Por Alfredo Lima

Cessada a queda de braço entre o presidente e os governadores e prefeitos a respeito das medidas de isolamento social, parece que chegaram a um consenso cruel de flexibilizá-las, apesar de o número de casos e mortos só subir.

Moradores do Povoado Barrinha — zona rural de Matias Olímpio, no Piauí — descontentes com a flexibilização tomaram a iniciativa de se organizar para fazer uma barreira sanitária no acesso ao Povoado Repartição, que é o primeiro município do estado vizinho, Maranhão. Tiveram apoio da Secretaria de Saúde assim que tomaram a atitude, mas não obtiveram apoio material, como profissionais de saúde orientando, por exemplo.

No Pará, moradores de São João da Ponta já faziam barreiras por conta própria desde maio. De acordo com eles, no município “não tem médico, não tem oxigênio, não tem nada”. Um médico atende em todo o município e uma vez por semana. Há uma subnotificação devido à ausência de testes em pacientes que apresentam sintomas da Covid-19. No município de Bragança, moradores de uma vila pesqueira viviam a aflição de não ter uma Unidade Básica de Saúde na comunidade. Apesar do isolamento social, eles viam constantemente a chegada de visitantes e decidiram fazer algo a respeito. Até abril a comunidade não havia registrado nenhum caso, mas 35 já haviam sido confirmados no município.

Mas onde não foi possível realizá-las, ora por falta de pernas, ora por falta de apoio do poder público, moradores organizaram protestos exigindo barreiras sanitárias. Tal fato aconteceu durante os dias 30 e 31 de maio em Nova Friburgo, município do Estado do Rio. Eles denunciavam inclusive que regiões turísticas estavam abertas junto de hotéis que recebiam gente de fora sem restrição.

Imagem do coletivo Assombroso Prefeito de Paraty
Imagem feita pelo coletivo Assombroso Prefeito de Paraty

O que se vê nessas experiências são esforços populares em resguardar-se apesar de os gestores preocuparem-se mais com a abertura do comércio, superestimando inclusive o sistema de saúde de várias localidades. Onde prefeituras se recusaram a garantir a vida dos trabalhadores, eles se impuseram pautando a quarentena por meio da ação direta. Na cidade de Paraty, alguns trabalhadores inspirados pelos moradores do bairro de Trindade esboçaram um minimanual de como bloquear o seu bairro. No início de junho Paraty entrou em regime de flexibilização. Apesar da irresponsabilidade da prefeitura, os trabalhadores podem e devem reduzir as perdas com a força de sua solidariedade.

4 COMENTÁRIOS

  1. A iniciativa é boa. Mas a segunda imagem mostra pessoas aglomeradas – coladas umas às outras, na verdade – e sem máscara, o que significa que esse fechamento “desde baixo” pode ser aperfeiçoado. E a imagem de destaque também: várias pessoas próximas e sem máscara. É como se apenas os “de fora” pudessem contaminar, mas é muito difícil que uma vila ou comunidade mais isolada não mantenha algum tipo de contato com quem é “de fora”. Mais do que a barreira física, é necessária uma mudança de comportamento.

  2. Fagner, essas imagens são de meados de março. Naquela época ainda não existia essa coisa de todo mundo usar máscara. Inclusive, as recomendações até então era de só usar máscara as pessoas que estivessem tossindo ou apresentando sintomas de gripe. Acredito que por conta da escassez de máscaras nas farmácias locais. Nessa época, inclusive, tudo funcionava normalmente. No meu trabalho, estava aglomerado até ser colocado em home-office (no final do mesmo mês). Muita coisa mudou desde então. Essa experiência aí antecedeu em muito o que algumas prefeituras só iriam colocar em prática lá pro final de março/início de abril.
    E, de fato, a experiência teve êxito. Em Trindade, até hoje, foram 2 casos confirmados. Já no sertão do taquari, bairro próximo, parecido, mas que sempre teve um fluxo menor de pessoas porém sem a barreira sanitária, foram 21 confirmações.

  3. Me ocorreu de esquecer de mencionar no presente texto que em Belo Horizonte 1200 pessoas foram encaminhadas para hospitais com sintomas de covid-19 devido a abordagens em barreiras sanitárias. Imaginam quantas infecções não foram evitadas? Nessa matéria é claro que a Globo estaria falando de barreiras que a prefeitura mesma impôs. Essas experiências de organização proletária não devem substituir a cobrança às autoridades por medidas sanitárias adequadas.

    https://g1.globo.com/mg/minas-gerais/noticia/2020/06/17/mais-de-1200-pessoas-que-passaram-pelas-barreiras-sanitarias-de-bh-foram-encaminhadas-para-unidades-de-saude.ghtml

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