Passadas as eleições, o temor é que essa alucinação coletiva “anti-retrocesso” perdure, já que a miséria política que a engendrou certamente persistirá. Por Gustavo Moura

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Os doze trabalhos de Hércules, painel lateral de um sarcófago da Coleção Ludovisi.

Na condição de militante de esquerda que tem acesso à internet e participa de algumas listas de discussão, surpreendeu-me a quantidade de e-mails relativos ao 2º turno das eleições presidenciais. Lotavam minha caixa de mensagem as conclamações pelo voto em Dilma (ou contra Serra), a convocação de atos de apoio, os manifestos, as denúncias contra a candidatura Serra, as respostas às denúncias feitas contra Dilma, etc. Assinando tais mensagens e documentos, ora estavam intelectuais de esquerda, ora artistas “periféricos”, ora blogueiros democráticos, ora militantes e “ex-militantes” de certos partidos e movimentos sociais. Diante de tamanho empenho virtual, gostaria de fazer algumas considerações, mas adianto que muito do que segue é o óbvio, que nem sempre é devidamente levado em conta.

1. A ascensão e a crescente articulação dos setores mais conservadores e nefastos da sociedade brasileira, boa parte identificados à candidatura Serra, não é uma resposta a um projeto político de esquerda encarnado ou capitaneado pelo petismo (ou pelo lulismo); essa tragédia, que se agrava em ritmo acelerado e aponta para a consolidação de um projeto ultradireitista num curto espaço de tempo, responde justamente à ausência de uma real força de esquerda capaz de influenciar a conjuntura. Diversos fatores alimentam os reacionários que hoje mostram suas garras e destilam seus ódios com tamanha tranqüilidade; dentre eles devo destacar aqui, primeiramente, o seu fortalecimento decorrente do incremento da acumulação em fase ascendente do ciclo econômico, que caracterizou a economia brasileira em vários dos últimos anos (malgrado as repetidas crises econômicas mundiais). Mas também o populismo, o culto à personalidade, o paternalismo – diga-se de passagem, traços elevados à enésima potência pelo Governo Lula –, a venalidade generalizada, fatores esses que se revelaram de maneira contundente nas eleições, em que as discussões eram meros simulacros vazios; tudo remetendo à figura do Serra ou da Dilma, e mesmo os traços mais profundos de suas “personalidades” ou trajetórias individuais, como suas convicções políticas sobre o aborto ou a experiência da perseguição política e da tortura, no caso de Dilma, por exemplo, foram colocados à venda.

2. As eleições, ultraprofissionalizadas, há tempos nada têm a ver com militância política. As cifras astronômicas arrecadadas (declaradas), a qualidade das propagandas eleitorais que mais parecem filmes de Hollywood, o empenho dos mais diversos setores em garantir o incremento de seus privilégios, independentemente do candidato vitorioso, os conchavos, as barganhas, as negociatas, os exércitos de lobbystas e de profissionais da política das mais diversas estampas, tudo isso e muito mais faz da política um jogo de cartas marcadas, que não abre brecha para princípios. Malgrado o populismo das campanhas, nos bastidores e sob os holofotes vimos uma corrida para se agradar todo e qualquer grupo político e econômico de relevo. À medida que hoje inexiste um agrupamento de esquerda considerado relevante nesses termos, trata-se de uma disputa por se mostrar – e para ser, na prática – mais conservador que o rival, beijando todo tipo de cruz reacionária.

3. Esse cenário tão catastrófico de uma perspectiva de esquerda, pobremente caracterizado nas linhas anteriores, não é produzido pelas eleições, mas é evidenciado por elas, sobretudo num país periférico em que a acumulação de capital é tão dependente da intervenção estatal. E frente à atual impotência em se intervir sobre tal cenário, de uma perspectiva de esquerda, muitos de nós se furtam a compreender as origens sociais e históricas dele, e se recusam a encarar o fato de que a atual conjuntura exige a aparentemente quixotesca devoção de nossas energias à construção de lutas diretas e de organizações autônomas e não-burocráticas, que no interior de um horizonte revolucionário não-imediatista optam antes pelo massacre do que pela capitulação, a qual sempre vem na forma de uma ou outra variante do reformismo e na subseqüente absorção pelas estruturas estatais e empresariais. (E é evidente que no atual contexto os pormenores dos referidos esforços organizativos não serão alvo de debate nas tais “redes sociais”).

No mesmo sentido, faz-se vista grossa ante a necessidade de se avaliar criticamente as trajetórias políticas da esquerda brasileira e mundial. Por ser tão recente, dentre as inúmeras experiências históricas dignas de consideração, a petista devia merecer destaque, pois ela evidencia que, sob certas circunstâncias, a dinâmica da acumulação de capital exige a mobilização de quadros gestores oriundos da própria esquerda (reformista), para se auto-impulsionar e para evitar qualquer ameaça de ascenso revolucionário. Tais gestores são fundamentais para alimentar a pão-de-ló as tão comentadas forças reacionárias que eventualmente poderão substituí-los, já que seu apetite voraz e insaciável por dinheiro e poder de tempos em tempos as impelem a dispensar intermediários.

eleições4. Desviando seus olhares desse cenário tão evidente, vejo muitos se lançarem a uma cruzada delirante: agem como se o destino da humanidade ou a linha divisória entre o fascismo e a possibilidade de um futuro suportável estivesse na eleição da Dilma. Face a uma “escolha” tão premente, parecem vociferar: ignoremos nossa completa incapacidade de influenciar o destino das eleições e façamos da internet nossa ferramenta de luta, dos nossos pequenos grupos a nossa trincheira, e da arte do convencimento nosso objetivo último….

Não é à toa que praticamente não se viu circular pelas ditas “redes sociais” uma análise de conjuntura digna desse nome; ao invés disso, pulularam os chavões sobre a “fase de descenso da classe trabalhadora”, ou a cantilena sobre o perigo dos “retrocessos”, e se gastaram linhas e mais linhas, além de muito tutano, num esforço aviltante de salientar as nuances entre um candidato e outro, em demonstrar quem é menos pior, quem possui os apoiadores menos perversos. Em meio a esse esforço, sobrou oportunismo, populismo, nacionalismo; apelou-se aos índices nutricionais, ao aumento da esperança no futuro, ao fortalecimento da soberania nacional e a outras balelas que não resistiriam à mais superficial discussão.

5. É certo, houve um ou outro que sustentou uma postura honesta e buscou inclusive desenvolver uma reflexão crítica e aprofundada sobre a conjuntura. Não obstante, faz-se necessário mais uma vez constatar o óbvio – e me perdoem a falta de jeito –, mas danem-se os manifestos e as nossas declarações de voto; as que importam são as dos Malafaias, dos Setúbals e das vedetes “globais”… Os esforços virtuais por parte dos que não se colocaram à venda não decidem os resultados eleitorais.

raloAo contrário, o engajamento apaixonado, desvairado e anacrônico nessas eleições, por parte dos não-profissionais da política, é expressão da falta de engajamento em substantivos processos de luta e organização revolucionária, ao qual todos estamos condenados hoje, em menor ou maior medida. Se existe alguma esperança em modificar esse quadro e impedir a terrível escalada das forças sociais mais podres que esse sistema é capaz de produzir, ela passará pelo combate ativo e intransigente à política eleitoral e ao Estado, partes fundamentais da dinâmica capitalista.

6. Passadas as eleições, o temor é que essa alucinação coletiva “anti-retrocesso” perdure, já que a miséria política que a engendrou certamente persistirá. Ao invés de atacar as raízes do ascenso das forças reacionárias, já é possível ver muitos desperdiçando suas capacidades e energias num esforço de defesa do “Estado democrático de direito”, traduzindo toda uma gama de fatores e processos sociais de vulto em querelas parlamentares, pirotecnia midiática e manobras cênicas no âmbito dos palácios de governo. Seria um papel verdadeiramente lamentável, misto de covardia e desespero… Tomara que outros tantos o recusem e assumam suas responsabilidades no interior da guerra de classes.

11 COMENTÁRIOS

  1. Fiz esta opção errada que critica, certamente, e o admito.
    Mas sabendo que duraria neste período, apenas contra o que, ao contrário de você, acho sim o pior garantido, com Serra.
    Não consigo igualmente acreditar em que coloque nestes termos a idéia de segurança alimentar e problemas tão complexos, como o avanço/retrocesso ambíguo que colocam os programas sociais do governo numa linha. É fácil dizer ao dependente que isto é ruim e que não se deve aceitar a bolsa, quando isto minimiza a fome de quem a recebe.
    Isto é um problema em qq parte e era mesmo para o MST quando chegou a recebê-las, com os revezes que teve e a questão lá se colocava: o movimento, representado pela sua direção não devia aceitar o que poderia ser oferecido individualmente caso se deslocassem para cidades, em situação de fome ? Era isso uma opção ? Pode-se sair disso numa decisão política local, estratégica ou não ?
    Concordaria que é melhor errar em grupo que acertar sozinho, como dizia Rosa Luxemburgo, mas não que se opte pelo massacre e pela não capitulação neste contexto. Não acredito seja isso que se deveria colocar como opção e nem o foi, exceto algo menos ou pior num curto e médio prazo.
    Vi certamente parte disto quando observei quem estava inserido nesta campanha como partícipe. Não era uma militância do PT, mas a esquerda que se aproximou do PT e isto causado pelo Serra que conseguiu, como lembrou o Rugai aglutinar não só a direita e setores religiosos divididos em disputa, mas trouxe a esquerda para junto do PT sem concessões à esquerda, o que terá, é claro, consequências.
    Mas a miséria política desta geração que se vincula com nunca por este meio, onde este veículo ou canal, o passa palavra, se insere entre os demais.
    Talvez seja ligado a uma conjuntura específica, o fato de que a esquerda envelheceu, trabalha em setores ligados à burocracia ou se distanciaram só se encontrando nestes veículos virtuais de interação onde o que conta é a aparência dos fenômenos e processos políticos. Fenômeno que retrai a esquerda, mas que por outro lado potencializa e aglutina a direita, como as novas gerações de direita organizada do ME.
    Acho que é em parte ruim como coloca, mas muito disso é latência, pois a virtualidade destes veículos leva a todos mudarem de posição ou orientação conforme o próximo passo ou evento político que aconteça, isto é, caso não se distanciem, e aí mora o perigo desta virtualidade e oscilação, e tendam igualmente a defender a estabilidade política e social e uma representação política indireta com a aparência de ecologia ou socialismo, desde que distanciada do lugar onde está permitindo que permaneçam imóveis.
    Mas acho que isto não inibe a inciativa de se criarem redes como coloca, pois acredito se desdobrarem em planos e locais distintos, ou não e isto as inibe de alguma maneira ?

  2. Douglas,
    Não entendo que o artigo se concentre na crítica à opção eleitoral por este ou aquele candidato. Ao contrário, parece-me antes um tentativa de dar um salto para fora desta dicotomia (seja ela visível, tênue ou mesmo falsa).
    Concordo consigo: é de se compreender que companheiros façam um certo cálculo que aponte um dado projeto como menos pior e, zap!, apertem lá os botãozinhos. Mas não é isso que me preocupa, o fato de optar ou não pela Dilma.
    A grande questão, para mim, é a quantidade de energia que se despendeu neste interminável processo eleitoral, em todos os sentidos. E basta olharmos nossas caixas de e-mails, listas, fóruns de discussão, coluna da direita do CMI, seção Brasil do Passa Palavra, etc, para saber do que é que estou falando.
    Do ponto de vista ideológico, convenhamos, concentrar esforços para realçar diferenças entre PT e PSDB, nos dias de hoje, é prestar um desserviço à luta anticapitalista; é fortalecer, preencher de sentidos, uma arena de luta onde, desde há tempo, sabe-se, seremos sempre derrotados. Que tipo de consciência nós produzimos quando passamos três anos criticando veementemente a politicagem profissional, o intrumentalismo dos partidos, os jogos de cena, e tudo que está relacionado ao processo eleitoral e, de repente, como num piscar de olhar, estamos invadindo todos os espaços virtuais conclamando as pessoas a votarem neste ou naquele candidato??? Nesse sentido, acabamos atuando muito mais para a mistificação do que pela clareza dos nossos horizontes estratégicos, por mais que – entre vírgulas e parenteses – façam-se inúmeras ponderações.
    Na prática, se toda energia-militante vai sendo concentrada numa certa arena de luta, é porque outra vai sendo esvaziada. E é justamente esta ausência periódica (conforme os ciclos eleitorais), este não-estar-onde-deveríamos-estar, que abre espaço para que as forças políticas perniciosas tomem conta: igrejas, crime organizado, políticos mafiosos, ONGs, etc. E nos meios sociais não há vácuos organizacionais, todos eles são rapidamente ocupados. Aí, compas, dizer que uma catóstrofe direitista se avizinha acaso não assumamos nossas responsabilidades nas urnas, a meu ver, é chorar o leite derramado. Não são as campanhas que conduzem a um processo de endireitização da sociedade, mas ao contrário, é a predisposição política da sociedade que dita o caminha que a propagando eleitoral deve seguir se quiser agradar a um maior número de eleitores, ué! E o único remédio para isso, penso eu, é não nos deixarmos esgotar por este debate que não é o nosso, despejando por tão pouco nossas já parcas forças, e empregarmos todos nossos meios físicos e mentais nas organizações de base, lá onde nascem os problemas.

    Abraços,
    Taiguara

  3. Coloquemos noutros termos Taiguara e Guto.
    Sei que constatamos quando a política não é esta coisa indireta e horrível que sacrifica todos os que contruíram o processo político, num momento em que se podem descartar estes agentes como o PT faz, mas isso não permite colocar esta identidade plena entre um e outro.
    Sínteses permitem o pensamento com a fórmula do “o um é como o outro”, a analogia, mas sem análises não acertamos o alvo quando a coisa é mais concreta e imediata. Sabemos o que é um confronto com a CUT e Força Sindical quando fecham um acordo pelego. Sabemos. Sabemos que as alianças partidárias se formam negociando com grupos do centrão político fisiológico, dando margem à própria direita dentro do partido de ex-esquerda, e seus quadros que já abandonaram ou novas gerações que nunca tiveram idéia do que seja socialismo e que ao se manifestar o que era uma idéia de reforma para a classe trabalhadora custou toda sua essência se tranformando num outro negócio somente para uma maioria simples ? Que algumas gerações surgem justificadas somente pelo fato de combaterem seres ainda piores ?
    Sabemos disso Taiguara e é dia de luta sempre, mas o que gostaria de lembrar é o seguinte: como se faz quando uma luta sofre repressão, distante da cobertura da mídia, ou quando esta consegue transformar a pauta reivindicada ou o movimento em algo que tem rejeição popular e das elites “progressistas”, com quem se negocia ?
    Não se apela aí, todo movimento social, a uma estrutura dentro do Estado ?
    A base das nossas reivindicações não apela aos mandatos de políticos comprometidos com as causas populares para evitarem o massacre local num conflito de interesses por terra por exemplo, o que demanda uma área específica nos movimentos sociais, pois a disputa no local também acaba tendo um reflexo no estado ?
    Ou seja, quero dizer que a Ação direta que praticamos hoje não é a ação direta de ontem, hoje ela é a ação física em si, pois ela é feita não para uma tática de reivindicação e construção local, mas algo que reivindica AO ESTADO e que o Estado reconheça a pauta reivindicada como “sujeito de direito” e digno de uma determinada lei que a princípio regeria o Estado, mas que ele não cumpre.
    Dentro dele estão os políticos institucionais aos quais apelamos para a realização da pauta e para o reconhecimento dela como de direito, pois todos apelamos, dentro do quadro Democrático popular aos temas da constituição de 1988.
    Ou seja, pressupomos talvez que os políticos de esquerda que atuam e apoiam as ações quando acontecem sempre estarão lá e pressupomos sua “disposição”, sempre vista com desconfiança, pois está ligada a interesse próprio de marketing político com um certo grupo do eleitorado.
    Esta pressuposição está em risco, é claro, mas junto a ela duas conjunturas podem se formar, a de cooptação na nova fase do PT e, além disso, a repressão por outro lado ao qual estes novos políticos do PT, que não tem tradição socialista ou ligada a lutas populares com os quais se justificar não se comprometem nestes embates. Seja para a conquista de uma pauta ou sua realização posterior, ligado a uma pressão externa indireta, mesmo quando reconhecido um direito de fato é aos políticos aí que o foco se coloca em toda a alienação que este sistema pressupõe, pois se atuamos concretamente, é com esta abstração concreta específica que lidamos.
    E todos sabemos disso.
    A única proposta alternativa de retorno a um tipo de ação direta é a atuação em redes, cuja idéia, justamente com o sentido de mobilizar é o que sinto falta aqui.
    Pois tanto queima cartucho se atinar a isso, quanto colocar este foco eleitoral como uma capitulação, francamente um exagero, pois, se falamos de uma política de fato na base, abandonada pelo PT e partidos de esquerda em geral desde o começo dos anos 90, em seus últimos suspiros, não haveria necessidade de bater nesta tecla com tantas letras.
    Energia queimada com a campanha ? Acho que só elétrica determinável pela relação entre caracteres/bits que permite calcular pela velocidade média de processamento de computadores, no mais, é um evento similar à copa. Mas acho que não deveria, pois de fato estamos tratando de como materialmente se constitui o mecanismo da alienação política, mas não da cooptação digital ou virtual.
    E o efetivo, para além desta política representativa que, no máximo, resulta em leis que servem de balisas normativas não cumpridas e entre seus interstícios resistimos ?
    Disso precisamos que se ouça e se divulgue para suplantar de fato, a abstração política concreta que se coloca.
    Porquê outras opções para este processo, só vejo a trotskista e não me parece a melhor que propõe o quanto melhor pior, ou seja, a política de tentar gerar um fato político com o corpo dos outros militantes expostos à repressão.
    Isto é ruim, mas para além de ser ruim localmente, ela perde seu espaço de possibilidade de mobilização, ou de gerar mártires ao não mais sensibilizar parte da opinião pública que é a razão do pq os atos se realizam, isto é, visa-se sensibilizar a opinião pública para influenciar o Estado numa dada demanda. Mas hoje, gerações e mais gerações inseridas no neoliberalismo ou ainda no período posterior do lulismo não mais se insensibilizam. Não se revoltam e não se empolgam com a dor do sacrifício de quem luta.
    É isto hoje que está em cheque no processo onde a pretensa consciência de classe do militante iluminado se insere na luta local, isto é, caso não consigam mudar de foco e criar uma base local para ação e, reitero, só me é apontada hoje pela idéia de redes, ao menos como possibilidade lógico-política que precisa se efetivar.

  4. OBS> A coluna da direita do CMI antes da eleição estava somente sendo utilizada como classificado da direita e do PCO e LBI e, provavelmente, estava na mão de alguém da campanha ou de um empolgado disponível.

  5. Compa, mais uma vez, compreendo os argumentos que levaram muitos militantes a oPTarem taticamente, acho-os relevantes e até verdadeiros. Mas, o que me espanta não é isso, senão o lugar e o peso que foi dado a este evento dentro do conjunto de tarefas que urgem na luta anticapitalista, só isso. A cada quatro anos, vemos a nossas expectativas cada vez mais rebaixadas, e isso nos leva a colocar um medida que deveria ser meramente defensiva, tática, como finalidade estratégica.Sob este aspecto, reafirmo minha avaliação de que houve um despendio de força desproporcional nesse sentido. E não me venha com esse papo de que a única energia gasta fora a elétrica, pois refiro-me a “cérebro, nervos e músculos” de militantes preciosos. E para este “desperdício de energia” colaboraram tanto os que defenderam o voto em Dilma quanto os apaixonados defensores do voto nulo. E até eu, agora, acabo de doar minha parcela, rs! Por isso, fico por aqui.
    Abraços,
    Taiguara

  6. Agora, creio, entramos em acordo, a crítica não é da decisão, mas da empolgação em torno do tema.
    Isto sim preocupa, é como uma empolgação do jovem pela política indireta que representa um interesse do capital, numa face um pouco menos bárbara, o que corre o risco de ser apenas aparência.
    Mas tal decisão aparece como fim em si e apaga todos os traços odiosos do que foi a capitulação do PT e seu processo de endireitamento nestes anos.
    No entanto, queimou-se energia, igualmente no voto nulo como algo central, em geral, pelos mesmos que pregavam, não como você, candidaturas socialistas sem a mínima articulação e que apresentam um enigma sobre o quanto avançaram na luta de classes ou nas pautas defendidas e mesmo gente que hoje solta falas “radicais” como o Plínio sobre é melhor ser reprimido que cooptado.
    Quem o pensava deveria ter feito PELA esquerda fazer campanha por Serra, pela esquerda ? Propondo o quanto pior, melhor ?
    Mas, em de outro lado, escolhido qual o inimigo a combater e NÃO o aliado, crendo-se o mais fácil um contra a avaliação de outro, passemos em frente: – à luta ! pois ninguém duvida que com um ou outro não iria acontecer algo contra a classe trabalhadora e o internacionalismo.

  7. Podia ter-se aproveitado a discussão neste artigo e no «Fora de pauta: um debate» para avaliar como as eleições contam pouco — escrevi: pouco; não escrevi: nada — para a governação efectiva; como as decisões mais importantes são exteriores aos órgãos eleitos e são tomadas por órgãos, ou meros grupos, tecnocráticos baseados na cooptação; como as grandes determinantes económicas condicionam a evolução da sociedade brasileira muito mais profundamente do que qualquer opção eleitoral. Em vez disso, os temas em discussão nos comentários destes dois artigos foram ditados pela própria campanha dos candidatos. A maioria dos intervenientes parece ter acreditado nas ameaças do candidato tão ingenuamente como outras pessoas acreditam nas promessas da candidata. Eu no geral não voto, embora ocasionalmente me suceda votar. Mas há uma coisa que eu aconselho as pessoas a fazer, militantemente, fanaticamente, sem concessões nem compromissos: nunca verem televisão, em circunstâncias nenhumas, mas sobretudo durante as campanhas eleitorais. Assim conseguirão manter um pouco de sanidade política.

  8. Foi somente nestas eleições que eu parei pra pensar numa contradição presente na prática da extrema esquerda que disputa as eleições no Brasil. A contradição reside na apropriação legal de dinheiro público (Fundo Partidário) por grupos privados. Digo isso porque no espaço público é comum encontrarmos os militantes do PCO, PSOL, PSTU criticando este tipo de prática. A defesa “intransigente” do uso do dinheiro público somente por setores públicos se foi. O Fundo Partidário somente na década de 2000-2010 (fonte :Tribunal Superior Eleitoral)destinou mais de um bilhão – mil milhões – de reais aos partidos legalizados. E ainda tem aqueles que defendem a aprovação de uma lei que garanta um outro tipo de financiamento público de campanhas eleitorais. Acho que não se contentam com pouco, que na verdade não é tão pouco assim.

  9. Não vejo televisão, ocasionalmente em jogos de futebol.
    Mas, voltando à provocação, recentemente tal questão de critério me trouxeram novas dúvidas que achei interessantes.
    Na disputa recente do sindicato dos correios de São Paulo há uma direção nas mãos da CTB, central do partido PCdoB, contra ela formou-se uma chapa que contém elementos da Conlutas, hegemonicamente do PSTU aliada à CUT do PT.
    O mesmo partido PSTU pregou pela eleição nula, acreditando assim não haver diferença entre os dois candidatos. No entanto, este conseguiu achar uma diferença, de difícil percepção entre a CUT, do PT e o PCdoB, aliado de primeira hora e todos os momentos do PT.
    O raciocínio é contraditório, ou ora vale e ora não vale ?
    Na greve dos professores, além da disputa local com o PSDB, havia uma luta contra a direção maioritária do sindicato, a APEOESP, filiada à CUT, do PT. NO meio do ataque, aguçou-se quando interessante o conflito político entre o PSDB no governo do estado e o PT no sindicato, mesmo com todos os problemas. Neste caso, igualmente havia uma diferença entre o PSDB e o PT.
    Aliás, na Universidade, ou em locais sob administração de um ou outro, é normal aliar-se ao PT contra o PSDB, mas não o contrário. Não é curioso, já que não há diferença ?
    Posteriormente à eleição o campo ideológico ficou marcado por manifestações de xenofobia e racismo muito frequentes, que não estão apenas na internet, (talvez João estivesse se referindo à internet e não à televisão, mas com o problema de ser o espaço de intervenção deste veículo, o Passa Palavra) pois do discurso do candidato notou-se uma polarização no final da eleição com ares de revanchismo contra os estados mais pobres do país e os pobres em geral, como vi algumas e como narraram vários outros colegas.
    As pessoas, como recentemente em greves na USP, estão se manifestando sem qq receio de modo racista e xenofóbico em espaço público, vendo a manifestação de suas posições como uma libertação dos entraves de um moralismo que atribuem à esquerda.
    A militância virtual e ativa de psdebistas, reitero atingiram muitas pessoas e recebia-se, não pela televisão e internet, mas pelo telefone mensagens ameaçando o eleitor, dizendo que, ao votar em Dilma, votaria em uma terrorista com atendimento de telemarketing por todo o país.
    Levando esta sugestão ao limite, pois tal mobilização atingia todos os meios de comunicação em massa, teríamos de nos isolar especificamente para pensar o pleito, mas aí encontrávamos as pessoas na rua ou ao passar por igrejas e outros lugares onde entregavam santinhos.
    Enfim, ainda acho que houve algo diferente nesta eleição e que isto é a questão, o modo como se mobilizou e o fim que se chega com isso. Pois, se não serviu para ganhar uma eleição, serviu para manter as pessoas, ao menos em São Paulo, mobilizadas. O que ocorrerá daí, que não se encerra na eleição, não sei.
    Que apenas o imaginário simbólico de esquerda era tocado com isso, com certeza.
    Que a militância de esquerda deve se mobilizar para outra coisa e sair dessa hipnose coletiva gerada, novamente concordo.
    Que ainda mais, o resultado político nas instituições capitalistas e dos gestores se reacomodará lançando medidas horrorosas contra a população, certamente.
    Mas esta diferença entre processo eleitoral e governança é o ponto. Houve algo que aconteceu no processo eleitoral que não é a governança e que não acredito que se resume apenas à condução ao governo. Algo que ainda acompanharemos, infelizmente, como o estamos fazendo aqui, o desdobrar das consequências e cuja alternativa não é o que ora falamos, mas o que faremos.

  10. Douglas,
    Em seus comentários, o Taiguara expressou bem o que há de fundamental no argumento do texto, que infelizmente, ao que me parece, te escapou. Por isso irei responder a algumas das principais críticas que você dirigiu ao texto, mesmo que com isso tenha que repetir coisas que já foram ditas. Por outro lado, adianto que algumas passagens do seu argumento eu não consegui compreender.
    Meu texto – bastante problemático, é óbvio, já que curto e de caráter eminentemente polêmico -, não faz outra coisa se não discutir posicionamentos estratégicos, levando em conta o contexto em que eles são feitos, e tendo como pano de fundo uma crítica ao reformismo. Para os que se lançaram nestas eleições a uma “cruzada virtual” pró-Dilma, o que te inclui, segundo você relatou, o primeiro argumento é simples: todo seu empenho em produzir e repassar centenas de mensagens que muitos poucos lerão não afetará o curso de qualquer eleição; no caso da que acabou de passar, tratou-se de um confortável simulacro de embate contra as forças conservadores que se aglutinaram em torno à candidatura Serra, que tanta revolta e temor nos despertam.
    E nossa impotência diante das eleições federais vale também para outros âmbitos, mais restritos, como o que você evocou em sua segunda mensagem, ao falar sobre a importância de termos interlocutores dentro do Estado. E aqui falo não só da “militância virtual”; por exemplo, alguns movimentos populares de esquerda se esforçaram bastante na candidatura do Raul Marcelo para deputado estadual em SP, e ele ficou longe de ser eleito. Isso diz algo sobre a atual fraqueza da esquerda, e deveria nos desafiar a tentar modificar essa realidade.
    Assim, além de alguns poucos elementos conjunturais, uma ou outra passagem sobre a relação entre Estado e acumulação, e a menção a certos princípios políticos, o texto ora em discussão se tratava de um convite à reflexão: onde poderemos combater efetivamente as referidas forças conservadoras, e de que modo? Nisso o texto avança pouco, por uma série de motivos. Parece-me que você sentiu bastante essa falta, tanto que buscou supri-la tomando algumas passagens pontuais do texto e atribuindo a elas significados que elas não têm. Com isso, acabou produzindo, a meu ver, falsas polarizações, fugindo ao argumento principal, que é bastante simples.
    Em primeiro lugar, fiz um grande esforço para fugir à discussão sobre que candidato é menos pior, ou mesmo se são iguais, diferentemente do que você afirma. Isso, reitero, à medida que não me é dado a escolher realmente entre um e outro.
    Ademais, em nenhum momento discuti a “idéia de segurança alimentar”. Quando falei dos “índices nutricionais” pensava no apelo oportunista – de direita e de “esquerda” – ao tema da fome, por parte de hipócritas que nunca a sentiram e nem a sentirão, e que fazem de tudo para ficar bem longe dos famélicos. Agora, de fato, não vejo toda essa complexa “dialética” dos “avanços e retrocessos” posta pelos programas sociais. Falando toscamente, tais programas sempre se encontram entre a concessão diante da luta reivindicativa, de um lado, e a contenção/cooptação, de outro. No geral, o primeiro pólo é revertido no segundo, seja por meio do porrete, seja pela distribuição de benesses. Mas hoje, diga-se de passagem, o lado da luta reivindicativa está bem em baixa. Fora isso, em tempos de vacas gordas, tais programas tendem a receber mais recursos, e em períodos de depressão, a minguarem; assim como via de regra ocorre com os salários reais. Isso independente do país e do governo em turno. Por exemplo, um Milton Friedman pode propor nos idos da década de 1950 um programa similar a um “renda básica” do Suplicy, talvez muito mais interessante do que um Bolsa-Família; ou os trabalhistas britânicos podem desmantelar boa parte do Estado de Bem Estar Social de seu país; ou, especulemos, caso estoure uma crise financeira e econômica nos próximos 4 anos, além dos ônus recaírem sobre as famílias de baixa renda endividadas até o talo, a Dilma cortará pesadamente os tais gastos sociais. Crueldade? Não, a boa e velha dinâmica da acumulação capitalista, ao qual qualquer governo está submetido.
    Esquematicamente, se a reivindicação junto ao Estado faz parte de quase todo processo organizativo, como de fato ocorre, cabe buscar uma correlação de força para que o objeto da reivindicação “econômica” venha não como dádiva, mas como conquista, uma conquista numa batalha em que o Estado é inimigo, e que deverá se reverter contra o Estado. Logo, quanto ao seu ponto acerca do dilema face à adesão aos programas sociais, diria apenas que a construção de uma crítica radical ao capital não tem como desdobramento estratégico necessário a recusa em se comprar pão na padaria, ou em se vender a própria força de trabalho, assim como a crítica radical ao Estado como parte dessa crítica mais geral ao capital não implica na recusa a se negociar com o Estado, ou a receber uma bolsa-família. Essa crítica implica sim em se envidar amplos esforços no sentido de se bolar estratégias de luta, dinâmicas organizativas e organicidades internas às organizações que nos permitam resistir a nos tornarmos meros braços do Estado, o que significaria nossa morte como militantes e a morte de nossas organizações.
    Volto aqui, portanto, à idéia de que só teremos a possibilidade de combater seriamente os miasmas sociais produzidas por esse sistema – a fome inclusive – se não sucumbirmos ao reformismo, e daí a “máxima” – que tanto te chocou – “antes o massacre do que a integração”, que nada tem a ver com uma loa ao martírio, já que entre um e outro há ainda algum espaço, creio eu.
    Por fim, como sempre, existe um desafio muito grande em se pensar e construir formas organizativas adequadas a um projeto político de esquerda hoje, mas não estava discutindo isso ao falar das “redes sociais”. Referia-me às miríades de meios virtuais em que predomina o excesso de “informações” e estímulos que bloqueia qualquer processo de real troca de idéias, de criação de vínculos, etc. E com isso não estou dizendo que a internet não possa ser uma ferramenta organizativa, mas que seu emprego nesse sentido impõe uma série de desafios e esforços. Assim, não incluiria o Passa Palavra nisso que designei por “redes sociais” – valendo-me de um jargão ideológico tão em voga na grande mídia -, pois tal iniciativa me parece, ao contrário, um esforço para fugir a esse tipo de esvaziamento.
    Lamento que você tenha interpretado o texto – e mesmo alguns comentários que foram feitos a ele – como ataques pessoais (sempre escrevendo “eu isso”, “eu aquilo”). Imagino que você não esteja defendendo a militância de “spamzinho” de esquerda, uma prática política inócua e, portanto, conservadora. Mas concordo com a intervenção do João Bernardo, quando ele diz que precisamos nos distanciar desse maldito debate de campanha, e fincar os pés em nosso meios de intervenção política. Daí sim poderemos realmente conversar.
    Ps: desculpem o tamanho do comentário, isso não se repetirá…

  11. Olá,

    A intervenção do Gustavo explicita, de forma evidente, os debates e questões que estão realmente em jogo nesse momento de reflexão e atuação da esquerda anticapitalista e autônoma.

    Claramente fugindo da mera transposição de “modelos e experiências”, apresento aqui uma sugestão de leitura – para os mais interessados. A partir de uma atuação com grupos de Educação Popular da Argentina, o Coletivo Situaciones (de Buenos Aires) sistematizou essa experiência no livro que pode ser acessado por meio desse endereço:

    http://www.trashumante.org.ar/IMG/pdf/universidad_trashumante.pdf

    Como destaque, sugiro a leitura – ainda que o trabalho seja admirável em sua totalidade – do texto “Apuntes sobre las redes”, do próprio Coletivo Situaciones. Ele destaca o outro sentido da idéia de redes de mobilziações e movimentos sociais – e não as “redes virtuais” aqui apontadas.

    Coloco isso em discussão, principalmente tendo em vista a interessante experiência desenvolvida por diferentes organizações na periferia de São Paulo – como os saraus e a Rede de Comunidades do Extremo Sul, para ficarmos em poucos exemplos.

    Abraços – e desculpem-me pelo comentário aparentemente desfocado. Na verdade, acho que o texto acima – e as discussões desenvolvidas nos comentários – apontam justamente para algo além do voto e eleições. Por isso o resgate dessas experiências desenvolvidas pelos coletivos autônomos da Argentina – que, mesmo em outro contexto, nos ajudam a pensar e agir.

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