Por Legume Lucas

Desde que Bolsonaro chegou ao poder somos cotidianamente bombardeados com pautas e ataques que ganham senso de urgência. Em uma semana são pelo menos cinco questões que tomam as redes e exigem o nosso posicionamento. Em geral, a resposta da esquerda tem sido a grande comoção nas redes, mas, devido aos frangalhos organizacionais em que se encontra, pouco estava sendo feito de prático para que esses ataques fossem interrompidos. Parecemos em alguma medida viciados na adrenalina de indignação que a situação atual nos proporciona. A coisa parece ter mudado um pouco nos últimos meses. Sinto isso na minha vida cotidiana, com diferentes pessoas me repetindo a mesma pergunta: “Você vai no ato?” São pessoas variadas, amigos, colegas de trabalho, familiares; em geral identificados com a esquerda. Todas as vezes que me perguntam, me ponho a pensar sobre ir ou não no ato. Escrevo este texto para compartilhar algumas reflexões sobre o assunto.

Me parece claro que retirar Bolsonaro do poder é uma tarefa urgente. Cada momento em que ele continua lá, aumenta a possibilidade de transformação de um governo fascistizante num regime fascista. E embora ainda pareça faltar ao presidente um movimento de massas próprio, ele parece continuar tentando cria-lo. Foi assim com sua aproximação aos caminhoneiros; com o incentivo às manifestações pela abertura do comércio, que uniam trabalhadores e donos de lojas; continua sendo assim quando organiza motociatas na tentativa de se aproximar esteticamente da mobilização dos motoboys. Mesmo que nenhum desses ensaios tenha logrado êxito em constituir aquele movimento, há que se perguntar se a inserção do bolsonarismo nas forças policiais e militares, associada a elementos populares distintos, já não configuram bases suficientes para uma ação radical do presidente. Embora, até o momento, a resposta me pareça negativa, não tenho dúvidas que a agitação dessa base tende a se radicalizar fortemente em 2022, tendendo a chegar a um ponto sem retorno.

Deveria ser desnecessário dizer que isso seria terrível não apenas para a “esquerda institucional”, mas também para todos aqueles que pretendem fomentar a organização autônoma dos trabalhadores, uma vez que o fascismo trabalha para destruir de vez essa capacidade de ação. Uma viragem radical do bolsonarismo implicaria a destruição das poucas capacidades de articulação e resistência de classe que existem hoje, um aprofundamento da derrota em que os movimentos dos trabalhadores se encontram. O atual estado das organizações de esquerda também me leva a acreditar que elas seriam facilmente destruídas por um regime mais repressivo, seja pela falta de autodisciplina, seja pelo excesso de exposição nas redes a que ficaram viciadas.

Partindo dessas constatações, derrotar o bolsonarismo se apresenta como desafio fundamental para todo militante de esquerda (não importando qual seja a concepção de esquerda que você adote). O que se coloca como questão então é o que significa derrotar o bolsonarismo.

Neste sentido, ir às ruas é importante para demonstrar que a maioria da população se opõe ao governo e exige que o presidente saia. Afinal, sua atuação durante a pandemia contribuiu ativamente para a morte das pessoas, especialmente dos setores mais precarizados da classe trabalhadora. No mesmo sentido faz-se necessário não deixar a rua ser monopolizada pelos grupos de extrema-direita; e como as manifestações pautam a imprensa, isto aumenta o desgaste do governo. Indo mais longe, é possível argumentar que, ao focar no uso de máscaras pff2 nas manifestações –- como tem sido feito em diferentes cidades -–, se contribui para a divulgação de medidas de segurança que realmente podem ser eficazes na mitigação da pandemia, não apenas nas manifestações, mas no país inteiro. Ainda cabe destacar importantes iniciativas de relacionar o aumento do custo de vida e o empobrecimento da massa trabalhadora com as ações de Bolsonaro, buscando conferir um caráter de classe aos atos.

Ao mesmo tempo, cabe perguntar em que medida as manifestações conseguem influir na desconstrução do bolsonarismo. Pelo que tenho acompanhado, parecem repetir alguns roteiros muito engessados: as falas são centralizadas nos carros de som, escolhidas pela composição de forças que oficialmente convoca os atos; a manifestação se divide em blocos dos partidos e movimentos, que por vezes terminam tendo a função de reforçar as identidades desses mesmos, com suas bandeiras próprias, cantos próprios e até baterias próprias. Esse ir à rua como um reforço da própria identidade vale tanto para a esquerda tradicional quanto para os “blocos autônomos”.

As recentes disputas por qual seria o grupo que fica na frente do ato e, portanto, qual seria a pauta mais destacada, são apenas mais um capítulo de uma forma de organização que sempre levará a este tipo de problemas. Muito se pode argumentar sobre como cada pauta é a mais urgente e a que mais explicita os ataques feitos pelo governo. Entretanto, a prática emula a disputa feita nas redes sociais por hashtags, reforça identidades militantes específicas e cria a disputa por uma foto mais bonita.

Para algumas das lideranças, o foco aparenta ser a construção de si mesmos como figuras de relevo. Isso explicaria a concentração de horas com falas alternadas, explicaria também o fato de terem marcado inicialmente atos com mais de um mês de intervalo. Não fica muito claro qual é a estratégia para derrubar o presidente a partir desses atos. Em alguma medida lembra a tática do MBL e do Vem pra Rua para derrubar Dilma Roussef: focar-se em grandes atos festivos que se assemelham a comícios e com um apoio generalizado da imprensa, para a partir daí pressionar o Congresso. Evidentemente, não foi só isso que derrubou Dilma Roussef, tendo os parlamentares agido claramente em interesse próprio. Será que cabe à esquerda emular a estratégia que a direita utilizou?

Ainda enredados no mesmo roteiro estão as críticas que setores da esquerda, junto com liberais contra o Bolsonaro, fazem a ações de destruição de propriedade e as denúncias feitas pelo “bloco autônomo” em relação à comissão de segurança do MTST desfazer barricadas. Pode questionar-se a efetividade de fazer uma barricada no meio de um ato no sábado. Qual fluxo se pretendia interromper com ela? Em que ela permitiria uma radicalização da manifestação? Quem esperava que se radicalizasse? Será que existe uma esperança que setores da esquerda que sempre prezaram por manter as manifestações e bases sob controle tenham aprendido que isso pode fortalecer a direita? Nesse sentido ambos falam em aprender com 2013, porém os campos tiraram lições opostas. Enquanto uns acham que a repressão feita pelos governos da época abriu caminho para a direita, os que coordenam as manifestações pensam que falta de controle daquelas manifestações foi o que permitiu o fortalecimento da direita, e se negam a reconhecer a que a destruição de propriedade privada naquele contexto contou com uma grande aprovação popular. Em comum nenhuma delas olha para os equívocos de seu próprio campo, assim como ambas se consideram a verdadeira leitora da vontade popular.

Há que se pensar em que medida tem sido feito um esforço para falar para fora das próprias manifestações; para propor ações que permitam que pessoas nas ruas, que não estão lá para a manifestação, se engajem nela. Pelo que pude observar, são pouquíssimos os panfletos distribuídos para a população, e também não me pareceu existir uma preocupação de que as pessoas que estão na rua adiram à manifestação. Em alguma medida, o próprio chamado da manifestação dificulta tal adesão, já que o ato em pleno sábado assume o papel de ocupação do tempo livre e não de interrupção da vida normal. É perfeitamente possível a pessoa se submeter a um trabalho que não segue os protocolos de higiene nos dias de semana, e a ir à manifestação no sábado respeitando todos os protocolos. A mencionada distribuição de máscaras na rua poderia ser um caminho para a articulação do ato com o cotidiano dos trabalhadores que se expõem ao vírus, mas para isso precisaria ser algo voltado não apenas aos manifestantes. Entretanto, é uma iniciativa muito pontual. A questão que fica para mim é a seguinte: se os ataques feito por Bolsonaro ao conjunto dos trabalhadores é cotidiano, como podemos romper com esse cotidiano? Apenas respondendo a essa pergunta poderemos derrotar o que permitiu o bolsonarismo ganhar força.

Anos atrás um camarada militante escreveu um texto que me marcou muito. Ele dizia que sair do roteiro é uma obrigação de quem quer vencer. Interpreto isso, não sozinho evidentemente, como a necessidade de olhar para as nossas experiências anteriores e ao mesmo tempo evitar repetir as práticas, sermos criativos e críticos ao mesmo tempo. Parece ser isso que tem nos faltado nos últimos anos.

A fotografia de destaque, só um detalhe, é de Emil Heilborn (1900-2003) e as outras duas são de René Maltête (1930-2000).

 

 

10 COMENTÁRIOS

  1. • quem não tem um diagnóstico correto da crise, acaba sendo engolido por ela.

    • desde Junho de 2013 há uma crise de hegemonia, pois o setor dominante não consegue mais apresentar seus interesses privados como se fossem também de interesse coletivo, sendo o maior exemplo disto a ausência de projeto unificador nem mesmo no tocante à pandemia.

    • Bolsonaro não é um ponto fora da curva, mas a própria curva em movimento – como em 1989 já o fora Collor.

    • o que o atual Fora Bolsonaro deveria aprender com o Fora Collor de 1992?

    • de um lado: a população clama por uma solução anti-sistêmica, mesmo ao fazer escolhas equivocadas por representantes incapazes de atender sua demanda.

    • do outro: ao não encaminhar qualquer projeto de coesão nacional, o setor dominante também se pauta por fora da ordem constituída.

    • no meio: a Esquerda eleitoral-institucional é a única ainda supondo haver alguma saída por dentro da ordem, com seus ordeiros e pacíficos saraus de Sábado à tarde.

    • de um lado: Bolsonaro alegava a necessidade de “matar uns 30 mil” para mudar o Brasil, agora já são mais de 530 mil cadáveres.

    • do outro: liberais, social-democratas e reformistas para justificar a não radicalidade das lutas, sempre brandiram como argumento o temor de um banho de sangue, agora ele já aconteceu e a radicalização não.

    • em meio a isto, só resta a nosotros romper com toda e qualquer ilusão: estamos num beco sem saída, não haverá solução sem ruptura institucional.

    • em cada ascensão do fascismo se ouve o grito mudo de uma revolução fracassada.

    Se as criaturas monstruosas do fascismo contemporâno estão por toda parte, por onde vai a Revolução no séc. XXI?

  2. arkx Brasil,

    que crise de hegemonia é essa que a boiada toda da privatização, retiradas de direitos trabalhistas e previdenciários passam sem praticamente resistência ou luta? De hegemonia a burguesia vai bem como nunca.

    Em 2006 o candidato do PSDB tinha que colocar boné do Banco do Brasil pra fazer de conta que não era privatista. Em 2018 Bolsonaro não fez questão nenhum de esconder e seu vice declarou que era a favor de acabar com o décimo terceiro salário. Que o candidato mais votado da direita não tenha precisado esconder seu programa econômico, mostra que de hegemonia a burguesia está bem melhor do que 15 ou 20 anos atrás.

  3. Pra mim só uma completa ignorância da realidade em que os trabalhadores urbanos brasileiros vivem de desmonte e defensiva diante de ataques diários da burguesia brasileira no seu cotidiano justificam esse diagnóstico de burguesia com crise de hegemonia. A burguesia conseguiu afirmar sua hegemonia mesmo diante do risco de morte da Covid-19. Mesmo a de baixa produtividade. Estamos ferrados.

  4. ☆ Uma Crise de Hegemonia se caracteriza pelo setor dominante não conseguir mais apresentar seus interesses privados como se fossem também de interesse coletivo.

    Exemplos:

    – no período desenvolvimentista, com a industrialização e urbanização forçada, a imigração atendeu aos interesses do grande empresariado, fornecendo mão de obra barata, mas se apresentava aos trabalhadores como oportunidade para “vencer na vida” – portanto havia uma dominação por consenso, sob o pressuposto de interesses convergentes.

    – nos governos Lulistas, através da recomposição do Salário Mínimo, criação de postos de trabalho de baixa renda, expansão do acesso ao crédito e políticas sociais compensatórias, apresentou-se aos trabalhadores uma oportunidade para “melhorar de vida”, muito embora tratar-se de situação conjuntural e sem sustentabilidade, pela qual quem nunca antes ganhou tanto dinheiro neste país foi o grande empresariado.

    Nada semelhante existe desde o Golpe de 2016. Sem qualquer disfarce ou escrúpulo a boiada do interesse privado vai passando, sem nenhuma contrapartida, mesmo ilusória, para o conjunto da população.

    Nem mesmo na emergência sanitária provocada pela pandemia, o setor dominante foi capaz de ações de âmbito nacional.

    Ao contrário, permaneceu restrito aos seus interesses particulares, chegando ao extremo de negociatas com aquisição de vacinas.

    Aliás, teria sido a grande oportunidade de legitimação inclusive de seu programa econômico, derrotadado anteriormente por 4 vezes na urnas e jamais assumido abertamente, em seu conjunto e prioridade, pela candidatura Bolsonaro.

    Bolsonaro não participou de debates e sua campanha não se pautou pelas propostas econômicas gerais, e sim focou em pontos diversionistas para através deles gerar minimamente um consenso de interesse coletivo: combate à corrupção, melhora da segurança pública, pauta conservadora nos costumes.

    A Crise de Hegemonia se expressa politicamente numa Crise de Representação, resultando num absoluto descrédito para os gestores e os partidos, daí a busca por candidatos que se apresentam como anti-sistêmicos.

    E neste sentido Bolsonaro foi a bola da vez, levando-se em conta também o absoluto desinteresse de Haddad em vencer as Eleições de 2018.

    Para isto teria sido necessária uma campanha de acirramento da Luta de Classes, como fora a de 2014, algo com que Lulinha Paz e Amor jamais concordaria, mesmo estando preso.

    Uma Crise de Hegemonia não implica em perda da capacidade de mando da burguesia, e sim de sua habilidade de comando, comprometendo a estabilidade sistêmica.

    A burguesia brasileira nada mais oferece à sociedade além de miséria, doença e morte.

    Inviabilizado o pacto social, a dominação só pode se exercer pela coação e repressão num regime abertamente fechado e autoritário.

    É um cenário que possui semelhanças com 1968, mas este não foi só o ano do AI-5 , pois marca o início do Milagre Brasileiro, com os índices altos de crescimento do PIB que conferiram apoio popular à Ditadura.

    Algum outro falso milagre à vista?

  5. arkx Brasil,

    A hegemonia burguesa (pelo conceito que você usa) é muito maior agora do que nos exemplos históricos que você mostrou.

    Hoje a burguesia apresenta seus interesses privados, de privatização, reforma da previdência, trabalhista, incentivo a empreendedorismo etc. como se fosse interesse geral e consegue consenso ou consentimento sobre isso, muito mais do que em outras épocas. Nunca nas últimas várias décadas a visão de mundo burguesa esteve tão difundida e entranhada na classe trabalhadora, e sem visões de mundo competindo com ela. Nenhuma visão de emancipação social, de sociedade socialista, autogerida, está posta e difundida em parte da sociedade civil.

    *** *** ***

    acrescentando ao comentário sobre a ‘crise de hegemonia’…

    Se a burguesia caiu no Bolsonaro, não acha candidato do seu coração com voto pra ganhar eleição, é fruto exatamente da sua imensa hegemonia, a ponto de poder dispensar e criminalizar a “social-democracia”, ou a centro-esquerda. A crise de representatividade é crise da burguesia achar uma representação por via eleitoral num momento em que ela demonstra tamanha força, domínio, que torna incompatível com uma representação “social-democrata” ou de centro esquerda.

  6. Leo V,

    Percebo estarmos abordando a mesma situação através de dois enfoques diferentes, contudo complementares.

    E disto podem surgir respostas para as questões colocadas pelo texto principal deste post, principalmente: como sair do roteiro para ser possível vencer?

    Muitas vezes ao se afirmar que o Capitalismo se encontra em crise sistêmica, provavelmente terminal, de imediato surge uma refutação: isto não corresponderia à realidade porque os lucros das mega corporações transnacionais tem sido astronômicos.

    Entretanto este dado, embora correto, expressa exatamente a debilidade do Capitalismo contemporâneo, pois incapaz de criar novo valor depende de uma aguda e extrema oligopolização.

    Ao se observar a curva da taxa de lucro geral do sistema, ela apresenta uma irreversível tendência de queda.

    No caso do Brasil este processo se mostra particularmente brutal e selvagem, com a burguesia local e o Imperialismo associados promovendo um saque generalizado à renda e aos recursos públicos.

    Para este processo de expropriação se viabilizar foi necessário o Golpe de 2016 e a fraude eleitoral de 2018.

    Se há de fato uma coesão burguesa quanto a ele, acompanhada do poder para implementá-lo, trata-se de um programa derrotado por 4 vezes nas urnas e jamais colocado claramente na campanha de 2018.

    Não é por outro motivo ter sido necessário um conjunto de manipulações para garantir a vitória de Bolsonaro, sendo este próprio uma opção de última escolha (como em 1989 ocorrera com Collor).

    Não é um programa aplicado por consentimento, e sim pela força!

    Em 1964 o apoio popular a Jango era imenso, foi necessário uma longa ditadura militarizada para impor os interesses do bloco dominante.

    Se em 1964 Jango dispunha de não só apoio popular como militar, por que não houve resistência?

    Se Temer chegou a ter aprovação de apenas 1%, portanto um consenso às avessas, como não chegou a cair?

    Cada vez mais isolado politicamente, por que Bolsonaro se mantém?

    Claro que a resposta é complexa, mas um dos motivos está em sua correta sua argumentação: 《 Nenhuma visão de emancipação social, de sociedade socialista, autogerida, está posta e difundida em parte da sociedade civil》.

    Para vencer é preciso sair do roteiro imposto pela classe dominante no Brasil, e isto é exatamente o que a Esquerda eleitoral-institucional se recusa a fazer, nem mesmo como mera cogitação no plano do debate político.

  7. Arkx Brasil,

    Os que acreditam que o capitalismo está em crise permanente ou em estado terminal e usam a queda tendencial da taça de lucro como explicação, esquecem-se que simultaneamente no próprio processo produtivo do modo de produzir capitalista cria-se as suas próprias contra-tendências que equilibram a queda da taxa de lucro, tornado-a sempre tendencial e nunca de fato. Muitos acreditam, e não sei se é o seu caso, que com o avanço do capital constante sobre o capital variável, no desenvolvimento das empresas, substitui-se máquinas por trabalhadores, e como máquina não produz valor e por conseguinte não produz mais valia, bingo… a taxa de lucro está a cair ladeira a baixo sem salvação. Esquecem que as transformações no processo produtivo não se dão somente no trabalho morto das tecnologias, mas, e principalmente, no mundo vivo do trabalho, das relações de trabalho no processo produtivo, e que não são as máquinas que estão a substituir os trabalhadores, e sim, trabalhadores desqualificados que estão sendo substituídos por trabalhadores mais qualificados, trabalhadores submetidos pela mais valia absoluta por trabalhadores submetidos a mais valia relativa. Os trabalhadores com mais qualificação junto com as inovações tecnológicas produzem muito mais mais valor elevando pra cima a massa de trabalho não pago e por conseguinte a taxa de lucro. Embora a intensidade desses trabalhadores desvaloriza a unidade da mercadoria diminuindo a mais valia aumenta-se a quantidade de mais valia absorvida no atacado aumentando a taxa de lucro, isso é uma contra tendência. A diminuição de trabalho gasto e custos por unidade produzida de mercadoria baixa os preços inclusive daquilo que é consumido pelos capitalistas em seus investimentos futuros, uma outra contra-tendência. A elevação da taxa de lucro pelo o aumento da taxa de mais valia em consequência do desenvolvimento da mais valia absoluta para a mais valia relativa e seus desdobramentos é esquecida como contra-tendências, pelos decadentistas, assim como outros fatores contra-tendenciais. O resultado é sempre uma visão catastrófica para o futuro.
    O capitalismo não vai morrer por sua supostas contradições sistêmicas, isso é um mito! Se isso fosse verdade o capitalismo já tinha morrido a muito tempo.
    Essa história de que o capitalismo está na sua fase terminal é velha, um exemplo disso, é a decadente tese do Terceiro Período que levou os PCs ao ultraesquerdismo, fase nefasta e de muito fanatismo no movimento comunista, dos anos 1928-1934. As consequências disso na Alemanha junto com a tese do social-fascismo foi a contribuição dos comunistas na ascensão de Hitler ao poder.
    Isso de crise terminal do capitalismo só revela o estado de decadência e decomposição que se encontram as esquerdas que acreditam e pregam essa lorota. Essa esquerda, ou melhor, ultraesquerda é comparável aos irracionalistas místicos, aos exotéricos-esotéricos fascistas, que vêem o mundo, no atual período histórico, ou seja, o mundo moderno como pertencente ao mito da idade das trevas, o mundo em decadência, Kali-yuga.
    O mito da crise permanente, sistêmica e terminal do capitalismo é a versão marxista do que os hindus, os esotéricos Tradicionalistas ocidentais, ou seja, os fascistas chamam de Kali-yuga, a fase da decadência e degradação humana, é a versão militante dos tempos sombrios.
    A absorção desses mitos apocalípticos enfraquecem a consciência do movimento da classe trabalhadora em suas lutas, assim como enfraqueceu os fanáticos cristãos da idade média, e sua crença no apocalipse, durante as invasões dos Vinkings a suas terras, como aponta os estudos de Marc Bloch sobre as invasões bárbaras tardias.
    As crises no sistema capitalista fazem parte do sistema capitalista e são corrigidas pelo próprio capitalismo em seu progresso. A queda tendencial da taxa de lucro faz parte do desenvolvimento progressivo do modo capitalista de se produzir, do seu progresso, e não da sua involução.
    A crise terminal é um mito assim como o Kali-yuga, assim como o apocalipse.
    É pura escatologia!

  8. Gogol,

    • decidi contribuir nos comentários deste artigo por considerar que ele aponta um dos maiores problemas atuais: a inadequação das formas de luta e organização frente ao atual estágio do Capitalismo.

    • localizei a origem desse problema num diagnóstico incorreto da crise.

    • quando a hipótese de queda tendencial da taxa de lucro foi formulada, não havia série histórica de dados acumulados suficientes, mas hoje os gráficos estão disponíveis e a comprovam.

    • tanto sua argumentação acerca da funcão contra-tendencial da mais-valia relativa (portanto da produtividade), como várias outras abordagens a respeito publicadas no Passa Palavra, padecem de um mesmo equívoco, que está resumido neste trecho de seu comentário: 《 aumenta-se a quantidade de mais valia absorvida no atacado aumentando a taxa de lucro》. 

    • não basta produzir valor, ele precisa ser realizado no momento da venda.

    • ao ser depreciada a taxa de lucro por unidade produzida, a quantidade total a ser absorvida no atacado gera crises de superprodução, inclusive pela contração do poder de compra geral dos salários (causada pela redução de custos com mão de obra) .

    • além disto, também a relação entre mais-valia absoluta e relativa é de inter-dependência, sendo o mais emblemático exemplo atual o Vale do Silicio e as swetshops asiáticas.

    • estas contradições intrínsecas não são auto-corrigidas pelo próprio Capitalismo, muito pelo contrário como ensinam as suas cada vez mais destrutivas crises, que apenas por curto período interrompem a queda da taxa de lucro geral do sistema.

    • portanto, o Capitalismo não vai se dissolver em pleno ar, precisa ser derrotado, tampouco se trata de alguma catástrofe futura, pois a catástrofe é o próprio processo de acumulação do Capital.

    • vivemos atualmente situação semelhante ao período entre a Crise de 1929 e a eclosão da II Grande Guerra, incapaz de se auto-reciclar o Capitalismo exige maciça destruição de forças produtivas, mas desta vez o arsenal nuclear possibilita um aniquilamento total.

    • ao mesmo tempo ressurgem manifestações dos fascismo, com sua mais evidente e nefasta metamorfose atual ocorrendo na China.

    • a Crise de Hegemonia no Brasil nada mais é do que expressão localizada de um Crise de Hegemonia global, os anos dourados do Capitalismo ficaram definitivamente para trás, não há nenhum jogo ganha-ganha, muito menos no projeto chinês das Novas Rotas da Seda.

    • frente a este cenário devastador, o conjunto das Esquerdas, em todo seu espectro, se mostra claramente perdido no tempo e no espaço.

    • as formas de luta e de organização estão defasadas, desde uma simples manifestação até a concepção de como seria a Revolução no séc. XXI.

    Por onde vamos? Só haverá caminho por fora do roteiro imposto pelo Capitalismo.

  9. Arkx Brasil,

    Sobre os gráficos demonstrarem isso ou aquilo vai depender da escolha do que se quer procurar nesses gráficos estatísticos. Se existem gráficos que comprovam a redução irreversível da taxa de lucro, também existem gráficos que dizem que não é bem assim. A queda tendencial da taxa de lucro pode contribuir estruturalmente para crises de maiores proporcionalidade? Eu não duvido disso. Mas achar que isso tende a uma crise terminal do capitalismo é crendice, é algo que se encontra na subjetividade. As crises cíclicas e estruturais do capitalismo fazem parte do seu progressivo desenvolvimento e não de sua decadência.

    A realização das mercadorias está a acontecer nos centros urbanos e rurais e consequentemente a acumulação dessa realização, e quando não realizados vem as crises cíclicas de superprodução e as sua consequências terrível a classe trabalhadora com muita destruição de forças produtivas e de mão de obras, muitas empresas vão a falência, geralmente as menos competitivas com taxas de lucro maiores, logo em seguida o clico se repete. As crise são reguladoras do sistema, colocam as suas coisas no lugar e as empresas maiores que possuem taxas menos de lucro costumam a tem mais sobre vida nesses momentos de crise e retomada, tendendo a acumularem ainda mais com novos mercados em uma população sempre crescente.

    A depreciação por unidade em condições de mais valia relativa é da mais valia e não da taxa de lucro, isso se dá em consequência da melhor quantidade de trabalho despendido por unidade na produção, só que a quantidade total que o trabalhador produz na sua jornada de trabalho aumenta, e assim, aumentando a quantidade de mais valia extraída por seu trabalho mais intenso. Isso é uma contra tendência. E possibilita que a classe trabalhadora e os capitalistas consumam produtos mais baratos e em maiores quantidades. O capital constante em uma nova onda de investimentos, por maiores que sejam as demandas futuras, não desequilibrará tanto a composição orgânica do capital, o barateamento de equipamentos e plantas novas não afeta tanto a queda da taxa de lucro. Essa é mais uma contra tendência que deve ser levado em conta.

    Os salários baixos muito por conta da recuperação de lutas dos trabalhadores pelos capitalistas nós momentos de crise, podem o ser, pelo barateamento da unidade produzida em condições de mais valia relativa. Isso os capitalistas sabem muito bem e querem que os trabalhadores vivam com o menos possível. Menores salários maiores lucros. Essa é uma outra contra-tendências. Os capitalistas não produzem somente para a classe trabalhadora consumir, os próprios também o fazem e sabem muito bem para que grupo consumidor existe maior potencial. Só que nos momentos de retomada da economia e ou aumento da inflação os trabalhadores se vêem obrigados a reagir e só a luta de classes que pode reverter esse quadro aos trabalhadores para melhores condições de vida e para a sua emancipação substituindo por um outro modo se produzir ao qual o próprio trabalhador que tenha o controle a autogestão.

    A queda tendencial da taxa de lucro não é uma contradição do modo capitalista de se produzir, só tem aparência de contradição, a queda tendencial da taxa de lucro é o discreto charme da burguesia de continuar aumentando a sua acumulação, mesmo que no caminho muito caiam debaixo do rolo compressor, trabalhadores, capitalistas e forças produtivas. Só pela luta de classes que se pode minimizar e destruir as consequências desse rolo compressor.

    O a história é diferente o capitalismo está cada vez mais internacional, ou como se diz hoje, transnacional. Duvido muito que uma futura guerra mundial está por vir. A não ser por motivos ideológicos metacapitalistas. E as manifestações contra o governo Bolsonaro são pertinentes nesse sentido. Esses caras que estão no poder são muito perigosos e agem por impulsos de um capitalismo de baixa produtividade. Se o capitalismo de alta produtividade é cruel com muito o de baixa produtividade é o terror de todos.

    Sobre a esquerda está perdida eu concordo com você, mas para mim os motivos são diferentes dos seus e até contrários. Agora acredito que o bom debate deve ser feito sem sectarismos. Não podemos cometer os mesmos erros das esquerdas da década de 20 e 30. Será os sectarismos de ultraesquerda ou os sectarismos das alas da direita socialdemocrata.

    Trabalhadores de todo mundo, uni-vos!

    Abraços

  10. Desde que escrevi esse texto houve algumas novidades, por um lado começaram algumas ações de agitação entre as manifestações, seja com a barricadas feitas em alguns dias de semana, seja com outdoors feitos na cidade do presidente da Câmara para pressioná-lo, ou ainda com a queima simbólica da estátua de Borba Gato feita hoje. De mais interessante me chegou a notícia que um pequeno coletivo militante decidiiu não ir hoje a manifestação central para focar-se em panfletagens na região que tem um trabalho mais regular.
    Por outro lado, os organizadores do ato central em São Paulo se esforçaram sobremaneira para roteririzá-lo. A ponto de decidir junto à polícia onde ficará posicionado cada um dos carros de som e qual o horário de início e de término da manifestação.
    Ao mesmo tempo apareceu uma manifestação que conseguiu se inserir de fato no cotidiano popular. Deveríamos pensar o que é possível aprender com ela?

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