Por Thiago Canettieri
Terminou a maior paralisação de entregadores de aplicativo no país. Os trabalhadores precarizados de plataformas como a iFood na cidade de São José dos Campos interromperam as suas entregas. O movimento teve início num sábado, dia 11 de setembro, sob a chamada de uma “greve nacional contra a exploração dos apps”. A data não foi escolhida de maneira aleatória.
A principal reivindicação dos grevistas é o aumento das taxas que recebem os trabalhadores de logística. Os parcos recursos que recebem pelas entregas acabaram defasados pelos sucessivos reajustes no preço dos combustíveis e de todo o custo de reprodução material das pessoas, com a inflação galopante. Em São José dos Campos a mobilização se disseminou rapidamente e afetou toda a rede de entregas. Muitos estabelecimentos tiveram que interromper as entregas por aplicativos e passaram a pressionar as plataformas. Essa iniciativa conseguiu, provavelmente pela generalização do perrengue, unificar os dois regimes de trabalho dentro desses aplicativos[a saber, os regimes “OL” e “nuvem”]. Em geral, há uma tremenda disputa entre os trabalhadores que integram um ou outro regime.
Na sexta, dia 17, através da página de twitter @tretanotrampo que informa sobre essa luta, foi anunciada a suspensão da greve com a promessa pela iFood de uma reunião para discutir as demandas da categoria para o dia 28. Há o indicativo de iniciar novamente a paralisação caso as negociações não avancem.
O ritmo da luta dessa fração do precariado uberizado das entregas é intenso. Os trabalhadores de São José dos Campos elaboraram uma tremenda organização, que sustentou a “mais extensa greve da categoria já feita no país”.
No entanto, apesar dessa conquista, segue-se um tremendo isolamento do movimento entre as organizações de esquerda mais “tradicionais”. Isolamento esse que resulta numa asfixia da luta desses trabalhadores e pode pôr em xeque a luta da categoria.
Esse não é um texto sobre a greve dos entregadores de aplicativo, mas sobre seus efeitos. Talvez essa situação possa servir para pensar os significados e as consequências de uma organização de esquerda hoje.
Dito isso, cabe esclarecer três pontos fundamentais para o breve desenvolvimento desse comentário. São três pontos para começar a traçar um diagnóstico sobre os significados de uma organização de esquerda.
i. Competição potencializada pela precarização: resultado das sucessivas reestruturações produtivas, a força-de-trabalho foi sendo expulsa das tramas produtivas do capital. Isso significa a desubstancialização do capital que entra num regime crítico sem volta. Mas também implica na eliminação da forma historicamente determinada de reprodução dos seres humanos que foram convertidos em sujeitos monetários, mas agora sem dinheiro. Isso significa que, para acessar as mercadorias, as pessoas estão mais dispostas, porque necessitadas, a se submeterem aos regimes de superexploração mais intensos. Isso intensifica a competição interna aos “precarizados”.
ii. Distorção política resultado da forma-política: há a produção de uma certa maneira de enquadrar a prática de dar respostas coletivas e comensuráveis aos problemas que surgem –– na boa definição de Negt e Kluge para política. Essa produção, por suposto, é histórica e não algo inato e ontológico. Existe, assim, uma formação da “forma-política”, e essa forma “deforma” tudo o que não cabe em sua métrica. Se nossa forma-política se desenvolveu e consolidou a concepção de que a política é limitada ao processo institucional e seu entorno imediato, é natural que o que exista fora não seja reconhecido enquanto tal.
iii. Solidariedade limitada pela identidade: A razão política tradicional de esquerda parte, antes, daquilo que reconhece compartilhar uma mesma identidade. Há chaves e chavões que permitem identificação –– o partido, o sindicato, o movimento, a foice e o martelo, a liderança carismática de esquerda. O que não é reconhecido dentro dos estreitos limites dessas identidades não é merecedor da solidariedade.
O que as consequências do breque dos apps indicam é uma situação muito parecida com aquela descrita por Torino e Wohlleben num texto sobre os coletes amarelos, na França. A dupla percebe que “a racionalidade política contemporânea não consegue compreender ações radicais, somente atores radicais”. Dentro desse esquema de interpretação política, o que importa é apenas a relação entre atores: a chave para compreender as ações passa, portanto, necessariamente no reconhecimento dos atores envolvidos. As primeiras perguntas que emergem na tentativa de compreender uma ação radical são: Quem está fazendo isso? Por que está fazendo isso? Essas questões servem para enquadrar as ações num catálogo, antes mesmo de olhar para a ação em si. Ou seja, para essa racionalidade, uma ação vale somente o quanto é informado pelo ator que a pratica.
O resultado é uma cegueira estrutural. Não se vê a ação concreta. Em seu lugar se tem uma imagem construída pelo repertório político institucionalizado que pressupõe o sentido da ação sem, no entanto, ser afetado pela ação. A unidade é dada, portanto, no nível estatutário — do reconhecimento dos agentes — e não no nível da prática — do reconhecimento das ações. Isso implica que o índice de unidade está baseado na ideologia e não no compartilhamento das práticas e ações.
No caso da greve dos entregadores de aplicativo esse choque ocorre porque o movimento organizado escapa das “formas de identidade” com que normalmente se identifica um movimento de esquerda. Sendo um “ator não identificado”, por consequência, a racionalidade política corrente os joga para o lado de lá: afinal, quando os entregadores dizem que não querem Bolsonaro, mas também não querem Lula, ou quando levantam uma faixa “Motoboys sem Sindicatos”, esse ator político que emerge de uma situação concreta já é rotulado como estando necessariamente fora de um certo espectro político.
Como notaram os editores deste site, essa “esquerda parece mais presa aos seus símbolos que à luta dos trabalhadores”. E talvez esse seja parte considerável dos nossos problemas.
Sendo assim, essa racionalidade diagnóstica da esquerda, que busca antes a identidade dos atores, poderia facilmente atribuir-lhes que se não são regressivos estão abrindo caminho para o fascismo. Isso muito antes de agir juntos e colaborar. Seja como for, essa situação revela muito sobre as formas de organização da esquerda contemporânea: acossada pela competição (tanto no mundo do trabalho como na busca da melhor cotação eleitoral); deformada pela forma-política (na qual está completamente impregnada); limitada pela identidade (que se sustenta antes nos seus próprios símbolos como critério de solidariedade e engajamento).
Talvez parte do abismo da prática política contemporânea tenha a ver com o rotulacionismo das ações radicais por nomes já estabelecidos. Essa racionalidade diagnóstica atribui ao outro (sempre evanescente) a pecha de “esquerdismo”, “basismo”, “fundamentalismo”, “academicismo”, “centralismo”, “autonomismo”, “stalinismo”, “trotskismo”, “anarquismo”, etc. (na atual conjuntura política, poder-se-ia dizer “bolsonarismo”, “lulismo”, “cirismo”, and so on). Assim, não é possível compreender as vicissitudes e singularidades dos processos, pois já partem de conceitos caducos.
Uma unidade que é dada só na esfera do semblante é uma unidade frágil. Na primeira oportunidade as fraturas explodem em milhares de cacos. A diferença desses fragmentos não é algo ruim, a ser evitado a priori; tudo o que é preciso é que elas não sejam assumidas como o critério definidor do compartilhamento de práticas.
Não é o caso de dizer que a ideologia não importa, mas de reconhecer que ela ser o único definidor da prática política de esquerda é deixar escapar muita coisa –– entre elas a condição de compartilhar um espaço de engajamento, que permita desenvolver relações de confiança de afetação mútua. Se assumirmos que a tarefa de uma organização de esquerda é transformar o mundo, pode ser uma boa ideia estar nesses lugares. Porque compartilhar esses lugares é condição para desenvolver a sensibilidade necessária para compreendê-los.
Uma esquerda que não tem o que falar da maior mobilização grevista em curso no país da categoria que está na ponta dos processos de precarização, e só reage quando certos marcadores de identidade são lançados, é algo que revela muito sobre nossa situação política contemporânea.
Há momentos que o silêncio soa mais alto.
Toda solidariedade aos lutadores do breque dos apps.
Por que a Esquerda eleitoral-institucional teria algo a dizer sobre lutas autônomas, além de um eloquente silêncio?
E se algo dissesse, o que poderia ser? Certamente iria querer pautar e capturar as lutas, para delas extirpar sua característica de maior potência: a autonomia.
A Esquerda eleitoral-institucional é um cadáver putrefato desde Junho de 2013. Deixemos os mortos deixarem seus mortos insepultos.
De Maio a Junho, por exatos 2 meses, no Campo de Refugiados 1º de Maio, em Itaguaí (RJ), se deu uma rica experiência: um Quilombo contemporâneo erguido pelo Movimento do Povo.
Ali se desenvolveu o embrião de outro tipo de relações sociais, para em tempos de pandemia e ultra-liberalismo caminhar coletivamente em direcão à autonomia: alimentar, hídrica, habitacional e cultural.
O que a Esquerda teve a falar e solidarizar?
Não há de se lamentar, até mesmo porque ninguém ouviria nossas lamúrias. Cabe apenas: divulgar as lutas, apoiá-las, pensar sobre elas e se empenhar para que se articulem em redes.
A partir de 27/09, segunda feira, o Movimento do Povo mais uma vez se põe em marcha, saindo da Zona Oeste em direção à Prefeitura do Rio de Janeiro, com previsão de concluir o percurso em 4 dias.
Sobre o Campo de Refugiados 1º de Maio:
https://www.youtube.com/watch?v=-pOzwu5hQhE
https://www.youtube.com/watch?v=tLRmD-U7gtM
Muito boa reflexão, Thiago. Vou tentar somar.
Uma abordagem materialista desse problema que é apresentado em mais de uma passagem do texto – e bem sintetizado em “não consegue compreender ações radicais, somente atores radicais” – é também aquela proposta pela Análise do Discurso que entende que (no campo das práticas discursivas) sujeito e sentido se constituem conjuntamente. Não tem sujeito fora de uma prática, não tem sujeito que não seja sujeito de uma prática, e não tem prática de sujeito que não tenha sentido atribuído. Se o sentido for outro, o sujeito também já é outro – por isso mesmo que historicamente diferentes lideranças vão ocupando e desocupando esse lugar do sujeito radical, o sujeito da esquerda radical, e diferentes práticas vão assumindo esse sentido de ação radical. O que as Ligas Camponesas representaram no pós-Estado Novo, depois foi representado pelas novas Ligas Camponesas no pré-golpe de 1964, depois foi representado pelo MST no pós-ditadura militar e pré-Era Lula, depois foi representado pelos sem-teto e agora parece haver uma possibilidade de ocupação pelos entregadores. É a nossa esquerda da luta direta, da ação enraizada na e feita do interior da classe trabalhadora mais pauperizada. Em todos esses ascensos a incorporação das práticas e dos sujeitos radicais não foi imediata pela esquerda que ocupa as margens (às vezes, mas mais raramente, o centro) do aparelho de gestão de Estado.
Algumas ações parece que só adquirem “substância” (um sentido preciso, ao qual nos filiamos e reproduzimos) quando chanceladas por algumas figuras nas quais se deposita confiança, mas isso talvez diga mais de um sistema político-partidário (em sentido amplo, que inclui a imprensa, por exemplo) reduzido a lideranças, do que uma incapacidade incomum das pessoas de se posicionarem no dia-a-dia. Lembro de colegas, em tom de piada, dizerem que estavam aguardando a próxima reunião da célula do partido para saberem o que pensavam sobre tal ou tal assunto. Penso que é até salutar não se posicionar politicamente antes de uma “ruminação interior”, posto que quanto mais imediato, sem mediações, se dá esse posicionamento, mais automático, viciado e irrefletido ele tende a ser.
Então, sim, provavelmente tem um personalismo mais grosseiro na política dos dias atuais, as redes devem ter inflado isso que já era forte, mas eu não colocaria o problema central nos termos de “não consegue[m] compreender ações radicais, somente atores radicais”, e sim de um descolamento realmente trágico entre esquerda e classe trabalhadora.
E pode ser algo até pensado, do tipo “não é o momento” (para lutas radicais). No caso do MST, esse “não é o momento” que apareceu durante os governos do PT voltou a aparecer agora no governo Bolsonaro.
Por acaso a esquerda tem mostrado força, apoio e solidariedade a qualquer luta que seja?
Ela não consegue nem desenvolver lutas minimamente efetivas quando suas organizações estão sob ataque.
A luta dos trabalhadores da Casa da Moeda, que realizaram uma greve selvagem de ocupação, por acaso teve repercussão condizente? Que apoio receberam?
E o problema é internacional. E a solidariedade internacional aos revolucionários em Rojava? Impressiona como a esquerda mundial e brasileira esteve ausente, como se nada acontecesse de importante e fundamental por lá.
Por isso, sinceramente, ficar batendo na tecla de que a greve dos entregadores de São José dos Campos, que pegou a todos de surpresa, não teve apoio da esquerda, me parece lamento de quem acha que as coisas caem do céu.
O momento de desorganização, recuo e baixo moral da esquerda é um dado da realidade. Quem tá militando tem que saber disso e não ficar no chororô querendo que os outros apoiem mais efetivamente. A cobrança chega num nível, como num texto do Passa Palavra sobre o assunto, que tem como efeito obviamente não atrair a esquerda, mas afastá-la ainda mais. Ou alguém gosta de ser cobrado dessa forma, como se fosse obrigado?
O que impressiona mais ainda é que parece que o objetivo é ter o prazer de falar mal da ‘esquerda’, ou da ‘esquerda’ que ‘não sou eu’.
Além disso, quem colocou entregadores falando que não gostam de Lula nem Bolsonaro, ou melhor, quem selecionou isso, criando a imagem de que essa é uma posição política do movimento, não foram os entregadores. Evidente que tal tipo de “escolha” afasta o grosso da esquerda. (escolha entre aspas para não usar a expressão que se usaria normalmente: manipulação ou aparelhamento, por que é o que foi, mostrando uma burocracia em formação ou formada).
A faixa Motoboys Unidos Sem Sindicato tampouco era dos entregadores de São José dos Campos, e é difícil saber até que ponto eles se identificam com o slogan (aqui em Florianópolis essa faixa seria bem problemática e dividiria os entregadores porque a experiência vivida deles é diferente dos motoboys de São Paulo). Num enquadramento em que a faixa aparece em primeiro plano tomando toda a imagem, com os motoboys quase não aparecendo, não é difícil interpretá-la como posição política antissindical, com todo o efeito que isso pode ter diante do grosso da esquerda, que vê uma relação direta entre sindicato e esquerda. E novamente, tal foto não foi escolhida pelos motoboys de SJC para ser quase um cartão postal do movimento.
Sendo assim, alguém de fora pode muito bem chegar à conclusão que houve um esforço deliberado para isolar o movimento do apoio da esquerda.
Nem quando se faz a lição de casa bem feita faz sentido ficar no chororô de falta de apoio. Tem é que se trabalhar mais e melhor para o apoio vir.
Outra coisa: ainda mais com o fascismo nas ruas, mobilizando caminhoneiros, é claro que as pessoas e organizações estarão mais reticentes em prestar apoio sem saber de onde o movimento vem, qual o sentido, quem ‘dirige’ etc. Sempre que não temos proximidade com um movimento, os símbolos que vemos são sim importantes para formarmos uma ideia e um sentido de afinidade ou não. Na hora que símbolos que só trazem identificação a grupúsculos de extrema-esquerda ou à direita (como MBL e Vem pra Rua) são usados e ostentados por quem controla a representação simbólica do movimentos dos entregadores, o que se deve esperar, por lógica, é um afastamento maior da esquerda e não uma aproximação.
Se o interesse é escrever textos falando mal da esquerda, o caminho está correto. Gerar afastamento para depois falar mal.
Se o interesse é criar movimento de massa, o caminho está obviamente errado. Para criar movimento de massa com amplo apoio o movimento deve ser capaz se de tornar um objeto (ou um sujeito) em que a esquerda como um todo assim como os trabalhadores e o povo em geral, consigam projetar nele uma extensão dos seus desejos e impulsos represados. O movimento deve encontrar o que é comum a todos, e não o que é diferente, e atrair por contágio, por afetos positivos. A luta justa por dignidade no trabalho, por salário, é isso que tem potencial de contagiar e trazer apoio.
A escolha é entre luta de classes na perspectiva de movimento de massa ou de movimento identitário, centrado e encerrado num gueto cujo prazer parece ser retirado de no final das contas poder falar mal da ‘esquerda que não sou eu’.
O intuito, evidentemente, é despertar um debate fundamental para esse momento.
Achei muito interessante as argumentações do Rodrigo e do Léo, além do texto publicado.
A partir disso, como dúvida mesmo ou para a continuidade da discussão, achei extremamente intrigante essa ideia que o Passa Palavra – pelo modo como encaminha seus posicionamentos críticos – pode ser considerado um “grupo com posições identitárias” em relação à esquerda. Não defende gênero ou posições sobre o tema étnico, mas argumenta por uma esquerda que é contra outra que burocratiza/atrapalha a verdadeira questão da luta social.
Não concordo com essa apreciação em relação ao Passa Palavra, mas gostaria de ouvir os demais sobre isso.
Muito obrigado pelo texto e debate.
Alguns pontos que foram colocados no texto e nos comentários me parecem relevantes.
O primeiro é sobre a capacidade de mobilização ou articulação da esquerda. Como já foi debatido nesse site o primeiro problema dessa discussão é que o termo esquerda passou a denominar um conjunto de práticas, ou posicionamentos, que são entre si muito díspares, e que pouco tem ligação com o que historicamente significou ser de esquerda. Dessa forma a associação entre esquerda e lutas dos trabalhadores passou a não estar necessariamente relacionada. Isso teve como grande marco no Brasil as mobilizações de 2013 que geraram uma reação simplesmente demofóbica de uma certa esquerda institucional. Nesse sentido a esquerda de fato pode aparecer como apenas uma identidade, não relacionada a uma prática concreta.
O segundo ponto, é uma certa rejeição dessa identidade por frações da classe trabalhadora que se põe em luta. Por se associar a esquerda com partidos que aplicaram políticas capitalistas, ou mesmo políticas anti-opressão que não responderam – por um motivo ou outro – as demandas daqueles trabalhadores; se rejeita qualquer proximidade com os símbolos de esquerda. Esse caminho abre espaço de fato para a aproximação de grupos de direita, organizados ou não, se aproximarem dessa mobilização. Caberia a nós, evitar que a extrema-direita ganhe a disputa pela mobilização dos trabalhadores. Entretanto, os caminhos para isso não são nem um pouco claros, sendo fundamental não ignorar o problema sob o risco de cometer o erro do partido comunista alemão em 1932 que organizou seus piquetes na greve dos transportes em conjunto com os nazistas com o pretexto de enfrentar os sociais-democratas.
O terceiro ponto é sobre sectarismo. Me parece que as falas contrarias a políticos como Lula, ou as declarações reiteradas de motoboys dizendo que são contra qualquer politicagem, são uma afirmação de identidade constante. Existe aí um aspecto duplo, por um lado pode ser considerável saudável a sua rejeição aos gestores, por outro pode se considerar um reforço da política de “motoboys pelos motoboys”, que tem como resultado o isolamento de uma categoria perante o restante da classe. O trabalho político é então o de articulação dessa desconfiança salutar em relação aos gestores, com uma construção solidária de meios de apoio de outros trabalhadores.
O quarto ponto é sobre a crítica à esquerda. Tenho a impressão que o distanciamento da esquerda em relação às lutas que os trabalhadores tem feito me parece clara. Ao mesmo tempo parte da esquerda sente-se culpada desse distanciamento. No caso concreto da luta de São José dos Campos, as críticas ao silêncio da esquerda parecem ter tido um bom efeito. Após as críticas iniciais alguns sindicatos de mobilizaram para declarar apoio, outros grupos de esquerda escreveram textos em seus sites, e algumas figuras de grande destaque midiático divulgaram a vaquinha que foi feita em apoio aos trabalhadores. Não me parece que foi produzido um isolamento maior a partir das discussões. Penso que inclusive serviu para que os próprios apoiadores pensassem em estratégias para romper esse isolamento.
Parece-me formativo que os entregadores percebam que as ações de solidariedade concreta virão mais dos grupos associados à esquerda, do que dos associados à direita, mas para isso precisamos trabalhar para que essa solidariedade aconteça de fato.