O programa da esquerda brasileira está sendo parcialmente realizado como etapa necessária ao desenvolvimento do capitalismo, contra o qual luta desde há muito. Por Passa Palavra
O Brasil vive uma profunda mudança de sua inserção na economia e na política globais. Nunca antes na história deste país se produziu, exportou e investiu tanto, em especial fora das fronteiras – desenvolvendo as empresas transnacionais de origem brasileira. Nunca antes a política externa brasileira foi tão independente – com base na exploração dos recursos econômicos da América Latina e na disputa de mercados e de espaços de investimento em África. Nunca antes o Brasil foi tão engajado – ao ponto de grandes capitalistas apoiarem políticas compensatórias “de esquerda”. Na verdade – e é o que queremos investigar com esta série de artigos – nunca antes o Brasil foi tão imperialista.
O Brasil vive uma profunda mudança de sua inserção na economia e na política globais. Nunca antes no Brasil se foi tão “engajado” – ao ponto de grandes capitalistas apoiarem políticas compensatórias “de esquerda”. E aqui reside o que talvez seja um dos mais dramáticos paradoxos de sua história: o programa da esquerda brasileira está sendo parcialmente realizado como etapa necessária ao desenvolvimento do capitalismo, contra o qual luta desde há muito.
Há tentativas bastante variadas de elucidação deste paradoxo, das mais simplórias às mais elaboradas. Uma delas, a mais simplória, diz que o caso é de “traição” por parte do Partido dos Trabalhadores (PT). Ora, certamente cabe perguntar: houve traição realmente, ou se trata de fazer ouvidos de mercador às promessas que efetivamente foram feitas? Basta analisar não somente os documentos internos do PT, mas também a prática de suas administrações, para que se veja: não traíram ninguém, apenas cumpriram o que prometeram. A Carta ao povo brasileiro, mandada publicar por Lula em sua campanha eleitoral de 2002 e cumprida à risca até o último dia de seu segundo mandato, é exemplo cabal desta desatenção.
Uma outra linha de interpretação, mais conformista, deriva da inserção da esquerda brasileira nos postos mais altos e importantes do Governo Federal (desde o Estado Novo varguista, a única que realmente conta dentre as três esferas federativas brasileiras). Conseguida a partir das sucessivas vitórias eleitorais das coligações de (centro-)esquerda capitaneadas pelo PT desde 2002, tal inserção representaria também a chegada ao poder dos restos de um programa de lutas de mais de trinta anos, cujas origens imediatas remontam à resultante de idéias amalgamadas pelo clássico tripé “Comunidades Eclesiais de Base + sindicalismo autêntico + esquerda revolucionária semiclandestina” que sustentou a criação do PT. Este programa “popular” estaria sendo cumprido, apesar de a “correlação de forças” – sempre ela! – impor sucessivos recuos programáticos. As disputas entre os Ministérios da Agricultura e do Desenvolvimento Agrário quanto ao modelo de agricultura a reforçar no país; a disputa entre os setores “desenvolvimentista” e “ambientalista” dentro do governo federal; a pressão pelas casas decimais para cima ou para baixo nas reuniões do Conselho de Política Monetária (COPOM); a desestruturação dos ministérios e secretarias especiais “identitários”, como a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR), e a polêmica em torno do Estatuto da Igualdade Racial; tudo isto seria explicado pela “correlação de forças”, transformada no infalível abracadabra dos recuos. Mas cabe perguntar: quem controla quem neste jogo de barganhas e enfrentamentos internos dentro do Estado? Os recuos programáticos são feitos porque a correlação de forças políticas é realmente desfavorável à esquerda, ou porque os setores da esquerda hoje no governo desistiram, por acomodação ao Estado, de testá-la de verdade?
Uma terceira linha de interpretação diz que ao longo do tempo o partido teria “virado à direita”, atendendo a interesses cada vez mais “pragmáticos”, perdendo qualquer ligação com projetos de transformação social mais profunda. Estaria “entregando os pontos” há um bom tempo, e terminou “beijando a cruz” do programa das instituições financeiras multilaterais internacionais por força de hábito, de tanto segui-lo em busca de “credibilidade”. Reconhecendo a esta interpretação o mérito de ligar os destinos políticos do país àquele das finanças internacionais – afinal, a mundialização, hoje a forma principal de atuação dos gestores do capitalismo, está no DNA do regime – ainda assim cabe perguntar: que significa esta “virada à direita”? Quem a capitaneou, e com que interesses? Resultaria a adesão de setores da esquerda brasileira aos círculos financeiros internacionais do automatismo de “beijar a cruz” seguidas vezes, ou de escolha deliberada, verdadeiro corolário de opções políticas anteriores?
Uma quarta linha de interpretação diz que a “virada à direita” e o “pragmatismo” resultam da ocupação paulatina, por setores da esquerda, de espaços em conselhos gestores de fundos públicos (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS, Fundo de Amparo ao Trabalhador – FAT), de bancos de investimento (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES) ou de fundos de pensão (PREVI, PETROS, etc.). Os setores da esquerda que chegaram a tais posições exercem controle direto sobre algumas das principais forças motrizes da economia brasileira. E assim, de grão em grão, se chegou ao paradoxo de “trabalhadores” controlarem os meios de produção, embora os trabalhadores sigam explorados – este, o real conteúdo da “conversão à cartilha neoliberal”. Embora o esmaecimento das fronteiras entre o “público” e o “privado” seja traço histórico da política brasileira desde há muito, estes setores da esquerda agora participam – e não raro patrocinam – suas formas mais avançadas. Reconhecendo a esta interpretação o mérito de entrar nas lutas internas da própria esquerda, cabe ainda assim perguntar: quem são estes setores? De onde vieram, o que querem, para onde vão? Que jogo político levou a esta opção, e que metamorfoses sociais resultam dela? Que ligação têm estes setores com práticas parecidas ocorridas em outros tempos e lugares?
Os “descaminhos” da esquerda não surgem somente a partir das “traições” de certas lideranças, mas também – e fundamentalmente – das disputas internas que atravessam suas organizações. Nas origens do programa político que a esquerda brasileira apresenta hoje – totalmente funcional ao desenvolvimento do capitalismo – há traços não apenas do ideário “democrático-popular” do “tripé clássico” já referido, mas também de todas as polêmicas que marcaram o nacionalismo revolucionário brizolista, o socialismo democrático do Partido Socialista Brasileiro (PSB), as críticas das organizações dissidentes do Partido Comunista Brasileiro (PCB) surgidas a partir da década de 1960, o programa “etapista” do antigo PCB, as lutas das oposições sindicais, as ideias dos chamados “autonomistas” que compuseram o núcleo ideológico inicial do PT e de personalidades isoladas, etc. É preciso refletir sobre tão controverso quinhão. Do espólio das lutas populares herdamos – aqui sim, por hábito – a noção de que o Brasil é um país subdesenvolvido. Mas aquilo que vemos diante dos olhos mostra outra coisa. E esta outra coisa, que entra olhos adentro, é preciso vê-la através dos olhos dos outros, pois o hábito torna-se cegante depois de certo ponto.
Nunca antes na história deste país se produziu, exportou e investiu tanto, em especial fora das fronteiras – campo onde se desenvolvem as empresas transnacionais de origem brasileira: Marcopolo, Colcci, Copersucar, Grupo André Maggi, Camargo Corrêa, Embraer, Vale, Braskem, Grupo Votorantim, Fibria Celulose, WEG, Duratex, JBS, Traffic, Odebrecht, Brazil Foods, Suzano, Queiroz Galvão, etc. Nunca antes a política externa brasileira foi tão independente – com base na exploração dos recursos econômicos da América Latina e na disputa de mercados e de espaços de investimento em África. Alguns exemplos. A Agência Brasileira de Cooperação tem orçamento anual de cerca de R$ 52 milhões, e pulou de 23 projetos de cooperação técnica no exterior em 2003 para 413 em 2010. Segundo The Economist (15 jul. 2010), o total de investimentos brasileiros na cooperação para o desenvolvimento, somando-se nesta rubrica contribuições ao Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), apoios pontuais aos palestinos na Faixa de Gaza, investimentos no Haiti e empréstimos internacionais feitos pelo BNDES, pode chegar a US$ 4 bilhões [milhares de milhões] – mais que, por exemplo, os investimentos da Suécia ou do Canadá. Países da comunidade lusófona (Moçambique, Timor Leste e Guiné Bissau) estão no topo da lista de beneficiários, mas a cooperação para o desenvolvimento vinda do Brasil estende-se também sobre a América Latina. Cabe perguntar: tal como a cooperação para o desenvolvimento feita pelos países imperialistas “clássicos”, esta “ajudinha” não seria uma das formas de exercício do soft power sobre número cada vez maior de países? Como é possível entender a cooperação para o desenvolvimento brasileira dissociadamente da incessante busca por um assento no Conselho de Segurança da ONU e da constante participação de tropas brasileiras nas Forças de Paz da ONU? É isto mesmo? Ou ainda temos que “deixar de pagar a dívida”?
Há outros sinais importantes. Que dizer quando 80 organizações, movimentos sociais e sindicais da Alemanha, Argentina, Brasil, Canadá, Chile, Equador, França, Itália, Moçambique, Nova Caledônia, Peru e Taiwan organizam o Encontro Internacional de Atingidos pela Vale e acusam uma empresa “brasileira” de formação de milícias, de superexploração de trabalhadores e de ataque a sindicatos, sem contar os incontornáveis danos ao meio ambiente? Seria este comportamento semelhante ao da Petrobras na Bolívia e na América Central, ao da Itaipu junto ao Paraguai, ao do Grupo Votorantim em diversos países, ao da Odebrecht na África e ao da Mendes Júnior no Oriente Médio? É isto mesmo? Ou ainda temos que lutar apenas e tão-somente contra o “imperialismo ianque”?
Não há respostas prontas para as perguntas emersas do desnorteio em que se encontram setores cada vez mais expressivos da esquerda brasileira no período mais recente de lutas. A tais questões ainda não se oferecem as respostas tranquilizantes que se espera das cartilhas de formação, como quem busca abrigo em meio ao furacão. Apesar disto, há uma quase certeza, um fio desgarrado da meada, a orientar quem tem o internacionalismo como método e só compreende a emancipação dos trabalhadores como resultado de suas próprias lutas e da consolidação de sua força política. Puxando este fio, pode ver-se algo no caminho rumo às – sempre provisórias – respostas que surgirão da análise das lutas sociais que vivemos: nunca na história deste país se foi tão imperialista. E o pior: muita gente – inclusive de esquerda, inclusive autoproclamados “revolucionários” – acha isto ótimo. É a partir daí, e das lutas disto decorrentes, que é preciso buscar as respostas pelas quais se anseia – algo com o que a série de artigos aberta com estas breves provocações pretende colaborar.
Estas versões de Tarzan devem-se, a de cima e a do meio, a Frank Frazetta e a de baixo, a Hal Foster.
A questão é muito pertinente e deve ser mesmo levantada.
Mas se não fôr feita com um grau maior de escrutínio, corre o risco de se esgotar pela imprecisão.
É natural que sejamos tentados a deduzir, das práticas recentes das sub-condições de trabalho dessas empreiteiras aqui no Brasil, comportamente semelhante nos países em que as mesmas empreiteiras se instalaram.
Entretanto, o modelo de contratação dessas empresas lá fora parece ser outro, o da contratação de mão-de-obra local, o do treinamento dessa mesma mão-de-obra, e provavelmente delega todas as responsabilidades trabalhistas a empresas locais, de forma a concentrarem-se exclusivamente na prestação dos serviços e, é claro, no recebimento do dinheiro (e que não é pouco).
Nesse ponto, as empreiteiras em África parecem carregar um comportamento “irretocável”, e que acaba sendo até um diferencial na hora em que têm que concorrer com os chineses, na medida em que dão oportunidade de trabalho e treinamento aos locais, coisa que o modelo de Pequim não pratica, importando mão-de-obra chinesa para realização dos serviços em África, além de serem conhecidos desrespeitadores dos direitos humanos. (Ver aqui
O ponto que na verdade tem que ser focado é, além do próprio caráter oligárquico da meia-dúzia de empresas de sempre que vão ganhando bilionários contratos a reboque da política externa (também, irrepreensível) do Brasil, o grau de coerência efetiva com um discurso diplomático que diz querer auxiliar os povos do Sul.
Nesse sentido, passaríamos a questionar que serviços estão sendo feitos lá, se são estratégicos ou não, e para quem: para o próprio país contratante? para que setores do país contratante, o povo? uma oligarquia que tem o poder? para o Brasil? para que setores do Brasil, as empreiteiras? o povo? em que medida?
Se não fôr por mais nada, pelo fato de que esses projetos recebem, normalmente financiamento do BNDES, dinheiro público, portanto.
Pelo meu lado tenho procurado reunir algumas evidências para tentar responder estas questões, num trabalho bem limitado de pesquisa na internet, registrando-as num blog, mas há a necessidade de maior aprofundamento dessas questões e, para isso, deve-se abandonar as acusações mais fáceis, que podem ter um efeito imediato melhor, por serem facilmente resumíveis em frases curtas e bombásticas, mas que também podem ser fácilmente derrubadas se não estiverem efetivamente fundamentadas, com o agravante de trazer a sombra da desconfiança para quem fez a denúncia.
Ao comentar sobre o modelo de contratação de mão-de-obra em África por essas empreiteiras, quis alertar exatamente para a necessidade de fundamentar melhor essas denúncias para direcionar o arcabouço crítico de forma mais eficaz.
Só para ilustrar melhor o ponto a que quero chegar – sempre no sentido de agregar – tomemos, por exemplo, a Embrapa.
É inegável que o discurso oficial que prega a transferência de tecnologia agrícola para países mais carentes é sedutor: a insegurança alimentar – especialmente dos países africanos, grandes importadores de alimentos – está na ordem do dia, e a diplomacia brasileira se vale desse momento para estimular a presença da Embrapa em África com o suposto objetivo de auxiliar o continente a adquirir a sua própria soberania agrícola. (ver aqui)
Por outro lado, sabemos também que há grande interesse por parte do Brasil em transformar o etanol em commodity (ver aqui), e não por acaso as memsmas empreiteiras já iniciaram projetos em África nessa direção (ver aqui)
E mais, onde existe uma iniciativa, a da Embrapa, está a outra – a do etanol. E aí, surge a questão? Será que a tecnologia agrícola gentilmente cedida pelo Brasil aos povos amigos será utilizada, na verdade, para potencializar a agroindústria do etanol, em detrimento da agricultura de alimentos? Pelo menos é o que sugere uma análise grosseira de alguns números em Angola (ver aqui, aqui e aqui. Se vocês observarem bem, o empreendimento da Embrapa para produção de alimentos é pontual, se comparado com o de etanol. Ou seja, o discurso sobre o uso de tecnologia brasileira para o combate à insegurança alimentar parece ser apenas isso, um discurso, quando a prática parece mostrar que o uso será para outra finalidade (desnecessário mostrar o quão qustionável é o estabelecimento de uma agroindústria de cana, com seus grandes latifúndios, voltada para exportação, em países importadores de alimento)
Isso para não mencionar as próprias suspeitas de conflitos de interesses que recaem sobre a Embrapa (ver aqui
Gustavo,
O fato das empreiteiras brasileiras terem na África, ou onde for, um padrão de exploração do trabalhador menos ruim do que no próprio Brasil me parece irrelevante para a argumentação do texto. O artigo não busca denunciar essa ou aquela empresa ou setor: ele aponta o fato do Brasil estar cada vez mais numa posição imperialista, que parte condiderável da esquerda sempre condenou e condena nos países do chamado Primeiro Mundo. Isso á fato, a meu ver.
Comentando o artigo: o Brasil se torna proto-imperialista sem ter resolvido os enormes bolsões de miséria dentro do país. Algo que no governo Lula foi “como sempre” e não “nunca antes”, se trata da manutenção das desigualdades econômicas e de renda no país.
Leo, seu comentário me lembrou de alguns fatos. Primeiro: enquanto a Inglaterra era a principal potência econômica mundial, a aristocracia vitoriana conviveu com as mais terríveis formas de miséria. E não apenas na Inglaterra, mas também na Irlanda, tida quase como colônia inglesa, onde a fome grassou em grandes períodos do século XIX e movimentos revolucionários brotavam como cogumelos depois da chuva. Segundo: ao dar seu salto para a hegemonia mundial, os EUA conviveram com uma enorme pauperização no bojo da crise de 1929. Com estes exemplos quero dizer que a convivência entre pujança econômica e desigualdades sociais não é exclusividade nossa, e que sua não-resolução não representa, a meu ver, obstáculo para o desenvolvimento apresentado no artigo.
Acrescento algo ao comentário de Manolo. Essa discrepância constitui uma regra do capitalismo, que Trotsky formalizou ao mencionar o «desenvolvimento desigual e combinado». E não devemos pensar que a conjugação entre centros de elevado crescimento económico e bolsões de miséria caracterize apenas a relação estabelecida entre o que muitos insistem em denominar Centro e Periferia. É no interior dos mesmos países, até das mesmas regiões, que essa conjugação se opera. Seria bom que aqueles brasileiros que consideram o Brasil como um país do terceiro mundo tivessem oportunidade de visitar as periferias de algumas conhecidas capitais europeias, isto se não quiserem dar-se ao trabalho de estudar as estatísticas e um pouco de história económica. A articulação entre aquilo que em termos marxistas se denomina mais-valia relativa e mais-valia absoluta tem caracterizado o capitalismo em todas as épocas e em todos os países, embora em graus variáveis. Ainda quanto ao Brasil, recordo o que escrevi neste site num artigo acerca do Programa Bolsa Família ( http://passapalavra.info/?p=21194 ), que «o índice de Gini apresenta uma descida continuada especialmente desde 2001», embora isto não impeça «a ocorrência simultânea de outro processo, o do agravamento da desigualdade na repartição da renda entre o capital e o trabalho».
Um grande brasileiro, Ruy Mauro Marini, (re)negado pela estória de seu próprio país nos apresentou estes problemas já na decada de 70. Subimperialismo e superexploraçao do trabalhador, duas características presentes na história e no presente deste erro histórico, o Brasil.
A superexploração do trabalho do Marini nada tem a ver com a articulação entre mais-valia relativa e mais-valia absoluta de que o João Bernardo falou em comentário anterior.
Esse estranho conceito de superexploração considera que os trabalhadores latino-americanos seriam mais explorados que os trabalhadores do capitalismo industrial central mesmo estando submetidos a sistemas de trabalho menos produtivos. Aliás, segundo a lógica do modelo que o Marini apresentou em “Dialética da dependência”, os países centrais se desenvolvem devido à transferência de valor dessas regiões superexploradas e a causa do desenvolvimento daqueles é o subdesenvolvimento dessas regiões.
Ora, isso não só é absurdo como também dá margem para aquelas interpretações que julgam que o trabalhador (e o capitalista) latino-americano é explorado pelo capitalista e pelo trabalhador das regiões centrais, reavivando o antigo mito fascista da nação proletária.
O Marini me parece muito mais um daqueles autores que se inserem perfeitamente no quadro dos socialistas da miséria do que alguém que antecipou os problemas que essa série de artigos pretende discutir.
Camaradas,
É extremamente pertinente a retomada – mesmo que crítica – das contribuições da teoria marxista da dependência, na qual se insere a obra do Ruy Mauro Marini. Os conceitos de superexploração e subimperialismo, se tomados com uma leitura séria e atenta, podem contribuir para o entendimento do papel do Brasil atual. E acrescentaria a este quadro o conceito de semiperferia, mas por enquanto não entrerei neste ponto.
Em relação ao comentário do Astolfo Jr., considero totalmente equivocada sua leitura, que distorce os argumentos do Marini para melhor criticá-los. Aliás, essa prática foi bastante comum durante duas décadas no Brasil e talvez seu comentário ainda esteja preso ao boicote que esse autor sofreu, junto com a Vânia Bambirra, o Theotônio dos Santos e o Andre Gunder Frank. Para ilustrar o tremendo erro de interpretação – no melhor dos casos – do Astolfo, basta reproduzir uma passagem do mesmo Dialéctica de la dependencia: “lo que se pretende demostrar en mi ensayo es, primero, que la producción capitalista, al desarrollar la fuerza productiva del trabajo no suprime sino acentúa, la mayor explotación del trabajador, y segundo, que las combinaciones de formas de explotación capitalista se llevan a cabo de manera desigual en el conjunto del sistema, engendrando formaciones sociales distintas según el predominio de una forma determinada.”
Em suma, para Marini a superexploração do trabalho não significa, tal como coloca Astolfo, que “os trabalhadores latino-americanos seriam mais explorados que os trabalhadores do capitalismo industrial central mesmo estando submetidos a sistemas de trabalho menos produtivos”, mas “se define – agora nas palavras do próprio Marini – más bien por la mayor explotación de la fuerza física del trabajador, en contraposición a la explotación resultante del aumento de su productividad, y tiende normalmente a expresarse en el hecho de que la fuerza de trabajo se remunere por debajo de su valor real.”
Enfim, para uma leitura crítica, melhor leiam “Dialéctica de la dependencia” e “En torno ‘Dialéctica de la dependencia'”, dispníveis em http://www.marini-escritos.unam.mx/index.htm
Nada mais distante do pensamento do Marini do que falar em “nação prolerária”, ou algo parecido. Se alguém encontrar esse termo ou similares em sua obra, aí sim caberia a crítica, mas isso é impossível. Esse tipo de crítica só se dá como suposições: “O Marini me parece…”.
Bueno, quem quiser entrar séria e rigorosamente na discussão sobre subimperialismo, deve primeiramente ler o próprio Marini – sugiro, de começo, o Prefácio a Subdesarrollo y revolución, ou “La acumulación mundial y el subimperialismo”, disponíveis em: http://www.marini-escritos.unam.mx/073_subdesarrollo_prefacio_es.htm e http://www.marini-escritos.unam.mx/006_acumulacion_es.htm.
Atualmente tem cada vez mais gente trabalhando a questão do subimperialismo, entre os quais se destacam Mathias Luce e Fabio Marvule Bueno. Alguns dos seus trabalhos estão dispiníveis em http://www.iela.ufsc.br/uploads/docs/151_teoria_do_subimperialismo.pdf
E http://www.rebelion.org/noticia.php?id=116643
Particularmente, não considero que os conceitos de superexploração e subimperialismo esgotem plenamente a caracterizaração do Brasil atual, mas acredito que não podem ser descartados da discussão e que a crítica, quando feita, deve ser mais rigorosa e precisa.
Era isso.
Saudações!
Aliás, essa discussão me lembrou um artigo do Wallerstein sobre “O antigo dilema da esquerda: caso do Brasil”, disponível em http://fbc.binghamton.edu/277pr.htm
Saludos!
Leo,
Admito que dei importância demais ao fato de o artigo sugerir a existência de práticas exploratórias nos países em que essas transnacionais brasileiras atuam (e resta saber se não existem mesmo, a despeito das minhas indicações em contrário).
De forma equivocada, condicionei o imperialismo que tematiza o artigo a essas práticas, e apenas a elas, e tentei mostrar que, se se deseja contrapôr um discurso à internacionalização brasileira, teria que se levar em conta as particularidades com que ela se tem dado recentemente, ou seja, protegida por um discurso de inclusão de mão-de-obra local e de transferência tecnológica que, numa primeira análise, e em tese, são aspectos positivos e que diferenciariam, de certa forma, a internacionalização brasileira da imagem clássica do imperialismo ianque (ou, em outras palavras, na imagem que não-especialistas, simples leitores como eu, fazem do termo)
Entretanto, a partir dos demais comentários, e posterior releitura do artigo, vejo que o conceito de imperialismo é muito mais complexo e vasto do que essa imagem clássica, e remete a arcabouços teóricos dos quais só posso dizer que desconheço.
Agradeço, portanto, a oportunidade para maior aprofundamento da questão, suscitada, em primeiro lugar, pelo ótimo artigo, e depois, pelos demais comentários.
Se bem entendi, este artigo é o primeiro de uma série sobre o assunto, portanto, fico aguardando, com interesse, a publicação dos próximos artigos.
Saudações a todos
Gustavo,
quando respondi ao Leo, terminei me esquecendo de dizer mais ou menos o que ele disse: o artigo não trata do comportamento desta ou daquela empresa brasileira em comparação com empresas de outros países, mas do comportamento do Brasil na arena econômica e política internacional. Algo difícil no campo da esquerda brasileira, que em geral prefere não tocar neste assunto espinhoso.
Mas tem algo mais, que reparei agora: você baseia seu comentário no comportamento de empreiteiras, e delas seu blog dá informações boas e abundantes; mas note como o artigo não menciona apenas empreiteiras, mas também a indústria do vestuário, a indústria alimentícia, o agronegócio…
Quanto a você não conhecer os arcabouços teóricos do imperialismo, não se preocupe com estes detalhes, isto não impede o debate quando se está aberto a argumentos. Na curta semana em que estive na Bolívia, em 2008, tenho certeza que a maior parte das pessoas que me tacharam de “imperialista” por eu ser brasileiro — do engraxate ao motorista de “buseta”, da policial ao sociólogo, da freira ao jornaleiro — nunca leu nada de Marini, Lenin, Hobson, Bukharin, Luxemburg, Harvey etc., nem sequer conhece o debate sobre o tema.
Ótimo texto de introdução ao debate do Brasil enquanto nação imperialista. Acredito que este eixo de discussão será um dos mais polêmicos no campo da esquerda brasileira atual, pois mostrará o quão entranhada está a ideologia nacionalista da qual custamos a nos livrar. Logo a discussão esbarrará em outra ideologia anti-internacionalista, o “bolivarianismo”. Os nacionalismos latino-americanos continuam com sua política chauvinista de apontar para um único inimigo, sempre externo, mascarando suas políticas internas de contenção violenta das lutas sociais. Com a visita de Obama ao Brasil, esse espírito se exacerbou, como mostra a fala do bolivariano Atílio Boron: “Os interesses imperialistas estão sobre o Brasil. (…)um Brasil poderoso é um estorvo para os projetos do imperialismo na região” (http://limpinhocheiroso.blogspot.com/2011/03/atilio-boron-e-amazonia-estupido.html). Foi interessante o debate que participei há algum tempo em outro fórum, onde coloquei um texto da CCI em circulação, que denunciava o caráter imperialista da Venezuela chavista. Concordemos ou não com as posições da CCI, o que gerou a maior indignação foi a própria tese de que Chaves era imperialista, uma verdadeira blasfêmia para muitos. Para além de todo tipo de desqualificação que surgiu em resposta, o argumento central era sempre o da velha “desconsideração da correlação de forças”. Ou seja, para fortalecer um bloco antiestadunidense, vale qualquer coisa. Este é o anti-imperialismo (dos outros). Seria o “capitalismo andino-amazônico” diferente, ou até, melhor do que o ianque? Sem dúvida há interesses imperialistas dos EUA sobre o Brasil e o restante da América Latina. Mas, no caso da visita de Obama, não se trata apenas da ave de rapina visitando sua vítima para ver como vai sua engorda. O imperialismo crescente brasileiro busca seu lugar ao Sol, e para tal vem fazendo uma série de acordos políticos e econômicos com o imperialismo ianque, com a comunidade européia, com a China, e com quem mais for necessário, como mostra o texto e alguns dos comentários acima.
A dificuldade (ou não) em aceitar que o Brasil É uma nação imperialista, é o termômetro que aponta a atual situação da esquerda brasileira, pelo menos um grande indicativo.
Ah! Já ia me esquecendo: o que Boron quis dizer com “um Brasil poderoso”?
Camaradas,
estou conhecendo o site agora e adorei bastante o debate. Buscarei tecer alguns comentários dentro das minhas limitações.
Acredito que o texto base superdimensione o papel do Brasil na economia e política mundiais, distorcendo o novo cenário global. Observem que utilizei o adjetivo novo para caracterizar o nosso momento histórico, pois acredito que a sua differentia specifica deva ser apreendida pela esquerda – evitando-se assim os manuais pré-fabricados. Esta mudança existe, porém não na profundidade apregoada pelo texto que termina por corroborar com as palavras de Obama e de Dilma, quais sejam: Brasil e EUA como dois países simétricos na disputa econômica e política mundiais. No livre mercado mundial, o Brasil ainda se situação com um país periférico do sistema do capital, como um locus interessantíssimo para o capital especulativo e numa tendência de reprimarização da economia. Me pauto bastante aqui nas análises de Reinaldo Gonçalves e Luiz Filgueiras sobre a política econômica do governo Lula: continuidade no processo de endividamento público para satisfazer o capital especulativo e que desindustrializa o país, hipertrofiando a nossa tradição de exportador de matérias-prima. Frisemos que a grande maioria das grandes transnacionais citadas no texto é de natureza primária ou de setores de menor relevância em termos macroeconômicos. A única exceção é a Embraer. Não esqueçamos também que grande parte das transnacionais brasileiras estão associadas ao capital internacional. No rearranjo de quatro décadas de neoliberalismo – como reflexo necessário da crise estrutural do capital – o Brasil se mantém como periferia do sistema, mesmo que neste novo momento produza os seus próprios oligopólios que atuam como um subimperialismo regional, sem, contudo, macular sua posição no sistema mundial. Acredito que a tese de Virgínia Fontes do Brasil e o Capital-Imperialismo nos ajude a situar este novo-velho momento do Brasil. Ainda acredito que nesta dialética de novo e velho característico da formação capitalística brasileira o velho se sobrepunha às transformações correntes. Acredito que o texto também peca ao dizer que o programa da esquerda brasileira está sendo parcialmente realizado. Isso porque a moribunda estratégia da revolução democrático-nacional, por mais equivocada que seja, não se identifica com o que vivenciamos atualmente. Termina fazendo coro com os Mercadantes e Mantegas da vida com a tese do neodesenvolvimentismo. Por mais díspares possíveis que sejam as teses democrático-nacional do PCB e do desenvolvimentismo, ambas previam transformações estruturais do capitalismo nacional, nada semelhante ao nosso grau de dependência externa onde o sucesso do agronegócio é a solução para as contas externas não fecharem no vermelho. Tudo isso sem falar na natureza dos postos de trabalhos criados pelas transnacionais brasileiras, aqui e no estrangeiro. A Vale e a Petrobrás são as nossas maiores empresas, ambas exportadoras de matérias-primas. O texto pode até ser interessante para nos contrapormos às reminiscências do etapismo stalinista, mas termina por defender que a mesma perdeu a razão de ser simplesmente porque o governo do PT realizou a primeira etapa da revolução brasileira. Mesmo como socialista e adepto da teoria da revolução permanente acredito que os dignos defensores da estratégia democrático-popular não concordam com a ideia de que esta é uma realidade. O capitalismo brasileiro – agora mais do que nunca – exige uma estratégia socialista que refute qualquer caracterização do caráter progressista da burguesia nacional, qualquer que seja a sua clivagem. Pra defender o caráter atrasado do etapismo não precisamos defender que o PT engendrou a capitalismo nacional.
O comentário do Iraldo me fez lembrar de um curso a que assisti em 2009 sobre a teoria da dependência. Lá pelas tantas um dos organizadores do curso passou a exaltar o governo Chávez por opor-se ao imperialismo estadunidense. Segundo sua linha de raciocínio, era essencial a defesa dos governos que se afirmavam anti-americanos pois constituíam-se nos baluartes de onde se podia vislumbrar uma saída para a tal dependência. Perguntei então se o anti-imperialismo do Chávez não era também um outro imperialismo embrionário.
Argumentei à época à maneira de Lênin, considerando imperialismo aquele estágio avançado do capitalismo e enumerando as 5 características por ele apontadas, em especial a da fusão do capital bancário com o capital industrial e a criação do capital financeiro; e a da formação de associações capitalistas de monopólio internacional. E considerei as propostas de criação de bancos binacionais com Rússia e Irã, feitas em fevereiro e abril daquele ano para financiar a produção dos setores militar, energético e de infraestrutura, o caso mais típico de imperialismo. Mas, assim como o Iraldo, aquilo que disse soou aos bolivarianos uma completa blasfêmia.
O cânone que lhes norteia (ou suleia, como queiram) diz que só os EUA são imperialistas, e que o Brasil pode no máximo ser subimperialista. Isso mais parece um auto-de-fé.
Sempre me pergunto por que quem se diz marxista ou adepto da teoria da revolução permanente em geral usa como termo de comparação as características físicas dos bens produzidos, se são afetados ou não pela gravidade, se apodrecem ou enferrujam. Ou estou enganado, ou são os ricardianos quem sempre procedeu a esse tipo de análise. Quem se diz marxista deveria ao menos, acho eu, analisar o processo de produção e as formas de realização da exploração durante este processo. É a produtividade com que se produz e não o que se produz o que importa.
Nunca se sabe se a extrema-esquerda brasileira critica os governos de Lula e de Dilma por não derrubarem o capitalismo ou por não administrarem eficazmente o capitalismo. Se é por não derrubarem o capitalismo, esses governos nunca se propuseram derrubá-lo. Se é por não o administrarem com eficácia, será que a extrema-esquerda se propõe gerir o capitalismo de maneira mais competente?
Pessoal,
Aproveitando a dica do Fernando, não somente li o texto do Mathias Luce, como me dei ao trabalho de traduzi-lo, e postá-lo no meu blog.
http://matutei.wordpress.com/2011/03/29/o-subimperialismo-brasileiro-na-bolivia-e-america-latina/
Dokonal,
primeiramente, não devemos desconsiderar a materialidade da coisa, o ser-precisamente-assim transformado mediante o trabalho humano. Abstrair tal aspecto é incorrer em um erro profundamente idealista, pois unilaterizaríamos a ideação (a liberdade, as volições) em detrimento da necessidade da matéria que será alvo de nossa ação. Daí chegaríamos ao ponto de desconsiderar o valor de uso que está subsumido ao valor de troca: subsumido, porém não dissolvido em sua existência. Ex.: a materialidade cana-de-açúcar impõe consequências importantíssimas para a produção do setor sucroalcoolero e para a rotação do capital como um todo; por mais que a biotecnologia avance não há como prescindir das determinações intrinsecas deste ser natural. Marx mostra que o sal e o ouro não se tornaram a toa equivalentes universais: a materialidade dos mesmos os capacitaram a figurar como dinheiro. Enfim, deve-se sim levar em consideração a qualidade do valor de uso, mesmo que não se configure como o momento predominante do processo de produção e circulação.
Segundo e como consequência: o índice de produtividade é de fato o fundamental de uma análise marxista, entrantanto, faz-se necessário saber de que produto está se tratando. Se levarmos em consideração a produtividade do trabalho no que diz respeito a produção de soja, açúcar, minério de ferro, etc. certamente o Brasil figurará entre as potências mundiais. O mesmo não ocorrerá caso pensemos em ramos produtivos onde a nossa produção é retartadária ou inexistente, justamente aquelas onde a magnitude de valor agregado por unidade produzida é de maneira tal que torna as nossas trocas desiguais. Nosso parque produtivo mais avançado compra seu capital morto das potências centrais; nossos bens de capital são em larga escala trans-oceânicos. Acredito que, entre outros aspectos, a superação de tais trocas desiguais e a equalização do índice de produtividade com as potências centrais é uma condição para afirmarmos que a mudança foi tão profunda a ponto de figurarmos de igual para igual com os yankees. A universalização do rádio ou da televisão na era da microeletrônica não nos torna equiparados aos pólos produtivos que operam as inovações produtivas. Obama veio ao Brasil para fazer propaganda dos F-16 e exigir parcelas do pré-sal, ao passo que o Brasil exigia o fim das barreiras alfandegárias que encarecem o suco de laranja no mercado estadunidense. Relações simétricas? Trata-se de um lula-petismo velado se afirmar que sim.
A questão não é se o PT administrou bem ou mal o capitalismo brasileiro, mas sim reconhecer a natureza do projeto político-societário implementado pelo mesmo. No meu ver, tal projeto possui a linha de continuidade com o governo anterior, da direita clássica. Digamos que as estratégias do PT e do PSBD para o Brasil são as mesmas, divergindo entre si em aspectos acessórios. O neoliberalismo não deve ser encarado como uma política pontual, mas sim como um continuum na quadra histórica atual onde a crise agonizante do capital estreita ainda mais o leque de possibilidades da política. Nestes estreitos limites da política na contemporaneidade é que o PT e o PSBD divergem, sem, contudo, superarem o “possível” para o capital. E mais: não se trata de traição do PT, mas sim da falência da estratégia socialdemocrata ou democrática-popular do PT; tal programa sucumbe àquelas exíguas possibilidades existentes no sistema do capital atual, pondo em evidência a necessidade da ofensiva socialista. O PT abandonou o projeto democrático-popular radical em função da incompatibilidade deste projeto com a ordem capitalista atual; o movimento do real se expressou numa política apequinada, mesquinha e frouxa. Seu projeto se tornou dar continuidade à inserção do Brasil no mercado mundial segundo o modelo liberal-periférico, que traz mudanças importantes a serem desveladas cientificamente, mas cuja continuidade tem primazia sobre a descontinuidade.
João Bernardo, ainda me parece existir uma terceira perspectiva política em setores da esquerda: não simplesmente melhor gerir o capitalismo, mas transformá-lo em “socialismo”, através da gestão do Estado. Se os bolcheviques, mesmo no quadro de um processo revolucionário, não foram além de um capitalismo de Estado e da constituição de uma nova classe, quem dirá nossos “partidos revolucionários” que buscam chegar ao poder por meio do voto, no quadro institucional-eleitoral burguês. E muitos levam a sério tal empreitada. A ideologia da “revolução por cima” ainda se faz presente. Seria interessante ver Lênin e Trotsky na TV apresentando as “teses de abril” em 10 segundos: “Em outubro, todo poder aos soviets! Para Presidente, vote Lênin e Trotsky vice!”.
Camaradas,
Fujo um pouco da discussão principal para fazer um comentário específico. Dokonal, é uma pena ler sua generalização simplória da discussão travada no mini-curso de 2009. Você bem sabe que não existe um passo automático entre, por um lado, estudar seriamente autores marxistas que trataram da dependência (não entrarei aqui no mérito de se forma ou não uma “teoria”…) e, por outro, defender o “anti-imperialismo de Chávez”. Tampouco há, ao meu ver, um “cânone” que norteia ou “suleia” aqueles que tratam de ler e difundir uma série de autores normalmente esquecidos e boicotados pela academia e que muitas vezes são também descartados ou desconhecidos por parte do pensamento crítico. Aliás, se existe uma unidade naquele curso é a tentativa de pensar criticamente nossa realidade, para além do pensamento único, inclusive o que assola boa parte da esquerda brasileira, que desconhece autores latino-americanos e nunca leu ou às vezes nem ouviu falar de José Carlos Matiátegui, Victor Raúl Haya de la Torre, Sergio Bagú, Silvio Frondizi, Jorge Abelardo Ramos, Pablo González Casanova, José Revueltas, José Martí, René Zavaleta, Agustín Cueva, Aníbal Quijano, Ana Esther Ceceña, Silvia Rivera Cusicanqui, José Aricó, etc… Isso sem falar nos proprios brasileiros, como os antes mecionados Ruy Mauro Marini, Vânia Bambirra, Theotônio dos Santos, Darcy Ribeiro, Florestan Fernandes, e por aí vai. Enfim, Dokonal, aquela sua forma de debate pouco contribui…
De volta à questão principal do texto – o imperialismo “brasileiro” -, remito também à discussão que a Virginia Fontes vem fazendo sobre o “Brasil e o capital-imperialismo”: http://www.epsjv.fiocruz.br/upload/d/resenha_virginia.pdf
http://www.centrovictormeyer.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=177:o-capital-imperialismo-algumas-caracteristicas&catid=39:artigos&Itemid=63
Bueno, era isso. E seguimos o debate!
Saludos!
Fernando, talvez eu tenha me expressado mal, pois não pretendi fazer uma generalização da discussão travada no mini-curso de 2009, mas tão somente expor um fato ocorrido durante o evento. O que me levou a escrever aquele comentário foi a lembrança deste fato, que por acaso ocorreu durante o referido curso.
Tampouco pretendi estabelecer um passo automático entre teoria da dependência e defesa do chavismo. Alguém poderia estar numa conversa de boteco e ver um garçom exaltar a figura do Chávez, mas acredito que dificilmente ligaria botecos ao anti-americanismo. Quem tratou de estabelecer esse passo automático, de maneira reflexa, foi você quando leu o que escrevi. Ora, isso é de alguma forma significativo porque, se não há um passo automático, deve haver algum caminho entre um e outro, caso contrário você mesmo não teria feito tal associação.
Por fim, posso ter sido pouco claro quando falei do cânone “suleador”, mas referia-me aos bolivarianos e não aos que tratam de ler e difundir os marxistas latino-americanos. Foi você, outra vez, quem procedeu a essa associação.
Voltando ao assunto do artigo, parece-me importante a leitura do relatório “Knowledge, Networks and Nations”, produzido por The Royal Society, a academia britânica de ciências, e disponível aqui: . Para quem tem problemas com o inglês (ou não quer ler as 114 páginas do relatório), o site Inovação Tecnológica publicou um resumo razoável do relatório (e mais voltado ao Brasil) aqui: .
Ainda que cheio de ressalvas, o relatório indica alguns movimentos interessantes da pesquisa científica no mundo, que, não por acaso, tendem a seguir o próprio desenvolvimento do capitalismo. Tão significativo quanto mostrar o avanço da pesquisa e desenvolvimento nos chamados países emergentes é o destaque que o relatório dá à concentração da pesquisa científica em regiões e pólos específicos dentro dos países e ao aumento da colaboração internacional.
Olá,
Provavelmente os links que dokonal gostaria de compartilhar não apareceram corretamente.
Assim, e justamente pela acuidade e importância do relatório destacado, repasso aqui os dois (em inglês e o resumo em português, respectivamente):
http://pt.scribd.com/doc/51762876/Knowledge-Networks-and-Nations
e
http://www.inovacaotecnologica.com.br/noticias/noticia.php?artigo=potencias-cientificas-emergentes-ciencia-global&id=020175110330
Os links não apareceram, mas estão aqui: http://royalsociety.org/policy/reports/knowledge-networks-nations/
e aqui: http://www.inovacaotecnologica.com.br/noticias/noticia.php?artigo=potencias-cientificas-emergentes-ciencia-global&id=020175110330
Olá, entro no debate um pouco atrasado, mas não posso me furtar a rebater os comentários equivocados do Astolfo Jr. com relação à obra de Marini. Sua interpretação é repetidamente a mais simplista e a mais superficial que se extrai de Marini. Mesmo assim, negar a transferência de valor de países como a própria Bolívia ou mesmo a Venezuela aos EUA, Alemanha e França é negar a própria situação de dependência e neocolonialismo de regiões inteiras como a América Latina e apoiar a ideia “arco-íris” da interdependência mundial. Tampouco se trata, em Marini, de alguma reverberação nacionalista ou regionalista. Será tanta nossa ignorância sobre a história colonial de saqueio? Por fim, também espero atento os futuros artigos da série e o debate.
Mas Bruno, acho que o artigo fala do Brasil, não da Bolívia ou da Venezuela. Que acha do que ali está dito?
Com a visita da Presidenta Dilma a Portugal na última semana, no quadro da crise política e econômica que vive o país, ocasionando inclusive a renúncia de Sócrates, houve rumores de que o Brasil iria comprar títulos da Dívida Pública portuguesa, como forma de “ajuda” à nação lusa, uma injeção de capital em sua economia. Embora negada por Mantega, tal “ajuda” nada mais seria do que uma forma de endividamento externo que Portugal assumiria com o Brasil. Segundo informações de parentes que lá vivem, portugueses indignados afirmavam que o Brasil iria “comprar Portugal”. Mais um indício de uma economia fortemente em expansão internacional, de tipo imperialista. Seria interessante que os comentaristas portugueses do passapalavra, nos dessem mais informações a respeito desses fatos.
Iraldo,
Por favor, poupe os comentaristas portugueses, que têm mais que fazer, ocupados que estão com as misérias da terrinha. Respondo eu, que aliás até sou português. Basta consultar artigos publicados em 2010 no site do Governo Federal brasileiro:
http://www.brasil.gov.br/noticias/arquivos/2010/12/10/brasil-podera-comprar-titulos-da-divida-publica-portuguesa
e no site da Embaixada de Portugal em Brasília:
http://embaixada-portugal-brasil.blogspot.com/2010/12/brasil-podera-comprar-titulos-da-divida.html
e compará-los com uma notícia posterior, de 31 de Março de 2011:
http://g1.globo.com/economia/noticia/2011/03/mantega-sinaliza-que-brasil-nao-vai-comprar-titulos-da-divida-portuguesa.html
Mas, pelas suas observações, não creio que você esteja a par da situação. O endividamento externo de Portugal existe há bastante tempo, e atingiu agora proporções catastróficas. O Brasil limitar-se-ia a comprar títulos de uma dívida já existente, e se o fizesse seria um péssimo negócio nesta altura. Quanto às reacções dos «portugueses indignados» que você cita, é sabido que o nacionalismo assume todos os cambiantes da estupidez, e esses portugueses deveriam, pelo contrário, ficar muito contentes por haver algum país a querer «comprar Portugal».
João Bernardo, de fato estou desinformado, por isso pedi mais informações sobre o caso. Também não afirmei que não havia endividamento externo em Portugal, mas que esse ponto poderia ser mais um aporfundamento do processo. Também não dei razão às manifestações nacionalistas, apenas coloquei como um indício do problema. Óbvio que um empréstimo não é a compra de um país e quem pensa isso é merecedor de todos elogios tecidos em seu comentário. Acredito, mas posso estar enganado, não é o meu caso. Quando me referi aos comentaristas portugueses, estva pedindo ajuda a compreender uma situação, a quem melhor a conhece. De qualquer forma, agradeço os esclarecimentos, era justamente o meu objetivo, pois nunca pretendi escrever um livro sobre o assunto.
Manolo, nao acredito que a discussao foi desvirtuada. Ainda podemos falar da América Latina em bloco quando se refere a economia mundial. O Brasil também se inclui nos países que realizam transferencia de valor (quantidade de trabalho) para os países centrais do capitalismo através da super-exploracao dos seus trabalhadores. Longe de ser um “conceito estranho”, se trata de uma ferramenta que nos ajuda a explicar o neocolonialismo atual. Mas a insercao do Brasil é outra, menos subordinada, mais autonoma, sem deixar de exercer seu subimperialismo (seria outro “conceito estranho” aos nossos ouvidos eurocentricos e colonizados???) sobre os países vizinhos e agora África e outras regioes. Aqui no México, se comenta que anos atrás, antes da crise de 1982, a “bola da vez” era o próprio México. O campo mexicano era forte e sua proximidade dos gringos dava a sua indústria certa solidez. Ninguém esperava efeitos recessivos tao profundos que se sentem até hoje. Por isso lhes pergunto: o que será da economia brasileira (que agora é a que está de moda) quando as próximas crises afetarem a economia chinesa, principal destino das exportacoes do nosso gigante com pernas de barro???
Intrometo-me no debate entre o Manolo e o Bruno, mas a questão interessa-me e trabalhei longamente nela. Em Economia dos Conflitos Sociais (1ª ed. Cortez, 1991; 2ª ed. Expressão Popular, 2009) pretendi mostrar que aquilo que é geralmente apresentado como uma super-exploração dos trabalhadores de um país subdesenvolvido pelos capitalistas de uma metrópole imperialista é, na realidade, uma desigual repartição da mais-valia entre os capitalistas das duas regiões. A operação que, no plano económico, consiste em apresentar algo que decorre da desigual repartição da mais-valia como se decorresse da exploração da mais-valia equivale, no plano político, à operação que pretende apresentar a existência de uma burguesia nacional e nacionalista, dotada de potencialidades emancipadoras. É, uma vez mais, a confusão entre luta de classes e luta de nações.
É muito comum a resposta a uma crítica se resumir a caracterizar essa crítica como simplista, superficial, uma leitura equivocada, um erro de interpretação ou coisa pior. Não importa a esse tipo de resposta se a crítica conseguiu, embora de forma reduzida, reconstruir o modelo criticado com sua lógica interna e seus mecanismos causais. Nem se nessa reconstrução a crítica consegue apontar as consequências extremas, mas possíveis, desse modelo levado ao limite.
O que me parece curiosíssimo entretanto é o tipo de resposta que reafirma, já na frase seguinte, exatamente aquilo que a crítica havia apontado como problemático. Só uma profunda cegueira — ou a fé, que tem efeito similar sobre a razão — explicam uma coisa dessas.
Estou falando aqui obviamente da resposta do Bruno ao comentário do Astolfo Jr. O comentário seguinte do Bruno só prosseguiu de forma mais acentuada a coisa toda, ao deixar de lado uma certa classe e ao tratar a questão em termos de países. É a confusão entre luta de classes e luta de nações, bem apontada pelo comentário do João Bernardo e já sugerida naquele comentário do Astolfo Jr.
dokonal, apenas tentei responder o questionamento do Manolo com relação ao que eu achava do artigo depois de haver respondido o Astolfo Jr., que a meu ver reduz a interpretação do Marini a uma questão de luta entre o sul e o norte do mundo. Se depois de afirmar que em Marini a luta de classes está presente e paradoxalmente minha resposta ao Manolo voltou a confundir luta de classes com luta de nações, talvez seja porque o próprio artigo do PassaPalavra também deixa isso subentendido (ao menos essa foi minha leitura quando o artigo trata da presença do Brasil na América Latina e África). Como dei minha opinião sobre o artigo, acabei refletindo minha interpretação sobre ele diretamente, sem as mediações que o Joao Bernardo acertadamente propôs depois. O que não dá pra aceitar é que titulem o Marini de tintes fascistas baseando-se num único livro. Não sou especialista em sua obra, mas conheço o suficiente para não ficar calado diante de tal absurdo. Ele deve estar se remoendo em sua tumba…
Acho que no meu comentário anterior, não havia entendido a crítica do dokonal. Esclarecendo melhor o debate: quando respondi ao Astolfo Jr., afirmando que sua interpretação está equivocada, me referia ao que ele descreve como “nação proletária”, que fica subentendida na obra de Marini. Segundo essa idéia, os trabalhadores e capitalistas latino-americanos são explorados pelos trabalhadores e capitalistas das regiões centrais. Isso é uma derivacao equivocada da obra do Marini reproduzida pelo Astolfo Jr. que é repetida por outros leitores brasileiros de sua obra “Dialética da dependencia”. Ponto. Quando na frase seguinte da mesma resposta ao Astolfo Jr., afirmei que mesmo assim, não se pode desconsiderar a transferência de valor de países periféricos ao centro do capitalismo mundial, me referia entre outros elementos a que não se pode esquecer, num exercício ahistórico, que a acumulação originária propiciada pelas riquezas do nosso território foi o motor do desenvolvimento capitalista europeu. A civilizacao moderna européia teve como contraponto a otimizacao da exploracao dos povos coloniais. Os resíduos coloniais, mantidos mesmo sob o regime de classes, tem sido funcionais a exploracao da forca de trabalho para extracao de um excedente máximo em regioes como a nossa, já afirmava Florestan Fernandes. Dita transferencia atualmente ocorre através da dívida externa (pública e privada), da transferencia de lucros derivados de investimentos externos diretos, cobranca de royalties e direitos de licenca, etc. Mas atencao dokonal: historicamente isso tem acontecido através da articulação das burguesias satélites nacionais e as imperialistas. Ambas repartem a riqueza, porém os primeiros de forma subordinada. Espero ter esclarecido meu ponto de vista e não ter complicado mais ainda.
Fico me perguntando se as coisas tem outro jeito de ocorrer senão historicamente. E “historicamente”, por exemplo, no Brasil do século XIX não há unidade na posição dos britânicos, tão pouco dos brasileiros, isto no auge do período imperialista.
Os brasileiros interessados na modernização do país estavam ampla e intimamente associados aos ingleses. Por outro lado os setores mais retrógrados, aqueles dos latifúndio com trabalho escravo, eram abertamente antibritânicos.
Aqui as tralhas do sistema colonial, notadamente os senhores de terra, atuaram no sentido contrário ao colocado pelo Bruno. Por que faziam isso? Pelo simples motivo de estarem eles muito bem instalados nestas estruturas de poder – herdados dos tempos da colônia – por isso não terem como meta a mudança de suas práticas de exploração (consequentemente também não queriam ver alteradas as suas posições no jogo de poder).
Por outro lado os brasileiros com posições modernizantes viam os ingleses como grandes parceiros, pois eles tinham um capital acumulado indispensável para seus próprios objetivos e além disso detinham também as tecnologias mais importantes que poderiam atuar na modernização brasileira.
Mas os ingleses também se dividiam: os que atuavam junto ao setor de importação-exportação eram contrários à elevação das taxas alfandegárias; curiosamente os ingleses eram favoráveis à elevação destas mesmas taxas quando tinham relação com o mercado de créditos à empresas instaladas no Brasil, quando eram proprietários direto destas empresas, ou quando eram simplesmente administradores destas. Eles entendiam que com o aumento das tarifas alfandegárias poderia haver estimulo ao desenvolvimento das empresas locais, fortalecendo e expandindo o comércio.
Por quê então os ingleses jogavam contra os interesses do seu império? Pelo motivo mais simples (que nunca é devidamente considerado): o da expansão das possibilidades de exploração capitalista. Ou seja, de extração de mais-valia. E chamo a atenção disto ao Bruno, pois no modelo que ele expõe a exploração se dá por mecanismos de circulação e não na produção.
Então em um primeiro momento parte dos brasileiros e parte dos ingleses se uniram para criar estruturas capitalistas no Brasil. Agora (considerando que as empresas tem donos espalhados pelo mundo todo) se unem (até com outros de outros lugares) pra criarem estruturas capitalistas na AL e na África. A dubiedade levantada pelo Bruno sobre o texto (que na minha opinião é uma ironia) é justamente jogar com o fato de hoje existir no Brasil uma estrutura capitalista tão consolidada que ela (a estrutura capitalista de sede brasileira) pode hoje se projetar enquanto imperialista sobre os locais onde ainda esta estrutura não esta suficiente ou satisfatoriamente consolidada. Basta ver a atuação das grandes empresas brasileiras pelo mundo, justamente construindo os meios necessários para a modernização de novas áreas.
Isto faz cair as máscaras de alguns e estapiar a cara de outros, que insistem em tratar o Brasil como um coitadinho explorado.
É curioso como alguns marxistas esquecem certas coisas. Um dos eixos da crítica de Marx à economia é que o capital não é uma acumulação de objectos mas o estabelecimento e a reprodução de um dado tipo de relações sociais. Do mesmo modo, a acumulação primitiva não foi um empreendimento de saque e pilhagem — o saque havia sido parte integrante do sistema de troca de presentes, um dos sistemas económicos anteriores ao capitalismo — mas uma reorganização da sociedade que proletarizou vastas camadas populacionais e generalizou as relações de assalariamento. A dinâmica expansional do capitalismo proveio dessa reorganização social operada no interior das metrópoles capitalistas, e antes de mais na Grã-Bretanha. Foi só depois dessa reorganização social estar assegurada na Inglaterra e na Escócia que o capitalismo britânico pôde começar a remodelar a sua forma de exploração colonial. Veja-se a reorganização, e depois a extinção, da Companhia das Índias. No pólo oposto, as elites portuguesa e espanhola, por mais ouro e prata e pedras preciosas que tivessem extraído à América do Sul não conseguiram converter-se em centros de acumulação capitalista, porque a reorganização social interna de Portugal e da Espanha era incipiente. O caso talvez mais flagrante é o do Estado Livre do Congo, curioso nome que o rei Leopoldo dos Belgas deu àquele seu Estado pessoal, onde impôs uma política de terror e uma economia de pilhagem que tiveram como único efeito provocar a falência do território, de tal modo que Leopoldo teve de vender o seu Estado ao governo belga. Se um dia os terceiro-mundistas pensarem em termos de relações sociais e não de riquezas materiais, chegarão a conclusões interessantes.
Rodrigo, nao pretendi ser ironico. Foi apenas minha leitura sincera do texto do artigo, com todas as limitacoes minhas e do próprio texto. Joao Bernardo, está claro que o capitalismo nao é mera acumulacao de objetos. De qualquer forma, excetuando-se o rótulo final, obrigado pela lembranca e pelos esclarecimentos. Para algo me está servindo esse debate.
Bruno, me desculpe mas é uma falha da minha redação. Não quis dizer que você havia sido irônico e sim que o próprio texto o era no conteúdo da dubiedade que mencionou.
João Bernardo, aproveitando o debate e a oportunidade de esclarecer alguns pontos e rever minhas imprecisoes, acredito ser possível sustentar uma perspectiva não-eurocêntrica e latino-americanista sem escorregar no bolivarianismo, patria-grandismo ou terceiro-mundismo, enfim. Afirmo “acredito”, porque até agora não tive tempo (também sou um jovem precário) nem o devido esforço para empreender uma leitura de autores marxistas latino-americanos em profundidade. Ultimamente têm sido publicados livros críticos do eurocentrismo, tanto como perspectiva de análise social quanto de visão de mundo. Cito o CLACSO, porque é a fonte que mais conheço. No ano passado, no aniversário de 50 anos do Centro de Estudos Latino-americanos da UNAM, um professor brasileiro teve a coragem de sustentar que o eurocentrismo é um mito (afirmo “coragem” porque o tal professor estava rodeado de autores que utilizam o eurocentrismo como categoria de análise crítica há algum tempo). Em vista de que você mesmo já foi criticado de eurocêntrico no debate do artigo anterior sobre socialismo da miséria (nao quero entrar no mérito da questao) e em vista do debate que foi gerado nesse espaço, qual sua visão a respeito do assunto? (se o tema já tiver sido tratado anteriormente, peço por gentileza que você mesmo ou outro compa me direcionem ao debate).
Uma opiniao sobre a obra e pensamiento de Marini:
Esos argumentos “”nación proletaria”, “fascismo”, etc.) ya fueron esgrimidos en el pasado por los ideólogos del PC en América Latina; por ejemplo René Zavaleta, el mismo Cueva, Arauco y otros. No resisten el menor análisis, en primer lugar porque Marni nunca hizo esos planteamientos y, en segundo lugar, porque esos críticos no comprenden esencialmente las tesis centrales que básicamente se resumen en que la superexplotación del trabajo (soporte del capitalismo dependiente) constituye el mecanismo esencial de la formación de la plusvalía y de la ganancia TANTO DE CAPITALISTAS NACIONALES COMO EXTRANJEROS a través del proceso de explotación que, por cierto no tiene patria o nacionalidad según Marx; es decir, el capitalismo dependiente posee un ciclo propio de capital, pero DEPENDIENTE.
planteamiento que nunca realizaron ni los ideólogos fascistas NI los reformistas de los PCs, quienes SÍ sostenían que los explotadores eran los “EXTRANJEROS” y no los burgueses que, mas bien eran vistos como “burguesías progresistas” a las que tanto la clase obrera como el campesinado tenían que apoyar. ¿Quien diluye la lucha de clases?
Te escribo con mas detalle después.
Un abrazo
Caro Bruno,
Agradeço-lhe a pergunta, que me dá oportunidade para esclarecer um certo número de coisas. Já fui tratado de «eurocêntrico» muitas vezes e em muitos lugares, não só naquela polémica recente que você refere. Mas adiante, e não se queixe se eu fôr longo.
Não existe uma cultura europeia, nem existia o que hoje chamamos Europa antes do período entre os séculos IX e XI, quando as grandes rotas do comércio de longa distância dos artigos de luxo — que é o mesmo que dizer, as rotas do poder — passaram a obedecer a eixos transcontinentais norte–sul. Antes disso havia, no espaço geográfico a que chamamos Europa, uma área de cultura mediterânica, que incluía o norte da África e sustentou as civilizações grega, fenícia e romana, e em parte a árabe; e uma área de cultura céltica, depois nórdico-báltica. Uma cultura unificada daquele espaço que denominamos Europa é, portanto, relativamente recente — recente em termos históricos — e não tem uma filiação directa na antiguidade greco-romana.
Mas o importante, e é onde quero chegar, é que essa cultura que se desenvolveu mais ou menos homogeneamente na Europa tardo-medieval, renascentista e barroca foi destruída ou desestruturada ou assimilada, ou estes três processos juntos, por uma nova cultura: a cultura capitalista. Essa cultura capitalista resultou de um modo de produção estruturalmente expansional, que não se confunde com nenhum espaço geográfico nem decorre de nenhum espaço geográfico.
Enquanto durou o mercantilismo — que não foi um capitalismo, mas a última forma pré-capitalista — os europeus puderam escravizar populações, mas respeitaram as culturas locais, até porque o escravismo fazia parte dessas culturas. Foi quando o capitalismo surgiu no norte da Europa, no final do século XVIII, e quando começou a expandir-se, que procurou disseminar por todo o mundo as relações de assalariamento e procurou desarticular as culturas locais em nome de uma cultura capitalista. Quem estudar a evolução da Companhia das Índias verá muito claramente a passagem de uma para outra fase, do mesmo modo que a verá quem ler a prosa dos administradores coloniais portugueses e franceses em África. A cultura que eles estavam a aplicar na Índia ou em África era uma cultura capitalista recente, que só desde há poucas gerações se tornara preponderante na Europa. Um caso muito elucidativo é o de um dos progenitores do sistema de ensino fundamental na França da Terceira República, Jules Ferry, que tanto foi ministro da Instrução como ministro das Colónias.
O mesmo empenhamento com que o capitalismo se dedicou a destruir as culturas europeias arcaicas, os regionalismos, os dialectos, as tradições locais, ou seja, com que se dedicou a construir espaços nacionais novos e homogéneos, serviu-lhe igualmente nos espaços colonizados e semicolonizados para destruir as culturas vernáculas. Mas em nome de uma cultura nova, a cultura capitalista.
O processo teve dois sentidos, porque ao mesmo tempo a nova cultura capitalista localizada na Europa importava, assimilando-as e transformando-as, as culturas tradicionais não-europeias. A história da arte moderna, desde os impressionistas em diante, é incompreensível se não conhecermos esse processo de assimilação e adaptação. Adaptação primeiro — no final do século XIX — das formas gráficas japonesas, tanto os traços como os tipos de perspectiva, e acessoriamente chinesas também. Adaptação em seguida — no começo do século XX — das lições da escultura africana, tanto pelo expressionismo alemão (Schmidt-Rotluff e Kirchner, para me limitar a estes) e francês (sobretudo Modigliani, mas também Vlaminck) como, ainda mais importante, pelo cubismo (as Demoiselles d’Avignon e tudo o que se seguiu são impensáveis sem a profunda influência exercida sobre Picasso pela escultura africana). Adaptação igualmente — também no começo do século XX — das lições da escultura da América pré-colombiana (nomeadamente por Gaudier-Brzeska). A história do modernismo artístico não se entende sem levar em consideração aquilo que, em termos técnicos de história da arte, se chama primitivismo. Aliás, essa mesma referência ao chamado primitivismo ocorre na primeira geração do modernismo brasileiro. O capitalismo não expandiu a cultura europeia. O capitalismo criou uma cultura nova, universal e de vocação universalizante, que destruiu ou incorporou as culturas anteriores, tanto na Europa como nos outros lugares.
E os anticapitalistas — cuja génese, naturalmente, é um pouco mais recente ainda do que a do capitalismo — caracterizam-se por adoptar um quadro de pensamento que é antagónico e ao mesmo tempo comum ao dos capitalistas. É o que sucede em todas as lutas em que os participantes são elementos da mesma estrutura.
Os comentários a este artigo incluem um pequeno show de horrores, com gente desqualificando Ruy Mauro Marini e Atílio Borón sem sequer conhecer suas obras, teses e argumentação, e mais um a reprodução acrítica e automática de tudo o que a mass media internacional fala para desqualificar a luta anti-imperialista dos africanos, latino-americanos e asiáticos.
Caro João Bernardo,
Seu artigo esquece os detalhes essenciais. O Brasil ainda possui uma economia primário-exportadora (e importadora de produtos de alta tecnologia), com um mercado interno fraco e uma grande parcela de controle do capital externo sobre a produção e reprodução econômicas. O Brasil “exporta” dezenas de bilhões em lucros, equivalentes a uma parte relevante do PNB brasileiro, tanto por meio de remessas de lucros das empresas multinacionais quanto por dívida pública, e ainda pelos incentivos fiscais e creditícios dados às empresas multinacionais. O subimperialismo brasileiro têm atuações óbvias no caso da Bolívia e Paraguai, onde realmente há um controle direto/indireto de recursos naturais e capitais (e perdemos, felizmente, uma parte deste controle no caso da Bolívia).
Não entendi bem à propósito de que desehos do Tarzan estão enfeitando um artigo sobre o subimperialismo brasileiro. É alguma analogia (o que segeriria que você considera os brasileiros “selvagens”)?
A respeito do comentário acima, recordamos que este artigo é da autoria do coletivo Passa Palavra, e não de João Bernardo. Basta ver a assinatura.
Mil perdões.
Mas, mesmo assim, o questionamento ainda permanece: como afirmar que o Brasil é um país plenamente imperialista, quando ele ainda possui uma economia nacional de base primário-exportadora, fortemente submetida ao controle do capital financeiro internacional, exportando uma parte relevante da renda nacional para o exterior? Será que somos ao mesmo temo colonizados e colonizadores? Mas como articular ambas as coisas em uma análise concreta da situação contreta?
Sem dúvida, há casos claros de imperialismo: o controle parcial sobre as economias da Bolívia (em grande parte rompido pelo governo de Evo Morales) e o projeto de Itaipu, imposto ao Paraguai. E, no entanto, eu pensaria duas vezes antes de incluir qualquer iniciativa positiva do Brasil no sentido da integração latino-americna sob a rubrica de “imperialismo”, pois não implica (nem necessariamente, nem normalmente) o controle unilateral do Brasil (podem ser acordos bileterais ou multilaterais). É um diagnóstico que, aliás, é demasiado otimista. Implica que, de alguma forma, teríamos superado a condição de economia capitalista dependente, o que a análise sociológico-econômica não sugere de modo algum.
Além disso, há um erro primordial no início. Acusar o Lula de traidor é mostrado como se fosse a suprema estupidez. A arrogância da exposição, na verdade, esquece o detalhe: os que acusam Lula disso se referem ao programa político do PT, que era socialista, e não à campanha eleitoral de 2002 e de sua “carta aos brasileiros”, citada alhures como uma declaração de oportunismo político para “acalmar os mercados”, ou seja, se comprometer com os interesses da burguesia brasileira, que é sócia do capital transnacional e controla os monopólios da indústria cultural. Portanto, não se trata de nada “simplório”, é uma constatação bastante realista.
Pergunto ao Matheus se notou que o artigo é divido em partes, e que esta é a primeira, pois sua crítica, além de querer impor métodos ao autor, antevê o que sequer foi publicado. E se percebeu que este artigo é parte de uma série, que contem (e conterá) diversos artigos.
Prezado Matheus, respeito os seus comentários, principalmente os do outro debate, mas me parece que vc está passando de um campo de argumentação racional, para o de defesa apaixonada de seu ideário político. Não digo isso como crítica, mas de fato são duas posturas diferentes, que levam a situações também diferentes. Concordo que alguns comentários críticos sobre Marini não pareciam tão bem embasados teoricamente. Mas, pelo seu último argumento, parece que apenas especialistas sobre um determinado autor deveriam comentar a obra do mesmo. Como não vi mais ninguém citar Atílio Borón além de mim, tratarei desta questão. De fato, não sou especialista no pensamento de Borón, mas considero legitima a crítica que fiz ao texto ao qual me referi, ainda que eu possa estar errado. Além disso, não fiz nenhuma afirmação genérica sobre o autor, tampouco algum tipo de acusação leviana. Mas, me sinto no direito de interpretar as afirmações de Borón e criticá-las politicamente. João Bernardo tem razão em distinguir luta entre nações e luta e classes. Qualquer apologia a um “Brasil poderoso” recai diretamente no âmbito da luta entre nações, porque pressupõe uma diluição do antagonismo de classes no plano nacional, colocando a luta pelo posicionamento do Brasil no plano internacional enquanto “interesse geral”. Criticar esse tipo de posicionamento na esquerda não é afirmar que o autor seja fascista, mas mostra certos limites da ideologia nacionalista no plano da luta de classes, no interior da nação, além de mascarar, sim, interesses imperialistas de países como Brasil, Venezuela, etc. Aqui se fala tanto em aprender com a história, então o que deveríamos aprender com a adesão do Partido Social-Democrata alemão à I Guerra? Aquela não foi uma opção imperialista? Não podemos recair em idealizações e não perceber que o fortalecimento de blocos econômicos como Mercosul, etc, tem menos relação com a emancipação dos trabalhadores, e mais a ver com o fortalecimento das burguesias nacionais dos países envolvidos nesses blocos, e com a disputa imperialista no cenáro internacional. Tais blocos tentam ampliar as “vantagens competitivas” desses países, o que em termos capitalistas significa sempre, ainda que não se limite a isso, alguma forma de exploração do trabalho, seja pela mais-valia absoluta, seja pela relativa. Nada do que eu disse foi tentando “neutralizar” seus comentários, muito pelo contrário, considero que vc pontuou questões muito importantes. Mas, no campo político não dá tempo de realizarmos uma tese de doutorado sobre cada autor, para depois podermos exercer a crítica sobre suas idéias e práticas.
Quanto às questões apresentadas por Bruno, que só agora tive tempo de responder mais detalhadamente, acho que o artigo trata exatamente da inserção “menos subordinada, mais autonoma” do Brasil neste bloco. Talvez haja uma divergência quanto ao caráter desta inserção (se é “subimperialista” ou se é “imperialista”), especialmente porque o artigo tem um tom acentuadamente polêmico e porque a situação que Marini conceituou como “subimperialismo” talvez esteja cedendo espaço à formação, mesmo embrionária, de um imperialismo propriamente dito. (E na verdade não entendi porque alguns comentaristas, verdadeiras “viúvas de Marini”, empenharam-se mais em defender sua memória que em julgar se as questões levantadas pelo artigo ainda encontram respostas claras em sua obra, pois esta é a verdadeira defesa de memória que um militante como Marini mereceria.)
No que diz respeito à semelhança da situação econômica brasileira atual com aquela do México pré-crise, que desconheço, pergunto se os fundamentos do ciclo de crescimento mexicano da época eram exatamente os mesmos do Brasil de hoje, e se a conjuntura econômica internacional era exatamente a mesma. Você aponta, com razão, a interdependência entre as economias brasileira e chinesa como um problema caso a economia chinesa entre em crise. Mas a diversificação de parceiros da economia brasileira não teria alterado a situação, visto que anteriormente as importações e exportações eram extremamente depententes da economia estadunidense? Além disso, o baixo impacto da crise de 2008 sobre a China, quando comparado com aquele sofrido pelos EUA, não demonstra que a economia chinesa, cujos 20% de sua produção foi exportado para os EUA (bem mais que os 15,3% que a economia brasileira exporta para a China, por exemplo), é robusta o suficiente para sustentar um crescimento continuado?
Para prosseguir no debate, pergunto ao Matheus o seguinte:
a) Qual sua posição sobre as afirmações de economistas a respeito do mercado interno brasileiro, que, para eles, teria sido uma, senão a principal, tábua de salvação do país durante a crise de 2008 (que só afetou diretamente o país por três meses)?
b) Qual sua posição a respeito da afirmação da Royal Society, de que o Brasil é “potência emergente” no campo científico, mencionada comentários acima inclusive com endereçamento para o relatório completo?
c) Qual sua posição a respeito do papel do BNDES e dos fundos de pensão (PREVI, PETROS etc.) como motores da economia brasileira — e, portanto, de sua expansão para outros países menos industrializados?
d) Qual sua posição sobre as investidas de transnacionais de origem brasileira sobre economias africanas, onde disputam mercado com empresas chinesas?
e) Na sua opinião, a finada Área de Livre Comércio das Américas era uma imposição dos EUA ou um tratado multilateral de comércio?
f) Na sua opinião, “colonização” e “imperialismo” são termos sinônimos? Do contrário, o que os diferencia?
g) Qual a sua opinião sobre o conceito de socialismo tal como definido no 3º Congresso Nacional do Partido dos Trabalhadores (PT)?
h) Qual a sua opinião sobre o tamanho do parque industrial do Brasil comparado com aqueles dos demais países da América do Norte, Central e do Sul?
Preciso compreender estas questões para seguir debatendo.
Manolo, só agora voltei a acessar o site do passapalavra, quase um mês depois das suas perguntas. Ando exilado escrevendo a dissertação e trabalhando. Olha só, aqui no México a década de 70 e 80 também foi carregada de otimismo. Luis Echeverría, presidente entre 70-76, levantou a bandeira do “terceiromundismo” e se falava muito das altas taxas de crescimento do país baseadas na produção do petróleo principalmente. Com López Portillo (76-82), como no caso dos militares brasileiros e como o que vemos agora no Brasil, se falava do México como “potência média”, próxima do Primeiro Mundo. Mas aí veio a crise a qual me referi antes, a partir de 1982 e toda propaganda das classes dominantes foi pro saco. Mas você tem razão quando comenta sobre a diversidade de parceiros comerciais do Brasil; no caso mexicano, o mercado estadunidense historicamente tem abarcado boa parte das exportações. Uma pena não ter tempo pra te mostrar números e continuar o diálogo.
Qualquer economista ou historiador tomaria o exemplo mexicano, invocado por Bruno, para compará-lo com o caso brasileiro e verificar o que existe de diferente entre ambos, que explique a diferença de resultados. Nas ciências sociais este tipo de análise comparativa é o equivalente aos testes laboratoriais nas ciências da natureza. Mas os esquerdistas pairam muito acima do empírico e tudo o que sabem fazer é apontar com o dedo para um ou outro caso que lhes pareça confirmar as suas opiniões — os casos que não confirmam são ignorados — e proclamarem que no capitalismo nada mudou nem mudará depois da data da última obra do líder defunto da sua predilecção.
João, essas conclusoes são suas, não minhas. Já tive a oportunidade de mostrar nesse mesmo espaço os efeitos da reestruturação produtiva na Bolívia sob o regime de acumulação flexível, além de suas implicações na migração boliviana pra São Paulo (de modo muito mais elaborado que meus comentários, que no máximo são pontos pra incitar o debate). Como alguém já disse anteriormente, não pretendi escrever uma tese nem um livro sobre o tema.
JB,
O capitalismo não é herdeiro direto do desenvolvimento da Razão e da Ciência, instrumentos que permitiram à Humanidade desvincular-se da Natureza e de Deus?
Nesse sentido, o capitalismo não é, portanto, herdeiro direto da tradição greco-romana?
O que seria do capitalismo sem o Homem, sem a queda de Deus e da Natureza, todos remetendo, se não estou enganado, ao pensamento grego?