Por Eduardo Tomazine Teixeira
Uma estratégia de segurança pública com as proporções da “pacificação” de favelas no Rio de Janeiro tem limites coerentes com seus objetivos. Responde a finalidades eleitorais, econômicas e sociais, e é possível graças a uma conjuntura particular de crescimento econômico e alinhamento político. Trata-se, como eu já disse alhures [1], de uma estratégia que tende a ser cada vez mais reproduzida nas grandes metrópoles da semiperiferia sistêmica em vias de crescimento, em cujas necessidades de reorganização social, fundamentais ao amadurecimento do capitalismo nestas plagas, embora venha a passar por rearranjos estruturais, não afrontarão a injustiça social – como ocorreu, em certa medida, em um momento fugidio e regionalmente limitado da evolução do capitalismo. Isto significa que os ganhos de produtividade, a formação da força de trabalho e a manutenção de um ambiente seguro de negócios serão forjados sem as reformas sociais dos “trinta gloriosos” ou de antes. Evidentemente, um caminho semelhante de desenvolvimento tende a acumular tensões e a tratar a questão social como um assunto de polícia. Estaríamos, com isso, em vias de criar um Frankenstein, o qual, amanhã ou depois, despertará incontrolável para nos esganar?
O ano é 2021, e a cidade, Rio de Janeiro
I A última UPP [Unidade de Polícia Pacificadora] no município foi inaugurada já há cinco anos, completando o número de 40. Fechou-se, com isto, o “corredor de segurança” previamente esquadrinhado pelo estado, embora algumas unidades não previstas tenham sido instaladas na zona oeste, devido, em grande parte, à consternação da sociedade civil perante as imagens dos conflitos entre facções do tráfico de drogas e milícias que ocorreram por ali. De 2009, ano da inauguração da primeira UPP, até 2016, o efetivo da Polícia Militar do Rio de Janeiro cresceu de 32 mil homens e mulheres para 60 mil. As despesas para formar, remunerar e equipar toda essa gente, somadas aos demais gastos com segurança pública, ultrapassam 9% do PIB do estado do Rio, superando, assim, em muito, o percentual destinado à educação e à saúde. Afinal, não basta manter em dia o pagamento dos policiais, sendo preciso também mantê-los bem remunerados para evitar o seu aliciamento pela corrupção. As próximas eleições para governador ocorrerão no ano seguinte, e o tema que mais ocupará a pauta de debates será, sem dúvida, a reforma da polícia, com vistas a “fazer mais com menos”, isto é, reduzir o efetivo da corporação, que pesa como uma bola de chumbo no orçamento estadual. Sobretudo após a desaceleração econômica dos últimos dois anos. A bancada fluminense no Congresso pressiona pela legalização da venda da canabis para fins medicinais, alegando o imperativo de novas receitas para financiar a cara segurança pública no estado. As bancadas de São Paulo, Bahia e Pernambuco aderiram ao lobby do Rio.
II Depois da ocupação do complexo de favelas da Maré, na zona norte do município, em 2012, as diferentes facções do tráfico de drogas deram início às mal sucedidas disputas pelas áreas controladas por milícias, na zona oeste. Estas, mais bem organizadas e enraizadas no aparelho estatal, não demoraram para rechaçar as investidas. As milícias, hoje, ocupam quase a totalidade dos espaços pobres sem UPPs. Os narcotraficantes de antes, perdendo seus principais mercados, perderam também em poder de fogo, fragmentaram-se e desencadearam uma “guerra molecular” de longa duração na Baixada Fluminense e no interior do estado pelo controle das bocas de fumo. O governo do estado, em convênio com os municípios, respondeu com a abertura de sucedâneos desajeitados de UPPs, no âmbito dos quais os policiais logo foram corrompidos e tornaram-se mafiosos, cobrando taxas de comerciantes e de moradores para manter o “policiamento” nos bairros e loteamentos.
III Desde a desaceleração econômica que o salário dos policiais lotados em UPPs não são corrigidos, e há notícias de que, mesmo em algumas unidades da capital, a prática de extorsão de moradores tem virado rotina. Líderes comunitários foram assassinados nas favelas da Providência e do Parque União (no complexo da Maré), mas os policiais negam qualquer participação nos crimes, alegando tratar-se de acerto de contas entre grupos políticos rivais.
IV Os moradores destas duas favelas, em protesto, ocupam a entrada dos edifícios das UPPs, queimando ainda carros e pneus nas vias de acesso às comunidades. Os protestos se alastram para outras três favelas “pacificadas”. As emissoras de TV fazem uma cobertura ostensiva dos manifestantes encapuzados e ateando fogo em viaturas da polícia, provocando a imediata indignação da sociedade civil, a qual clama pela intervenção das Forças Armadas. Praças lotados em UPPs vizinhas, reforçados por homens do BOPE [Batalhão de Operações Policiais Especiais] e dos Fuzileiros Navais cercam as comunidades. O secretário de segurança do estado dá um ultimato de 48 horas para que os logradouros públicos e as entradas das UPPs sejam desobstruídos. Os manifestantes recusam-se a sair. Helicópteros blindados da PM sobrevoam as comunidades em chamas. A tensão cresce. As operações de manutenção da ordem são iniciadas pela madrugada na favela da Providência, próxima ao porto “revitalizado”. 50 manifestantes são presos, 15 moradores saem feridos, e um deles é morto durante a operação. Os manifestantes das demais comunidades encerram os protestos, em troca de uma anistia oferecida pelo governador. A população carioca dorme aliviada. O governador, o secretário de segurança e os capitães das UPPs reúnem-se no Palácio Guanabara para negociar aumentos salariais.
V O mercado imobiliário prosperou nas favelas da rica Zona Sul da cidade. Hostels e restaurantes das comunidades do Vidigal e Santa Marta figuram, pelo terceiro ano consecutivo, no Guide du Routard [2] (que esqueceu-se, porém, de instruir os leitores sobre os procedimentos para a compra de drogas no Rio “pós-pacificação”…). As casas coloridas das favelas e suas vielas emaranhadas – esta Casba nas Américas, como definiu a revista Time – conferem uma originalidade a mais na pitoresca paisagem carioca. Os moradores das áreas mais baixas das comunidades alugam seus barracos aos comerciantes ou aos novos vizinhos da classe média remediada, alugando para si casas no alto do morro. Os moradores menos aquinhoados, por sua vez, migram para favelas mais distantes, onde sofrem com a tirania das milícias ou com a guerra dos bandos de narcotraficantes. O Rio de Janeiro é a 20ª cidade mais rica do mundo, e cinco bilionários seus destacam-se na última edição da revista Forbes. A despeito das violentas manifestações dos últimos meses – a inteligência [serviços de informação e espionagem] da polícia suspeita instigações por parte de narcotraficantes –, os hotéis têm, em setembro, praticamente 100% da capacidade já reservada para o próximo carnaval, um indício de que a atividade econômica deve retomar o dinamismo de outrora. A companhia de eletricidade, Light, comemora a desativação daquela que seria a última ligação clandestina em comunidades “pacificadas”. Na favela da Rocinha, uma reunião, contando com a participação de mais de 3.500 moradores de diversas favelas, vota pela criação da Liga de Comunidades em Áreas de Pacificação. Uma pequena reportagem a respeito é publicada no portal eletrônico de um importante jornal. Comentários dos leitores pedem a interdição, pela Justiça ou através da bala, deste conluio de vagabundos supostamente manipulados por traficantes, milicianos e líderes do MST [Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra], armado com o único propósito de desestabilizar as UPPs e a agressiva política de combate ao crime organizado empreendida pelo governador Eike Batista. A previsão do tempo para o domingo é de sol forte, com possíveis pancadas de chuva ao final da tarde.
Notas
[1] Ver, aqui, aqui e aqui, os demais artigos do mesmo autor sobre as UPPs publicados no Passa Palavra.
[2] Um dos mais importantes guias turísticos internacionais, contendo, além de sugestões de passeios e informações históricas, recomendações de hotéis e restaurantes aos visitantes.
As imagens utilizadas neste artigo são de Friedensreich Hundertwasser (a primeira e a última) e de Francis Bacon.
Uma notícia do presente: “Aluguéis em comunidades com UPPs valorizam 6,5% a mais que média” http://www.valor.com.br/brasil/1097048/alugueis-em-comunidades-com-upps-valorizam-65-mais-que-media
Eduardo, publiquei no blog do Outras Palavras, para o qual estou colaborando no momento, o seguinte texto, com algumas impressões apressadas:
http://rede.outraspalavras.net/pontodecultura/2011/11/21/upps-a-quem-interessa-o-choque-elementos-iniciais-para-um-debate-necessario/
É um texto de blog, não artigo, mas de repente você pode dar uma olhada e uma ajudada a melhor pensar este cenário, como já tem feito aqui no PP.
Abraço,
Júlio
http://www.istoedinheiro.com.br/noticias/73525_PAZ+E+LUCROS+NA+ROCINHA
Eduardo e Júlio – e pessoal que acompanha o debate,
– Leiam essa reportagem publicada na Isto É Dinheiro, que possui o seguinte lead: “Casas Bahia, Caixa e Banco do Brasil são algumas das empresas que se preparam para expandir seus negócios na maior favela carioca, depois da pacificação promovida pelo governo do Estado”.
Acho tais reportagens, esta que destaquei e a outra assinalada pelo Tomazine, bons indicadores dos caminhos da pacificação…
Olá,
Continuando, mais dois comentários. O primeiro deles, publicado na Folha de SP de ontem (dia 26):
Empresas pagam preço de Jardins em Paraisópolis
Locação do m² comercial no centro da comunidade alcança valor da Oscar Freire, endereço nobre de SP
TIM, Vivo e Santander chegam até o início de 2012; nos últimos 18 meses, 20 companhias procuraram a região
CAROLINA MATOS
DE SÃO PAULO
Nas ruas estreitas e movimentadas do centro comercial de Paraisópolis, comunidade de 100 mil habitantes na zona sul de São Paulo, a variedade é grande.
Caminhando poucos metros, é possível encontrar Casas Bahia, Bradesco e Banco do Brasil ao lado de lojas locais, como a Gisele Presentes e o Sacolão Farias. E já há espaço reservado para TIM, Vivo e Santander.
Com tanto interesse no potencial de consumo local
-cerca de 20 empresas procuraram a União de Moradores nos últimos 18 meses para se instalar-, ficou mais caro montar ponto nos endereços mais cobiçados.
A Folha apurou que, hoje, o aluguel do m² no centro comercial de Paraisópolis chega a custar R$ 125 por mês.
Na região da Oscar Freire (Jardins), onde estão várias lojas de grife, o valor mínimo de locação está em R$ 100 por m², podendo alcançar R$ 220, segundo levantamento da imobiliária Herzog.
O preço em Paraisópolis também é superior praticados nas avenidas Interlagos (R$ 75 o m²), Brás Leme (R$ 90) e Radial Leste (R$ 85).
“Até pouco tempo, o que abria na comunidade era comércio local, tirando exceções como Casas Bahia [loja que chegou em 2008]”, diz Gilson Rodrigues, presidente da União dos Moradores e do Comércio da comunidade.
“Agora, o poder de compra cresceu e passamos por um grande processo de urbanização, o que favorece a entrada de empresas maiores.”
VÍNCULOS
Ao se instalar, as companhias contratam mão de obra local. “É uma forma de reforçar o vínculo com a comunidade e ajudar a desenvolvê-la”, diz André Caio, diretor da regional SP da Vivo, que pretende abrir as portas em Paraisópolis até o fim deste ano.
“Além de vendedores, contrataremos pessoas locais para ações de marca na loja [como fotos em cartazes].”
As empresas que chegam oferecem a esse mercado consumidor, com renda média familiar de três salários mínimos, os mesmos produtos das lojas de outros endereços.
Algumas companhias, como Vivo, TIM e Santander (o banco prevê abertura de agência em Paraisópolis no primeiro trimestre de 2012), já atuam em outras comunidades do país -entre elas, o Complexo do Alemão, no Rio.
“Vale a pena o investimento”, diz Erika Cascão, diretora de vendas da TIM no Estado de SP, que planeja abrir a loja em Paraisópolis ainda em 2011. “Esses consumidores podem comprar. Hoje, eles estão carentes é de oferta.”
Olá,
E agora, por fim, a análise (na mesma edição do jornal) da notícia acima pelo representante do SECOVI – entidade responsável pela defesa dos interesses de empreiteiros e imobiliárias:
ANÁLISE
Implantação de infraestrutura ampliou a atratividade comercial de Paraisópolis
CLAUDIO BERNARDES
ESPECIAL PARA A FOLHA
Paraisópolis, oriundo de uma favela formada no Morumbi na década de 1950, aos poucos vai se transformando em um bairro da cidade.
A implantação de infraestrutura na região, a partir de 2005, reintegrou a área à malha urbana do município, por meio da execução de avenida perimetral e pavimentação das ruas, construção e instalação de redes de esgoto, desobstrução e canalização de córregos, construção de calçadas e espaços de lazer.
E, entre outras medidas, propiciou a entrada de sete linhas de transporte público.
Essas medidas urbanas tornaram a região mais segura e possibilitaram a entrada, com segurança de tráfego, de veículos de transporte de cargas e mercadorias.
Tal ação, aliada à concentração de mais de 80 mil pessoas, faz de Paraisópolis um bairro atrativo para ampliar o comércio local.
Com um sistema viário próprio planejado pela CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) e outro binário, com ruas em sentido único, uma paralela à outra, o fluxo de tráfego no bairro está adequado à movimentação interna necessária para garantir acesso aos diversos polos.
A urbanização e a instalação de infraestrutura básica incentivaram o desenvolvimento de inúmeros programas sociais, o que aumenta a população flutuante.
Embora ali ainda predomine certa informalidade e pobreza, existe uma parcela em franca ascensão social, fator de estímulo ao acesso a mercadorias e produtos mais sofisticados, normalmente consumidos pela população vizinha do bairro do Morumbi.
Redes de varejo importantes, como Casas Bahia, já se instalaram no local em razão das condições oferecidas. E outras, seguramente, chegarão para atender o aumento da demanda. Com certeza, isso proporcionará um ciclo virtuoso ao bairro.
A instalação de equipamentos urbanos mais elaborados e a construção de edificações com serviços variados farão com que novos empreendimentos comerciais se estabeleçam por ali e, sem dúvida, a valorização imobiliária torna-se inevitável.
O aumento de poder aquisitivo da população nos grandes centros, registrado nos últimos anos, em conjunção com medidas de urbanização, propicia o funcionamento do comércio na área, cuja população é equivalente a uma cidade do porte de Mogi-Mirim ou Paulínia.
CLAUDIO BERNARDES, 57, é engenheiro, vice-presidente do Secovi-SP (Sindicato da Habitação) e pró-reitor da Universidade Secovi.
Sobre as “oportunidades” abertas pelos processos de militarização das periferias em especial no Rio de Janeiro, coloco dois trechos de uma entrevista de Paulo Cunha, presidente do grupo Ultra, divulgada na Folha de São Paulo de hoje (27/12).
“Lado bom
A qualidade de governança nas empresas melhorou muito. Os brasileiros estão se educando, fazendo um esforço comovente. Trabalham o dia inteiro e estudam à noite. Isso me dá esperança. A Rocinha é um bom exemplo.
Pessoas a elogiar
José Mariano Beltrame, secretário de segurança do Rio de Janeiro, e Eliana Calmon, corregedora do Conselho Nacional de Justiça.”
Sobre o elogio a José Mariano Beltrame, segue uma coluna assinada por Eliane Catanhêde, no dia 15/11/11:
“Missão impossível
BRASÍLIA – Com tantas belezas e peculiaridades, o Rio sempre abriga vários governadores simultaneamente. Agora mesmo, Sérgio Cabral (PMDB), de fato e de direito, Aécio Neves (PSDB), ex de Minas, e Eduardo Campos (PSB), oficialmente de Pernambuco. Confira o CEP.
A estrela que sobe, porém, é a do secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, 54, gaúcho de Santa Maria, expert em inteligência policial e cérebro da guinada histórica que ocorre no Estado, principalmente na cidade maravilhosa.
Beltrame tem muitas coincidências com Rudolph Giuliani, o prefeito da “Tolerância Zero” em Nova York, que encarna bem o “Yes, we can” da campanha posterior de Barack Obama à Presidência.
Beltrame e Giuliani são de famílias italianas e formados em administração. Um, o nosso, é delegado da PF. O outro, o deles, é procurador. Ambos acreditam que o impossível é possível e levam ao pé da letra as funções de homens públicos.
Foi pela ousadia e estratégia de Beltrame que o Estado recuperou o Complexo do Alemão e a Rocinha (esta sem um só tiro) e devolveu a cidadania a seus moradores. E ele tenta inaugurar uma nova era com os policiais que recusaram propinas fabulosas e puseram o traficante Nem na cadeia. Parece pouco? Pois, no Rio, a “bola” é a regra, não a exceção.
Surge, assim, um nome novo no cenário político. Só não custa lembrar que Giuliani conquistou o reconhecimento público, capas de revista e prêmios internacionais, mas jamais se elegeu mais do que prefeito. Tentou em 2000, de novo em 2008 e não emplacou. Fala em insistir em 2012, mas praticamente sem chance.
Uma pena. Se Beltrame e Giuliani enfrentam a criminalidade e a corrupção com tanta firmeza e sucesso, por que não assumir responsabilidades mais globais como governadores, quem sabe até presidentes? Faltam-lhes carisma e apoio partidário? Mistérios da política.”
Se ainda não se dedicam a propagandear a viabilidade política de Eike Batista – possibilidade colocada pelo texto ficcional acima – já o estão fazendo com o Beltrame na vida real contemporânea.
Olá,
Notícia publicada hoje, no jornal Folha de SP:
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Microcrédito avança em favelas do Rio
CEF já liberou 97 empréstimos no Complexo do Alemão; Banco do Brasil fechou 330 contratos em três localidades
Empréstimos, em média, vão de R$ 2.000 a R$ 4.500, com juros de 0,64% ao mês e prazo de 24 meses
CIRILO JUNIOR
DO RIO
De olho nas vendas de fim de ano, o comerciante Antônio José de Souza, 52, pensava em como incrementar a linha de produtos oferecida por seu bazar quando recebeu a visita de um agente de microcrédito na loja.
Fechou um empréstimo de R$ 5.500 sem ter que sair da loja. Três dias depois, o dinheiro estava em sua conta.
“Foi tudo fácil e rápido. Estou pensando em pegar mais um empréstimo”, afirma o comerciante. Ele utilizou os recursos para obter equipamentos e acessórios para telefones celulares que são vendidos em sua loja.
Ele é um dos empreendedores do Complexo do Alemão que desde setembro têm acesso a microcrédito facilitado por bancos públicos.
Souza fechou acordo com a Caixa Econômica Federal, que já liberou 97 empréstimos desse tipo no Alemão.
O conjunto de favelas da zona norte do Rio apresenta o melhor resultado entre as 21 comunidades do Brasil contempladas pelo programa de microcrédito do banco.
As favelas do Rio representam 22% do total da população do Estado, segundo dados do Censo 2010 do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Formam um mercado praticamente inexplorado pelos bancos, que começaram a oferecer serviços nessas comunidades a partir da entrada das UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora), em 2008.
A estratégia da Caixa na favelas pacificadas é ir ao encontro desses clientes.
Para isso, jovens com idades de 18 a 22 anos circulam diariamente captando empreendedores, formalizados ou não. O dinheiro pode ser investido em melhorias ou na compra de equipamentos.
“São todos moradores da comunidade. Conhecem os empreendedores e mapeiam suas necessidades”, afirma Bruno Fraga, supervisor do programa de microcrédito da Caixa no Alemão.
Outro crédito concedido pela Caixa foi para o comerciante Francisco Eraldo da Silva, 39. Ele pegou R$ 3.500 para a compra de um forno, de material e de um letreiro para sua pizzaria.
O Banco do Brasil adota estratégia menos agressiva: os agentes não vão de porta em porta, atrás dos clientes.
O BB conta com três agências em favelas do Rio, todas abertas em 2011 -Alemão, Cidade de Deus e Rocinha.
Em 90 dias de operação, foram liberados 330 empréstimos, que somam R$ 1,030 milhão, segundo o superintendente do banco no Rio, Tarcisio Hubner.
As condições da Caixa e do BB são semelhantes. O crédito tem teto de R$ 15 mil, para empresas com faturamento de até R$ 120 mil anuais.
O empréstimo pode ser quitado em até 24 meses, mediante juros de 0,64% ao mês. Em média, os empréstimos variam de R$ 2.000 a R$ 4.500.
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Bancos estimam explosão da modalidade
DO RIO
As perspectivas de expansão de microcrédito nas favelas são bastante favoráveis. O Banco do Brasil, por exemplo, estima um crescimento de 300% nesse tipo de operação em 2012. “Temos muitas operações em análise, prestes a serem aprovadas”, diz o superintendente do banco no Rio, Tarcisio Hubner.
Os bancos planejam abrir agências e fazer trabalhos semelhantes nas demais comunidades que contam com UPPs. Atualmente, 18 estão ocupadas pela polícia.
A Caixa já tem 40 mil pontos comerciais identificados e contatados em todo o Brasil. O chamado microcrédito produtivo orientado será o principal produto, na linha de pequenos empréstimos, nos próximos anos.
Atualmente, representa 20% do total de crédito de pequeno porte. Os 80% restantes são para o microcrédito para consumo, que engloba cheque especial e empréstimos para pessoa física. A meta do banco é que essa relação se inverta, já em 2013.
A Caixa privilegia beneficiários do Bolsa Família na escolha dos jovens que atuam nas comunidades oferecendo microcrédito.
No Alemão, são 20 jovens de 18 a 22 anos, cujo salário é de R$ 810 mensais. Eles fecham contrato de dois anos. É obrigatório estar cursando ou ter o 2º grau completo.
“Era beneficiária do Bolsa Família, e a Caixa me ligou oferecendo essa oportunidade. Está sendo ótimo, e quero continuar nessa área”, afirma Michelle Barros da Costa, 21, uma das agentes.
Matéria interessante, em que transparece que a ocupação da Rocinha beneficiou economicamente as grandes empresas (distribuidoras de serviços), em detrimento dos pequenos comerciantes locais, para não dizer dos moradores de uma forma geral.
Livre do tráfico, Rocinha entra em crise econômica
http://extra.globo.com/noticias/economia/livre-do-trafico-rocinha-entra-em-crise-economica-3646635.html
“Aqui as pessoas e até as crianças não nos respeitam. Xingam, olham feio. A população no Haiti era receptiva. Não vou sentir saudades do Alemão, só vou levar lembranças boas do convívio com os companheiros e da missão em si”.
O comentário é de um militar do exército ao deixar o Complexo do Alemão no Rio de Janeiro ilustra bem um cisco na galáxia de conflitos sociais em que estamos mergulhados.