Por Coletivo Loukanikos

A 20 de Junho de 2015 estes dezoito jovens angolanos foram acusados de “crimes” como tentativa de golpe de Estado e incitação a rebelião. O que faziam? Participavam de protestos contra o governo de Angola e, na ocasião da prisão “em flagrante” (a polícia invadiu, sem mandado, a casa onde se reuniam), discutiam a leitura de livros sobre os problemas do país e como enfrentá-los com uma revolução pacífica. O julgamento está marcado para 16 a 20 de Novembro, sendo que as duas mulheres aguardam em liberdade, enquanto os 15 homens foram mandados para o presídio, cumprindo um período de prisão “preventiva” de mais de três meses – sendo, portanto, uma prisão ilegal mesmo no código penal angolano. Além da ilegalidade da prisão, destacamos que no momento da prisão não foram judicialmente notificados os motivos de estarem sendo detidos, sendo informados dias depois dos “crimes” já anteriormente citados.

O caso chama atenção internacional e exige solidariedade de lutadores por todo o mundo, sendo que vários grupos de defesa dos Direitos Humanos, como a Anistia Internacional, já agem pela libertação imediata dos jovens e pela retirada de todas as acusações. Os jovens Mbanza Hanza, Albino Bingobingo e Luaty Beirão iniciaram a 21 de Setembro a greve de fome, encerrada por Beirão nesta terça-feira (27), cumprindo mais de um mês sem se alimentar e portanto encontra-se em estado crítico de saúde.

Os atuais presos políticos são acusados de “crimes” como incitação a rebelião e golpe de Estado, sendo que foram presos “em flagrante” em invasão da polícia a uma reunião onde se discutiam leituras de livros, algo que o regime realmente acha perigoso. São ativistas conhecidos no país, alguns estudantes, outros professores e outros rappers, sempre produzindo letras e presentes em manifestações – e alguns já detidos diversas vezes – contra o governo de José Eduardo, cujo maior medo, exposto nos inquéritos e acusações formuladas pelo Ministério Público e outras instituições, é que se faça em Angola algo como a Primavera Árabe – jornadas de luta admiradas por lutadores sociais angolanos.

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Em Portugal, a partir do contexto do 28 de Maio de 1926, criaram-se polícias políticas a fim de se manter pela repressão o regime ditatorial. Pulando alguns anos e siglas, começamos por citar a PDPS (Polícia de Defesa Política e Social) criada em 1932, com Salazar já Presidente do Ministério, coexistindo com a PIP (Polícia Internacional Portuguesa). Em 1933, já outorgado o Estado Novo, as polícias fundem-se na PVDE (Polícia de Vigilância e Defesa do Estado), exclusivamente para espionagem e repressão política a opositores, abertamente anticomunista. Em 1945, torna-se PIDE (Polícia Internacional e de Defesa do Estado) e em 1968, já com Marcello Caetano na chefia do governo, DGS (Direcção-Geral de Segurança).

As duas últimas são conhecidíssimas polícias políticas do regime fascista português, instituições que perseguiam opositores e promoviam torturas, ameaças e assassinatos. Era uma instituição que recebia especial atenção do regime, tendo um vasto quadro de funcionários, gozando de considerável autonomia, atuando no serviço carcerário e sendo considerada por muitos como “o Estado dentro do Estado”. Tinham dossiês de milhares de portugueses, infiltravam agentes e bufos (civis “recrutados” como informantes), perseguiam opositores na metrópole, nas colônias e em outros países, grampeavam telefones, violavam correspondências e assassinavam. Entre as práticas, era comum que se prendessem “suspeitos” sem acusação formada e sem mandados, jogando-os nos presídios políticos em prisões “preventivas” que podiam durar meses, onde sofriam torturas e sevícias dos mais variados tipos. Os tribunais de julgamento normalmente eram compostos pela própria PIDE/DGS, e os advogados, quando não eram os indicados pela própria polícia, sofriam igualmente ameaças e intimidações.

Na cadeia ou nas esquadras, a PIDE e DGS promoviam a tortura, marca de sua atuação. Tortura do sono, na qual o preso era impedido de dormir; tortura da estátua, em que devia que ficar imóvel em uma posição desconfortável; tortura de ruídos inquietantes; socos e pontapés; ameaças de tortura a familiares; injeção do LSD ou Pentotal (soro da verdade); e outras variadas formas, sendo que a polícia política do Estado Novo privilegiava sempre a tortura psicológica (de caráter mais “científico”, até médicos participavam das sessões para garantir que o preso se mantivesse acordado, alguns contabilizando horas ou mesmo dias em tortura), a fim de se obter qualquer informação ou confissão de fosse lá o que queriam ouvir – normalmente um “sim”. Nos estabelecimentos prisionais e campos de concentração, feitos para prisioneiros políticos, os maus tratos e torturas nos ambientes degradantes continuavam, com frequentes espancamentos promovidos por agentes e proibições de contato entre prisioneiros ou mobilidade nos espaços comuns. Alguns eram mandados para a chamada “frigideira”, e outros para a solitária, sem dúvida, pelos relatos de ex-presos políticos, uma das piores faces da tortura psicológica.

O crime, para o Estado, era a oposição, a crítica à ditadura e ao fascismo. Militantes de esquerda eram alvo principal, mas se fossem militantes de esquerda e trabalhadores pobres, sofriam ainda mais. Se fossem militantes de movimentos de libertação nas colônias africanas, sofriam ainda mais, vide Tarrafal, São Nicolau e outras prisões e campos de concentração portugueses em África. O PAIGC, Frelimo ou MPLA, só como exemplos, eram consideradas organizações terroristas, criminosas, acompanhadas de perto pela PIDE/DGS. Um caso que possa ilustrar é o do sacerdote católico angolano Joaquim da Rocha Pinto de Andrade, acusado de pertencer ao MPLA. Foi preso pela primeira vez em 1960, no Aljube, e toda sua família também foi perseguida e alguns assassinados. Dali, em 1961 foi solto e preso no ano seguinte no Porto, sem acusação formada, e enviado novamente para Aljube, passando 86 dias numa minúscula cela. Solto em 1963 e preso às portas da prisão de Aljube e mandado para a de Caxias, sendo solto no mesmo ano, mas convivendo diariamente com a vigilância da GNR (Guarda Nacional Republicana que, assim como a PSP e PIP/PJ, eram forças auxiliares da PIDE/DGS). Em 1964 foi preso novamente e solto, nunca em liberdade, pois estava sempre sob vigilância. Em 1970 foi raptado por agentes e preso novamente, sendo julgado em 1971 por crimes contra o Estado e tendo seus direitos políticos cassados por 15 anos.

Em Angola há o SINSE (Serviço de Inteligência e Segurança do Estado), antigo SINFO, que é a polícia política que persegue estes e outros ativistas. Em declarações de amigos, ativistas, familiares e advogados, nota-se sempre a referência a agentes à paisana que lhes perseguem e vigiam no cotidiano. Infiltravam bufos ou agentes (no Brasil conhecidos como P2) nas reuniões e manifestações e intimidam mesmo nas vigílias que ainda são feitas em favor dos presos políticos, sendo essas vigílias consideradas ilegais pelo presidente, acompanhadas inclusive de tropas de intervenção (choque) e canhões de água.

 Estes presos políticos foram detidos sem mandado e sem acusações, sendo que essas foram formadas dias depois, quando já cumpriam a prisão preventiva, que hoje já expirou e ultrapassa os limites legais da legislação de Angola. O SINSE, como polícia política, faz o mesmo, intimidando advogados, familiares e a população em geral, prevenindo que não haja mais manifestações, apresentações culturais de teor opositor ou críticas públicas – e leitura de livros oficiosamente proibidos. E também, como alegado pelos advogados e pelos presos, alguns foram raptados pela polícia e todos sofreram torturas na cadeia e nas esquadras, passando inclusive por períodos de solitária.

Os ativistas presos são trabalhadores, artistas e estudantes, que se mobilizavam no direito democrático de se protestar contra um governo tirano e ilegítimo, que explora e oprime a classe trabalhadora angolana, impondo o medo como regra social. Seus familiares, defensores e outros militantes estão sendo ainda perseguidos e vigiados, sofrendo ameaças constantemente e passando os dias na possibilidade de ser sempre o último. Os presos que saíram da greve da fome se recuperam mal das consequências, e o que se mantém, Luaty Beirão, está em estado crítico de saúde e corre risco de morrer, segundo informações médicas.

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Há quase 40 anos Angola é governada pelo presidente José Eduardo dos Santos, também presidente do MPLA (Movimento Popular para Libertação de Angola), partido que se encontra no poder desde a independência do país em 1975. O país esteve em guerra civil até 2002, um conflito pós-independência entre os movimentos independentistas nacionalistas: o marxista-leninista MPLA e os rivais FNLA e UNITA, sendo um trauma para o país que ainda sofre as consequências de anos de conflito. Em 1977, um grupo dissidente do MPLA entrou em conflito com a parte hegemônica do partido, tentando um golpe, entretanto fracassado, mas abrindo por dois anos um período de represália aos dissidentes que causaram a morte do então líder Agostinho Neto, sendo relatado por angolanos como um período de massacre – portanto um outro trauma que assusta sobretudo os pais dos atuais presos políticos, conhecedores e temerosos do inimigo a quem seus filhos combatem.

Protestos em Lisboa pela liberdade dos presos políticos

José Eduardo dos Santos é o sucessor de Agostinho Neto, portanto é parte da ala hegemônica do partido. Mantendo-se há tantos anos no poder, governa o país de maneira ditatorial, controlando as instâncias de poder e a imprensa. Angola é o segundo maior exportador de petróleo em África, sendo também membro da SADC (Southern African Development Community, ou Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral), atraindo investimentos de várias partes do mundo, inclusive do Brasil. Porém, ainda assim é um país onde 36% da população encontra-se abaixo da linha da pobreza, tendo a pior taxa de mortalidade infantil e vendo a maior parte de seus habitantes morando nas musseques, as favelas angolanas, sem condições dignas de moradia, saneamento, energia, educação e transporte.

Este contraste social agrava-se ao se colocar o presidente em questão. Santos é dono de grande fortuna e é acusado de fazer parte em grandes esquemas de corrupção, inclusive na extração e tráfico de diamantes. Sua filha Isabel é considerada a mulher mais rica do continente africano, sendo protagonista também de escândalos internacionais de corrupção. Ora, o MPLA, inicialmente um movimento marxista-leninista, ao chegar no poder e afastar os antigos gestores coloniais portugueses, criou uma nova elite política e econômica no país, portanto uma classe dirigente nativa angolana. Esses novos gestores capitalistas, que chegaram ao poder dizendo defender os interesses do povo, exploram a classe trabalhadora angolana que vende sua força de trabalho a salários baixos a empresas nacionais e, sobretudo, transnacionais, enfrentando ainda um alto custo de vida, principalmente na capital Luanda, onde os preços de bens de consumo são altíssimos.

O governo português é pressionado por movimentos a se posicionar em relação à prisão política dos jovens, tendo enviado o ministro de Negócios Estrangeiros a Angola para acompanhar o caso, mas sem constranger o governo angolano que, confiante, diz até aceitar a visita de observadores da ONU (Organização das Nações Unidos) ao país. Os dirigentes portugueses, mantendo-se sempre hesitantes e nunca assumindo uma postura dura perante as violações de Direitos Humanos em Angola, dizem que não se pode ir além na questão, pois assim estariam violando um artigo constitucional que preza pela não ingerência em outros países. Ora, é muito contraditório tendo em vista que não se trata simplesmente de assuntos internos angolanos, mas de violações de direitos humanos, os quais a Constituição portuguesa de 1974 (a dos Cravos) também diz defender, e, ora, é mais contraditório ainda Portugal afirmar que não pode se ingerir em outros países sendo que é integrante da OTAN e enfrenta atualmente duras críticas de defensores da paz por permitir em seu território exercícios militares desta organização militar internacional que tem como fim, voilà, a interferência armada em territórios estrangeiros – sendo que a atuação da OTAN (ou NATO) em países como Iraque, Afeganistão e Síria abriu a maior crise de refugiados na Europa desde a 2ª Guerra Mundial, colocando milhões de vidas em risco e sem dignidade (muitos ainda estão passando fome, sede, frio e se arriscam nas estradas e fronteiras) e assim violando violentamente os Direitos Humanos.

A atitude do Estado português não deveria ser surpresa, tendo em vista que, segundo dados do jornal Público, baseado por sua vez em dados do Instituto Nacional de Estatística, 9440 empresas portuguesas exportam mercadorias para Angola, sendo que mais da metade destas dependem 100% da atividade. Mais centenas de empresas portuguesas, entre elas corporações como TAP, Jumbo, Pingo Doce, Galp, EDP, NOS, Cofaco, Coba, Viauto, Oeleoga, Água do Mourão, Famo, Sulnor, Prébuild, Primavera Software, Mota-Engil, Sinfic e Central de Cervejas, têm negócios em Angola e se assustam com a crise no país levada pela queda no preço do petróleo. Marca-se assim a dita parceria comercial e de negócios entre Portugal e Angola – outrora metrópole e colônia – tendo como entidades representativas dessas atividades os próprios bancos, por exemplo, BPI, BCP e Caixa Geral de Depósitos com seus espaços dedicados a investimentos em Angola e, o mais expressivo de todos, o BIC, cujos carro-chefe e finalidade são justamente a de investimentos no país africano.

No rescaldo da guerra civil terminada em 2002, iniciou-se a chamada “Reconstrução de Angola”, com uma maior abertura dada pelo regime do MPLA e presidente José Eduardo a empresas estrangeiras para a exploração económica no país por investimentos de infraestrutura e demais negócios. Empresas dos países do BRIC (bloco de Brasil, Rússia, Índia e China) detêm aproximadamente um terço de toda a relação comercial com Angola, segundo dados em reportagem da Folha de São Paulo. De acordo com o sul-africano Standard Bank, são cerca de 150 empresas chinesas (sendo a China o maior parceiro econômico dos gestores angolanos em valor de investimentos) e cerca de 200 brasileiras. A baixa taxa tributária a essas empresas e a fragilidade das legislações trabalhistas em Angola são facilidades que garantem a alta lucratividade das corporações.

O Brasil é um dos principais parceiros do governo angolano nesse processo, tendo como principal propulsor o governo de Luís Inácio “Lula” da Silva, que em sua gestão (2003-10) assinou 40 acordos comerciais com Angola, em sua política imperialista Sul-Sul de parcerias econômicas em países que já foram denominados de terceiro-mundo. O BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Ecônomico e Social) concede crédito a empresas que queiram se expandir a países de Ásia, América Latina e África, sendo Angola um dos principais locais de investimento.

Há várias empresas de origem brasileira atuando comercialmente ou na exploração econômica em Angola, com empréstimos e incentivos do BNDES. Entre elas estão, por exemplo: Oderbrecht; Camargo Corrêa; Queiroz Galvão; Andrade Gutierrez; Pão de Açúcar; Petrobras; Banco do Brasil; Votorantim; Companhia Siderúrgica Nacional; Gerdau; Taurus; e Vale. Especificando, entre todas as brasileiras, há as goianas: Grupo Odilon Santos que explora em Goiás no agronegócio; indústria alimentícia, a Creme & Mel); setor imobiliário (como o Shopping Cerrado); e transportes rodoviários (com a Rápido Araguaia e Viação Araguarina e participação de interesse nos projetos de VLT e BRT em Goiânia), atualmente explorando em Angola os serviços de transporte interprovincial e recolha de lixo urbano; a holding JBS (cuja empresa mais conhecida é a Friboi); Equiplex, de Heribaldo Egídio e Vanderlan Jr. (ex-prefeito de Senador Canedo e atual presidente regional do PSB-GO, com participação também na JBS e em estreito amor empreendedor com Odilon Santos, a quem chama de “Odilonzinho”); Orca Construtora (de Wilton Pedro, senador pelo DEM); e Multidata (de Helenir Queiroz, também à frente da Associação Comercial e Industrial do Estado de Goiás, a Acieg) que vende softwares a empresas que exploram em Angola.

Angola é grande produtora de petróleo, produto que corresponde à maior parte do PIB do país. Com a crise atualmente vivida, com baixa no preço do barril e desvalorização da moeda local, o Kwanza, o governo angolano anunciou cortes nas finanças e várias corporações mostram preocupação. Para garantir a produtividade, as empresas tomam medidas austeritárias que prejudicam, obviamente, seus trabalhadores. Empresas portuguesas e brasileiras já demitiram e expatriaram milhares de seus operários que trabalhavam em Angola, situação bem diferente do auge de lucratividade em 2008. Entre as brasileiras, está a que mais tem investimentos em África – e obviamente em Angola – com as facilidades concedidas pela gestão do PT: Oderbrecht.

Ato em Lisboa em defesa dos presos políticos

Os interesses em exploração econômica da Oderbrecht, de origem baiana, na África não são novos. Remontam à década de 1980 em que estreitava laços com a ex-União Soviética e, por consequência, a seus países de influência, como a Angola do MPLA. Segundo reportagens da BBC Brasil, a multibilionária holding brasileira investe em média US$1 bilhão anuais em Angola. Ainda segundo o órgão de imprensa, a Oderbrecht foi condenada pelo crime de trabalho análogo à escravidão, sendo muitas as notícias e relatos de situações degradantes a que os trabalhadores da empresa enfrentam em África.

Rafael Marques, jornalista angolano e perseguido político do regime por ser opositor, defender os direitos humanos, os presos políticos e por ter escrito o livro Diamantes de Sangue, acusa que a Oderbrecht detém a maior parte dos contratos no país. Também, além de Rafael, ativistas do país acusam uma estreita e privilegiada relação entre a empresa brasileira e o presidente José Eduardo. Por exemplo, ela é parte do projeto Biocom, junto às empresas angolanas Sonangol (estatal responável por explorar petróleo, onde atuam os generais do regime e familiares do presidente) e Damer – segundo dizem, neste projeto não há participação do BNDES. A brasileira também detém a gestão da rede de supermercados Nosso Super, que atua em 18 províncias, e de 2005 a 2012 formou a SDM com a estatal angolana Endiama, que, juntas a Di Oro, exploravam a extração de diamantes em Lunda-Norte – negócio altamente sangrento e lucrativo, beneficiando o mercado e investimentos de luxo, como os da filha de José Eduardo e que faz relembrar as tragédias empreendidas pela Diamang na Angola ainda colônia portuguesa.

E ainda há mais. A Oderbrecht, que mantém estreitas relações com os regimes e governos onde atua, como no Brasil (com várias frentes de exploração, como energia e combustível, infraestrutura, setor imobiliário, transportes – como no PAC de Mobilidade Urbana –, tecnologia, armamentos etc., que deveriam assustar a classe trabalhadora, e que é parte autuada na Operação Lavajato, escândalo de corrupção midiático que assusta mais os gestores ressentidos que ficaram de fora dos esquemas), é íntima do ambiente palaciano do ditador José Eduardo. Ela é parte de uma alcova privilegiada do regime, o Conselho Fiscal da Fundação Eduardo Santos (Fesa), juntamente à Texaco (EUA), Mota-Ergil e Teixeira Duarte (Portugal), Dar Al-Handisah (Líbano) e Sunenge (Angola). Também tem parte no Santos Futebol Clube, time popularmente conhecido em Angola como a “equipa do ZéDu”, de nome em homenagem ao homônimo do litoral paulista, e que é conhecidamente uma empresa de lavagem de dinheiro do ditador, e da qual é de conhecimento público que a Oderbrecht disponibiliza instalações para treinamento do time.

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Para nós, é incompleto culpar apenas a figura do presidente José Eduardo ou a tal “cleptocracia” de seu regime. Todas as empresas e governos que se beneficiam dos negócios em Angola também são culpadas pela situação, pois coadunam com o regime autoritário do MPLA. O que fazem em Angola é bem semelhante ao processo imperialista e colonialista empreendido a partir do século XIX, quando as companhias transnacionais investiam no continente africano tendo os Estados nacionais como intermediadores do processo de exploração capitalista. Essas empresas fomentaram o trabalho forçado e compulsório (denominações as quais, sinceramente, apenas os colonialistas do século XX insistiam em tentar diferenciar), guerras e extermínios (e genocídio), formaram milícias, criaram o imposto de palhota e impuseram as relações sociais de produção capitalista a toda população africana.

As atuais empresas seguem um rumo semelhante e, no caso das de origem brasileira, têm o governo PT como principal intermediador diplomático para a abertura de territórios africanos à exploração empreendida por corporações capitalistas. É o medo institucionalizado pelo governo José Eduardo que mantém a classe trabalhadora em Angola sobrevivendo com jornadas exaustivas e salários que não correspondem ao custo de vida, sendo presos por motivação política os que se levantam contra. É essa a situação que faz de Angola, assim como outros países africanos, o Eldorado de capitalistas que prosperam com alta lucratividade. É impossível dissociar a corrupção e o autoritarismo do governo angolano da atuação de transnacionais no país.

No Brasil, além da atuação de defensores dos direitos humanos, como a Anistia Internacional, houve um protesto de uma senadora em sessão chamando a atenção à situação dos 15 presos políticos e das outras duas acusadas que aguardam em liberdade. O Brasil é um país cujo governo é um dos principais parceiros do regime em Angola, e onde se viu até então, depois das jornadas de 2013 e 2014, prisões políticas (sendo 23 no Rio de Janeiro, mais Rafael Braga que ainda se encontra preso, tendo a DRCI assumido publicamente a capitania de polícia política, assumida em São Paulo pela DEIC e em Goiás pela DRACO, que fez quatro presos políticos em penitenciária). Tais presos políticos brasileiros não têm somente os órgãos de repressão estatal como algozes: empresas de transporte coletivo (como se demonstra nos documentos da Operação 2,80 em Goiás), bem como outras, como a FIFA em razão da Copa de 2014 – e, assim como anuncia um documento da CIA vazado pelo Wikileaks, é cobrado do Brasil maior vigilância e repressão, mais que para a Copa, na ocasião das Olimpíadas no Rio de Janeiro – são financiadoras das perseguições políticas e crimes de Estado.

As polícias e órgãos de inteligência já estão integrados nacionalmente, como era proposta de “segurança” da campanha eleitoral da vencedora Dilma Rousseff do PT (antiga presa política), em desfavor das lutas sociais por direitos, e mais presos políticos podem surgir ainda no Brasil. Medidas legislativas mais autoritárias, como a proibição de usos de máscaras em manifestações políticas e a tentativa de aprovação de uma lei antiterrorismo que enquadra a luta social como associação criminosa e terrorista, são também reação da classe dominante à resistência de trabalhadores em luta. Nesta situação, vendo que os capitalistas e sua repressão se organizam internacionalmente para garantir a exploração, é necessário e urgente que a luta social e solidariedade também ultrapassem as fronteiras que dividem a classe trabalhadora.

É preciso que os defensores de direitos humanos e direitos civis, e coletivos e movimentos sociais, se unam e discutam a situação em Angola, propondo formas de pressão para que o governo brasileiro e outros governos reconheçam as violações de direitos e crimes de Estado perpetrados pelo regime do MPLA, bem como suas culpas na situação. Em Portugal, a AI promove abaixo-assinados endereçados ao governo português e ao presidente angolano, e no Brasil o mesmo pode ser feito, via Itamaraty, Planalto e embaixadas e consulados, protocolando documentos. É o mais básico a se fazer.

Portanto, como informação (e recomendações de que os leitores procurem mais notícias sobre o caso, como na Rede Angola , a agência Pública , Amnistia Internacional e dossiê do esquerda.net , além de, claro, a própria página no Facebook de apoio ) e pedido de intervenção, engrossamos o coro: liberdade já para os presos políticos angolanos; que se retirem todas as acusações por crimes inexistentes; que sejam dignamente tratados os que se encontram fisicamente e psicologicamente debilitados; que seja extinto o processo e o julgamento que começará a 16 de Novembro e, se ocorrer, que se inocente todos, em nome dos valores democráticos e dos direitos humanos; e que, se todas as liberdades e fim de perseguições políticas só sejam possíveis em outro modelo de sociedade, ao menos sejam respeitadas as limitadas liberdades permitidas em uma democracia capitalista.

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