela fez da fragmentação sua profissão de fé, como se isso fortalecesse a luta, sendo que não fortalece nem mesmo a luta “integradora” contra a opressão “específica”, muito menos a luta por outras relações sociais e outra sociedade sem machismo, racismo, exploração…

  37. Achei que grande sacada o texto!
    Para além da discussão feminista, estou de pleno acordo de que o homem autor de agressão/violência contra a mulher deve ser levando em consideração neste processo, Heleieth Saffioti, uma das maiores referências sobre e temática gênero foi sensivel ao destacar o agressor! No meu estado o ES um dos maiores em homicidio de mulheres, se nao o maior, tem um pequeno municipio que faz esse tipo de trabalho… e saibam os casos de reincidencia a violência são baixissimos e temas como a luta feminina e o direitos da mulheres são trabalhados e bem aceitos pelos homens ali atendidos… então como não considerar o processo educacional valido? A própria Lei Maria da Penha de forma branda traz esta inovação! Acho super valido e estou levando o assunto para meu projeto de mestrado!

  38. O texto começa com uma comparação entre ONGs e setores do Estado por um lado e coletivos feministas libertários por outro. Os primeiros, “têm apresentado propostas e realizado práticas de superação de violências, por meio de ações reflexivo-educativas”, diz o texto. Os segundos perpetuariam o binômio “vítima-vitimário” (mulher-homem). Ao mesmo tempo, aponta para um olhar imediatista de ditos coletivos e um esforço estratégico de combate ao patriarcado pelas instâncias institucionais.

    Ora, devemos então conversar sobre o que seria uma luta estratégica contra o patriarcado. Ele tem bases materiais e as medidas reflexivo-educativas são inócuas no seu combate se não se atacam essas bases, e que têm a ver, em primeiro lugar, com a exploração do trabalho reprodutivo. Então, talvez estejamos partindo de premissas diferentes.

    Por outro lado, o combate das mulheres tem efeitos educativos reais. Em primeiro lugar, para as próprias mulheres, porque as tira da sua condição de vítimas e as coloca na posição de protagonistas. Mas também tem efeito educativo sobre os homens, porque coloca uma resistência material para a reprodução prática e ideológica da opressão. Não é pela catequese que se supera o machismo dos homens, ele só pode ser superado por uma ação externa.

  39. “A luta da mulher proletária por libertação não pode ser similar à luta que as mulheres burguesas travam contra os homens de sua classe. Pelo contrário, deve ser uma luta conjunta com os homens de sua classe contra toda a classe dos capitalistas. Ela não precisa lutar contra os homens de sua classe para romper as barreiras que foram levantadas contra sua participação na livre competição do mercado de trabalho… Seu objetivo final não é a livre competição com o homem, mas a conquista do rumo político do proletariado. A mulher proletária luta punho a punho com o homem de sua classe contra a sociedade capitalista.” Clara Zetkin

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