Por Jan Cenek

 

Retomo o tema da última coluna, daí o título. Junho de 2013 repensado a partir de alguns dados.

Segundo o Datafolha, em 2003, três meses após o início do governo Lula, o desemprego era o principal problema do país para 31% dos brasileiros, depois vinha a fome/miséria, para 22%, e a violência/segurança, para 18%. De acordo com o mesmo instituto de pesquisas, dez anos e três meses depois, em junho de 2013, já no governo Dilma, o desemprego era o principal problema do país para 4% dos brasileiros, enquanto 2% mencionaram a fome/miséria e 10% citaram a violência/segurança. Os problemas que mais preocupavam os brasileiros, em junho de 2013, eram a saúde, para 48% dos entrevistados, a educação, para 13%, e a corrupção, para 11%.

Os dados sinalizam que no período (2003 a 2013), com a valorização dos preços das commodities exportadas e as políticas sociais, houve redução do desemprego, da miséria e da fome. É sintomático que maioria dos brasileiros considerasse, em junho de 2013, a saúde e a educação como os dois principais problemas do país. Encampar a demanda popular seria uma possibilidade, se a palavra trabalhadores fosse algo além de 13 letras esquecidas no nome do partido que ocupava a presidência da república.

Segundo o DIEESE, em 2004, no segundo ano do governo Lula, houve 302 greves no Brasil, com um total de 23.138 horas paradas. Já em 2013 e de acordo com a mesma fonte, ocorreram 2.050 greves que totalizaram 111.342 horas paradas. Ou seja, o número de greves cresceu aproximadamente 7 vezes enquanto as horas paradas aumentaram quase 5 vezes. Se houve redução do desemprego e, portanto, do exército industrial de reserva, é natural que crescessem as greves e a luta dos trabalhadores.

Por mais imprecisos que possam ser, os dados sobre as greves e os principais problemas do país ajudam a esboçar traços importantes da conjuntura brasileira em junho de 2013. Uma economia razoavelmente aquecida, transformando desempregados e miseráveis em consumidores de baixa renda. Redução do exército industrial de reserva e, consequentemente, fortalecimento das lutas da classe trabalhadora. Elevação dos salários [1]. Ameaça aos lucros do capital. Demanda crescente por saúde, educação e transporte de qualidade.

Um exemplo. De acordo com cientista político André Singer [2], houve escassez de trabalhadores domésticos no Brasil entre 2011 e 2013, o que ocorria devido ao crescimento da economia e à redução da miséria. Além disso, a categoria conquistou direitos como a limitação da jornada, pagamento de horas extras e adicionais noturnos. Abriam-se possibilidades mínimas para quem não as tinha. No Brasil, contar com empregados domésticos é sinal de status, além de ser, também, parte da nefasta herança escravista. O fato é que a escassez de trabalhadores e os direitos conquistados se chocavam com atavismos nacionais. André Singer novamente: “O lulismo não pretendia produzir confronto com as classes dominantes, mas ao diminuir a pobreza o fazia sem querer.”

A panela de pressão explodiu em junho de 2013. Colocado numa encruzilhada histórica que ajudou a construir, ainda que involuntariamente, o petismo tinha duas alternativas: 1) Promover um forte ajuste fiscal e retirar direitos dos trabalhadores, regredindo ao velho normal. 2) Mover-se para a esquerda no sentido apontado pelas ruas e pelas demandas populares: ampliando o acesso à saúde, à educação, ao transporte e outros serviços. A tal guinada para a esquerda que nunca aconteceu.

Dilma e o PT escolheram a primeira opção, mas não com a intensidade e a rapidez exigida pela burguesia brasileira, o que determinou os acontecimentos posteriores. Ao tentar conciliar o inconciliável, desagradaram todos os lados. De acordo com o Datafolha, em março de 2013, o governo petista era ótimo/bom para 65% dos brasileiros e ruim/péssimo para 7%; três meses depois, no final de junho, apenas 30% avaliavam o governo como ótimo/bom, enquanto 25% o consideravam ruim/péssimo.

A mídia empresarial mudou o tom depois da repressão policial ocorrida em 13 de junho de 2013. Do “Chegou a hora do Basta” (Estadão) e do “Retomar a Paulista” (Folha) para “A revolta dos jovens – depois do preço das passagens, a vez da corrupção e da criminalidade” (Veja). De acordo com o Datafolha, no final de junho de 2013 a corrupção era o principal problema do país para 11% dos brasileiros, dois anos e cinco meses depois o número havia crescido para 34%. Era o efeito da atuação combinada da mídia empresarial com a operação Lava Jato, abrindo caminho para a derrubada do governo Dilma, o ajuste fiscal e a retirada de direitos no ritmo exigido pelo capital.

Como pontuou André Singer [3]: o lulismo, especialmente no governo Dilma, cutucou onças com bases curtas. Mas faltou o cientista político complementar a sacada problematizando a questão. O lulismo atua freando as luta dos trabalhadores e, para isso, necessariamente encurta as próprias bases. Ou seja: fornece a corda em que será enforcado. Basta pensar nas lideranças que ganharam cargos e trocaram os movimentos populares pelos governos petistas, fortalecendo estes e enfraquecendo aqueles. O que não estava na conta do lulismo – um pouco por opção, um pouco por ilusão, um pouco por deslumbramento e outro pouco por miopia política – é que o atraso brasileiro é lucrativo e funcional para a burguesia e, sendo assim, nenhum avanço é possível sem mobilização popular e rupturas. Sem estas, o máximo que se consegue são melhorias pontuais permitidas pelos ciclos econômicos, mas que se perdem posteriormente. É o que explica a rápida reversão das “conquistas” dos anos petistas.

No calor dos acontecimentos, em 24 de junho de 2013, Dilma Rouseff anunciou cinco pactos para tentar conter as manifestações: responsabilidade fiscal, reforma política, saúde, transporte e educação. Era uma tentativa de dialogar com as ruas se mantendo em cima do muro, como se fosse possível. Responsabilidade fiscal para atender o “mercado” e garantir os pagamentos de juros e amortizações da dívida pública. Reforma política, saúde, transporte e educação para atender os manifestantes. Era tentar conciliar o inconciliável. Mas não se agrada a dois deuses ao mesmo tempo. Prevaleceu o arrocho (“responsabilidade fiscal”) e a retirada de direitos, como manda a cartilha neoliberal. Deu no que deu.

Por fim. Se as greves estavam crescendo e se a população queria saúde, educação e transporte público de qualidade, é possível pensar Junho de 2013 como uma última saída (à esquerda) antes do pedágio (que custaria caro). Mas o lulismo, como sempre, deu seta para a esquerda e entrou para a direita. Dilma Roussef cumpriu efetivamente o primeiro pacto, a responsabilidade fiscal (arrocho), e esqueceu os outros. Já as forças mais à esquerda não conseguiram unificar, encorpar e potencializar a revolta.

 

Notas

[1] No livro O lulismo em crise – um quebra-cabeça do período Dilma (2011 – 2016), André Singer informa que “embora mais de 90% dos empregos criados fossem de baixa remuneração, a renda média do trabalho se elevou em cerca de um terço entre 2003 e 2014, também graças a acordos coletivos vantajosos aos trabalhadores.”

[2] Livro citado na nota anterior.

[3] A sacada de André Singer está no livro mencionado nas notas anteriores.

27 COMENTÁRIOS

  1. Os protestos emergiram das possibilidades abertas pela ação de pequenos grupos e das condições criadas pelo próprio reformismo e sua impossibilidade de levá-las adiante. Eles se ampliaram e tomaram proporções surpreendentes devido à tentativa da mídia de instrumentalizá-los, a princípio sem sucesso e posteriormente alcancançando sucesso.
    Por parte dos empresários, influenciados pela vertente toyotista/neoliberal hegemônica, sempre houve pessimismo desde 2003, mesmo com lucros crescentes. Este inconformismo empresarial cresce com a redução excessiva desemprego, que agrava os confrontos de classe. Qualquer desequilíbrio econômico viria a confirmar suas expectativas pessimistas e abrir um caminho para livrar-los do governo insuficientemente neoliberal. A mídia, que a princípio condenou as manifestações, encontrou oportunidade de através destas exercer o papel que correspondia à estas expectativas da classe dominante e direcionar as manifestações contra a esquerda neoliberal.
    Por outro lado, como destaca o texto, a esquerda neoliberal tenta agradar a classe dominante que à despreza, e de forma sempre humilhante ataca de forma truculenta os elementos de esquerda que iniciaram as manifestações, tentam se apaziguar alguns dentre estes sem lhes oferecer nada, enquanto tomam medidas econômicas que vão contra os interesses da classe trabalhadora. Com estas iniciativas estes contraditórios pseudo-reformistas enfraquecem a si mesmos à ponto de posteriormente serem apeados do poder com muita facilidade.
    O grau de desnorteamento da classe trabalhadora, sem rumo, sem política revolucionária, sem perspectiva própria e sem autonomia nenhuma torna fácil abraçar quem lhes pareça intransigente, desafiador e rebelde, por mais caricata que possa parecer esta rebeldia. Por isto os elementos reacionários podem dirigir o descontentamento para os mais fantasiosos e inverossímeis embates. Não admira que uma parcela significativa abrace um famigerado mito quando as coisas tomam este rumo que tomaram.

  2. Ricardo, e é mais inacreditável ainda que essa esquerda neoliberal quer (e provavelmente vai) voltar ao poder com as mesmas premissas de quando ascendeu. É uma esquerda com um ideal de passado. E esse ideal que você descreveu aí.

  3. Ricardo Costa Pinto diz ” Por parte dos empresários, influenciados pela vertente toyotista/neoliberal hegemônica, sempre houve pessimismo desde 2003, mesmo com lucros crescentes”, equivocado, com a crise de 2007 a taxa de lucro passou a cair, embora o pib e os emprego tenham voltado a crescer . Na página 7 do artigo no link tem os dados da taxa de lucro. https://www.researchgate.net/publication/312191358_Lucratividade_e_Distribuicao_A_Origem_Economica_da_Crise_Politica_Brasileira

  4. Ricardo, tu tens elementos que comprovam esse pessimismo dos empresários desde 2003?
    Desde já, agradeço.

  5. Tenho elementos que comprovam. Tenho dificuldade de encontrar elementos que não comprovem. Vou lhe dar duas fontes persistentes porta voz dos empresário Mirian Leitão e GloboNews, todo santo dia durante 12 anos ou mais. No entanto desafio você a usar sua própria memória e me dizer se você conhece um único empresario que não compactua com a ideia de que o problema se chama “custo Brasil”. É senso comum. É tão hegemônico até hoje que não sei como você não percebe o óbvio. Faça o seguinte: saia a rua agora e vá conversar com alguns empresários. Mesmo com a catástrofe econômica atual encontrará somente raras excessões que não comungam com coisas tipo “teto de gastos”…

    ***

    Bruno. Não sei se você já percebeu, mas a situação não melhorou nem um pouco para os empresários depois da saída do PT. Deve ter percebido que havia uma grande expectativa infundada e uma paciência de Jó por parte dos mesmos. Isto vem da cultura proveniente no Brasil a partir dos anos 90, que tirou a economia da hiperinflação e estabeleceu uma cultura tanto econômica quanto a nível de produção. Como você deve saber, embora o toyotismo nem possa mais considerado a mais moderna dentre as metodologias de exploração de mão de obra, as novas metodologias mantém e agravam o que o toyotismo propôs, tipo flexibilização e etc… Embora o PT tenha levado adiante estas implementações, não o fez ao ritmos esperado. Havia planos interrompidos desde 2002 e que foram interrompidos e retomados somente após a queda do PT. Esta ainda continua sendo a expectativa da classe empresarial brasileira. Por isto ela ainda vacila entre um completo inepto Ministro da Economia e um patético Presidente incapaz de articular suas “reformas”. A percepção da queda da taxa de lucro é muito menor que a percepção da rotatividade da mão de obra e sua valorização, porém esta percepção sempre será regida pelas expectativas. Até os empresários se dispõe a pequenos sacrifícios quando isto está de acordo com as perspectivas que abraçam.

  6. O que será essa reedição da esquerda neoliberal que veremos? O descontentamento só irá parar quando o empresariado ver um de seus no poder. Poderemos ver um reedição da lava-jato? Malabarismo jurídico para colocar Alckmin?

  7. Ricardo , entendo quando voce diz “mas a situação não melhorou nem um pouco para os empresários depois da saída do PT”, seu equivoco é olhar apenas os dados do PIB, quando olhamos pro lucro, percebemos que embora a economia não esteja crescendo, os lucros estão aumentando. Segundo o Professor Eduardo Costa Pinto em uma reportagem da RBA ” Entre 2017 e 2019, o PIB variou entre 1,3% e 1,8%. Em 2020, primeiro ano da pandemia, veio o tombo de -3,9%, seguido de alta de 4,6%, no ano passado. Por outro lado, em 2021, a taxa de lucro das 240 maiores empresas de capital aberto cresceu 22%, quase cinco vezes mais que o PIB do país” e “o professor explica que esse aumento dos ganhos da “megaburguesia” tem relação com diversos fatores. Ele cita a recente alta das commodities no mercado internacional, além de fusões e aquisições entre empresas, que vêm concentrando ainda mais o mercado e reduzindo a concorrência. Mas a redução dos custos da mão de obra é o principal. Em outras palavras, conclui o pesquisador, o enriquecimento destes poucos é efeito direto da “reforma” trabalhista levada a cabo por Temer e aprofundada com Bolsonaro.” Recomendo que procure no facebook as pastagens dele.

  8. Caros,

    A queda das taxas de lucro e o aumento dos salários durante os governos do PT estão bem documentados. Ver André Singer, O lulismo em crise – um quebra-cabeça do período Dilma (2011 – 2016). O artigo citado pelo Bruno (Lucratividade e distribuição: a origem econômica da crise política brasileira) aponta para a mesma direção.

    Outro ponto. De onde não se espera muito é que não sai nada mesmo. O compromisso do reformismo rebaixado (PT) é com o capital. Por isso não hesitam em se colocar contra as lutas dos trabalhadores. Por isso não hesitaram em promover um forte ajuste fiscal e monetário em 2003 e 2015. Não será surpresa se o mesmo se repetir em 2023.

    Por fim. O que me intriga é pensar Junho de 2013 a partir das forças de esquerda que iniciaram o levante. As cartas continuam sendo jogadas, como escrevi na coluna anterior? Não conseguimos unificar, encorpar e potencializar a revolta? Por quê?

  9. Pois é, o que o Bruno aponta no comentário é o fundamental: a queda da taxa de lucro que levou a burguesia a se rebelar contra o governo do PT. E o que aponta Bruno mostra o motivo do golpe de 2016. Tem gente que diz que foi mera troca de gestores… Não, se tratou de luta de classes, no sentido de que estava em jogo reduzir renda da classe trabalhadora e condições de trabalho para aumentar a taxa de lucro.
    Quem ficou indiferente diante do que ocorria em 2016 não viu a realidade diante dos olhos.

  10. Leo V, tentando entender o teu raciocínio, quem não ficou indiferente diante do que ocorria em 2016 viu a realidade diante dos olhos e, participando ativamente na luta de classes, defendeu o governo Dilma contra o golpe. É isso? Obrigado!

  11. Fernando,

    Não, assim como quem se coloca contra a invasão da Rússia de Putin à Ucrãnia não se coloca a favor do governo de Zelenski (não necessariamente).

    O raciocínio é simples e exatamente o mesmo do caso da invasão da Rússia. Vai ficar indiferente à invasão pois lutar contra a invasão é apoiar o governo de Zelenski? Não faz o menor sentido.

  12. O Leo V é um fanfarrão. Já está mais que documentado, como já foi dito, que o determinante para a derrubada do PT foi a queda da taxa de lucro. Isso fez com que o pacto de sustentação do petismo se rompesse. O PT então, logo após as eleições de 2014, numa tentativa de recompor as taxas de lucro dos capitalistas, começou ele mesmo a tomar medidas para baratear a mão de obra. Mas não o fez (e nem poderia fazer) na velocidade e profundidade que seus antigos aliados desejavam. Resultado: perdeu o apoio dos capitalistas, e os trabalhadores também não mexeram um dedo para lhes defender. Mas, para Leo V, luta de classes é a derrubada do PT. O “estelionato eleitoral” de 2014 e as medidas de precarização e aprofundamento da exploração tomadas pelo PT no governo não é luta de classes.

  13. Quem ficou indiferente em 2016 foi a CUT, o MST, a cúpula do PT…
    quem foi às ruas foram alguns eleitores do PT, mobilizados para fazer o trabalho que os gestores não queriam arriscar-se a fazer com suas bases sociais, e alguns pequenos grupos que projetam suas fantasias políticas num governo zumbi. Justamente, dar sobrevida a este zumbi, é essa a luta de classes que se pretendia dar?

    Acho que isso tem realmente a ver com as perguntas que o Jan Cenek fez ao final de seu último comentário.

  14. https://www.anpocs.com › filePDF
    Os Empresários e o Governo Lula – Anpocs
    Cobrado por fontes a respeito da insatisfação sempre presente e nunca satisfeita dentro do “pacto do empresariado com o PT” anexo este link que descreve as espectativas desde 2003 e o que permaneceu sendo cobrado, independente do desempenho econômico, nos anos seguintes. É importante destacar estas expectativas a desconfiança permanente e a fragilidade desta aliança.
    Se o que importa é a avaliação do lado das forças que se propuseram a mobilizar desde antes de 2013 e que estavam ali no início das manifestações, é preciso saber o quanto houve de interesse da classe dominante para instrumentalizá-las, que foi o que acabou por acontecer. Não basta buscar onde termina a força contestadora do movimento e a repressão que abateu sobre ele. É preciso entender o quanto foi potencializado em um determinado por interesses contrários e usado para objetivos que não pertenciam aqueles que teceram as condições para que acontecesse.
    Atribuir à queda na taxa de lucro uma mudança de postura que só aconteceu às vésperas das manifestações não dá a exata dimensão da articulação que havia na classe dominante, pois esta tinha desde o início considerada traída em muitas de suas espectativas de reformas que considerava necessárias do seu ponto de vista.
    Se nós, com nossos pequenos grupos articuláva-mos romper com a imobilidade contestatoria imposta pelo pacto social a classe empresarial articulava o momento de romper de vez com o desenvolvimentismo que elegeu como inimigo nos anos 90.
    Em resumo, as manifestações não foram apenas enfraquecidas e reprimidas, mas foram sim desviadas e usadas para criar o seu reverso. É preciso levar em conta isto sem medo de dar vazão as teorias conspiratórias da esquerda neoliberal.

    *** *** ***

    Retirado o protagonismo da classe capitalista por um repentino interesse de mudar de rumo, é preciso detectar o momento em que ficou propício o desvio da luta para sua politização burguesa e posterior instrumentalização.
    Para mim o ponto de mutação pode ser detectado na mudança das palavras de ordem.
    As manifestações iniciam com a reivindicação da gratuidade das tarifas de transporte coletivo, o que lhe dava a característica do embate entre a comunidade material real e a politização burguesa e seu legalismo estéril e amortecedor.
    No momento em que parte para o “não vai ter copa” já está condicionado por estratégias e táticas fora da compreensão das massas. É nesta tentativa de dar uma dimensão abrangente que há uma articulação entre as minorias autônomas e a extrema esquerda tradicional. A estratégia por detrás das massas à moda leninista pressupõe o ataque à um governo específico e reflete a frustração e traição que setores da esquerda sempre reivindicam entre os seus. Entendo então que neste momento o cenário do fracasso já estava traçado de nossa parte. Podemos a amplitude da contestação para cairmos na mediocridade da política de governos.
    A partir do desvio do foco para um embate com o governo e não mais com o antagonismo social surgiu a brecha por onde entrou a politização de esquerda e direita, sendo que neste caso prevaleceu a direita. Não sou dono da verdade e parto da experiência que vivi e do modo como percebi no momento mesmo em que os eventos ocorriam.

  15. Paulo Henrique,

    A luta de classes obviamente se deu no governo Dilma também. Mas vou desenhar: em 2016 o tal impeachment não foi mera troca de gestores. Esse é o ponto que você desvia. No fundo nem desvia, você me parece que concorda, mas ainda assim alguma espécie de desafeto a ser tratado em relação ao PT faz você negar a prática que sua razão não nega: a luta contra o golpe era uma luta contra o avanço dos capitalistas sobre a classe trabalhadora (ah, mas claro, também se lutava contra os avanços da classe capitalista nos governos do PT e no governo Dilma iniciado em 2015).

  16. O Leo V tenta falsificar a história.

    O avanço dos capitalistas sobre a classe trabalhadora, de um ponto de vista econômico, deixando de mencionar o avanço truculento da repressão política, começou em 2011 e se agravou em janeiro de 2015, quando Dilma, cedendo por completo ao liberalismo conservador de parte de sua equipe econômica e às pressões patronais, nomeou Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda e o encarregou de realizar um forte ajuste fiscal. Escrevi algo sobre isso aqui: https://passapalavra.info/2022/03/142477/.

    Aliás, a reorientação da política econômica do PT a partir de 2011 ajuda a explicar a explosão de greves no Brasil em 2012 e 2013.

    Dilma foi retirada do poder, entre outras razões, porque o PT havia perdido o controle sobre a classe trabalhadora (já escrevi sobre isso aqui: https://passapalavra.info/2020/03/130158/) e porque havia uma falsa percepção dos patrões e da direita de que ela impunha obstáculos ao ajuste fiscal, sem contar o impacto da Operação Lava Jato sobre a imagem pública dos gestores petistas. Tudo isso criou oportunidades para Michel Temer costurar os acordos que viabilizaram o impeachment, tudo dentro da legalidade e da constitucionalidade, sem rupturas que autorizassem o uso do conceito de golpe.

    Dilma não teve o tempo nem a chance de atender às pressões mais radicais dos capitalistas, o que é útil para Leo V tentar confundir quem era quem na luta de classes.

  17. Segundo Leo V, a luta de classes no Brasil começou em 2016 com a derrubada da Dilma. Antes dessa data não havia a dicotomia taxa de lucro vs. vida dos trabalhadores.

  18. Alguns poucos grupos e eleitores não enxergavam que a própria dirigência política havia preferido não realizar um enfrentamento. Alguns poucos anos depois essa dirigência já estava fazendo alianças com aqueles que estes grupos e eleitores chamavam “golpistas”. E a maioria dos e das trabalhadoras nunca se surpreendeu com isso. Esse foi o drama de quem quis ser mais petista do que a dirigência do PT, de quem identificava o governo com a classe.

  19. Em 23 de agosto de 2018, João Almeida Moura escreveu no Diário de Notícias (aqui: https://www.dn.pt/edicao-do-dia/23-ago-2018/o-pt-golpeia-se-9749317.html) que “Lula é como o Fausto, de Goethe, que fez um pacto com o Diabo, na forma de Mefistóteles. Graças a esse pacto chegou ao auge do poder, da popularidade, do prestígio; hoje, sofre as consequências da imprudente amizade. No passado, os ‘golpistas’, como ele lhes chama hoje, foram parceiros de governo e de distribuição de dinheiros públicos no mensalão e no petrolão para ir facilitando a aprovação de projetos, oleando as campanhas de todos e garantindo a preservação dos mesmos no poder. De terríveis e infames corruptos, quando o PT ainda era oposição, Michel Temer, Renan Calheiros, Romero Jucá ou Eunício de Oliveira, alguns caciques do MDB, ainda a mais fiel representação do Mefistóteles do Fausto na política brasileira, passaram a ser destinatários de palmadinhas nas costas, abraços e afagos de Lula e companhia. Até Paulo Maluf, veterano vigarista procurado pela Interpol, mereceu visita do chefe do PT aos jardins da sua mansão para selar acordo com vista à eleição para a prefeitura de São Paulo de Fernando Haddad, em 2012. Argumenta o PT que sem esses acordos não teriam existido Bolsa Família, Minha Casa, Minha Vida, Prouni e tantos outros programas que, pela primeira vez na história, visaram diminuir a desigualdade do terceiro país mais desigual do mundo. ‘É a realpolitik, estúpido’, dizem os militantes do partido. ‘No Brasil, Jesus se coligaria até com Judas’, resumiu um dia o próprio Lula. No dia em que o dinheiro se retraiu como nunca, já sob Dilma Rousseff, uma presidente medíocre na economia, por um lado, e que nunca teve estômago para palmadinhas nas costas, abraços e afagos a quem desprezava, por outro, o preço a pagar pela aliança diabólica chegou em forma de impeachment. O resto já se sabe. Mas será que o PT, com resultados catastróficos nas últimas eleições municipais, e Lula, entretanto preso em Curitiba, aprenderam a lição? Não: enquanto os seus militantes, no Brasil e além-mar, perdem os amigos e a saúde a chamar ‘golpistas’ aos que derrubaram Dilma, o partido já se coligou com os partidos do ‘golpe’ em 15 das 27 unidades federativas do país. A tal realpolitik”.

    Podemos prosseguir a mesma reflexão hoje. Ora, além de termos visto Lula e Alckmin finalmente juntos (ver: https://passapalavra.info/2022/04/143283/) e um Alckmin desconcertado durante a execução do hino da Internacional (aqui: https://passapalavra.info/2022/05/143649/), li há poucos dias na Folha de S.Paulo que num almoço com parlamentares na residência oficial do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD), Lula pediu seu apoio para fazer desistirem de concorrer à presidência os pré-candidatos Gilberto Kassab (PSD), Simone Tebet (MDB) e Luciano Bivar (União Brasil), para que o apoiem já no primeiro turno. Outro pedido de Lula é que, caso seja eleito, Pacheco resista às pressões dos bolsonaristas contra a realização da cerimônia de posse. E agora passo a citar a reportagem de Ranier Bragon, Danielle Brant, João Gabriel, Thaísa Oliveira e Julia Chaib (aqui: https://www1.folha.uol.com.br/poder/2022/07/lula-diz-a-senadores-que-vitoria-em-1o-turno-e-essencial-contra-golpismo-e-busca-atrair-3a-via.shtml): “o ex-presidente afirmou ter certeza de que obterá o apoio de MDB – sob o argumento de que o PT cedeu ao partido em dez arranjos políticos estaduais sem pedir nada em troca – e que tem mantido pontes com Bivar, que, segundo ele, ‘odeia’ Bolsonaro […] Lula teria sublinhado aos participantes da conversa que, no sentido de evitar arestas com os adversários históricos, não falou uma palavra crítica em relação a ACM Neto, ex-DEM e secretário-geral da União, na visita recente que fez à Bahia. O MDB tenta emplacar a candidatura de Tebet, mas está rachado internamente e é alvo de ofensiva do PT. O PT também pressiona, por meio das bancadas na Câmara e no Senado, uma adesão de Ciro Gomes (PDT), mas o candidato e a cúpula do partido descartam desistência”.

    Pois bem, vejamos: o União Brasil, legenda pertencente a Luciano Bivar, é fruto de uma fusão entre o DEM e o PSL, partido de Bolsonaro nas eleições de 2018. No dia da votação da abertura do processo de impeachment contra Dilma (ver: https://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2016-04/impeachment-de-dilma-saiba-como-votou-cada-um-dos-partidos-na-camara), todos os deputados do DEM e todos do PSL votaram a favor. Segundo Leo V, votaram a favor do “golpe” e do avanço dos capitalistas sobre os trabalhadores segundo o binômio taxa de lucro vs. vida dos trabalhadores. O PSD, por sua vez, teve uma maioria de 29 votos pró-impeachment, contra 8 votos desfavoráveis. O criador do partido, ex-Ministro das Cidades nos governos Dilma e Temer, disse que não tomaria partido mas respeitaria a “decisão da maioria” dos parlamentares da sigla, comunicando pessoalmente a presidente (aqui: https://exame.com/brasil/kassab-informa-dilma-sobre-decisao-do-psd-pelo-impeachment/). Kassab manteve o mesmo cargo no governo Temer, o governo do “golpe”. O MDB, grande “aliado” do PT e que tinha um de seus parlamentares, Michel Temer, na vice-presidência, lançou 59 votos a favor do impeachment e 7 contra. Dos partidos mencionados na reportagem da Folha de S.Paulo, o único que sustenta hoje uma pré-candidatura à presidência da república e votou majoritariamente contra o impeachment foi o PDT de Ciro Gomes, e sabemos que Lula se esforça muito, e há muito tempo, para sabotar as pretensões presidenciais de seu ex-Ministro da Integração Nacional (escrevi algo a respeito aqui: https://passapalavra.info/2018/10/123251/). Ficamos, portanto, diante de uma realidade muito curiosa: o partido apeado do poder por um “golpe” busca o apoio daqueles que votaram a favor do “golpe” e faz de tudo para impedir uma renovação da centro-esquerda que lhe possa fazer concorrência, minando o projeto presidencial de um dos poucos partidos que votaram contra o “golpe”. Ou então aquilo não foi golpe, mas uma perda momentânea de apoio, entretanto já superada para permitir a reedição de um projeto de conciliação de classes e subordinação e cooptação dos movimentos dos trabalhadores, nos marcos de uma política econômica que oscilou entre o moderadamente neoliberal e o fortemente neoliberal (esta última versão do projeto entretanto frustrada, pois logo veio o impeachment, que livrou o PT de meter-se de maneira duradoura em mais uma contradição).

  20. Não gosto da palavra golpe para definir o impedimento ocorrido em 2016. Isso porque ao dizer golpe meio que se absolve o petismo, como se não tivessem promovido um estelionato eleitoral em 2015, como se não tivessem realizado alianças espúrias e, sobretudo, como se não atuassem desmobilizando e freando as lutas dos trabalhadores. A narrativa sobre o golpe serve, fundamentalmente, para colocar a esquerda no colo do PT. Basta ver o que aconteceu com o PSOL. Por tudo isso, prefiro a definição do professor Marcos Nobre. O que ocorreu em 2016 foi muito mais uma parlamentada do que um golpe.

    Mas dizer que foi uma parlamentada não significa ignorar que, a partir de 2016, foram intensificados os ataques contra a classe trabalhadora: teto de gastos, terceirizações, reformas trabalhista e previdenciária… Como já foi dito, a retirada de direitos e os ataques aos trabalhadores ganharam força no governo Dilma. Tivesse continuado no poder, ela teria aumentado a carga contra a classe trabalhadora. No nível do que efetivamente ocorreu? Difícil de saber. Assim como é difícil de saber se os ataques passariam se o petismo tivesse efetivamente mobilizado seus aparatos para resistir, ao invés de se limitar a repetir que teria ocorrido um golpe. Enfim. O fato é que a partir de 2016, com a parlamentada, foram promovidos diversos ataques contra os trabalhadores.

    Para piorar, o petismo se recolocou como alternativa (que não é alternativa) e é isso que devemos discutir. Que Lula é um conciliador interessado exclusivamente em manter e ampliar seus aparatos, freando a luta de classes, acredito que é consenso por aqui. A questão é por que não conseguimos criar alternativas por baixo e pela esquerda, ainda mais tendo um levante como Junho de 2013 ainda visível no horizonte. Em textos e documentários sobre aquele junho uma frase costuma aparecer: “outros junhos virão”. A frase está registrada, por exemplo, no final de um artigo publicado no Passa Palavra neste mês (https://passapalavra.info/2022/07/144931/). Eu mesmo fiquei tentado a registrar a tal frase nas duas colunas que escrevi. Se é verdade que outros junhos virão, é prudente discutir os limites e as possibilidades do processo: para que avance por baixo e pela esquerda. Daí as questões que coloquei no comentário anterior. As cartas continuam sendo jogadas? Não conseguimos unificar, encorpar e potencializar a revolta? Por quê?

  21. Quanta preocupação com os destinos do PT por parte de quem diz se propor a fazer uma crítica radical! Chega a ser ridícula tida esta preocupação em definir de houve ou não “golpe”. Pior ainda é este apego à crítica da corrupção, como se ele não fizesse parte obrigatória em todas as negociações capitalistas. O PT faz o melhor que pode dentro daquilo que ele é, nunca fará mais que isto. As críticas neste caso revela mais a respeito daqueles que as fazem do que do objeto da crítica. As esperanças e expectativas em relação à um partido político que ao fim se propõe apenas a gerir o capitalismo de um Estado Nacional como se fora um movimento revolucionário é mais que desproporcional é despropositada.
    Gostaria que alguém voltasse ao assunto sobre onde foi que nós que nos propusemos a mobilizar em 2013 erramos. Principalmente à afirmação feita por mim em comentário acima de que a partir da palavra de ordem “não vai ter copa” já estávamos desviados do caminho inicial.

  22. O Paulo Henrique tem um sério problema com a língua portuguesa.

    O antipetismo emburrece.
    Vou repetir pra ele o que escrevi:

    “Em 2016 a luta de classes era escancarada. Qualquer um que não sofresse de ressentimento crônico enxergava o que iria vir…

    Taxa de lucro vs. vida dos trabalhadores”

    Mas Paulo Henrique desconhece tempos verbais e lê que antes de 2016 não havia luta de classes e portanto disputa entre lucro e vida dos trabalhadores.
    Ele faz de conta que não sabe que estou escrevendo para rebater aqueles que diziam que o golpe de 2016 se tratava meramente de troca de gestores.

    Como ele não está no modo racional, pouco importa o que se escreve.

  23. Caro Jan,

    A meu ver, e sobretudo levando em consideração que Dilma e o PT passaram a enfrentar, desde 2013, uma muito abrangente oposição popular, permeando todas as classes sociais, não se pode chamar o impeachment de golpe, e também não faz sentido explicar a queda de Dilma a partir de uma manipulação arbitrária das regras formais dos ritos parlamentares. Não digo que é essa a visão de Marcos Nobre, não a conheço, não li suas obras, mas é assim que muita gente viu os acontecimentos. Não, para mim não houve nada de arbitrário, nenhuma manipulação da institucionalidade para derrubar Dilma. O impeachment durou mais de 6 meses! Houve observância dos ritos, dos prazos, das formas, com contraditório e ampla defesa, muito diferente do caso de Fernando Lugo, que nem teve tempo de elaborar uma defesa. Ocorre que os procedimentos parlamentares dependem, ao contrário de um caso apreciado pelo Judiciário, da formação de maiorias, e o PT não conseguiu, embora tenha se empenhado muito, obter maiorias. A remoção de Dilma já havia sido pactuada, como é comum em qualquer parlamento de qualquer país do mundo, e mesmo assim os parlamentares deram-se ao trabalho de observar as formalidades legais e constitucionais. Caso contrário, sempre que um parlamento resolve remover alguém do cargo, em situações onde o governante perde toda a sustentação política, inclusive de sua pretensa base social, é golpe. Além do mais, fora do parlamento não havia mais clima para um governo do PT: aquilo que o justificava, para o grande capital, era justamente a cooptação e controle dos movimentos sociais, e 2013 marca um ponto de inflexão nesse sentido. Além do mais, a classe trabalhadora que o PT cooptava foi mudando de forma, não é mais a mesma classe trabalhadora, é outra, existe já sob novas formas. Um livro que gosto, “Precariado”, de Guy Standing, ajuda a refletir um pouco sobre essa nova classe trabalhadora. É um livro que tem suas limitações, mas faz uma descrição precisa, a meu ver, dessa nova forma de ser do proletariado, ajuda a refletir. O PT conseguirá, se Lula for eleito, cooptar essa nova classe trabalhadora? A história dirá. Além do mais, a chamada “classe média” tinha por que se opor ao PT, uma vez que os governo petistas propiciaram uma altíssima concentração de riqueza no topo e uma maior distribuição de riqueza para a base, penalizando a camada de rendimentos intermediários. Laura Carvalho, no livro “Valsa Brasileira”, mostra que, entre 2001 e 2015, enquanto os 50% mais pobres aumentaram sua participação na renda nacional total de 11% para 12%, e os 10% mais ricos de 25% para 28%, os 40% intermediários reduziram-na de 34% para 32%. Isso explica muita coisa. De cima a baixo, aquele governo não atendia mais às expectativas. De cima a baixo, havia oposição àquele governo, marcando presença nas ruas, e se os manifestantes fossem de esquerda ou trabalhadores, sobretudo, sofriam ferimentos graves e eram mortos pela polícia. O impeachment foi a formalização da queda. E aí voltamos às questões que você coloca: “Não conseguimos unificar, encorpar e potencializar a revolta? Por quê?” Me parece que não conseguimos porque, de um lado, a extrema-esquerda que ascendeu ao primeiro plano em 2013 implodiu-se a si mesma. A velocidade com que o MPL se desagregou, devido a disputas internas motivadas pelo identitarismo, é impressionante. O que restou da extrema-esquerda, ou se dispersou, ou atrelou-se novamente ao PT. E então veio a extrema-direita bolsonarista, tirando do caminho ou atraindo o que restou da direita, implodida pela Lava Jato e disputas intestinas. Restou-nos o cenário atual. A extrema-esquerda poderia ter seguido outro rumo? Talvez. A nova forma de ser da classe trabalhadora tem algo a ver com o rumo que as coisas tomaram? Talvez. Mas havia, de todo modo, é preciso sublinhar, uns poucos que tentavam desenvolver uma luta anticapitalista, ao mesmo tempo contra o PT e as forças da direita. Fomos derrotados, evidentemente.

  24. Tenho dito, escrito e repetido que o Brasil não está no Brasil, está no mundo. Mas sem qualquer resultado. Nenhum brasileiro acredita que o Brasil esteja no mundo. Desde há dois dias que o Passa Palavra tem como principal destaque um artigo sobre os fundamentos da grande revolução popular no Sri Lanka, a maior que ocorre hoje em todo o mundo. Aliás, desde o início do processo revolucionário no Sudão, e que está ainda longe de ter terminado, não ocorria uma sublevação de massas tão significativa. Mas isso que importa! Aquele artigo continua sem comentários. Em contrapartida, os leitores do Passa Palavra abundam na discussão da extinção da presidência de Dilma Rousseff. Esta hierarquia de preocupações é um teste significativo. Pelo menos, devia ser.

  25. João Bernardo,

    No caso, a hierarquia de preocupações faz muito sentido. As consequências dos eventos de 2016, e que se prolongaram até a eleição de Bolsonaro (porque o impedimento de Lula em 2018 foi uma continuidade) são sentidas no dia a dia, todo santo dia por aqui. E falo para além da perda de direitos e renda dos trabalhadores que não aconteceriam de outra forma. Falo, por exemplo, do meu local de trabalho. Eu vejo colegas adoecidos, eu mesmo ganhando ma enxaqueca que nunca tive na vida, sofrendo assédios por três ou quatro anos, mantidos por vezes na sujeira, entre outras coisas piores relacionadas ao cotidiano de trabalho que atingem a saúde e eu diria até o tempo de vida.
    As consequências são muito reais e sentidas todo dia. Todo dia, literalmente.
    Então se parte da esquerda não foi capaz de enxergar o que viria, o que estava para acontecer com os trabalhadores (e consigo mesmo enquanto trabalhador), há uma questão política muito séria que não pode ser jogada para baixo do tapete.

    A hierarquia de preocupações começa no próprio local de trabalho.

  26. E o Leo V, mais uma vez, tenta difundir a ideia de que o campo da política se sobrepõe ao das relações de produção. Ele tem enxaqueca não porque houve uma intensificação da exploração do trabalho (que determinou a queda da Dilma), e sim porque a Dilma foi derrubada (o que segundo ele, determinou a intensificação da exploração).

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