Por Loren Goldner

A greve na Ssangyong Motors, em Pyeongtaek, na Coreia do Sul, dura já há quatro semanas e permanece sem resolução na data em que escrevo este artigo (19 de Junho). Vários aspectos desta greve lembram o processo ocorrido na recente luta na Visteon, no Reino Unido, bem como as lutas suscitadas um pouco por todo o mundo devido à reestruturação da indústria do automóvel. Mas, por outro lado, trata-se da tomada e ocupação de uma fábrica e da preparação para a defesa violenta das instalações, se for necessária, e desde há vários anos que não se via na Coreia do Sul nada deste género.

Aquela empresa está desde há três anos sob o controlo da firma chinesa Shanghai Automotive Industry Corporation, que adquiriu 51% do capital. Nessa época a fábrica de Pyeongtaek tinha 8700 assalariados, tendo agora 7000. Em Fevereiro deste ano a empresa entrou num processo de falência, propôs uma reestruturação e ofereceu a fábrica de Pyeongtaek como garantia dos novos empréstimos necessários para sair da situação de bancarrota. Os tribunais aprovaram este plano, com a condição de se proceder a despedimentos que tornassem a empresa novamente rentável.

A administração parece ter adoptado a estratégia de reduzir gradualmente e a longo prazo o número de assalariados e ao mesmo tempo adquirir tecnologia para desenvolver actividade na China. Desde a sua aquisição pela Shanghai Automotive que a Ssangyong Motors não recebeu novos investimentos nem lançou novos modelos de automóveis. (Note-se que nos tribunais o Ministério Público pôs em causa a legalidade dessa transferência de tecnologia para a China, já que se tratava de tecnologia criada com subsídios do governo coreano, mas até esta data não há qualquer decisão judicial acerca do assunto.)

Em Abril, os operários da fábrica de Pyeongtaek responderam com greves à ameaça de despedimentos [demissões], e rapidamente a greve se generalizou e levou à ocupação das instalações por 1700 operários em 27 de Maio, dia em que fora anunciada a lista dos despedidos [demitidos]. Os grevistas exigem três coisas: 1) que não haja despedimentos, 2) garantia de emprego para todos e 3) que não se recorra à subcontratação. A empresa pretende a reforma [aposentadoria] antecipada de 1700 trabalhadores e despediu 300 trabalhadores temporários.

Os operários da Ssangyong Motors são filiados no Sindicato dos Operários Metalúrgicos Coreanos (KMWU, iniciais do nome em inglês) e trabalharam em média entre 15 a 20 anos na empresa. Os que detêm um emprego estável ganham um salário de base, por ano, no montante aproximado de 30.000.000 won (cerca de 25.000 dólares); os temporários ganham cerca de 15.000.000 por um trabalho idêntico. (Na Coreia do Sul o salário de base constitui apenas uma parte da remuneração, que inclui diversos benefícios − para os detentores de emprego estável − bem como o pagamento de horas extraordinárias a uma taxa significativamente superior; é frequente que o trabalho extraordinário chegue a 10 horas semanais e a maior parte dos trabalhadores considera-o desejável para aumentar os rendimentos.)

Em meados de Junho cerca de 1000 operários prosseguiam com a ocupação, sendo a comida fornecida pelas esposas e pela restante família. Cerca de 500 trabalhadores que não estão incluídos na lista dos despedimentos preferiram ficar em casa e cerca de 1000 supervisores estão a desempenhar funções de fura-greves [pelegos], essencialmente manutenção de maquinaria, porque desde que a greve começou não foram produzidos automóveis.

Até agora a polícia não tem estado presente em grande número em Pyeongtaek. Pelo menos em parte, isso deve-se à crise política que a Coreia do Sul está a atravessar, devida ao recente suicídio do ex-presidente No Mu Hyeon e às grandes manifestações de protesto contra o governo de direita de Lee Myong Bak, prevendo-se que essas manifestações se ampliem em Julho. O governo de Lee, eleito em Dezembro de 2007 na base de um programa de elevado crescimento económico, comprometido agora pela crise mundial, foi surpreendido pela escalada de descontentamento, revelada em manifestações que chegaram a mobilizar 1 milhão de pessoas. E como a acção da polícia de choque agravou a indignação e fez com que ainda mais pessoas se manifestassem nas ruas, o governo não quer arriscar-se agora a ordenar um assalto à fábrica de Pyeongtaek.

No dia 16 de Junho ocorreu junto aos portões da fábrica uma grande manifestação contra a greve, com mais de 1500 participantes. Estavam presentes os 1000 supervisores fura-greves, 200 sujeitos pagos para mostrar a musculatura e 300 operários que não constam da lista de despedimentos e não apoiam a greve. No local encontravam-se 400 polícias de choque, que não intervieram e no fim declararam que a manifestação dos fura-greves era ilegal.

Durante a manifestação dos fura-greves, entre 700 e 800 operários de fábricas vizinhas, nomeadamente da firma automobilística Kia, vieram ajudar a defender as instalações da Ssangyang, em parte mobilizados por mensagens sms emanadas do KMWU.

Os operários ocupantes têm a intenção de se defender pelas armas contra qualquer tentativa da polícia de os expulsar da fábrica, e para isso constituíram stocks [estoques] de tubos de ferro e de cocktails Molotov. Em último caso, pensam concentrar-se na secção de pintura, onde calculam que a acumulação de materiais inflamáveis leve a polícia a desistir de lançar gases lacrimogéneos, o que provocaria um incêndio.

Segundo um militante que tem uma atitude crítica relativamente ao sindicato, parece que o KMWU mantém o controlo sobre esta greve. Contrariamente ao papel desempenhado pelos sindicatos na luta da Visteon, no Reino Unido, e no desmantelamento da indústria do automóvel norte-americana, o KMWU tem apoiado até agora as acções ilegais da ocupação da fábrica de Pyeongtaek e da preparação para a sua defesa armada. Por outro lado, todavia, tem insistido apenas na reivindicação do cancelamento dos despedimentos e tem-se mostrado transigente na questão da segurança de emprego para todos e na oposição à subcontratação.

No centro da ocupação da fábrica estão 50 ou 60 grupos de trabalhadores de base, cada um com 10 membros, que por sua vez elegem delegados (chojang) para coordenar a acção. Segundo o já referido militante, estes chojang são os operários mais combativos e com maior consciência de classe.

O resultado da greve está ainda por decidir. Ela beneficia de um clima político momentaneamente propício, que levou o governo coreano a uma atitude de recuo, mas tem de enfrentar a profunda crise da indústria do automóvel mundial e a crise económica generalizada. Nas vizinhanças, a Kia Motor Company encontra-se no meio de delicadas negociações de um plano de crise, e a GM-Daewoo está a ser afectada pela reorganização mundial da General Motors. A estratégia prosseguida agora pela empresa, tal como sucedeu no caso da Visteon, parece ser, no melhor dos casos, um atrito lento, que já vem a ocorrer desde 2006, ou mesmo o encerramento puro e simples da fábrica. Pode suceder que a luta na Ssangyong Motor se repercuta em toda a indústria automobilística coreana ou até passe além, mas o mais provável é que ela seja asfixiada − lenta ou rapidamente − no seu isolamento actual.

Sobre o final desta luta leia aqui.

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