É preciso exercitar o raciocínio, voltar-se mais uma vez à análise das práticas sociais, sair do tarefismo e da papagaiada, criar quadros de pensamento e formas de luta que permitam escapar da armadilha identitária. Por Passa Palavra
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Bradar aos quatro cantos que o identitarismo não oferece respostas não é suficiente, pois não aponta saídas práticas nem leva a outros modos de colocar a questão. A crítica ao identitarismo, enquanto crítica, não tem obrigação alguma de pautar o que quer que seja senão os limites lógicos e práticos daquilo que critica. Por isto mesmo, como qualquer crítica política, deve ser complementada pela ação política coerente com os resultados da crítica.
Mas que tendências apontam alternativas? A questão não diz respeito à perspectiva emocional, mas a uma análise das capacidades de transformação produzidas por meio de cada forma organizativa.
Um caminho, interessante mas ainda individual, é o de lidarmos com nossos próprios egos na atuação em coletivos. Há quem diga que é necessário restringir ao máximo nos coletivos o espaço dos egos e dos problemas pessoais trazidos a tais espaços. A militância não pode exigir de um coletivo ou de um movimento social que ele abarque a totalidade da vida, que tenha soluções para todos os problemas do cotidiano e preencha todos os vazios existenciais. É preciso ser terno, sempre, mas sem perder a dureza jamais. Alguns grupos com objetivos mais definidos, por exemplo, tendem a durar mais; por outro lado, eles podem se tornar rasos com facilidade. Paralelamente, surge uma questão: seria preciso haver algum tipo de procedimento de cuidado com a saúde física e mental dos militantes? Isto leva tempo para se construir, e pode terminar completando de outras formas o sequestro de pauta iniciado pelo identitarismo.
Há, por outro lado, quem queira coletivizar a questão. Note-se: coletivizar a questão, não coletivizar a punição. Pois punir é fácil: basta xingar, “dar um gelo”, botar para fora dos espaços, tudo isto é simples. Complicado mesmo é buscar as raízes do problema: cortar na carne, assumir que cada caso de violência individual expressa um problema sistêmico, o que implica na participação, na busca por soluções coletivas, de todos os sujeitos envolvidos nos casos de violência.
Uma analogia pode ajudar na compreensão. As lutas entre trabalhadores e capitalistas fundam-se na exploração econômica, não raro acompanhada de violência física e psicológica. Estas lutas tornam-se tanto mais fortes quanto mais trabalhadores de empresas diferentes, de setores econômicos diferentes etc. integram-se num só processo de lutas. É a superação prática daquele individualismo a que nos referimos anteriormente. A fragmentação entre os trabalhadores beneficia enormemente os capitalistas, porque podem, então, conter as lutas no espaço de uma empresa, de uma cadeia produtiva ou de um setor econômico, evitando, assim, tocar nos fundamentos da exploração da força de trabalho.
Os efeitos da analogia, entretanto, não são dos melhores. A relação entre capitalistas e trabalhadores é mediada por mercadorias: a força de trabalho no capitalismo é transformada em mercadoria, assim como os bens que os trabalhadores necessitam para viver bem. Parece mais simples despersonalizar a questão, objetivá-la, quando há algo que medeie a relação, que – neste caso – dê aos sujeitos a aparência de estarem apartados pelas forças do mercado.
É possível, entretanto, dizer que violências racistas e machistas são mediadas pelo que quer que seja? Há algo tão concreto como o salário que se interponha entre o racista ou o machista e sua vítima para que o racismo funcione? Não; pode-se ser racista ou machista independentemente do assalariamento, de bens etc. É esta aparente imediatidade que dá ao racismo e ao machismo a aparência de problemas individuais, a serem tratados individualmente.
Não é por acaso que as ações punitivas defendidas pela militância identitária como formas de combate ao machismo e ao racismo, especialmente o escracho, todas tenham nos indivíduos seu ponto de referência. Incapazes de ensaiar quaisquer outras respostas ao machismo e ao racismo que não as formas individualistas que lhe são próprias, a militância identitária, perdida na satisfação de seus próprios egos “empoderados”, sempre que se focam nos companheiros da militância anticapitalista terminam empurrando os alvos deste punitivismo a formas de defesa igualmente individualizadas, quando não a buscar proteção junto ao Estado. Resultado: combate-se o racista, combate-se o machista, combate-se o indivíduo, enquanto suas práticas e seus fundamentos passam ao largo de qualquer enfrentamento, permanecem em circulação, e produzirão seus efeitos deletérios mais adiante.
Mas o que se quer dizer com isto? Que é preciso exercitar o raciocínio, voltar-se mais uma vez à análise das práticas sociais, sair do tarefismo e da papagaiada, criar quadros de pensamento e formas de luta que permitam escapar desta armadilha.
Um exemplo, no que diz respeito aos quadros de pensamento, que é aquilo a que se pode limitar uma publicação sem ligações orgânicas com qualquer grupo militante. Racismo e machismo são formas de violência expressivas de um desejo por superioridade, e portanto expressam igualmente o projeto de uma sociedade formada por elementos sociais explicitamente desiguais. Numa sociedade onde se pretende que todos sejam tratados como iguais; onde se projeta a vigência da igualdade de acesso a cargos e funções públicas, a vigência da igualdade de emitir opinião sobre qualquer assunto nos espaços públicos e nas esferas públicas, e a vigência da submissão de todos às mesmas regras, sem distinções de qualquer tipo; numa tal sociedade, o que há é uma contradição entre este projeto de igualdade e o projeto de desigualdade defendido, explícita ou implicitamente, por racistas e machistas.
Há quem leia o parágrafo anterior e diga que se trata de um exercício cerebrino de raciocínio. Faltou dizer que não há raciocínio político digno de menção que não seja a síntese de tendências históricas. Veja-se o racismo: ele interessa aos capitalistas, entre outras coisas, porque faz com que um negro trabalhando na mesma função que um branco ganhe menos que este último, estimulando as pressões por baixas salariais; ao mesmo tempo, o racismo estimula entre os negros a busca por maiores qualificações de sua força de trabalho, especialmente por meio da educação técnica ou universitária, e como o negro que superqualificou sua força de trabalho nos quadros de uma sociedade atravessada pelo racismo seguirá ganhando menos que um branco exercendo a mesma função, o resultado é a desvalorização da força de trabalho dos dois. O mesmo raciocínio aplica-se, em igual situação, ao machismo. Isto sem falar, é claro, do uso da força de trabalho dos negros escravizados recém-libertos como exército industrial de reserva, da desvalorização do trabalho doméstico realizado por mulheres como forma de rebaixar os custos com a reprodução da força de trabalho (e, portanto, aumentando os lucros dos capitalistas nas empresas)…
O racismo, o machismo e outras formas de violência, portanto, não apenas nos formam enquanto sujeitos quando empregues pelos capitalistas para explorar melhor a nós todos que somos trabalhadores; vistos por esta perspectiva, é aos capitalistas que interessa mais a violência racista e machista, muito mais que a nós, trabalhadores. Se tanto o racismo quanto o machismo nos formam enquanto sujeitos, combatê-los implica, entre outras coisas, formar novamente estes sujeitos, reorientar suas práticas de modo a implementar aquele projeto de igualdade a que nos referimos. Isto implica trabalhar para esta reorientação em cada caso concreto de acordo com as possibilidades; este trabalho pode, inclusive, ter na ruptura de relações políticas uma consequência última, mas nunca uma ação imediata e prioritária. Como se vê, não negamos a necessidade de ações disciplinares; o que negamos é o caráter estritamente punitivista e fratricida destas medidas, tal como vêm sendo adotadas nos “coletivos autônomos”.
Note-se: o fato de o racismo e o machismo interessarem mais aos capitalistas não significa que não haja trabalhadores que se beneficiem deles individualmente; o problema está na contradição entre os benefícios imediatos que estes trabalhadores possam eventualmente obter de suas práticas machistas e racistas e os prejuízos causados à classe inteira por estas duas formas de violência. A explicitação desta contradição é tarefa constante dos coletivos anticapitalistas, não por “empatia” com os oprimidos ou qualquer sentimentalismo do tipo; trata-se da análise mais fria e dura das consequências políticas do racismo e do machismo, e por tal ótica o moralismo e o sentimentalismo característicos da militância identitária não têm vez.
Este é um exercício de interpretação da realidade, entre tantos outros; sua característica distintiva é a desindividualização da questão e a assunção de que se trata de um problema sistêmico do capitalismo. Neste quadro, torna-se difícil recorrer à particularização de cada caso de violência, pois ele assume de imediato contornos mais amplos que os de cada caso concreto e dificulta a pura e simples punição individualizada.
É preciso reconhecer, entretanto, que o esforço para pautar as violências machista e racista de modo coletivizado pode tirar a pouca energia de grupos pequenos, que nem sempre dispõem da capacidade ou mesmo das competências necessárias para lidar com a questão. Ainda mais quando se trata do esforço de ultrapassar os limites de cada coletivo e de buscar soluções mais amplas para o problema.
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Mas quem disse que nos “coletivos autônomos” são os afetos que pautam as ações? Que eles foram criados para tratar dos problemas afetivos de seus integrantes? Os afetos entram nos coletivos de contrabando mesmo, ora como sequestro de pauta, ora como consequência de problemas mais sérios. É difícil, por exemplo, organizar qualquer ação onde se trabalha sem envolver algum grau de afetividade e confiança pessoal; os critérios aí, todavia, não passam por qualquer exigência de pureza moral, como se dá nos “coletivos autônomos”.
Tudo se agrava ao constatar-se o sectarismo como traço comum da militância que constrói os tais “coletivos autônomos”. A vontade de construir no presente aquilo que se quer ver construído no futuro – a tão falada política prefigurativa, importante contraponto à proposta das organizações políticas que pretendem resolver todos os problemas “depois da revolução”, e só depois dela – terminou resultando em que tais prefigurações perderam sua radicalidade e se transformaram em verdadeiras bolhas de convívio, como que sociedades secretas, daquelas cujos membros reconhecem-se mutuamente pela assinatura, pelo aperto de mão ou por algum xibolé.
Sucessivamente derrotados como estamos sendo – por enquanto – nas lutas contra os capitalistas, minguadas que andam nossas vitórias, muitos entre nós voltaram-se à construção de relações sociais novas entre si próprios, com mínima ou nenhuma luta com os capitalistas; os coletivos, sob a influência deste processo, transformam-se de instrumentos de luta em ilhas de pureza militante, tanto mais “puras” quanto mais “desviantes” forem as relações sociais novas que se pretende construir. Os “coletivos autônomos” são o local que melhor acolhe os desviantes.
Precisamente pela aparente radicalidade das relações sociais que pretendem instituir, não são poucos integrantes destes “coletivos” que, pelo acúmulo de rejeições e repressões em outros espaços de convívio somado a problemas sérios de autoestima, têm nos coletivos seus espaços preferenciais de sociabilidade. É nele que vão desembocar as queixas quanto aos “reaças” e “pelegos” do lado de fora, e é nele onde se enraízam os reforços intergrupais.
Cedo se torna muito difícil, quando não impossível, dialogar com qualquer outra força política, grande ou pequena, “reformista” ou “revolucionária”, especialmente quando estas forças políticas organizam-se em modelos diferentes do solipsismo dos “coletivos autônomos”. Como o círculo de convivência social desta militância é pequeno; melhor dizendo, como é pequeno o círculo onde suas ideias e práticas são tidas como legítimas, e em certos lugares tais círculos podem corresponder quase totalmente ao tamanho do “coletivo” ou da “cena”, a atuação política destes militantes tende a não mais se dar nos espaços públicos e na esfera pública comuns a toda a sociedade, mas ali naqueles espaços onde há legitimidade.
De companheiros de luta, militantes passam a colegas de terapia. Não é preciso muito para imaginar, num tal cenário, onde a militância vai buscar preferencialmente suas relações sociais, afetivas e sexuais. De tanto lutar por construir relações novas, o que se conseguiu foi uma forma de narcisismo coletivo, “empoderador” dos narcisismos individuais… e onde há narcisismo, há incompreensão, o avesso da política.
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É neste cenário que o punitivismo identitário faz a festa. Não vamos tapar o sol com a peneira: já dissemos que não vamos nos calar diante de perseguições a integrantes do Passa Palavra promovidas pelo feminismo sectário e divisionista que temos denunciado desde há muitos anos, e mais outro caso nos levou a um pronunciamento público. Diferentemente destas moças, entretanto, não nos interessa caluniar ninguém. Elas que cuidem de destruir a própria reputação sozinhas; não vamos ajudá-las em seu suicídio político. Interessa-nos, isto sim, aproveitar a oportunidade para elevar o nível do debate e tratar de problemas mais amplos.
O escracho, por exemplo, é uma punição poderosa, assusta, não pela força de quem a pratica, mas pela fraqueza de quem a sofre. Trata-se do assassinato moral de um sujeito em determinado meio, ou melhor dizendo, exatamente no meio onde se dão suas relações sociais e afetivas mais importantes. Versão rediviva da morte civil prevista nas Ordenações Filipinas, o escracho padece do mesmo problema: só funciona lá onde o sujeito apenado submete-se sem mais ao poder e à influência de quem condena. Quanto mais sectário é quem milita, quanto menos participa de outros grupos sociais além do “coletivo autônomo”, quanto mais depende do “coletivo autônomo” para obter legitimação política e afetiva, mais vulnerável está aos escrachos, aos isolamentos políticos, às chantagens emocionais. Inversamente, quanto maior a capacidade de articulação política de quem milita, quanto mais conhece e se faz conhecer, quanto mais supera a prisão solipsista e fragmentária do “coletivo” (mesmo tendo-o como referência), menor é a chance de se deixar vitimar pelo escracho. Em suma: quer livrar-se de um escracho? Ignore-o.
Pior. Os escrachos costumam ser escudados na mais pura covardia, principalmente quando são empregues como forma de eliminar alguém de determinado espaço político com base em boatos e disse me disse.
Denúncias bem fundamentadas de fatos abjetos como surras, estupros e outras formas de violência costumam causar escândalo público, e são feitas em aberto. Mesmo considerando a tendência das autoridades policiais de fazer pouco do problema, de insinuar responsabilidade por parte da vítima etc., feliz ou infelizmente é nas delegacias que casos realmente graves vão parar.
Quando as provas não são seguras – ou pior, quando os fatos nunca existiram – tem início um trabalho sujo de calúnia, difamação e injúria, típico de quem optou por esta forma tipicamente individualista e particularmente mesquinha de ação política. Nos meios onde se pode registrar de alguma maneira as provas de calúnia, difamação ou injúria, como redes sociais e correios eletrônicos, nenhuma denúncia é feita de forma explícita; brotam, por outro lado, indiretas e referências veladas, que remetem a conversas e acordos feitos em espaços informais presenciais – por isto mesmo torna-se muito difícil, quando não impossível, qualquer forma de contestação ou contraditório das denúncias. Reais ou não os fatos, as denúncias só são feitas em grupos de amigos, em especial naqueles onde se supõe haver “confiança política” – não por acaso, trata-se de espaços onde militam pessoas ligadas aos “coletivos autônomos” em comum à pessoa denunciada, para que reverberem também nestes espaços. Construída deste modo a denúncia, com todas as evidências de quem recebeu boa orientação jurídica para não deixar rastros, pouco importa se ela é verdadeira ou não; está preparada uma armadilha capaz de destruir a reputação de qualquer militante sem qualquer possibilidade de defesa.
Que tipo de sociedade uma tal prática prefigura?
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O tipo de “solipsismo coletivo” que, numa perspectiva puramente individualista e burguesa, se poderia atribuir pura e tão somente a alguma “imaturidade”, quando visto de um ponto de vista simultaneamente político e sociológico mostra-se um potentíssimo instrumento de controle social. Uma geração inteira de militantes arrisca envenenar-se nos coletivos, tornados espaços tóxicos para a militância, se não for capaz de reverter as tendências apontadas.
O link tá indo pro texto 2 e não pro 1
Mari,
Obrigado pelo aviso.
Já está corrigido.
(não costumo escrever aqui, mas o debate dos meandros do fazer político são os que mais me interessam, espero me fazer entender)
Apesar de ter plena noção que o conjunto de textos se inicia com uma crítica estrutural dos “coletivos” para depois analisar as consequência dessa estrutura. Constantemente me parece emergir uma pessoalização dessas consequências e uma busca de solução a partir do comportamento militante. Seja de quem seja. Na busca de um “raciocínio” coletivo que mude a “estrutura”, ou da mudança total de alguns militantes. Vivemos há alguns anos nessa esperança de um ímpeto coletivo de “ideia” que dê um cavalo de pau nesse navio. (as vezes penso se isso é possível mesmo)
Minha reflexões vem sendo mais sobre esse modelo local/setorial de coletivos que, quando enfrenta o outro, se reconhece numa aliança tática com os companheiros na briga com a polícia, nas horas de delegacia, festas e comemorações. Mas que, nos momentos tranquilos, ou seja, aqueles momentos em que a tensão politica sai da alçada do coletivo, fazemos crítica e autocrítica e caímos na espiral de ver o coletivo como a sociedade, passando a lutar contra o inimigo dessa sociedade. Aquele que se encaixa menos nos padrão interno.
Dessa forma essa estrutura da militância que coloca a globalidade, principalmente nos momentos fora da luta, “em si”, sofre para realizar/voltar a posição da classe “para si”, num segundo ciclo de lutas. Perdemos contantemente a posição relativa ao todo. Nossos aliados “no mundo”, se tornam o lado oposto “no coletivo”. Quando o inimigo na sociedade some, vamos atrás do inimigo na microsociedade. Também numa busca pessoalizada de que aquela pessoa mude sua personalidade por consciência ou depois de ser afastada, direta ou indiretamente.
Não vejo “soluções” fora da busca de uma luta totalizante que insira os coletivos necessariamente na esfera social/global/real, constantemente. Participando de lutas politicas cotidianas globais e locais . Passando obviamente por uma organização totalizante. Para que os conflitos internos sejam devidamente e sistematicamente relativizados, não como uma estratégia de fuga, mas como uma tática para a vitória. E os julgamentos internos (que devem existir) sejam balizados pelos padrões do mundo real, e não pelos padrões internos, que são muito absolutos e altamente relativizados simultaneamente, dependendo dos gruas de proximidades que possua com o réu (ao companheiro relativiza/ ao excompanheiro absolutiza). Não sei se essa diluição na realidade é de fato uma fuga que protege o privilegiado ou uma aceitação do status quo, provavelmente o é, mas provavelmente esse seja o mais puro significado de política.
Por isso a reflexão do primeiro texto é central. Pensar os caminhos da organização totalizante, que tenha suas instâncias buro-políticas, mas que entendamos que estruturalmente tendam a superar a forma partido em sua reprodução de uma sociedade de classes. Com a tranquilidade de enfrentar as contradições que dela surjam. Caso contrário, enquanto não há esse ímpeto de superação, os coletivos é o que nos restam.(?)
A esquerda em si é um mercado. Só gente com estigma ou impossibilidade de competir no mercado em geral é que aderem. É muito raro que pessoas com potencial e sem estigma entrem nisso. O pobre entra porque vindo de famílias sem contatos, a esquerda oferecerá contatos e oferecerá qualificação. Outros entram por causa de algum estigma. Possuem dinheiro, formação, capacidade mas há algum estigma que os impede de serem plenamente aceitos na elite. Então a esquerda está cheia de gente que gostaria de ser ministro mas não é aceito como tal e, na outra ponta, pessoas vindas da pobreza que encontram na esquerda uma rede de contatos e qualificação. É oportunidade. Sem falar os que aderem por conta de mil estigmas.
O feminismo radical segue a mesma linha. Nem todas possuem a capacidade de Simone de Beauvouir. Não sendo capazes de competir entre todos, incluindo os homens, entram nesses núcleos de competição restrita pois ai encontrarão algum mercado. Novamente, trata-se de contatos, capacitação e potenciais cargos e bolsas. Ganhar 4 mil de bolsa por mês pra falar de feminismo num país onde o povo carrega pedra por 1.500 reais é um baita negócio.
A crítica do PP às feministas serve pra esquerda em geral. É a própria esquerda um espaço dissociado dos trabalhadores, composto por gente que quer um lugar ao sol e essa dinâmica violenta de derrubar possíveis competidores também se aplica.
Não é por acaso que o povo se conecta com a esquerda conforme a utilidade. Vê nela apoio quando é pra manter direitos sociais e se distancia quando se trata de temais morais que discordam, caso da esquerda identitária.