O que é uma pauta de reivindicação descolada dos lutadores que estão tentando construí-la? Por Grouxo e Legume

Nos movimentos de origem autônoma e libertária o discurso contra os burocratas está sempre presente. Frequentemente se considera os demais movimentos e grupos como autoritários, pelegos, recuados e uma série de outros adjetivos. Para estes grupos parece que burocratizar-se ou tornar-se pelego é uma questão ideológica e moral, não histórica. Para evitar qualquer possibilidade de burocratização basta, portanto, pregar a primazia da ação de rua, não pretender ocupar cargos diretivos e não se candidatar a nenhum cargo eletivo.

A ida a uma reunião com o poder público (seja o federal, estadual ou municipal), o diálogo com um candidato ou a demanda por uma audiência pública não pode ser considerada por si só algo pelego ou burocrático. Mas convém ter em mente que ir a esses espaços é sempre jogar no campo do inimigo. Não se trata de um julgamento pessoal de quem ocupa tais espaços, mas de identificar o papel do Estado em uma sociedade capitalista –- garantir as condições gerais da reprodução do capital, uma das quais é a manutenção das contestações dentro do quadro institucional capitalista. Não nos devemos considerar mais espertos do que esse adversário nem devemos acreditar que com nossa habilidade discursiva conseguiremos convencer, enganar, pressionar ou ludibriar o poder público. A análise sobre a pertinência de se ir ou não a esses espaços deve ser balizada por uma avaliação de conjuntura: em um momento de ascensão da mobilização, pode ser conveniente comparecer a uma negociação; quando o poder público ignora os assassinatos feitos pela polícia, pode-se exigir uma audiência pública; assim como em um primeiro passo para pedir o retorno de uma linha, pode ser tático produzir um abaixo-assinado. Em suma, a presença nesses espaços pode ser positiva quando associada a uma mobilização exterior relacionada com a demanda concreta. Quando há esse ascenso da luta, a presença no espaço representa mais um momento de pressão sobre os gestores e um momento em que o movimento pode questionar os limites da institucionalidade de maneira prática: a audiência pública que não resolve, a reunião que só enrola, enfim, um aprendizado coletivo do trato com essas instituições hostis à luta.

Contudo, não se pode dizer que a presença nos espaços institucionais descolada da mobilização basista é que leva à burocratização. Sucede o contrário. Esses espaços só são ocupados dessa forma quando um dado movimento já está em processo de burocratização ou quando este processo já está consolidado. A ocupação desses espaços pode ser, inicialmente, uma tentativa de “garantir a pauta” em um momento de refluxo. Afinal de contas – argumenta-se – a demanda está aí e precisa ser cumprida da maneira que for necessária. E os gestores, naturalmente, ainda sob a impressão das mobilizações muitas vezes recentes, não têm se furtado a fazer convites. Reuniões para “construir propostas viáveis”, um ou outro convite para tirar uma dúvida no gabinete, trocam-se telefones. Isso vai virando um hábito e o acesso fácil aos espaços de governo dá a impressão de que o movimento é forte e consegue “impor o diálogo”. Mas, na verdade, quem está impondo as condições da conversa são os gestores públicos. Quando não há a mobilização basista, mas permanece o interlocutor institucional, o interlocutor de movimento social acaba cumprindo muito mais um papel de assessor do que realmente de pressão. Afinal de contas, ao contrário das empresas e ONGs, não temos uma estrutura financeira nem técnica para sustentar as formas de luta da pressão em gabinetes. Lobby em movimento social não funciona, pelo menos não no sentido da conquista das pautas a partir de uma ampliação do poder dos trabalhadores sobre as suas vidas. As vanguardas de algumas lutas sociais se tornam, então, especialistas em seus temas específicos e bons entendedores dos ânimos populares. Podem, por exemplo, impedir uma medida impopular que geraria revoltas por meio da interlocução com o governo. É, de certa maneira, um avanço concreto, mas é um avanço para quem? O que é uma pauta de reivindicação descolada dos lutadores que estão tentando construí-la? De que maneira esse avanço concreto pontual permite um avanço estratégico?

Permeando esse processo de aproximação entre autoridades e vanguardas está a transformação da estrutura interna dos movimentos sociais. Movimentos massivos, voltados de maneira prática para a transformação mais ampla da sociedade, acabam se reduzindo a vanguardas persistentes. Essa redução da participação muitas vezes gera uma crise interna – os poucos que restam se voltam para dentro, tentam discutir as falhas que levaram até lá ou pelo menos garantir o que restou. Trocam-se acusações, desgastes, ocorrem disputas por poder. Essas discussões muitas vezes pouco interessam às pessoas novas, o que reforça o quadro de isolamento e pouca participação. A isso se somam, muitas vezes, outras complicações: uma inserção engajada na academia pode gerar uma confusão entre os meios de sustento/estudo e a militância política; uma dinâmica de organização pretensamente democrática, para garantir que todos participem de tudo e para isso tenham que dedicar muitas horas, pode ser excludente de uma participação horizontal ampliada. Tudo isso gera uma conjuntura em que a desmobilização da base, ao invés de gerar uma autocrítica e uma estratégia de novas formas de envolvimento efetivo das pessoas, apenas gera uma sensação de isolamento e incompreensão. Por que, o movimento se questiona, a população não se interessa pela pauta popular? Por que, pensamos, a inserção popular ampliada no movimento não se tornou mais questão de vida ou morte para a organização?

Se em um determinado momento a base social da luta não se interessa pelo movimento, mas os gestores públicos sim, o que resta fazer?

22 COMENTÁRIOS

  1. Nada importante a acrescentar, mas cumprimento pela lucidez das dúvidas.
    Pessoalmente, na maioria das vezes me sinto alijado de certas discussões
    pois parece-me que vivo num mundo diferente dos outros. Não digo certo ou errado, mas diferente. Minha idade biológica me parece ser um empecilho à comunicação. Procuro palavras apropriadas mas não as acho. Me sinto impotente quando estou no terreno do inimigo.

  2. Se em um determinado momento a base social da luta não se interessa pelo movimento, mas os gestores públicos sim, o que resta fazer?
    De duas, uma: ab) reconhecer que, se “a base social da luta não se interessa pelo movimento”, não há movimento; bb) fingir que há movimento e deixar-se abduzir-cooptar, tornando-se gestor público…

  3. Massa ? Os black blocks acabaram com ela, tanto por trazer a violencia, ajudando a pm a “legitimar” seus atos quanto quanto por fazer pouco das massas que não concordam com sua tática. Por isso este ano a mobilização foi fraca.

  4. Engraçado… pra dizer no mínimo… ao ler esta matéria me lembrei de cara de um coletivo do MPL, o de Brasília, que quanto mais se reúne com a burocracia, menos parece se importar com as lutas pelo transporte. Enquanto o bicho pega lá no entorno, várias manifestações e o povão em fúria, o coletivo lançou esta nota dando a impressão de tentar justificar sua ida até o gabinete presidencial (https://www.facebook.com/photo.php?fbid=707118212663288). Depois disso se envolve em lutas como esta (https://www.facebook.com/photo.php?fbid=713144312060678&set=a.400673959974383.83379.259970814044699). Não que os guaranis não mereçam as terras, longe disso, mas o MPL de lá é essa força e essa legitimidade toda no assunto? E neste contexto, como ficarão os trabalhadores do entorno?

  5. Li esse texto pensando no recorte dos anos eleitorais. Não sei, mas parece que em ano eleitoral a ação política fica mais contaminada com o desejo irremediável da reeleição, da eleição, do “vamos disputar por dentro”, ou coisa que o valha.

    Então “a ida a uma reunião com o poder público (seja o federal, estadual ou municipal), o diálogo com um candidato ou a demanda por uma audiência pública” neste período, o que significa?

    Ainda, dentro da disputa política em torno de conceitos como “transparência”, “controle social”, e até “conselho”, o que significa reforçar o espaço institucional?

    Ou como não reforçar o espaço institucional e ainda ter uma experiência prática que mostra a necessidade da luta política?

  6. Os comentários aqui abrem uma serie de questões e outras tantas surgiram em conversas com outros militantes.
    Os processos de junho e a luta contra os 20 centavos permitiram um momento de ascenso da mobilização urbana, especialmente em relação ao transporte. Essas mobilizações foram radicais não apenas porque ousaram enfrentar a violência policial, mas também porque permitiram uma tomada de controle momentâneo da população das decisões da cidade. Não se pode, como fez o Luiz, responsabilizar apenas aqueles que optaram pelo confronto direto pelo esvaziamento das manifestações; as pessoas saíram da rua porque tiveram uma conquista importante, obtiveram a redução de tarifa que reivindicavam; o problema é como essas pessoas podem se organizar para além da ação na rua? como formar um movimento social urbano de massas?
    Entendo o processo de separação entre as pessoas que se colocaram a frente de uma luta e a base social mais ampla dessa é algo gradual, esse processo acelera-se no momento em que existem amplas mobilizações seguidas de vitorias parciais e posteriores refluxos. Não por um desejo dessa minoria, mas porque após processos vitoriosos esses militantes passam a ser interlocutores respeitados pelo poder público e pela mídia, como se fossem estas pessoas as únicas responsáveis pelos amplos processos de mobilização. Entra aí um jogo duplo de fascinação pela fama e pelo poder alcançado, ao mesmo tempo que não este o papel pretendido pelas pessoas. Digo isso por experiência própria é impressionante ser reconhecido na rua e as pessoas perguntarem quais são os próximos passos de mobilização, existe uma demanda para que se exerça este papel. Contudo, não pretendemos ser dirigentes dessa maneira, mas ao respondermos todas as demandas que nos são apresentadas tendemos a ficar consumidos por elas; e são várias o apoio à lutas que consideramos centrais, a alteração das políticas públicas do setor, a criação de um conselho de transporte, a formulação de um program para a juventude com reuniões com a presidência. Tudo isso tende a acabar com a dinamicidade do movimento, amarrando suas possibilidades de militância e cristalizando posições de poder internas ao movimento, pois sempre se colocam as pessoas mais experientes e capacitadas para desenvolver essas tarefas, afinal elas são tão importantes.
    Temos o desafio reverso como permitir as pessoas interessadas a participação no movimento sem abrir mão de nossos princípios e dando conta das demandas que nos são colocadas? Como integrar essa revolta que toma forma na queima de ônibus na periferia em um processo realmente transformador? Quais espaços organizativos alternativos podemos criar?

  7. Cobre o judiciário!!
    EX: Só a Justiça tem o poder e o dever de acabar com a Máfia de Transporte do País. Somente a balança cega pode distinguir os desequilíbrios de interesses entre os governantes e governados. AFinal, a justiça fora criada para isso: ser o braço apolítico e apartidário da nossa República Platônica idealista.
    Agora se você quiser mudar a República Platônica Idealista Milenar, vá ler Nietzsche e pare de ser massa de manobra da direita com protestinho de facetruque, nas alamedas burguesas, com transmissão ao vivo da Globo!

  8. Cracatua,

    você viu que o MPL-DF está fazendo piquetes e construíndo a greve metroviária ainda em curso no Distrito Federal? E você viu também que o movimento está apoiando, acompanhando e se inserindo nas lutas de usuários e usuárias do entorno?

    Ou, de repente, você olhou seletivamente a página do MPL-DF no facebook pra justificar um argumento detrator?

  9. Paique, não olhei seletivamente não, olhei toda a página e acompanho com entusiasmo notícias do passe livre como um todo há um bom tempo. Da maneira como expõem as ações do grupo, a lógica aparente é a do coletivo de brasília servir como sigla com o objetivo de capitalizar politicamente outros agrupamentos (neste sentido, será que junho de 2013 contribuiu para legitimar este tipo de ação junto a alguns setores?, fica a dúvida). De qualquer modo, esta lógica parece expressa no caso citado no meu último comentário, ou mesmo com a redação de notas de “apoio” para a luta do entorno. Já o caso dos piquetes na greve dos metroviários merece reflexão mais profunda, pois convém lembrar que esta greve é puxada por um sindicato ligado ao PSB, em ano eleitoral…. Além disso, pelas pautas apresentadas e pela forma de expor politicamente a questão, é de se perguntar se a aliança do passe em livre brasília é de fato com os trabalhadores metroviários ou meramente com a burocracia sindical da categoria… De qualquer maneira estas questões servem só como indícios, pois o mais importante vem agora: qual é a luta específica do coletivo de Brasília? Quais são seus lutadores (no sentido social e não pessoal)?
    É mesmo incompreensível o que ocorre, pois quando acontece uma luta importante e que deveria ser central ao passe livre, como no usuários nas cidades do entorno, que poderia inclusive justificar a existência do coletivo, o que fazem é uma pálida tentativa de inserção com “notas” de apoio? Dizer que vai pra rua, que a luta é na rua, é consenso, mas as lutas sociais, feliz ou infelizmente, parecem não se reduzir a meras declarações sobre elas.

  10. Cracatua,

    seu argumento é de fato detrator e desinformado acerca da luta que desenvolvemos no Distrito Federal. Não sei se você é daqui ou de outra cidade, mas certamente não acompanha as ações do movimento. Parecendo que suas afirmações são muito mal-intencionadas, vou responder na forma como se responde a uma calúnia.

    1 – Realizar mobilizações de base e atuação comunitária sempre fez parte da forma de atuar do MPL-DF. Fossem ciclos de oficinas, aulas públicas, estímulo de assembleias nas diferentes cidades do DF, apoio a lutas de outros coletivos, etc. Temos há algum tempo nossos núcleos de trabalho de base em algumas regiões do distrito federal, inclusive no entorno sul, que é onde estão ocorrendo estas mobilizações espontâneas. O MPL-DF – assim como vários outros coletivos, creio – atua principalmente com três ações: trabalho de base, ação direta e organização/estudos. Tendo o trabalho de base como central ao nosso coletivo, é aí que estamos desenvolvendo nossos principais esforços. A especificidade das lutas do entorno tem detalhes que não vale nem devo expor em público… a única questão que lhe deixo, como informação, é que direcionamos sim efetiva e praticamente um esforço direcionado do coletivo a acompanhar e apoiar aquelas mobilizações. É fato que não temos trabalho de base suficiente no entorno para estarmos organizados de fato naquela região e é fato também que mobilizações por transporte coletivo não dependem do MPL pra ocorrer. Mas daí a dizer que ignoramos aquela luta é mentira, desinformação ou canalhice mesmo. Não sei dizer de qual foi a sua.

    2 – De onde você tirou que o sindmetrô-df é ligado ao PSB? Basta um mínimo de aproximação pra perceber que o sindmetrô é um sindicato independente, autônomo e que no campo sindical tem suas relações mais próximas à ASS/Intersindical – ao qual não é oficialmente vinculado, todavia. Não há qualquer diretor filiado a algum partido político nem mesmo qualquer força do psb na base como corrente. Compomos há cerca de 4 anos uma frente classista no DF com participação do MPL, MTST, Sindágua, Intersindical, Sindmetrô, Coletivo Cultura de Classe, Casa Moringa e outros grupso culturais. Temos relações com a diretoria do sindmetrô nesta frente e com a base metroviária em meio a mobilizações conjuntas, panfltagens que realizamos com a categoria e presença regular em suas assembléias. É pouco, mas isso foi construído com muito esforço e o processo é de avançar cada vez mais… de forma que não é por outro motivo que não a dúvida leviana que você levanta esta informação de que estamos vinculados a uma burocracia sindical pesebista. A sua calúnia é bem semelhante à que o Governo do Distrito Federal faz ao movimento metroviário, que já comprovou com seus próprios mecanismos a legitimidade de sua luta. Sua vontade de atacar o MPL-DF te leva a uma análise do movimento sindical extremamente reacionária e servil ao poder.

    3 – A luta do MPL-DF é por tarifa zero, há um bom tempo. De fato a conjuntura específica do distrito federal nos levou há uma situação de rearticulação social do coletivo, dado que tivemos que ampliar nossa luta de uma base estudantil aos setores populares e sindicais em período de reforma dos transportes. Todavia nosso foco público, tanto em nossos trabalhos de base, estudos e mobilizações foi sempre em torno da tarifa zero. Qualquer pessoa que conhece o MPL por aqui sabe disso. Nossos lutadores e lutadoras, no sentido social, são estudantes (majoritariamente jovens trabalhadores) e comunitários. Temos alguma relevância no primeiro setor e inserção parcial no segundo. Todavia, repito, qualquer aproximação mínima ao coletivo sana estas dúvidas. Se você não mora aqui e levanta estas dúvidas de longe com tanta certeza assim, claramente está vinculado a algum círculo de julgamentos aleatórios de lutas externas ao qual lhe sugiro se desligar.

    4 – Por fim, prefiro encerrar esta conversa por aqui. Esta não é a melhor forma de conversar sobre as lutas no DF, acho. Não sei se o interesse dos autores do texto era esse, espero que não – pois ambos teriam meios mais diretos para apresentar suas questões. Todavia, cracatua, estou aqui me colocando com meu mesmo nome público neste debate. Tomara, ou desejo, que você não seja daquelas pessoas que utilizam nomes estranhos na web alegando buscar segurança e se escondem em críticas pueris para, em encontros pessoais, viverem de tapas nos ombros recheados de cinismo. Tomara mesmo que não seja isso.

    Saudações Catraqueiras
    Paíque

  11. Paique,
    Acho que meus objetivos e os do Grouxo estão claros no artigo. Reforcei eles e coloquei mais alguns no meu comentário. Acho que é uma reflexão necessária para todos os movimentos autônomos, obviamente nos baseamos na experiência do MPL, tanto antes como depois de junho, mas o artigo não se restringe a isso.
    Se para você no DF essas questões não são pertinentes gostaria de entender o porque? Elas foram superadas? Considera que são falsas questões?

  12. Oi legume,

    estas questões apresentadas no texto são pertinentes a todo movimento autônomo brasileiro. Ao DF, que institucionalmente é abarrotado pela esfera local e federal, mais ainda.

    A resposta que fiz foi estritamente ao cracatua. Quando citei, no ponto 4, os objetivos de vocês no texto, foi explicitamnete para diferenciá-los da desqualificação que foi feita gratuitamente sobre nós nos comentários.

    No DF estamos em uma situação social de cooptação e repressão desde que derrubamos o governo arruda em 2010. Todos os movimentos combativos passaram por uma ou por outra estratégia, motivo pelo qual o argumento deste texto é importante para a nossa reflexão. Ainda mais porque, como explicitam, a burocratização de uma luta não é somente – e talvez nem principalmente – fruto dasvontades individuais de quem luta.

    Todavia, mais que isso, a questão que mais toca é: quais os mecanismos históricos constituídos para superar politicamente o processo de burocratização? Algumas formas que conheço – o isolamento político-social, a saída vanguardista estéril ou a implosão sectária da organização – não me pareceram frutíferas.

    Esta questão estará posta aos nossos movimentos quanto mais tivermos avanços.

  13. Paique, acho realmente muito proveitoso que você possa questionar alguns pontos colocados, porém são completamente inúteis estas adjetivações quanto a mim e a outros leitores pode até parecer uma tática para tentar ofuscar o que mais importa. Por isso sugiro que deixemos esse tentador caminho de lado, pelo bem da discussão. Indo ao que interessa pergunto: de fato estiveram em reunião com a presidência? Pois a nota do coletivo da a entender que não. Mas se estiveram (o que de fato tornaria o conteúdo da nota um tanto esquizofrênica ), quais foram os objetivos com esta reunião? Quais resultados alcançados? Além do mais, também seria importante esclarecer se andam tendo reuniões com o GDF (governo de Brasília) e quais os ganhos de mobilização que disso tem decorrido. Saudações.

  14. É espantoso ver que se criou uma nova forma de trabalho voluntário: o fiscal de ortodoxia “libertária” ou “esquerdista” de movimento social.
    Pois desse último comentário de Cracatua, parece que é disso que se trata.
    O mais paradoxal é que em nome da desburocratização, ou da antiburocratização, se cria um burocrata, o fiscal, alguém de fora com a função de manter algo numa linha política imaginada e estabelecida… por quem?

    Isso me lembrou muito a letra dessa musica: http://www.youtube.com/watch?v=6N8fDRA4Eq0

    As perguntas ou são infantis ou são cretinas.
    Não sou do DF e nem do MPL, mas é o tipo de pergunta que poderiam ser feitas a qualquer movimento que vai a uma reunião com uma autoridade. Oras, e desde quando quando um representante de movimento se senta em uma reunião com representante do governo achando que isso trará um ganho em mobilização??!! Mesmo sendo o principal, e da onde vem a força de um movimento social, há momentos de diálogo, de ouvir e sentir a postura do governo.
    Quem fez a pergunta é que tem que responder o que se perde indo um representante de movimento a uma reunião com a presidência numa manhã ou numa tarde? Me parece uma tremenda estupidez não ir, perder a oportunidade de ter uma avaliação melhor do discurso do governo, das suas táticas…
    Outra coisa muito diferente seria focar energias que não se tem participando de conselhos e outras instâncias de mediações estatais.

    Luta de classes é jogo de xadrez, e quem só sabe mexer um tipo de peça está fadado a perder.

  15. Leo,
    O seu comentário deixou-me perplexo. A esse «trabalho voluntário» de «fiscal», para empregar as suas expressões, eu chamo actividade revolucionária, a grande atenção que todo o revolucionário tem de prestar às manifestações de burocratização surgidas no interior dos movimentos, as mais graves de todas. É que há uma diferença abissal entre as conversas informais que um militante ou activista deve estabelecer com pessoas de todos os quadrantes ou mesmo sem quadrante nenhum, que são uma condição indispensável para compreendermos as várias forças em jogo, e o facto de representantes de um movimento se sentarem à mesa de negociações com agentes do poder de Estado. Para definir o carácter deste facto é necessário saber se existe um grande avanço das lutas e se o movimento se encontra na mó de cima ou se, pelo contrário, se trata de um período de refluxo das lutas e o movimento se encontra isolado. É disto que o artigo trata e que trataram os comentários de Cracatua. E veja você que eu sou tão «infantil» ou tão «cretino», para empregar as suas palavras, que concordei com aqueles comentários.
    Leo, você dá o exemplo do xadrez. Também eu jogo xadrez e se soubesse que você joga já lhe tinha dado o prazer de me ganhar. Mas olhe uma coisa. No xadrez as brancas são sempre brancas e as pretas são pretas, não existem processos internos de burocratização que façam as peças mudar de cor e um lado come as peças do outro, não as recupera nem as assimila. Quem julga que a luta de classes é como um jogo de xadrez está cego à ascensão dos novos burocratas.

  16. Se os litigantes tiverem que escolher um jogo de tabuleiro, o Go talvez seja mais propício.
    A cor do gato é, segundo um velho chinês, indiferente. Desde que ele cace ratos, à luz do pragmatismo revisionista…

  17. Paique,
    Achei curiosa a passagem ” desde que derrubamos o governo arruda”. Essa coletividade é o MPL-DF, são todos os movimentos juntos? Quem se aproveitou da derrubada do Governo Arruda, os trabalhadores e trabalhadoras, ou aqueles e aquelas que o sucederam?
    Acho particularmente estranho nós do MPL nos colocarmos como vanguarda de outras lutas que não as específicas sobre transporte – isso não quer dizer que não devemos apoia-las – acho que este caminho é o escolhido por agremiações de orientação leninista que pretendem sempre estar a frente dos processos de luta, acho também um passo importante para se converter em uma burocracia pois acho difícil que exista um trabalho organizativo com um grupo amplo de pessoas sobre todas as pautas. Claro que o reverso disso pode ser o isolamento político social que você mencionou, porém a ruptura com esse isolamento deve vir com a solidariedade e com uma organização concreta desde abaixo.

  18. João Bernardo,

    Meu comentário foi exclusivo ao absurdo último comentário de Cracatua, e não sobre o texto, que apresenta uma reflexa genérica, e por isso válida.

    Impossível não ler aquele comentário não enxergar uma espécie de pretenso fiscal de uma linha política que nãos e sabe qual é. Um fiscal, isto é, alguém externo, uma espécie de auditor. Revolucionário para mim é alguém que participando do movimento, questiona seus caminhos, e principalmente age de forma que se evite processos de separação internos, em hierarquias e similares.

    A pergunta sobre quais ganhos de mobilização se tem numa reunião esporádica com um autoridade é na melhor das hipóteses infantil. Pelos motivos que já expliquei. Não faz sentido perguntar isso uma vez que não se espera aumento de mobilização numa reunião dessas.
    Como já disse, a resposta que o Cracatua deve responder é qual a perda de mobilizaçao em se reunir naquela ocasião com a presidenta?

    Mas enfim, a discussão é inútil, pois quem participa é que dará os rumos às coisas e decidirá sobre os rumos.

    Um texto de reflexão, mesmo que externo, acho que é só próprio papel do intelectual.
    Cobrar atitudes sobre isto ou aquilo pontualmente, como fez Cracatua, é simplesmente uma tentativa infantil de ser uma direção externa, o ápice da burocracia.

  19. Uai legume,

    “derrubamos” não é o MPL-DF não. Foi um movimento bem amplo do qual o MPL participou. Foi o “movimento fora arruda e toda máfia”.

  20. Se não tivesse minhas asinhas para voar para onde quero, eu poderia responder ao Leo Vinicius que eu já poderia ter andado de ônibus, ficado parado no trânsito, inalado fumaça de caminhão, apanhado da polícia em alguma manifestação do passe livre, lido e pensado a respeito. Eu até poderia ser alguém que se interessa pela questão porque viveria ela todo dia quando iria trabalhar, passear, ir pra escola, pro médico, namorar…
    Será então que eu sou um agente externo (tipo um tira, como você disse)? Se for isso, então quer dizer que a luta pelo passe livre é dos donos do passe livre e o resto da arraia miúda que catem seus coquinhos? Isso seria só bobagem ou burocratismo? No que se diferencia essa posta da de um dirigente sindical do tipo burocrático clássico? Eu teria vergonha de sugerir isto.

    Sobre a parte do “reunião esporádica”, parece que quem é agente externo e não sabe do que fala é você (e pelo visto ninguém vai ficar sabendo também, pq o que mais importava pra mim já não vou mais ficar sabendo).

  21. Em novembro do ano passado o MPL-DF lançou uma nota sobre o processo de reuniões com o GDF. Talvez ela não tenha circulado muito, mas aqui está:

    Direito não se negocia, conquista-se – A Tarifa Zero só vira se for pelos de baixo

    Quando as manifestações contra o aumento da passagem estavam em seu auge ao redor do país, aqui no Distrito Federal o Goveno do Distrito Federal convidou o Movimento Passe Livre para uma reunião, na véspera da manifestação marcada pelo movimento. Sem aumento de passagem previsto, as reivindicações do MPL-DF consistiam, desde então, na Tarifa Zero e no transporte 24 horas. O ato de mais tarde era de fato o determinante, mas não vimos problema em expor nossas pautas pra quem quer que fosse. Por isso fomos ao Buriti com nossas vestes catraqueiras encontrar um tanto de secretários engravatados. Nessa reunião o governo admitiu que a Tarifa Zero era possível. Embora nós do MPL já soubéssemos da sua viabilidade, isso nunca tinha sido admitido pelo governo, o que foi um pequeno avanço. No mesmo dia fomos pra rua, lugar onde vemos de fato as mudanças acontecerem.

    Reivindicamos ao governo que, se dizia que a Tarifa Zero era possível mas não tinha segurança para implementá-la, realizasse um debate público sobre o tema. Após algumas conversas mais, fomos convidadxs para participar de um seminário com membros do GDF, movimentos sociais, pesquisadores e empresários. Embora o espaço não fosse deliberativo, concordamos em apresentar novamente nossa proposta de Tarifa Zero para um transporte coletivo realmente público. Nesse diálogo também ouvimos de especialistas que a Tarifa Zero é viável e necessária para uma sociedade mais justa. Já os setores do governo não apresentaram qualquer proposta para a implementação da Tarifa Zero. Apenas continuavam com a mesma enrolação. Já os empresários de transporte fingiram querer algo amistoso conosco, quando sabemos nossas diferenças de classe que nos colocam em lados opostos. Com os movimentos sociais sempre estivemos irmanados… com eles fizemos nossa força.

    Sabendo que a conquista da Tarifa Zero e Transporte 24 Horas não virá de cima, seguimos trabalhando nos espaços em que realmente acreditamos. Realizamos aulas públicas, conversas, trocas e oficinas em diversas cidades: Águas Lindas, Estrutural, Plano Piloto, Ceilândia, Samambaia, São Sebatião, Paranoá, Santa Maria, Valparaíso, Sobradinho, Taguatinga. Continuamos construindo nossas relações com movimentos sociais: participamos de atividades de formação, fizemos piquete e fechamos ruas com nossxs companheirxs. Na semana do dia 26/10 – Dia Nacional de Luta pelo Passe Livre – nos acorrentamos no Buriti e mais tarde fomos para rua reivindicar a implementação imediata da Tarifa Zero. O ato terminou com um emocionante catracaço na estação central do metrô.

    Nesse mesmo dia, fomos chamadxs para conversar novamente com o governo. Dessa vez, para supostamente ouvirmos as decisões do GDF depois do seminário sobre a Tarifa Zero. Fomos. Escutamos o mesmo discurso de quatro meses atrás. Nenhuma medida concreta, nenhuma proposta. Apenas o blablabla de antes. Somado a ele, muita hipocrisia.

    Se o GDF acha que vai nos enrolar com reuniões e burocracias, ele nem sequer se deu ao trabalho de nos conhecer melhor. O MPL, em seus quase 10 anos, nunca acreditou que era nas mesas de negociação que nossos direitos seriam conquistados. Foi ocupando órgãos públicos e parando o trânsito que fizemos o passe livre estudantil acontecer. Foi conversando nas escolas e comunidades e deixando a rodoviária em chamas que fizemos com que nenhum governo tivesse a coragem de aumentar a passagem nos últimos sete anos. Será pulando as catracas e nos organizando que chegaremos à tarifa zero de fato – não um discurso, mas uma realidade.

    Fomos às mesas de diálogo sem qualquer intenção de negociar nossos direitos, pois direito não se negocia: se conquista. Além da enrolação, também sabemos que existe um movimento de vários setores do estado em cooptar as lutas sociais. Se estão tentando domar a rebelião expressa em junho, cometem mais um erro grotesco: a força das ruas é coletiva – e o MPL só existe enquanto é fruto dos de baixo. Qualquer passo com os de cima não amansa a indignação popular: só afasta dela o pequeno grupo que se burocratiza.

    Assim, Não estamos rompendo as negociações com o governo, pois elas nunca existiram. Todos os eventos em que participamos foram claramente direcionados à conquista de nossa pauta. Só que agora apenas participaremos de reuniões em que forem debatidas propostas concretas sobre a Tarifa Zero e Transporte 24 horas. Nelas, apresentaremos nossas concepções e só. De resto, ação direta é a nossa linguagem.

    É que sabemos bem que é fechando ruas que abriremos caminho para uma cidade de todxs e para um transporte público de verdade. E que as catracas têm que ser quebradas pela base.

    Distrito Federal, 01 de novembro de 2014

    Por uma vida sem catracas
    Movimento Passe Livre – DF

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