O Indymedia Portugal voltou à rede em Novembro de 2009, depois de uma ausência prolongada. O Passa Palavra dirigiu algumas perguntas ao colectivo que assegura o seu funcionamento, no sentido de conhecer melhor esta experiência de comunicação alternativa e possibilitar o debate entre companheiros envolvidos em projectos semelhantes. Por Passa Palavra

Passa Palavra – Como definiriam vocês a natureza e o âmbito do Indymedia [-PT] recentemente reactivado?

indyIndymedia-PT – Após o encerramento do Indymedia [-PT], algo que se deveu essencialmente a dificuldades de ordem técnica (problemas com o servidor e ausência de uma pessoa com conhecimentos informáticos), sentimos que a sua função principal – a de constituir uma plataforma contra-informativa – não havia sido colmatada por outro meio. Apesar da expansão de blogues, algo que vemos como um fenómeno extremamente positivo, constatámos não existir um dispositivo que compile a informação publicada nesses mesmos blogues. De certa forma, é esse o desafio do colectivo editorial do Indymedia: continuar a divulgar aquilo que costuma ser ignorado e desvalorizado pelos meios de comunicação convencionais, através quer da produção de informação, quer da divulgação da actividade de outros colectivos. Queremos que as pessoas tenham no Indymedia um meio de informação que lhes interessa e no qual podem participar, escrevendo os seus artigos e comentando outros. O ideal seria que cada vez mais gente criasse o hábito de, quando participa numa manifestação, num debate, num piquenique ou o que seja, escrever qualquer coisa sobre como foi, tirar fotos ou filmar, e depois partilhar, publicando-o no Indymedia. Que quando alguém tem uma informação que acha importante divulgar, mesmo algo que encontra na net ou escreve num blog, a adapte para uma notícia e publique. No fundo, que todas as pessoas que sonham e lutam por um mundo mais justo passem a contar com o Indymedia para informar e serem informadas. O colectivo de voluntários que faz a gestão do site é também aberto a todos os que nele queiram participar, e a sua mailing list de discussão é pública.

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Escultura de Roland Topor, “Les Mains Sales”

PP – De que maneira e em que grau os colaboradores do projecto estão envolvidos noutros movimentos sociais existentes em Portugal?

Ind. – É difícil responder a essa questão. O meio de funcionamento, pela net e à distância, e o facto de constituir (para o actual colectivo editorial) uma experiência nova, leva a que o conhecimento inter-pessoal seja (ainda) bastante reduzido. Portanto, do pouco que sabemos uns dos outros, existem no colectivo desde pessoas ligadas a grupos ecologistas a dinamizadores de centros sociais, desde membros de grupos de reflexão política a pessoas ligadas a outros projectos contra-informativos. A variedade de «origens» é, deste ponto de vista, uma mais-valia, permitindo ensinar, aprendendo e aprender, ensinando.

PP – Sentem algum eco da vossa actividade junto desses movimentos sociais? Conhecem, da parte dos activistas e pessoas envolvidas, algum tipo de avaliação do papel do Indymedia no que diz respeito às suas lutas/movimentos?

Ind. – Uma vez que o sítio foi relançado há pouco mais que um mês, é ainda bastante cedo para falarmos de um eco junto dos movimentos sociais. Ainda para mais, quando estamos a falar da realidade portuguesa, caracterizada pela quase completa inexistência de movimentos sociais, pelo menos que sejam merecedores de tal termo. No passado, o Indymedia [-PT] desenvolveu esforços no sentido de uma aproximação a determinados grupos, com os quais sentia necessidade de comunicar e trocar experiências. Deste ponto de vista, destacamos a relação que se estabeleceu com a Associação contra a Exclusão e pelo Desenvolvimento (ACED). Tentou igualmente estar presente em «situações chave», como aconteceu nos despejos da Azinhaga de Bezouros ou na manifestação da Rua do Carmo, duramente reprimida pela polícia. Nalguns casos, nomeadamente neste último, o que foi publicado pelo e no Indymedia foi algo importante. Contudo, as limitações inerentes ao projecto, em particular o número de pessoas envolvidas, fizeram com que estes momentos não fossem tantos como os que desejávamos.

Um cartaz do Maio 68 francês
Um cartaz do Maio 68 francês

PP – Como é que vocês próprios avaliam o papel desempenhado pelo Indymedia-PT nas lutas sociais, desde a sua origem até os dias de hoje?

Ind. – Aconteceu, uma vez, um membro do colectivo Indymedia encontrar-se nIum protesto em que participavam pouco mais de dez pessoas. Uma das organizadoras perguntou-lhe até que ponto é que o Indymedia, mediante um apelo de mobilização, poderia garantir a comparência [comparecimento] de mais pessoas num curto espaço de tempo. A resposta foi obviamente negativa. Acho que um bom ponto de partida para qualquer actividade de natureza política (neste caso, contra-informativa) passa por vontade, humildade e realismo. O Indymedia [-PT] é um colectivo com poucas pessoas, essencialmente baseado na internet e que opera num país em que a fraca mobilização social, mesmo nas situações mais crispadas (como é a actual), é a norma.

PP – Num contexto de refluxo das lutas sociais qual o papel desses espaços de informação alternativa e como podem ajudar a reverter esse quadro?

Em primeiro lugar, abandonando qualquer tendência sectária. Não temos que ser todos amigos ou sequer gostar uns dos outros. Mas uma atitude que passa por destacar apenas as diferenças e declará-las irreconciliáveis constitui uma solução estúpida, não só em termos estratégicos, como igualmente em termos humanos. Porque reduzir a potencialidade inerente à comunicação e partilha a uma unidade redutora é, por e simplesmente, pobre. Tal não deve significar, contudo, o abandono de uma perspectiva crítica, quer em relação aos outros, quer em relação a nós próprios. Em segundo lugar, é necessário encarar o «outro» projecto contra-informativo e/ou a «outra» iniciativa de uma forma não concorrencial. Deixemos a competição para a SONAE e a Impresa [1]. Finalmente, é importante desenvolver uma solidariedade não paternalista, que rejeite qualquer espírito de vanguarda.

PP – Houve algum facto político que tenha contribuído e dado novo fôlego à reconstituição do Indymedia Portugal?

Ind. – Não houve nenhum facto em particular. Como referimos, apenas uma tendência, a de não existir suficiente ligação entre vários grupos contra-informativos.

PP – Que tipo de relações e ligações possui o Indymedia Portugal com outros projectos semelhantes, seja a rede mundial em que está inserido, sejam outras realidades de comunicação e informação alternativa?

indymedia_1Ind. – No passado, o Indymedia-PT teve uma forte ligação com o Indymedia-Galiza, algo que ainda se mantém através de alguns contactos que foram estabelecidos. Chegámos a organizar, no seio da rede Indymedia global, um colectivo específico – o Indymedia Portugaliza – essencialmente fruto da partilha de princípios políticos, da proximidade geográfica e da afinidade cultural. No entanto, quer a existência de algumas divisões entre o Indymedia galego, quer alguma incompreensão de ambas as partes sobre questões fracturantes (por exemplo, a questão do nacionalismo ou da língua) acabaram por dificultar essa colaboração. Actualmente, estamos a estabelecer novos contactos.

PP – Há algum tipo de problema – legal, técnico, de segurança – com o qual se vejam confrontados e que assuma particular importância no funcionamento do projecto?

Ind. – O nosso principal problema, desde sempre, foi a falta de pessoas com conhecimentos técnicos, capazes de resolver problemas num curto espaço de tempo. Neste específico ponto, o Indymedia-PT sempre foi particularmente dependente. Actualmente, embora existam mais pessoas disponíveis para colmatar esta falta, continua a ser um aspecto algo preocupante. Para além disto, consideramos que a sobrevivência do Indymedia depende sempre da participação das pessoas, não só através da aplicação de conhecimentos informáticos, como também na publicação de editoriais e de notícias no newswire, ou propostas que impliquem um alargamento qualitativo do Indymedia, para fora dos computadores.

Nota do Passa Palavra:

[1] A SONAE, de Belmiro de Azevedo, é o maior grupo económico português, possuindo vários órgãos de informação, entre os quais o principal diário de referência (o jornal Público). A Impresa, de Francisco Balsemão, é um grande grupo da comunicação que controla vários diários e revistas e um canal de televisão (a SIC).

2 COMENTÁRIOS

  1. Pelo contrário camarada. A única coisa errada é responder a essas pessoas, dando início a uma avalanche de comentários completamente irrelevantes. O pessoal que administra o indymedia vai, à medida das suas disponibilidades, filtrando este tipo de textos, que, na verdade, não beliscam ninguém de tão idiotas. Repare que se lêem o mesmo tipo de coisas em Portugal a propósito de Salazar. Os fascistas são muito pouco originais na sua lenga-lenga.

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