Por Sergio Bologna
Qualquer pessoa que tenha acompanhado um pouco mais de perto a presidência de Trump, e especialmente a campanha que levou à sua derrota, teria notado que ele e os seus apoiadores têm constantemente destacado que querem defender a liberdade individual.
Liberdade, liberdade, é o mantra que tem sido invocado, às vezes de maneira mais forte, às vezes mais fraco, ao longo de toda a história dos EUA. Durante o confronto com o comunismo, por exemplo, ela foi igualada a tudo o que o comunismo não era. Mais notavelmente com a liberdade de mercado, o oposto da economia planificada comunista. O conceito de liberdade, que a Revolução Francesa transformou no bem mais elevado e na essência da burguesia, já no século XIX fora mudado para um conceito de liberdade como a essência de uma certa ordem econômica, junto com o seu quadro institucional. Primeiro ela forneceu a identidade a uma classe específica, a burguesia, e depois ao capital – as classes subalternas preferiram antes desfraldar a bandeira da solidariedade.
Hoje, algo diferente está acontecendo, porque a noção de liberdade da extrema-direita, a qual pertence a Trump, deve ser traduzida em um comportamento que possa ser compreendido pela “multidão”, que não carrega consigo nenhum elemento de classe. Essa noção surgiu após o fim do confronto entre o modelo ocidental de democracia e o regime comunista (e então se tornou a oposição geral entre “direita” e “esquerda”) e através da dissolução da classe média e da fragmentação e divisão da classe operária.
A liberdade não é mais sinônimo de uma ordem social, econômica e institucional particular, mas de uma substância biológica, “natural” de uma humanidade em busca de puro bem-estar. Assim, a liberdade torna-se, simplesmente, o direito de o indivíduo fazer o que ele quer, para seu próprio benefício, não só fora de qualquer regra, ordem, ou da instituição – de novo, Trump pode servir como um exemplo –, mas também fora de qualquer consideração para com os Outros: o indivíduo tem o direito de fazer o que ele quer, sem pensar se isso é bom ou ruim para os outros. Esses só existem ao se oporem ao indivíduo, em pé de igualdade, e usarem o mesmo direito em seu benefício. Se eles não são iguais a mim, eu me imponho; se são, eu os combato para me afirmar. A regressão é óbvia: da sociedade de Locke, do contrato social de Rousseau e do liberalismo de Mill (o exercício da minha liberdade não deve limitar a dos outros) a Hobbes (homo homini lupus) e ao darwinismo social que caracterizou o capitalismo predatório, racial-colonialista e neoliberal dos séculos XIX e XX.
A noção de liberdade expressa no comportamento e propaganda dos “anti-vaxxers” (nome dado ao movimento nos países de língua inglesa) é da seguinte natureza: faço o que quero, onde quero. Portanto, assumimos que o movimento anti-vacinação é uma expressão da extrema-direita (e é paradoxal como os neo-fascistas e nazistas chamam aqueles que são a favor da vacinação de fascistas e nazistas). Pensamos que este movimento tem ideias muito confusas sobre a vacinação e a sua aplicação (mesmo as nossas não são muito claras, nem mesmo as daqueles que estão na OMS…); e que pessoas com ideias políticas diferentes e mesmo opostas participam dele, mas todos estão firmemente convencidos de que o verdadeiro conceito de liberdade é isto: todo mundo tem o direito de fazer o que quer, e ninguém tem o direito de proibir isso, principalmente o dispositivo [1] a que chamamos de Estado.
(Não podemos confundir o movimento anti-vacinação com o protesto contra os passaportes vacinais. São duas coisas diferentes e devemos tratá-las separadamente. Misturá-los resultou na liderança da extrema-direita sobre as manifestações públicas. Isto mostra que a confusão é grande na mente de muitos camaradas, trabalhadores e pessoas decentes…).
Está se tornando cada vez mais claro que o movimento anti-vacinação é, no seu cerne, contra o Estado. E ele não está sozinho nisso. Naturalmente, as tendências anarquistas também têm uma afinidade com o movimento. No entanto, o anti-estatismo anarquista não é a matriz dominante. Nos Estados Unidos, a direita “Trumpista” e o movimento anti-vacinação são muito fortes quando juntos. O ataque ao Capitólio em janeiro de 2021 foi o exemplo mais completo e eloquente disso. Vimos o círculo fechar-se também na Itália, quando uma manifestação anti-vax levou a um ataque fascista ao quartel-general da CGIL [2] e à tentativa de avançar para o Palazzo Chigi [3]: do ataque ao Capitólio ao ataque à CGIL, de “tomamos Washington” ao “tomamos Roma.” Além disso, o ataque aos sindicatos deve nos lembrar de como a Camere del lavoro [4] foi destruída e incendiada pelos fascistas cem anos atrás.
O movimento anti-vax não tem nada a ver com uma classe, mas se encaixa perfeitamente com a dissolução da classe média e da classe operária, com a crise das classes médias e a transformação do mundo do trabalho. Mesmo que se mostre atualmente como um movimento que não se baseia em nenhuma ordem econômica específica, ele claramente o faz: no neoliberalismo. Ser contra o Estado é ser contra os serviços públicos; falando implicitamente que saúde, educação, transporte público, abastecimento de água, etc. não podem ou não devem ser públicos. Porque se forem, o custo deles tiraria algo de mim e deixaria os outros beneficiarem-se. Tudo deve ser deixado para o setor privado, e aqueles que não podem pagar estão simplesmente sem sorte.
* * *
Temos de nos despedir dos estereótipos com que sempre definimos a extrema-direita, especialmente o nazismo e o fascismo. Hoje estamos falando de um “neonazismo sem Hitler”, porque o Nacional-Socialismo dos anos 1930 foi o oposto de uma ideologia individualista, foi baseado na ideia do Volksgemeinschaft (o povo alemão). O autoritarismo de Trump encaixa-se perfeitamente com o individualismo: é um individualismo à escala global, à escala da Internet; o universo virtual da rede é um local de indivíduos sem laços institucionais, sem ordem institucional, sem autoridade reguladora. O virtual cumpre maravilhosamente bem a função de um espaço onde os indivíduos pertencentes à “multidão” moderna projetam o seu comportamento. Na Internet, o indivíduo pensa que pode fazer o que quiser, nenhum governo – ou instituição, ou organismo intermediário – pode impor-lhe regras, nenhum poder pode discipliná-lo.
Costumávamos pensar que o reinado das multinacionais era o auge da evolução do capitalismo. Mesmo isso está agora obsoleto. A nova ordem de “big techs”, que os leviatãs Google, Amazon, Facebook e alguns outros estão impondo, representa um novo estágio do desenvolvimento capitalista com características diferentes. Uma delas é a “democratização” do acesso à comunicação; o indivíduo pode se comunicar com o mundo e, teoricamente, atuar no mercado. O antigo modelo do capitalismo multinacional manteve o comando hierárquico e o acesso exclusivo das empresas ao mercado. A sobrevivência material e econômica do indivíduo estava unicamente nas mãos das empresas que o empregava como força de trabalho dependente e subordinada. Hoje, a tendência natural para o individualismo é aumentada pela crença de que o acesso à Internet pode ser o acesso ao mercado e, portanto, para a sobrevivência, sem a mediação de qualquer instituição e a subordinação do trabalho e do salário – neste sentido, o freelancer é a figura simbólica do nosso tempo. Os organismos intermediários, como os sindicatos, são apresentados pelas empresas como obstáculos à auto-realização, e são percebidos como tal pelos trabalhadores.
Temos que ir até às raízes sociais do comportamento individualista para compreender essa tendência da adoção de certas ideias de liberdade.
Basear o nosso comportamento na ideia de que todos devem fazer o que querem é a maneira mais radical de negar todos os valores em que se baseiam o movimento operário, o socialismo e a “esquerda”. Isso nega a solidariedade, a comunidade, a ajuda mútua, valores em que se baseiam o tecido e os conflitos sociais. Valores que também inspiram nossa revista [5], o que não precisa ser explicado.
* * *
Entretanto, também podemos abordar os benefícios da saúde pública, questões que o movimento anti-vacinação simplifica: todos fazem o que querem, a saúde pública não é problema meu, só penso na minha própria saúde, não há ciência da saúde, não há nenhuma ciência, portanto não pode haver poder regulador que tenha mais conhecimento do que o indivíduo.
A ideia de que a liberdade do sujeito para pensar a partir de si e para si, é “conhecimento” e, além disso, um conhecimento maior do que o dos ditos “especialistas” – identificados como funcionários ou agentes do poder do Estado, ou como serviçais das empresas farmacêuticas multinacionais – nega o valor a coisas como competência, educação e pesquisa científica. Isso não significa retornar ao “nobre selvagem” rousseauniano, no entanto, mas à graça do mercado. Os indivíduos que pensam a si mesmos como seres autônomos, que não precisam de ninguém, que a base de sua existência não são as relações com os outros, mas o individualismo, são precisamente aqueles que perdem a sua liberdade, especialmente nas relações de trabalho: eles negam a solidariedade, a comunidade e a ajuda mútua e a se encontram sendo objetos da exploração mais desenfreada porque, como indivíduos, têm a posição mais fraca no mercado.
Aqueles que defendem fanaticamente a sua liberdade individual, que não reconhecem nenhuma instituição reguladora e nem o Estado Social, confiam total e inconscientemente no mercado, que os esmaga e os condena a uma existência como trabalhadores pobres. Eles pensam que são livres, mas estão em uma posição de fraqueza, não em relação aos antigos patrões, mas perante poderes sem rosto e muitas vezes sem nome, para os quais os indivíduos não significam nada – tudo isso contribui para a criação de fantasias: não é a dinâmica das relações de poder na sociedade, mas sim obscuros inimigos que conspiram “contra mim” e alteram o mundo à minha volta. Não sei quem são, mas sei que existem porque alguém tem que ser responsável pelos meus problemas. A maior instituição, elusiva, mas imediatamente reconhecível, é o Estado. É também nesse ponto que a desconfiança, a agressão e a violência se voltam para aqueles que são diferentes, mais ainda contra aqueles que estão mais próximos, que se destacam (pela cor da sua pele, sua roupa e o cheiro das suas cozinhas), e são socialmente mais fracos.
O movimento anti-vax não tem um conceito de saúde ou saúde pública porque, além do conceito de serviços públicos, a dimensão do coletivo é completamente estranha a ele.
Por que as pessoas que se envolvem com valores muito diferentes dos Trumpistas, com valores um tanto vagos de “esquerda”, se juntam a este grupo de pessoas irresponsáveis? Este comportamento é ainda mais incompreensível porque a saúde pública e as epidemias são há muito abordadas e aprofundadas nas nossas experiências, lutas, investigação e considerações.
Para dar apenas um exemplo: a partir de meados dos anos 1970, havia a revista “Epidemiologia e Prevenção” [Epidemiology and Prevention]. Era a expressão desse “movimento pela saúde” que liderou as lutas políticas e legais que levaram ao reconhecimento dos perigos a que os trabalhadores estavam expostos, como substâncias tóxicas (amianto, tetraetilchumbo, policloreto de vinila e beta-naftilamina, etc.) e o direito à indenização. Recordemos os nomes de Giulio Maccacaro e Ivar Oddone [6]. A revista nasceu para educar profissionais de saúde; para lutar contra a arrogância das empresas farmacêuticas e da indústria, que negavam a evidência dos danos causados por seus empreendimentos e financiavam estudos para demonstrar a inexistência de riscos; e a luta contra um modelo de saúde pública fornecido apenas por hospitais, centros e clínicas privadas enormes e altamente especializadas apenas para aqueles que podem pagar por tratamentos caros.
As lutas sociais dos anos 1970 nos deixaram esse conhecimento e experiência, um legado que se renova a cada geração. Não precisamos recorrer a teorias conspiratórias elaboradas para denunciar os crimes das empresas farmacêuticas, basta lembrarmos do conceito marxista de lucro. Não temos que nos juntar às ações anti-governamentais dos Fratelli D’Italia [7] para criticar os alarmantes cortes feitos pelo governo Draghi no sistema de saúde. A luta pela saúde para todos e pela prevenção, baseada num sentido de responsabilidade para com os outros, é uma das lutas que travamos já faz meio século, e não assunto para aprendizes de feiticeiro.
N.B.: após o ataque fascista ao quartel-general da CGIL em Roma, vozes se levantaram para banir [a organização de extrema-direita] Forza Nuova. O ressurgimento do fascismo é um problema sério na Itália há vários anos. A esquerda, a imprensa, grandes setores do meio intelectual e do judiciário não só ignoraram esse problema, mas inclusive, em alguns casos, apoiaram as piores tendências da extrema-direita, como no caso dos massacres de Foibe [8]. Talvez pensem que, ao banir a Forza Nuova, resolverão o problema? Continuar a ignorá-lo, fingir que não existe? Em vez de proibi-los, se a polícia os reprimisse como fazem com trabalhadores em greve, então o ataque à CGIL não teria acontecido. Não se trata de bani-los, trata-se de eliminá-los da existência política. É nossa tarefa, é nossa responsabilidade criar as condições para que eles possam ser isolados e derrotados.
Notas
[1] Dispositivo é um termo usado pelo intelectual francês Michel Foucault, geralmente para se referir aos vários mecanismos institucionais, físicos, administrativos e estruturas de conhecimento que reforçam e mantêm o exercício do poder no interior de um corpo social. [Wikipédia]
[2] CGIL significa “Confederação Geral Italiana do Trabalho”, um sindicato nacional na Itália.
[3] Onde mora o primeiro-ministro.
[4] Trata-se de uma organização constituída pelas diferentes federações sindicais da CGIL que existem numa área geográfica definida.
[5] “Primo Maggio”, a revista em que este artigo foi publicado.
[6] Militantes que lançaram investigações importantes sobre a toxicidade de plantas industriais em Itália através das enquetes operárias.
[7] Outro partido de extrema-direita.
[8] Os massacres de Foibe, ou simplesmente Foibe, refere-se a assassinatos em massa durante e após a Segunda Guerra Mundial, cometidos principalmente por partisans iugoslavos contra a população italiana local [Wikipédia]
Este artigo foi traduzido do italiano para o inglês pelos Angry Workers of the World, e logo depois traduzido para o português por Marco Tulio Vieira.
As notícias seguem velozes:
– Macron afirma que vai tornar a vida dos franceses não-vacinados um inferno
– Itália torna vacinação obrigatória para pessoas acima de 50 anos (https://www.reuters.com/world/europe/italy-make-covid-jab-mandatory-over-50s-tighten-curbs-draft-2022-01-05/)
– Centrais sindicais brasileiras defendem justa causa pra quem se negar a vacinar (https://www.jorgesoutomaior.com/blog/defender-justa-causa-o-que-e-isso-companheiras-e-companheiros-o-estranho-caso-da-portaria-620-do-ministerio-do-trabalho)
Mais uma pra sequencia, agora com a Aústria querendo multar os não vacinados:
https://www.reuters.com/world/europe/austria-announce-details-planned-covid-19-vaccine-mandate-2021-12-09/
Só agora li este artigo, e deparo com uma passagem lamentável:
«Não podemos confundir o movimento anti-vacinação com o protesto contra os passaportes vacinais. São duas coisas diferentes e devemos tratá-las separadamente. Misturá-los resultou na liderança da extrema-direita sobre as manifestações públicas. Isto mostra que a confusão é grande na mente de muitos camaradas, trabalhadores e pessoas decentes».
Possivelmente eu não serei nem um «camarada» nem um «trabalhador» nem mesmo uma «pessoa decente», mas sou inteiramente favorável à obrigatoriedade de mostrar os certificados de vacinação para frequentar um certo número de lugares e estabelecimentos, variável, aliás, consoante a gravidade da pandemia em cada momento. É que não me basta estar vacinado com três doses. Além disso quero ter a certeza de que no mesmo restaurante ou hotel ou espectáculo não está ninguém sem ser vacinado. O elevado grau de imunidade que as três doses me conferem não impede que eu possa, sem sintomas, transportar o vírus e contaminar outras pessoas. Vacinar-se e defender os certificados de vacinação são, para mim, uma e a mesma coisa, tal como usar máscara.
Além disso, o argumento de que por não gritarmos com a matilha deixamos a matilha ser dirigida pela extrema-direita e pelos fascistas mostrou o que valia precisamente durante a ascensão do fascismo. Não é por defendermos a mesma causa que os fascistas defendem que a causa passaria a ser boa. Pelo contrário, estaríamos a legitimá-la. Foi o que sucedeu então e é o que está a suceder agora, inclusivamente graças a artigos como este. Os protestos contra as vacinas e contra os certificados de vacinação são, neste momento e na Europa, o campo principal em que extrema-direita e extrema-esquerda se cruzam e, como procurei demonstrá-lo longamente, é nesse cruzamento que o fascismo se gera.
Eu colocaria da seguinte forma: a fé vacinal se mostrou impotente em comparação à funcionalidade vacinas, porque se as vacinas oferecem aumento da imunidade contra a forma grave da doença, não é verdade que impede mais pessoas de se contaminarem, portanto as condições para o vírus apresentar mutações. É que a fé vacinal é uma alternativa às políticas públicas. Eduardo Paes, o prefeito do Rio de Janeiro perguntado sobre o avanço da ômicron e possíveis restrições responde que não tem outra saída: “é vacina, vacina e vacina”. Não se sabe se o Paes é macronista ou se Macron é paseista. O que se sabe é que no município do Rio sabemos o que esperar: tivemos Copa América, reabrimos precocemente as academias e salões de beleza, priorizamos os lugares fechados ao invés dos locais abertos contrariamente às orientações dos principais infectologistas, e o carnaval vem aí. Se tudo der “certo” um exército de vacinados vai ter salvo conduto para transmitir o vírus livremente em eventos estabelecimentos fechados e mal ventilados. Para completar ainda sofremos um apagão de dados do Ministério da Saúde. Ainda assim se sabe que está havendo uma explosão de contaminações. Na véspera de natal cerca de 200 pessoas foram infectadas pelo novo coronavírus no município do Rio, ontem haviam sido 2000.
A posição de “apoiar a vacina e opor-se ao passaporte vacinal” tem razões até certo ponto justificadas. Novamente: até certo ponto.
Quem visse o alvoroço que tomou conta da área da segurança da informação com a implantação dos passaportes vacinais na Europa, entenderia. E olhe que a legislação sobre proteção de dados na União Europeia é bastante rigorosa e detalhista, existe um comitê europeu de proteção de dados bastante atuante, e as autoridades nacionais de proteção de dados espanhola, francesa, italiana, britânica, irlandesa e maltesa são tão fortes que estão conseguindo dobrar Facebook e Alphabet (Google) em vários casos! Até que se chegasse a um consenso entre autoridades regulatórias e “sociedade civil” sobre o tipo de informação necessária a tais passaportes vacinais digitais, demorou bastante, houve (e há) muita polêmica.
Neste meio, o problema não está, necessariamente, no passaporte; há, inclusive, quem defenda a obrigatoriedade se houver maior transparência e controle público sobre a coleta e compartilhamento de dados. O problema está em que, em certos países, o aplicativo conterá muito mais informação do que o necessário, arriscando enormes vazamentos de dados e coleta de dados indiscriminada por certas empresas cujos contratos com o Estado são pouquíssimo transparentes. Se em outros países a preocupação é com a coleta de dados por empresas de tecnologia ligadas à biomedicina, no Brasil, onde se poderia argumentar que é quem cuida disso é o Departamento de Informática do SUS (DATASUS) ou o Serviço Federal de Processamento de Dados (SERPRO), ambos estatais, se assustem vendo isso aqui: https://duckduckgo.com/?q=vazamento+dados+sus&t=ffab&ia=web . Todo ano, sem exceção, há pelo menos dois megavazamentos de dados ou incidentes de segurança digital muito sérios envolvendo o SUS. Um invasor chegou a deixar mensagem num dos sistemas invadidos do SUS dizendo algo como “isso aqui parece CTF”.
(“Capture the flag (CTF)”, ou “pique-bandeira”, é um modelo de evento de treinamento e competição em segurança digital inspirado pelo pique-bandeira tradicional. Os organizadores “escondem” “bandeiras” em certos pedaços do sistema deixados vulneráveis de propósito, equipes competem entre si para “capturá-las” (desvendando o problema, acessando o sistema, quebrando senhas, alterando o funcionamento normal de um programa etc.), e ganha quem as conseguir primeiro, ou quem fizer mais pontos “capturando” várias “bandeiras”. Mais detalhes aqui: https://pt.wikipedia.org/wiki/Capture_The_Flag_(CTF). )
A partir disso se pode entender a posição de “apoiar a vacina e opor-se ao passaporte vacinal”: para seus defensores, a vacina como estratégia coletiva de combate à pandemia é válida, mas o nível de coleta e compartilhamento indiscriminado de dados pessoais exigidos para os passaportes vacinais digitais em certos países deixa muita gente de cabelo em pé. Um resumo desta posição está neste artigo publicado no Intercept, que aliás tem boas razões históricas para insistir no assunto: https://theintercept.com/2022/01/01/covid-vaccine-passports-surveillance/ .
Acredito que é com base nisso que cabe debater as condições pelas quais o passaporte vacinal deve ou não ser tornado obrigatório. Minha posição: obrigatoriedade, tendo como contrapartida maior controle e transparência sobre a coleta e compartilhamento de dados, controle e transparência que, não sendo implementados de imediato, devem ser pautados por lutas em torno da questão.
Fora desse campo, e das questões válidas sobre a segurança de dados envolvida, a postura de opor-se a qualquer forma de passaporte vacinal (digital ou não, obrigatório ou não) como medida de “combate à vigilância” não passa de tecnofobia ou oportunismo, pouco importa se de esquerda ou de direita. Cada dose de vacina aplicada está registrada em bancos de dados das autoridades sanitárias nacionais para controle logístico. Cada dose aplicada é vinculada nesses mesmos bancos de dados ao documento de identificação pessoal de quem a tomou (CPF brasileiro, NIR ou code INSEE francês, SSN estadunidense, aadhaar indiano, RUN chileno, CURP mexicano, NIN nigeriano, DNI argentino, etc.). É simplesmente insustentável, na prática, opor-se a qualquer forma de passaporte vacinal (digital ou não, obrigatório ou não) sob o argumento de ser “contra a vigilância”, porque o passaporte apenas expressa o que o Estado já sabe sobre cada indivíduo vacinado; portanto, não é a existência do passaporte quem cria a “vigilância”.
Apenas para que fique claro o meu ponto no comentário anterior. O que chamo de “fé vacinal” não é a segurança de que as vacinas funcionam. Não tenho dúvidas disso. O que chamo atenção é que as vacinas são um componente da luta contra a pandemia, como o foram os lockdowns, as barreiras sanitárias, e como também são as iniciativas de apoio mútuo visando atenuar os efeitos sociais da interrupção das atividades econômicas. No atual pé em que estamos, em vários municípios, o passaporte vacinal se mostra uma alternativa a todas as outras políticas públicas em epidemiologia. A consequência não poderia ser outra senão a que vemos agora em várias localidades.
As vacinas que hoje existem resultaram da actividade de laboratórios científicos e de estudos de imunologistas, e o acompanhamento estatístico permite verificar em que percentagens os vacinados e os não-vacinados são internados ou vão para as unidades de cuidados (tratamentos) intensivos ou morrem. Ninguém devia escrever sobre o assunto sem ter consultado antes essas estatísticas.
Creio que sou autor do primeiro artigo sobre o covid-19 que foi publicado neste site, A autodisciplina no combate à pandemia, e que muitos insultos me valeu, nos comentários e fora deles. Vemos agora quem — infelizmente — teve razão. Mas, por muito que custe aos brasileiros acreditar, o Brasil está no mundo. E imagine-se que até mesmo o Rio de Janeiro está no mundo! Então, vale a pena comparar com o que se passa noutros países, tanto no que diz respeito às políticas públicas como às reacções da população.
Já agora, um pouco de conhecimentos históricos também não seria prejudicial a alguns dos leitores deste site, e não só. Por exemplo, aqueles que estão sempre prontos a desferir críticas ao que denominam eurocentrismo saberão por que vias a prática da vacinação entrou na Europa? Ou, mais amplamente, conhecerão a história das pestes, das epidemias e da proliferação descontrolada de certas doenças, com elevadíssimos graus de mortalidade ou de incapacitação, em sociedades rurais e em épocas antigas, muito antes de o capitalismo existir? Mas sobre isto escrevi a série de artigos São Marx, rogai por nós, escuso de prosseguir.
Caro, não ponho nenhuma dessas informações em dúvida! Veja que falo das infecções, não dos índices de hospitalização. A campanha de vacinação no meu município (e além) tem gerado resultados positivos e sobre nenhum desses coloquei nenhuma espécie de dúvida. Note também que quando digo das outras políticas públicas além da vacinação ressalto justamente a “autodisciplina no combate à pandemia”, como julgo terem sido as experiências comunitárias de barreiras sanitárias, só para dar um exemplo, quando inexistem decisões verticais nesse sentido.
Alan,
O meu comentário era geral, não se concentrava no seu. Aliás, não me parece que exista a este respeito uma fronteira nítida entre as políticas públicas e as iniciativas locais ou mesmo individuais, porque um governo pode abrir centros de vacinação e de testagem e facilitar o acesso e as marcações e eles podem encher-se ou ficar vazios. Depende da resposta popular e esta resposta depende de muita coisa. Por que é que na União Europeia o país com maior percentagem de vacinação é Portugal, onde o número de testes também é muito elevado (por exemplo, quase 250.000 testes na antevéspera de Natal, numa população de 10 milhões) e onde o movimento anti-vacinas é inexpressivo, enquanto em alguns países do norte da Europa, bem como na Áustria e nos países que pertenceram à esfera soviética a resistência à vacinação é enorme? Não creio que disponhamos de utensílios teóricos para explicar esta discrepância de comportamento.
Manolo,
O seu comentário é muito elucidativo, como não podia deixar de ser, mas creio que só uma pequeníssima minoria dos que se opõem ao certificado (ou passaporte) de vacinação é movida por esses argumentos sofisticados. Quem vai para a rua opor-se ao certificado são aqueles que não se vacinaram e que, apesar disso, querem frequentar livremente bares, discotecas e espectáculos. O movimento anti-vacinas e o movimento anti-certificados são o mesmo e pelos mesmos motivos.
Jaime Breilh é uma referência latino-americana em epidemiologia crítica e no campo da saúde coletiva. Professor e pesquisador, questiona as formas hegemônicas de exercer a medicina e a ciência. Denuncia “a ditadura do paper científico” e as décadas de domesticação do pensamento acadêmico.
Com distância dos antivacinas, aponta os riscos das novas tecnologias que são utilizadas contra o coronavírus e defende “romper com a ideia da vacina como única salvação”. Propõe que se aponte para as causas da Covid-19 e afirma que, para a pós-pandemia, é urgente parar o extrativismo.
https://www.ihu.unisinos.br/78-noticias/612588-no-coracao-da-pandemia-esta-o-sistema-agroalimentar-do-capitalismo-entrevista-com-jaime-breilh
arkx Brasil disfarça, mas é antivax.
ATENÇÃO: este comentário está com sua data de validade vencida. A leitura é por conta e risco de quem o fizer.
A quantidade oficial de total mortos por COVID na China é 4.636. Este número foi contestado pela Forbes (https://outline.com/dvK767), como sendo uma completa impossibilidade estatística, médica, biológica, política e econômica.
Pergunto: por que tenho que acessar a grande mídia pró-Capitalista para me informar a respeito?
Verdade revelada: o debate sobre a COVID no âmbito da Esquerda está interditado e subordinado, sem até agora sequer se propor a ter feições próprias.
Apesar de 86,4% da população chinesa já estar completamente vacinada, para controlar um surto local o PC da China não titubeou em colocar em quarentena uma cidade com 13 milhões de habitantes.
Especulo: seriam negacionistas da “fé vacinal”?
Verdade revelada: os burocratas gestores do Capitalismo na China não ousam desafiar o potencial disruptivo do Sars-CoV-2.
Mesmo com todo seu avanço tecnológico, a China não optou por uma vacina baseada em mRNA.
Acuso: esses comunistas chineses além de tudo são anti-ciência com viés anti-vaxx!
Verdade revelada: entre “burgueses e gestores” há uma diferença irreconciliável na gestão da pandemia.
Na China o enfrentamento da emergência sanitária se apoia em medidas combinadas: testagem, rastreamento, vacinação e quarentena.
A quarentena continua sendo o centro da polêmica em quase todo o restante do mundo.
E não exatamente por violar supostas “liberdades individuais”, isto não passa de manipulação psico-social ideológica.
Para ser viável a quarentena exige subsidiar o trabalhador em casa e o empresário com as portas abaixadas.
E o Capital? Como se reproduzir sem parasitar um corpo que trabalha? Como realizar o valor produzido sem consumo?
O Capital não se acumula por si só.
Esta é a mentira oculta.
arKx Brasil,
“Mesmo com todo seu avanço tecnológico, a China não optou por uma vacina baseada em mRNA.
Acuso: esses comunistas chineses além de tudo são anti-ciência com viés anti-vaxx!”
Inglaterra e Alemanha também não “optaram” por vacina de mRNA. Você trata como se fosse opção da China. E como se naturalmente todo país “avançado tecnologicamente” naturalmente “optaria” por vacina de mRNA. A sua construção faz e quer transparecer que a China poderia ter desenvolvido vacina de mRNA mas não quis por motivo de segurança. Primeiro você teria que pesquisar se havia empresa e instituto na China que dominava e usava essa tecnologia. Por que será que a europeia Astrazeneca nao é de mRNA?
Há 20 anos essa tecnologia já é testada e usada, e o grande problema dela não era com segurança das pessoas, mas com a eficácia da vacina/remédio.
Que se tenha que usar princípio de precaução em ciência, ok. Mas o princípio de precaução deve ser usado a partir da ignorância da ciência e não da ignorância do leigo.
É engraçado que vacina de mRNA já existia há 20 anos, passaporte vacinal existe há décadas ou século (no Brasil não se pega avião pro norte do país sem passaporte vacinal desde que me conheço por gente). E agora essa cultura negacionista toma essas coisas como bandeiras, polemizam com algo que estava aí até hoje, sem nenhuma polêmica.
Ainda não vi ninguém que realmente entende de vacina de mRNA falar algo negativo sobre essa técnica, em termos de segurança.
Leo V,
Como observei em comentário anterior: o debate sobre a COVID no âmbito da Esquerda está interditado e subordinado, sem até agora sequer se propor a ter feições próprias.
Postei também uma entrevista com Jaime Breilh na qual ele fala sobre as vacinas de indução genética (mRNA ou adenovírus e DNA da proteína Spike do Sars-CoV-2).
Muito além das várias facetas do negacionismo, seja de Direita ou de Esquerda:
🦠☄
Pero la vacunación masiva no se puede apropiar de toda la reducción de gravedad y de mortalidad de la infección por SARS-CoV-2 observada a lo largo de la pandemia. Al menos tres causas, no derivadas de la vacunación, han contribuido también a la reducción de esta gravedad y mortalidad.
https://saludineroap.blogspot.com/2022/01/de-lo-que-no-se-deben-aduenar-las.html
¡Ojalá las vacunas anti-covid19 tuvieran una efectividad persistente y seguridad absoluta! Pero no es así. Son vacunas fallidas por múltiples cuestiones.
Juan Gérvas: Doce razones para exigir mejores vacunas anti-covid19 – OSALDE
https://osalde.org/juan-gervas-doce-razones-para-exigir-mejores-vacunas-anti-covid19/
arKx Brasil,
Eu li a entrevista da Jaime Breilh. E ela demonstrou não ter nenhum conhecimento sobre vacina de mRNA. Quem lê a entrevista fica achando que essas vacinas foram criadas ontem (ela fala de ver o longo prazo… quando elas já existem há 20 anos). Me pareceu discurso de leiga sobre o assunto que lê RNA e acha que elas podem afetar os genes humanos de alguma forma.
Acho que a questão não é de debate interditado (isso a extrema-direita e os bolsominions também dizem). A questão é que não dá pra ficar num debate superado, voltar no tempo, regredir.
Que a vacina é só uma parte das medidas contra a pandemia os especialistas têm dito desde o início.
Leo V,
Há cerca de 40 anos Katalin Karikó pesquisa imunizantes a base de mRNA, sempre a serviço da Big Pharma. Atualmente é VP Senior da BioNTech, empresa parceira da Pfizer.
Entretanto, os testes oficiais e autorizados em humanos são recentes, e se deram a partir do início da pandemia. A emergência sanitária fez com que milhares de pessoas se voluntariassem como cobaias.
Foi assim que apenas 5 meses depois dos primeiros casos de COVID na China, as vacinas Pfizer começaram a ser aplicadas ainda em caráter experimental.
Jaime Breilh é um epidemiologista referência em saúde pública, especializado no estudo da determinação social da saúde. Ou seja: em como as relações sociais, os modos de vida, determinam a saúde e o surgimento de doenças.
Supor ele “não ter nenhum conhecimento sobre vacina de mRNA” é um notável, e triste, exemplo de negacionismo.
Além disto, entre uma sócia da Big Pharma e Jaime Breilh não deveria haver dúvida de quem é o nosso aliado.
arkx Brasil
“Jaime Breilh é um epidemiologista referência em saúde pública, especializado no estudo da determinação social da saúde. Ou seja: em como as relações sociais, os modos de vida, determinam a saúde e o surgimento de doenças.”
Exato, ela pode ser muito boa para fazer a crítica social e apontar os determinantes sociais da doença.
Apontar que ela não é especialista em vacinas e muito menos de mRNA não é negacionismo. Não é a área dela, simples assim.
Leo V,
O negacionismo é uma das mais fortes características da Ideologia atual, presente em toda a extensão do espectro político da extrema-direita à extrema-esquerda.
Para os pesquisadores do Fascismo trata-se de oportunidade única, já que diante de nós ocorre a metamorfose do fascismo para assumir sua forma no séc. XXI.
Em sua réplica há incidência do negacionismo, ao menos por mais duas vezes. Porém meu intuito não é apontar incoerências alheias, muito menos encher o saco de ninguém.
O negacionismo quanto a vacina, seja por negá-la ou por a tomar como panacéia, tem uma função ideológica, no sentido de ocultamento das relações sociais responsáveis pela eclosão das zoonoses e de sua propagação pandêmica.
Discutir única e exclusivamente as vacinas farmacêuticas serve apenas para desviar a atenção da causa primária da COVID: as relações de produção capitalistas.
Contra isto, a única vacina possível é o movimento autônomo de massas organizado desde as bases.
Essa é questão! Sem focar nela, tudo o mais é mero negacionismo.
arkx Brasil disfarça, mas é antivax. “De esquerda”, mas antivax.
Revelador de Verdades,
Mas eu nem estou disfarçando mais! O pessoal do movimento até me pediu prá editar uns vídeos prá eles.
Se entre uma sessão e outra de revelação de verdades vc se interessar em vê-los, deixo alguns links abaixo.
https://www.youtube.com/watch?v=dJVQdnL5kPI
https://youtu.be/oD1UVmjvwaU
arkx Brasil até edita vídeos “de esquerda” para disfarçar, mas é antivax. “De esquerda”, mas antivax.
Me pergunto o que esse tipo de comentário insistente do tal Verdades Reveladas acrescenta? Aliás, desde o nick escolhido parece de extrema-direita. Prática de extrema-direita, mero troll, que escreve apenas para assediar e carimbar rótulos, para desse modo, pela insistência, marcar alguém e anulá-lo politicamente.
Não vejo diferença substancial nesse tipo de comportamento e o mero xingamento, que é proibido pelas regras desse site.
Um trabalho que vem de antes
O maior equívoco sobre a vacina é achar que o trabalho para produzi-la começou no início da pandemia — na verdade, foi bem antes. “Parece que a vacina saiu rápido, mas não foi bem assim. Se você contar o tempo em que a tecnologia para combater o vírus foi desenvolvida, são pelo menos 20 anos”, calcula Viviane. A tecnologia para combater a Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARS) já estava em andamento em 2003, quando aconteceu o primeiro surto global envolvendo um coronavírus. “A universidade de Oxford estudava o SARS-CoV. Eles fizeram fase um e dois dos estudos clínicos em humanos, mas nenhum imunizante chegou a ficar pronto porque a pandemia acabou antes”, explica a pesquisadora científica.
O coronavírus reapareceu em 2012, com a Síndrome Respiratória do Oriente Médio (MERS). Da mesma forma que em 2003, companhias fizeram testes clínicos, mas a pandemia acabou antes de uma imunização coletiva ser necessária. A tecnologia, no entanto, foi novamente aprimorada.
Quando o SARS-CoV-2 surgiu, a tecnologia para enfrentar o coronavírus já existia. O que os cientistas precisaram fazer foi adaptar a vacina para combater o novo vírus – ele possui uma proteína chamada Spike (proteína S) diferente dos coronavírus anteriores. “Na verdade, tivemos sorte que a pandemia tenha sido causada por um coronavírus, e a resposta imune contra apenas uma proteína foi suficiente para proteger do vírus”, comenta Viviane.
FONTE: https://butantan.gov.br/covid/butantan-tira-duvida/tira-duvida-noticias/a-velocidade-com-que-foi-criada-a-vacina-da-covid-19-e-motivo-de-preocupacao-especialista-do-butantan-responde
A questão da vacina vai para além das questões que já apareceram. Brincadeiras a parte, para além de se o Djokovic vai jogar na Austrália ou não, o tema anti-vax se liga a temas caros a extrema-direita/esquerda, como imigração (nesta notícia aqui: https://www.nytimes.com/2022/01/09/sports/tennis/novak-djokovic-australian-open-vaccine.html) e, por que não, a futebol: https://www.cartacapital.com.br/cartaexpressa/comunista-e-petista-bolsonaristas-lancam-campanha-contra-tite-por-nao-convocar-jogador-sem-esquema-vacinal-completo/
Para mim o imbróglio continua, devemos apenas assistir a isso ou há uma possibilidade de debate e ação mais ampla?
Para que não se confunda o receio com negacionismo vacinal: https://noticias.uol.com.br/saude/ultimas-noticias/redacao/2022/01/15/omicron-passaporte-vacina.htm?cmpid=copiaecola
Há que ser claro, e não confuso.
Leio numa notícia referente à situação em Portugal, que é um dos países do mundo com maior percentagem de habitantes vacinados:
«As pessoas não vacinadas apresentam um risco de morte três a seis vezes superior do que aqueles que completaram o esquema vacinal. Esta é uma das principais conclusões do relatório das Linhas Vermelhas publicado esta sexta-feira pelo Instituto Nacional Doutor Ricardo Jorge (INSA) em conjunto com a Direção-Geral da Saúde.
Usando como amostra o número de mortes relacionadas de complicações associadas com a Covid-19 em dezembro de 2021, o documento indica que ocorreram 171 mortes (46%) em pessoas com o esquema vacinal primário completo, 168 óbitos (45%) em não vacinados ou com a vacinação incompleta e 32 mortes (9%) naqueles que tomaram a dose de reforço.
Nos casos diagnosticados em pessoas com idade igual ou superior a 80 anos, o documento refere que “por cada 100 casos sem esquema vacinal completo, cerca de 20 casos morreram, por cada 100 casos com esquema vacinal completo, cerca de sete casos morreram e por cada 100 casos com esquema vacinal completo e a dose de reforço, cerca de um caso morreu”.
Em termos gerais, tal significa que na faixa etária em estudo, “a dose de reforço reduz o risco de morte por Covid-19 quase seis vezes em relação a quem tem esquema vacinal completo e reduz mais de 18 vezes o risco de morte em relação aos não vacinados ou com esquema incompleto”.»
A exigência de um certificado de vacinação, sem o qual não se pode entrar num certo número de lugares públicos em espaços fechados, além de constituir uma pressão para a vacinação, destina-se a garantir que os vacinados não fiquem expostos à transmissão da doença pelos não-vacinados. As restantes normas, nomeadamente o uso de máscara e o distanciamento, destinam-se a reduzir o contágio em espaços abertos, ao ar livre.
Em resumo, anti-certificado = anti-vacinas.
Dizer que se é favorável às vacinas, mas se é contrário ao certificado porque infringiria a liberdade individual, é confundir pessoa livre com inimigo da sociedade. É lamentável que aquilo a que hoje se chama «esquerda» tenha perdido a tal ponto a noção de sociedade e de interesses colectivos.
Sobre o desastre atual e como sair dele
《O que esse minúsculo vírus veio pôr em causa foi a totalidade do nosso modo de vida e da produção ocidental e capitalista.
É, pois, precisamente aí que se situa o verdadeiro acontecimento desta sindemia.
Não nos sistemas de controle que foram ampliados e aperfeiçoados, não na supervisão sanitária e disciplinar de bilhões de seres humanos, tudo isso são continuidades e revisões, mas nessa verdade avassaladora, destituinte e fundamental: o mundo, ou seja, este mundo, deve ser desmantelado.
Se é importante insistir tanto na galáxia antivax e sua proximidade com os fascistas, é porque essa galáxia é uma bolha que impede qualquer decolagem do movimento contra o despotismo sanitário.
Porque se teria, sem dúvida, conseguido atingir um nível muito superior, e para além das fronteiras, exigindo, por exemplo, o fornecimento das técnicas de fabricação da vacina.
A patente é uma ficção. Ela contém a sequência de RNA que foi publicada 2 dias depois do sequenciamento da vacina ter sido feito por amadores.
Para fazer a vacina com base em mRNA, é a técnica que conta. Como encapsulamos o pequeno fio. E isso não está indicado na patente.
Trata-se de aprender a cuidar de nós mesmos. Só a partir daí, em tempos de pandemia, encontraremos o fôlego e a força para fazer uma investida para acabar com essa sociedade patogênica.
Como construir uma ofensiva que vá além de falsas oposições, falsos dilemas? Isso pode ser tema de um texto futuro.》
https://lundi.am/Sur-la-catastrophe-en-cours-et-comment-en-sortir
A ignorância da história é uma das características dos ecológicos e dos apocalípticos. Em todas as sociedades anteriores ao capitalismo em que é possível fazer observações deste tipo, houve epidemias e pandemias devastadoras, incomparavelmente mais graves do que a covid-19 e com uma percentagem de mortes muito superior.
Hoje, e pela primeira vez na história mundial, tornou-se possível dar uma resposta 1) muitíssimo rápida, 2) coordenada e 3) global. E isto foi possível com o capitalismo. Uma esquerda que seja digna desse nome — e espero que um dia volte a existir — construirá para além do capitalismo, mas tomando como base aquilo que o capitalismo conseguiu fazer, e não pretendendo apagar o capitalismo e regressar a qualquer situação mítica pré-capitalista. Até agora só duas situações desse género foram efectivadas, e ambas com resultados apavorantes.
Antes de considerar qualquer estatística, sempre é recomendado exigir um exame de corpo delito dos dados e números. Só assim se tem garantia de não terem sido torturados, para então corroborarem uma posição já previamente definida.
No caso atual das estatísticas cruzando internações e mortes por COVID e status da vacinação, a impressão digital da manipulação estatística se revela no uso da expressão “sem esquema vacinal completo”.
Não é tão difícil desmascarar a mentira, porém é quase impossível fazê-lo com uma meia-verdade. Porque esta ao mesmo tempo que mostra, também oculta. E mostra de tal modo que se torna “naturalmente” inquestionável.
Qual a definição de “esquema vacinal completo”?
Depende do momento da linha do tempo da pandemia. E também da vacina. Para as vacinas de indução genética, começou com 2 doses e momento são 3. Em alguns países se cogita uma quarta. Quem sabe 5 ou 6. Ou mesmo vacinação periódica.
E assim, além da vacina servir como panacéia para não se abordar as causas sócio-ambientais das pandemias, fica também dissimulado algo que deveria ser óbvio.
Um índice maior de internações e mortes entre os “sem esquema vacinal completo” é inegável indicador das vacinas proporcionarem apenas um curto período de imunização.
Tempos atrozes. De referenciais embaralhados. Com muita desorientação e medo.
Há de tudo. Anti-vaxx de Esquerda e pro-vaxx de Direita. Anti-capitalistas apologistas do Capitalismo. E capitalistas defensores do socialismo.
Não serão nossas consolidadas certezas o melhor apoio para avançar além de tamanha perda de rumo. E sim a capacidade de permanente questionamento.
O Boletim que citei, do Instituto Ricardo Jorge e da Direcção Geral de Saúde, emana de duas instituições portuguesas, como eu deixei explícito. Em Portugal, a expressão «esquema vacinal completo» é usada diariamente pela totalidade dos órgãos de informação e significa que a pessoa tomou a dose de reforço. É uma expressão que não oferece dúvidas a nenhum português.
Fully vaccinated
O esquema vacinal completo atual no Brasil para a Pfizer/BioNTech consiste em 2 doses mais uma de reforço, conforme autorização da ANVISA de 24/11/2021.
Portanto, anteriormente a esta data se estava com o esquema vacinal completo com 2 doses.
Israel avalia uma quarta dose extra de reforço para os maiores de 60 anos. Dessa forma fully vaccinated naquele país implicará em 4 doses.
A vacinação em massa em Israel se iniciou em Dezembro de 2020, com quase toda a população recebendo a vacina da Pfizer/BioNTech.
Um ano depois, a dose extra está na iminência de ser adotada. Ou seja: uma dose a cada 4 meses.
Num óbvio indicativo de como a vacina proporciona um curto prazo de imunização.
arkx Brasil,
Já que critica tanto as vacinas e os cientistas, se candidate você, que certamente sabe fazer vacinas com garantia vitalícia, a desenvolvê-las. E nunca mais tome vacina para gripe, já que ela também padece do mesmo mal de ter que ser atualizada todos os anos.
arkx Brasil é antivax. Nem disfarça mais.
Há dois anos na linha de frente do combate à pandemia, os trabalhadores da área de saúde estão exauridos:
《O pior é que o povo agora quer saber qual é a cepa. Só que na atenção primária o exame é a base de reagente. Só diz se tá com o vírus ou não. Não fazemos aqui exame molecular para a determinação da cepa. Resultado, o tempo fechou e um colega foi agredido. O povo afirma que estamos manipulando os resultados para ganhar dinheiro…》
No link abaixo Carta dos Médicos e Médicas do Rio de Janeiro:
https://www.instagram.com/sinmedrj2019/p/CYwfFsluUbv/?utm_medium=copy_link
Enquanto isto, cada vez mais os referenciais se embaralham e a perda de rumo se acentua:
“É só uma gripezinha!”
“Basta vacinar de 4 em 4 meses…”
Quando a mesma linha de argumentação se estende da Direita à Esquerda, devemos estar certos da ascensão do fascismo.
Por muito tempo sempre argumentei que o maior déficit da Esquerda é não termos contra-inteligência própria.
Cada vez mais me convenço ser só falta de inteligência mesmo.
Qual foi o trabalho coletivo que você, caro Arkx Brasil, fez ao longo desses quase dois anos de pandemia, junto ou em apoio aos trabalhadores, não só vida saúde, na linha de frente (focados em salvar vidas nos leitos), nas áreas da prevenção às infecções em massa e tb dos impactos socioeconômicos da crise sanitária (do levantamento e distribuição de kits de higiene e máscaras às cestas básicas, entre outros apoios emergenciais aos setores mais vulneráveis)? No apoio aos milhões de infectados, sobretudo aqueles com casos mais graves; as centenas de milhares de pessoas mortas e, portanto, as outras milhões de pessoas (familiares e amigos) severamente enlutados (questão psicossocial que também atinge e sobrecarrega todos os trabalhadores da saúde na linha mais à frente, não apenas os da saúde mental)? Qual foi a inteligência e o correspondente trabalho coletivo que vc somou e indica no apoio direto / solidariedade real a esses trabalhadores da saúde que você cita? Qual a alternativa prática e real colocada, para se poupar preciosas vidas, em massa, que não a conscientização e o incentivo que o máximo possível de pessoas possam ter o direito a se vacinar com as vacinas devidamente certificadas nacional e internacionalmente, o quanto antes possível (mesmo cientes dos interesses econômicos da indústria e das empresas farmacêuticas transnacionais envolvidas no desenvolvimento, patentes e comercialização de muitas dessas vacinas)? Qual o esforço coletivo que você tem feito no sentido de apoiar a quebra de patentes das vacinas frutos de pesquisas sérias, ou daqueles processos de pesquisa também cientificamente sérios comprometidos com fórmulas vacinais abertas, mas que tenham condição de atingir rapidamente, com qualidade e segurança, uma escala populacional global com condições factíveis de continuar salvando milhões de vidas? Ou essas vidas não importam tanto assim na sua reflexão, proposições (quais?) e práxis (qual)?
Vacina não é remédio: imunidade para todos
O movimento anti-vaxx tem um claro componente anti-Estado, portanto anti-sistema. Porém, é evidente se apresentar inteiramente enviesado à Direita, baseado numa abstração: a liberdade individual.
Como se os indivíduos existissem em si e por si, independentes das relações sociais que os determinam. E como se “liberdade” fosse uma propriedade, e não ela própria uma forma relacional.
Por sua vez, a defesa da vacina como panacéia milagrosa apenas dissimula as causas sócio-ambientais da pandemia.
A vacina não é um remédio individual, e sim uma estratégia coletiva de imunização a ser implementada de modo rápido e abrangente.
Ou a imunização será para todos, ou não será para ninguém.
Enquanto regiões inteiras, como a África, não estiverem sob cobertura de vacinação, o vírus continuará circulando em condição de sofrer mutações.
Uma crença acrítica nas vacinas pressupõe a capacidade do mercado, a Big Pharma, de resolver as patologias por ele mesmo criadas.
Isto não acontece na Economia. E justo por isto não pode acontecer com a medicina de mercado.
Óbvio que as vacinas tem fornecido um grau alto de imunização. Mas por qual prazo?
Os dados disponíveis até o momento indicam uma necessidade de reforço da vacinação, principalmente entre os mais vulneráveis, a cada 4 meses.
Dados os mega intereses financeiros envolvidos, talvez se trate até mesmo de obsolescência programada.
Na redução das mortes e hospitalizações, além da eficácia das vacinas, também deve ser considerado:
– gigantesco número de óbitos já ocorrido;
– desenvolvimento da imunidade natural;
– queda na virulência das sucessivas variantes.
A negação de uma abordagem crítica do atual sistema de vacinação, incluindo as condições de trabalho de quem o viabiliza na ponta, é o melhor combustível para o movimento anti-vaxx.
É exatamente isto que a quase totalidade da Esquerda tem feito.
arkx Brasil é antivax. Moderado, mas antivax.
‘Verdades Reveladas’ acha que criticar o sistema de vacinação, buscando desvendar os vários elementos e interesses capitalistas que nele adentram, é ser automaticamente antivax. Que imbecil (aquele que denota inteligência curta ou possui pouco juízo; idiota, tolo)! Nada revelará… a não ser sua ignorância.
O Passa Palavra recorda aos leitores que, tal como anunciamos, “O Passa Palavra publica comentários aos textos desde que […] b) não sejam pessoalmente insultuosos […]”. Procuramos aplicar esta norma com latitude, de modo a não prejudicar o debate, mas insistimos que os leitores se abstenham de insultos.
Revelador de Verdades,
Vai tentando, uma hora vc acerta!
Por isto mesmo, sempre se deve considerar: quanto de verdade cada um de nós é capaz de suportar?
A verdade é como uma pedra. Ao ser lançada hoje nos acerta muitos anos atrás.
https://www.youtube.com/watch?v=a9mGp3FGxMc
UBUNTU
“Exu matou um pássaro ontem, com a pedra que arremessou hoje”. provérbio Iorubá
arkx Brasil,
Você está batendo num espantalho.
Quem especificamente faz panaceia com a vacina como se ela fosse o que basta e/ou como se ela fosse um remédio individual e não uma política pública de imunização coletiva? A ONU? A comunidade científica? Os epidemiologistas?
Bem pelo contrário.
Leo V,
A História nos ensina como as epidemias tem sempre colocado em xeque os pilares dos modos de produção.
Seja no Escravagismo (Praga de Atenas), no Feudalismo (Peste Negra) ou no Capitalismo (Gripe de 1918), as relações sociais reproduzem a desigualdade.
Enquanto o combate às epidemias exige imunização coletiva igualitária, ou todos continuarão expostos.
Por serem uma questão de saúde pública, as epidemias não podem ser debeladas pela rede privada. Em outras palavras: frente a elas o mercado é impotente.
Exato por isto, está inteiramente fora da maioria das análises uma abordagem das causas sócio-ambientais da pandemia. Quando este deveria ser o foco principal.
Indo além, o Estado não tem, nem mesmo o mais totalitário regime, a efetividade necessária para o enfrentamento das emergências sanitárias de grandes proporções.
Só a organização autônoma comunitária tece os imprescindíveis laços de solidariedade, através dos quais as pandemias podem ser superadas com baixa perda de vidas.
Portanto, muito embora seja um componente indispensável ao combate as pandemias, a ênfase não pode se circunscrever à vacinação.
*Carta aberta dos trabalhadores da saúde atuantes nas UBS do município de São Paulo*
À população do município de São Paulo, ao Excelentíssimo Dr Edson Aparecido dos Santos, Secretário Municipal de Saúde de São Paulo, e às Organizações Sociais de Saúde que atuam na APS do município,
Acreditamos que, durante o curso de emergências sanitárias, a reorganização do atendimento à população seja fundamental e apoiamos estratégias de ampliação e readequação do atendimento. Contudo, a execução falha (e descolada de argumentos científicos) dessas estratégias é deletéria tanto para a população quanto para profissionais de saúde, conforme explicaremos a seguir.
*Profissionais da Atenção Primária à Saúde (APS) que atuam em UBS estão trabalhando desde antes da pandemia com grande sobrecarga, o que só se deteriorou com a atual conjuntura e a demanda dos sintomáticos respiratórios.* Hoje, além de mantermos os serviços rotineiros, adicionamos ao escopo de atuação a coleta de exames relacionados aos casos suspeitos de COVID-19, suporte à vacinação, atendimento aos sintomáticos respiratórios e aos pacientes com sequelas da COVID-19;
Apesar da elevação exponencial do número de atendimentos, nunca foi oferecido, por parte da prefeitura ou das OSS parceiras, a contratação de profissionais extras para auxiliar no enfrentamento à pandemia. Pelo contrário, os funcionários responsáveis pela vacinação, coleta de PCR para COVID-19 e atendimento a pacientes com síndrome gripal foram realocados de outras funções nas UBSs, deixando profissionais de todos os setores sobrecarregados e a população sem atendimento adequado;
Psicólogos, nutricionistas e equipes de saúde bucal, por exemplo, reduziram o tempo de trabalho em suas agendas para realização do telemonitoramento de pacientes sintomáticos respiratórios – negando à população a já tão escassa oportunidade de tratamento de doenças de saúde mental, bucal e nutricional;
Agentes Comunitários de Saúde que já continuamente se expõem ao risco dessa nova doença infecciosa estão sendo deslocados para auxiliar tarefas de vacinação nas unidades e em drive-thrus, e para organização de fluxo do atendimento de sintomáticos respiratórios e filas das UBSs, com manutenção da cobrança de metas: 200 visitas domiciliares/mês, sem abatimento dos dias em que ficam nessas atividades extras das unidades ou em drivethrus;
A equipe de enfermagem vem apresentando cada vez mais sinais de exaustão por serem cobradas pela organização de fluxos de vacinação, preenchimentos de notificações dos casos atendidos, coletas de exames em pacientes com sintomas respiratórios, além de acumularem as tarefas burocráticas da unidade, sem o devido aumento do dimensionamento de pessoal;
Médicas e médicos têm sido obrigados a atenderem num ritmo em que não conseguem prestar boa assistência aos seus pacientes devido à crescente demanda pelo serviço, cumprindo jornadas intermináveis de trabalho, estando cada vez mais expostos aos riscos que essa dinâmica representa tanto à sua saúde quanto à saúde da população. Além disso, esses profissionais vêm experimentando o risco de agressões físicas e verbais por lidarem diretamente com a insatisfação da população que, pela superlotação dos serviços, acaba descontando seu descontentamento no trabalhador que está na ponta;
Diuturnamente, nos faltam insumos mínimos para atendimento de qualidade à população. Não temos medicamentos básicos para conduzir duas infecções coexistentes (COVID-19 e Influenza): dipirona, ibuprofeno, salbutamol, diclofenaco, loratadina, antibióticos acabam nas prateleiras de nossas farmácias, impactando diretamente a Assistência Farmacêutica;
Equipamentos básicos são escassos: lençol para maca, oxigênio, luvas, dentre muitos outros. Sofremos junto à população, há muitos meses, com desabastecimento de recursos essenciais para atendimentos de APS, como testes de gravidez e espéculos vaginais. Nossa matéria prima e nossas ferramentas têm sido o descaso e a miséria.
Ironicamente, mesmo com toda falta referida acima, a cobrança por metas de atendimento gerais e de alguns programas, como atenção a gestantes, voltaram de maneira truculenta. Em adição, contrariando as recomendações de distanciamento social, foi-nos imposta a retomada das atividades em grupos, o que aumenta a contaminação dos participantes.
Não há pagamento de horas extras, mesmo diante da necessidade de trabalhar exponencialmente mais. E o desfalque em nossas equipes inviabiliza o uso das horas acumuladas em banco de horas para folgas de profissionais já colapsados. Os bancos de horas estão abarrotados com um tempo que o trabalhador não consegue usufruir saudavelmente.
Muitos feriados foram cancelados para manutenção dos atendimentos de sintomáticos respiratórios; além disso, abrimos os postos de saúde diversas vezes aos finais de semana para campanha de vacinas – com equipe mínima. Recentemente, nossos empregadores nos obrigaram (e obrigam, via convocação informal por WhatsApp) a trabalhar todos os sábados em UBSs para suprir a demanda de sintomáticos respiratórios (com exceção dos ACS). Os nossos horários de descanso estão cada vez mais raros.
A comunicação com a OSS se dá via WhatsApp, sem designação formal de responsabilidade e autoria, unilateralmente e sem justo embasamento. Os avisos para comparecimento em jornadas extras acontecem sem antecedência devida
A escolha política da prefeitura de São Paulo frente ao surto de Influenza H3N2 é comunicar para a mídia, antes de comunicar a trabalhadores de saúde sobre temas importantes como datas de abertura das UBS em dias de feriado e fins de semana, datas de campanhas de vacinação etc. Algumas divulgações levam a população a acreditar que as UBS não atendem sem agendamento prévio, enquanto mesmo antes da pandemia de COVID-19 profissionais já se desdobravam para acolher e atender casos agudos e de emergência, inclusive de pessoas com sintomas respiratórios.
Durante a pandemia, esse atendimento foi ampliado por recomendação da SMS em março de 2020, para organização da demanda por cuidados e para isolamento de casos respiratórios, mas só foi possível devido a ajustes locais que todas as equipes de saúde se dedicaram a realizar por conta própria.
Diante desse quadro, exigimos que:
O comparecimento dos profissionais de saúde nas UBS nos dias de sábado e feriados não deve ser obrigatório, embora possa ser oferecido para profissionais que se dispuserem voluntariamente. Caso aceitem, deve ser realizado pagamento como hora extra (com adicional de 100%). Caso não haja profissionais suficientes, devem ser contratados profissionais plantonistas, portanto a possibilidade de funcionamento de cada serviço deve ser individualizada conforme recursos;
Ofereçam possibilidade de pagamento em horas extras aos profissionais que possuem banco de horas, sem, no entanto, obrigá-los a trabalhar essas horas e reestruturando a contratação de profissionais para períodos de emergência epidemiológica;
Respeitem trabalhadores de saúde, informando com antecedência viável e sempre de forma oficial sobre a abertura de unidades em finais de semana e feriados;
Ampliem os recursos humanos das UBS do município para esse momento de epidemia de Influenza e reponham urgentemente insumos e medicamentos essenciais para o atendimento de sintomas respiratórios e para manutenção de medidas higiênicas dentro dos serviços de saúde;
A gestão da SMS deve fiscalizar e organizar a atuação das OSS para que trabalhadoras e trabalhadores de saúde de todo o município recebam uma resposta unificada das OSS, pois profissionais contratados por OSS oferecem serviços e cuidados em saúde para a população do município de São Paulo e observam severas divergências nos serviços geridos por OSS distintas;
Espaço de diálogo permanente entre representantes de profissionais de saúde (sindicatos, instituições de categorias profissionais) e gestão (SMS, coordenadorias regionais de saúde e OSS), com periodicidade mensal.
Trabalhadores que estão no SUS o fazem porque acreditam no compromisso com a assistência à saúde da população num país desigual e socialmente desmantelado, hostil. No entanto, o que recebemos em troca é a aridez de um trabalho insalubre, exploratório, descaracterizado de sua função cidadã e alienado de seus próprios benefícios e direitos.
O SUS de São Paulo enfileira miríades de profissionais doentes, que se doaram ao máximo desde o início da pandemia. Nós não queremos ser enxergados como heróis incansáveis e indestrutíveis. Somos e queremos ser vistos como trabalhadores que, como todos os outros, precisam ter seus direitos respeitados e suas vidas valorizadas. Nós pedimos que nos
escutem, pois já não conseguimos seguir nesse ritmo.
Precisamos de mais contratações urgentemente. Precisamos de estrutura física adequada em nossas unidades. Precisamos da garantia dos nossos direitos a uma remuneração justa e do nosso descanso. Precisamos que a população saiba que do outro lado daquela fila interminável do serviço de saúde, tem um trabalhador, exausto abandonado pela Prefeitura e pelas OSS. Precisamos do apoio daqueles de quem sempre estivemos ao lado prestando assistência, ainda que na adversidade.
*Os trabalhadores da saúde do município de São Paulo pedem socorro!*
Atenciosamente,
Victor Vilela Dourado – Presidente
Sindicato dos Médicos de São Paulo – Simesp
Fernanda Lou Sans Magano – Presidente
Sindicato dos Psicólogos do Estado de São Paulo – SINPSI
Renata Tereza Gonçalves Pereira – Presidente
Sindicato dos Farmacêuticos do Estado de São Paulo – SINFAR
Jefferson Caproni – Presidente
Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos de Serviços de Saúde de São Paulo – SinSaudeSp
Maria da Consolação Machado Furegatti – Presidente
Sindicato dos Nutricionistas do Estado de São Paulo – SINDINUTRI
Elaine Aparecida Leoni – Presidente
Sindicato dos Enfermeiros do Estado de São Paulo – SEESP
José Jailson da Silva – Presidente
Sindicado dos Agentes Comunitários de Saúde do Estado de São Paulo – Sindicomunitário/SP
*
Nota do Comentador – E a esta altura um rapaz que se diz de esquerda, comentando num site de esquerda, se dizendo sensível e solidário à situação dos trabalhadores da saúde nas várias linhas de frente, segue insistindo em amenizar ou relativizar a importância da máxima vacinação em caráter de urgência, por meio da vacinação e do passaporte vacinal obrigatórios, como condição _sine qua non_ para aliviar a situação limite destes trabalhadores e trabalhadoras, e para termos alguma chance de melhor controlar está onda bem como o surgimento e a proliferação de novas cepas e variantes mais agressivas do vírus (conforme alerta global emitido pela OMS na justa data de hoje – 18/01/2022).
Confesso que já tinha visto muita loucura nesses dois anos de Pandemia e decorrente Genocídio no Brasil, mas gente de esquerda floreando para defender na prática a imunidade de rebanho, ou nas suas palavras “desenvolvimento de imunidade natural”, contra todos os estudos científicos sérios até aqui, eu ainda estava pra ter visto…
“Indo além, o Estado não tem, nem mesmo o mais totalitário regime, a efetividade necessária para o enfrentamento das emergências sanitárias de grandes proporções.”
É por isso que a pandemia comprometeu o capitalismo de Estado chinês: perdeu-se o controle sobre os trabalhadores e o regime está à beira de um colapso.
arkx Brasil,
Você mistura prevenção com tratamento.
Você acha que na nossa sociedade capitalista a prevenção de pandemias e epidemias baseada numa visão crítica anticapitalista vai ter espaço muito além do círculo de anticapitalistas?
Existe gente sim apontando as condições sociais que são fatores para pandemias. Claro que são poucas, porque poucos são os anticapitalistas, e porque o negacionismo ao “tratamento” obriga a focar em salvar as vidas no aqui e agora.
Agora, você acha que vai resolver uma pandemia em curso e salvar a vida das pessoas apontando que a raiz é o capitalismo?
Quando as pessoas precisam de uma boia pois vão se afogar você acha que é suficiente dizer que o barco virou por causa do capitalismo?
A panaceia quem faz me parece que é você, ao fazer crer que medida preventiva é medida de tratamento.
Ora, diante do negacionismo tão pandêmico quanto a doença, infelizmente temos que bater na tecla da vacinação, como um dos recursos indispensáveis para salvar vidas e combater a pandemia.
Os negacionistas de fato conseguiram isso, que os anticapitalistas também tivessem que lutar pela vacinação, perdendo tempo que poderiam usar quem sabe demonstrando melhor os determinantes sociais e econômicas da pandemia. Agora, o pior seria fazer parecido com os negacionistas e deixar a vacina em segundo plano, deixar a pandemia correr solta para ficar simplesmente apontando os determinantes do sistema capitalista na origem da pandemia.
Danilo,
Pelo visto, você tem muito ainda por ver. Por exemplo:
• em comentário anterior postei o link para a Carta Aberta dos Médicos do Rio de Janeiro.
• adicionei também um trecho de um depoimento de um trabalhador da área de saúde, atuando na linha de frente da atenção primária.
• imunidade natural e imunidade de rebanho são conceitos diferentes.
• sobre os fatores contribuindo para a queda das mortes e internações, além da vacinação, citei com link uma análise de um médico de família.
Mas se houver interesse, tem muito ainda a se ver:
👉🏼 Diários da Pandemia #28: na linha de frente – Xingu – II
https://teiadospovos.org/diarios-da-pandemia-28-na-linha-de-frente-xingu-parte-ii/
👉🏼 Diários da Pandemia #51: Devastação Épica
https://teiadospovos.org/diarios-da-pandemia-51-devastacao-epica/
*** *** ***
Bêbado,
Se por ventura desfrutar de alguns momentos de sobriedade, consulte a publicação do coletivo Chuang:
“Social Contagion and Other Material on Microbiological Class War in China”
Foi traduzido e publicado no Brasil pela editora Veneta.
Caro Arkx Brasil, eu tinha me dado ao trabalho de ler com atenção tudo que você tinha escrito antes, e agora de novo. E, por isso mesmo, fiquei abismado desde seus primeiros comentários, demonstrando tal perplexidade num crescente desde o meu primeiro comentário neste artigo (e já estou no quarto – e último). Também sei a diferença entre “imunidade natural” e “imunidade de rebanho”. E você havia se referido ao “desenvolvimento de imunidade natural”…
O que eu e o restante da torcida do Corinthians estamos aqui tentando lhe dizer, e demonstrar e comprovar, nestes comentários é que, ao negar, ou relativizar ou amenizar a prioridade urgente de uma vacinação em massa tendendo à universalização, o que passa pela obrigatoriedade pública das vacinas devidamente certificadas para todas as idades (como direito humano básico, inclusive), exigência do passaporte vacinal ao máximo possível em locais públicos de grande fluxo, entre outras medidas sanitárias imprescindíveis para a prevenção social das infecções (como o uso de máscara em espaços públicos, higienização, testagem etc), MEDIDAS IMPRESCINDÍVEIS PARA A PREVENÇÃO E CONTENÇÃO DE UMA SINDEMIA GLOBAL DESTA GRAVIDADE (cujo apelo primeiro para que nós cumpramos são os Trabalhadores das Ciências e da Saúde que nos fazem todos santos os dias…), ao tergiversar sobre essa condição elementar de vida em sociedade evocando as causas do “modo de produção capitalista” e o “contexto socio-ambiental” dessa pandemia, propondo supostas medidas alternativas e de prevenção comunitárias absolutamente irreais no momento, infactíveis frente à emergência global e, portanto, incapazes da pronta e plena resposta, em larga escala, necessária neste momento para salvar milhões de vidas e solidarizar-se, de fato, com os trabalhadores que seguem focados em nos salvar nas linhas de frente, enfim: NA REALIDADE VOCÊ ESTÁ INCENTIVANDO/REFORÇANDO COMO SUPOSTA ALTERNATIVA PRÁTICA PARA O COMBATE À SINDEMIA O ESTÍMULO AO DESENVOLVIMENTO NATURAL DE UMA IMUNIDADE DE REBANHO QUE NÃO VIRÁ SEM O CONJUNTO DE MEDIDAS PREVENTIVAS BÁSICAS ACIMA LISTADAS, COMEÇANDO PELA MAIS AMPLA VACINAÇÃO POSSÍVEL.
VOCÊ ESTÁ, NA PRÁTICA, MESMO QUE PREGANDO UM SUPOSTO ANTICAPITALISMO MAIS “INTELIGENTE”, VISIONÁRIO E RADICAL DO QUE TODO MUNDO, JOGANDO ÁGUA EFETIVA NO MESMO MOINHO DE UM SEM-NÚMERO DE NEGACIONISTAS DA EXTREMA DIREITA GLOBAL QUE, PELAS RAZÕES E TEORIAS MAIS ESDRÚXULAS, SEGUEM DESESTIMULANDO AS PESSOAS A SE VACINAREM COMO DEVERIAM – E TODOS NÓS PRECISARÍAMOS. SEGUEM MATANDO PESSOAS AOS QUILOS.
E, pra mim, é inadmissível que uma pessoa de esquerda contribua, por qualquer que seja a pirueta teórica e discursiva (a incrível estupidez dos mais inteligentes, aquela surpresa que sempre pode aparecer), na prática para seguirmos com dificuldades que as pessoas se vacinem o quanto antes e o mais amplamente possível, multiplicando a nossa exposição pública ao risco de infecções e mortes, colaborando assim à vera para a prolongamento deste pesadelo – que tantos dos nossos e nossas têm levado diariamente.
Mas eu desisto de seguir argumentando aqui, pois para tudo que escrever parece que haverá um contra argumento retórico inteligentíssimo, no papel ou aqui na web – que aceitam tudo.
Boa sorte na sustentação desse seu Castelo muito particular… Um abraço.
Leo V e Danilo,
A interdição de uma abordagem crítica das vacinas é a variante atual de um velho truque, com o qual a Esquerda sistematicamente trapaceia a si mesma.
Consiste em reafirmar um dogma: qualquer auto-crítica no campo da Esquerda serviria para fortalecer a Direita. As lições da História nos ensinam exatamente o inverso.
Outro ponto cuja centralidade vem sendo negada: o anti-Capitalismo precisa se materializar em lutas concretas, cujas formas dessas lutas são determinantes do conteúdo delas.
Não basta erguer a bandeira de ordem “Abaixo o Capitalismo”. Do mesmo modo é insuficiente um slogan do tipo: “Vacina no braço, comida no prato”.
As formas de organização e os modos de encaminhamento das lutas é o critério definidor.
《Num movimento, tanto pela terra como por teto, transporte ou por qualquer outro objetivo, a vida das pessoas tem de ser diferente desde o início, elas têm de se organizar de uma maneira que rompa com a sociedade dominante; em todas as dimensões de sua vida tem de haver mais autonomia e mais coletividade. Ou seja, as formas de organização coletiva têm desde o início de ser distintas das que vigoram no capitalismo.》
Só a organização autônoma comunitária tece os imprescindíveis laços de solidariedade, através dos quais as pandemias podem ser superadas com baixa perda de vidas.
Temos tido no Brasil diversos exemplos práticos deste tipo de lutas concretas, conforme este critério definidor: a autonomia como meio e fim no enfrentamento da pandemia.
Não é verdade que arkx Brasil é anti-vaxx, ele só está esperando uma vacina autonomista orgânica ser produzida. Uma vacina anticapitalista produzida em um território autônomo anticapitalista, pelo laboratório revolucionário com tecnologia e técnica coletivistas, e desenvolvido por cientistas socialistas. Tudo puramente autônomo.
O erro fundamental de Arkx Brasil neste debate é transpor a noção de autonomia, surgida num contexto de lutas contra a burocratização das lutas, para um debate envolvendo saúde pública e o problema de como reagir à ameaça global de um vírus. Há algum tempo, o Passa Palavra traduziu e publicou um artigo de Aurora Apolito que partia do seguinte problema: ainda que as unidades de produção estejam já sob autogestão, como edificar uma economia comunista que articule tais unidades em escala global sem recorrer ao Estado e ao mercado capitalista, garantindo ainda que sejam atendidas uma infinidade de necessidades e demandas as mais diversas, surgidas no seio da sociedade? A autora forneceu uma pequena contribuição para começarmos a pensar numa solução para o problema. Agora voltemos à pandemia: se aumentar a escala do comunismo de maneira autônoma é já um problema de enorme complexidade, pressupondo inclusive que os trabalhadores já tenham tido sucesso em apropriar-se das unidades de produção, ou seja, uma conjuntura revolucionária, de que maneira os trabalhadores, sem estarem praticando a autogestão em grande escala, ou praticando a autonomia nos termos propostos por Arkx Brasil, seriam capazes de, num curtíssimo espaço de tempo, promover em escala global o distanciamento social, isolar os infectados, erigir rapidamente hospitais de campanha, promover uma testagem o mais ampla possível, distribuir medicamentos e equipamentos médicos e hospitalares, dirigir e coordenar centros de pesquisa, laboratórios, etc., promover campanhas educativas, coordenar esforços e injetar recursos colossais no desenvolvimento, testagem e distribuição de vacinas, etc.? Porque, se a autonomia de Arkx Brasil não fornece uma resposta rápida para tais problemas, então ela não responde às necessidades do contexto histórico em que vivemos. É mero “se assim fosse…” ou “gostaria que…”. É mera aspiração.
Fagner Enrique,
Ufa! Enfim uma crítica baseada no que escrevi, e não a partir de leituras enviesadas.
Jamais me coloquei contra a vacina. Ao contrário, assinalei-a como indispensável. Além disto há vacina e vacinas, e mesmo outras vacinas.
O inadmissível é abrir mão da crítica, não só às vacinas como ao que quer que seja. Só assim mantemos nossa autonomia.
Autonomia não é “uma noção surgida num contexto de lutas contra a burocratização das lutas”, apesar de ser o único antídoto contra todos os tipos de burocratizações.
Autonomia é um modo de viver fundado em: auto-organização, auto-gestão, auto-suficiência e auto-defesa. E só se viabiliza através da auto-disciplina e da auto-crítica.
Compreendida como meio e fim, a autonomia é a forma pela qual se materializa como processo a Revolução.
Em sua crítica há uma apologia, mesmo inconsciente, ao Capitalismo. Todas as medidas citadas (desde hospitais de campanha até “injetar recursos colossais”) se enquadram no modelo de gestão capitalista da pandemia.
Após 2 anos de morticínio, o critério da prática nos mostrou ser um modelo fracassado. Ao menos no que tange a salvar vidas. Já os negócios vão cada vez melhor. A Big Pharma agradece.
Este tipo de apologia deriva de um dogma clássico: o desenvolvimento das forças produtivas gera as condições necessárias para a Revolução, que só pode acontecer num contexto de Capitalismo avançado.
A História tem impiedosamente desmentido este dogma, pois seu postulado foi ignorado por todas as Revoluções Socialistas até hoje ocorridas.
O desenvolvimento das forças produtivas capitalistas a nada mais conduz, a não ser a mais do próprio Capitalismo.
Justo por isto, o outro ponto central de sua crítica é uma bem conhecida falsa questão: a escala.
Trata-se de uma exigência intrínseca do modo de produção capitalista, não para tornar mais acessíveis as mercadorias produzidas, e sim para compensar a composição orgânica do Capital.
Quanto mais cresce o capital fixo, maior precisa ser a produtividade e a escala de produção para tentar ao menos freiar a insustentável queda da taxa de lucro.
Como se dá então um enfrentamento da pandemia fundamentado na autonomia?
Temos vários exemplos. Desde o Zapatistas e o Curdistão (sempre constantes referências), indo até o Vietnam, com algumas surpresas na China, voltando aos muitos casos aqui mesmo no Brasil. E com certeza muitos outros exemplos em muitos outros lugares.
São experiências locais, restritas, incompletas, deficientes e contraditórias? Por certo! Autonomia é sempre relativa, tampouco é um estado e sim um processo.
Ainda acossados pela COVID, e frente às inevitáveis futuras zoonoses, nada pode ser mais importante do que conhecer essas experiências, refletir sobre elas e divulgá-las.
Para que possam ser inspiração, para que se fortaleçam e para que se articulem em redes.
👉🏼 https://teiadospovos.org/category/diarios-da-pandemia/
arkx Brasil,
Isso significa que vc não é anti-vaxx mas está anti-vaxx? Até que uma auto-vacina produzida auto-suficientemente em território autônomo apareça?
“Überzeugungen sind gefährlichere Feinde der Wahrheit als Lügen.” – Nietzche
arkx Brasil bugou.
Resolver pandemia em escala mundial em alta velocidade olhando para zapatistas e curdos!
Muito sem noção.
Geral tá sacando: arkx Brasil é antivax. Autonomista, mas antivax.
Hoje (20/01/2022), o Brasil bateu novo recorde de novos casos diários de Covid-19, com 204.854 confirmados em 24h (cf o insuspeito de esquerdismo apocalíptico Portal R7 – https://noticias.r7.com/saude/brasil-bate-recorde-de-novos-casos-de-covid-19-com-204854-em-24h-19012022).
Eu fico imaginando um Trabalhador ou uma Trabalhadora da Saúde numa megalópole como SP, à beira do burnout após dois longos e exaustivos anos à linha de frente contra a sindemia, e às vésperas de um novo pico nesta terceira onda sob predominância da variante Ômicron, em meio ao impasse vital entre pararalisar esgotado ou ter que seguir trabalhando mais que no limite (pra salvar novas inumeráveis vidas), tendo que lidar (e se proteger) de um lado com muitos bolsonaristas negacionistas atuando contra a vacinação, suas doses de reforço e, agora contra tb a necessidade prementes de vacinação infantil (um “infanticídio”, nos termos da mais nova propaganda infodêmica da necropolítica bolsofascista); mas de outro lado, ou na mesma fila da UBS lotada, uma pessoa, em local público, possivelmente tendo se movido pra lá de transporte público, via de regra lotados, sugerindo que o farol / solução à esquerda “autonomista” para nossas emergências pandêmicas seria mirar no exemplo de alguns enclaves em Chiapas, no Curdistão e/ou no link da teiadospovos. (sem qualquer demérito dessas experiências comunitárias localizadas…)
Mas pensar na situação do médico, dos demais cidadãos minimamente mais sensatos (tentando se proteger com máscara adequada e álcool em gel) dividindo a mesma fila, o mesmo espaço público urbano lotado, o mesmo busão ou trem lotados com… É de chorar.
Fico cá me perguntando se as lutas autônomas dependerem deste tipo de “trabalho de base” tão sedutor quão convincente (terraplanismo autonomista?), como estarão elas no próximo ciclo pandêmico ou pós pandêmico… Com quens e de quais formas poderá se contar no cotidiano, por exemplo, aqui na aldeia de SP…
A crença religiosa de arkx Brasil numa solução “autônoma” para o flagelo da pandemia me fez lembrar Paul Mattick:
“Um revolucionário não pode deixar de, de tempos a tempos, se encontrar à margem da situação. Crer que uma prática revolucionária, exprimindo-se através da acção autónoma dos trabalhadores, é possível em todos os momentos, significa aceitar as ilusões democráticas.”
(Paul Mattick, “Karl Kautsky: De Marx a Hitler”)
Trocando em miúdos: fora de uma situação revolucionária o que arkx propõe não passa de uma bela carta de intenções. É que maioria numérica dos trabalhadores não se exprime diretamente como força social. Crer nisto é “aceitar as ilusões democráticas”.
Isso, no entanto, não é um convite ao imobilismo. Mesmo com sua debilidade os trabalhadores podem arrancar aqui e ali concessões ao capital – vacinas, homeoffice, protocolos sanitários nos locais de trabalho, etc. É o fim do capitalismo? Nem de longe. Mas não é exatamente isso a luta de classes?
Quem procura atalhos na luta de classes pode até chegar mais rápido – mas onde?
Danilo,
Você me parece uma pessoa sinceramente envolvida com o imenso desespero dos trabalhadores da saúde, aqueles na linha de frente da luta.
Em comentário anterior indiquei 2 links, e poderia ter acrescentado outros, sobre o cotidiano de quem combate a pandemia na ponta.
Conheço pessoas assim, me relaciono com elas.
Do mesmo modo que vc tomou minha defesa de uma imprescindível abordagem crítica das vacinas como negacionismo anti-vaxx, vc agora outra vez incorre no mesmo tipo de incompreensão.
O ponto central de minha argumentação é:
• o enfrentamento à pandemia, como de qualquer outro sofrimento decorrente do Capitalismo, só pode ser minimamente bem sucedido caso se dê a partir da organização autônoma comunitária.
E quanto a isto, “trabalho de base” não é fazer proselitismo em UPA, ou qualquer outro local.
Este é outro já bem conhecido erro da Esquerda. A consciência política não vem de fora para dentro, por obra e graça da catequese de alguma vanguarda iluminada.
É da luta concreta que floresce a consciência política. Não se trata de conscientizar para que então se possa lutar. É ao contrário: trata-se de participar de lutas concretas, para então gerar a consciência.
Não é a consciência que determina o ser social, e sim este que determina a consciência.
Um terrível exemplo disto se tem aqui nesta área de comentários.
O PassaPalavra se propõe a ser um coletivo propugnador da Autonomia.
Entretanto, exceto por minhas postagens, as quais são motivo de polêmica, não há sequer um único comentário a respeito da Autonomia como meio e fim no enfrentamento à pandemia.
Enquanto abundam exemplos de posturas de Direita e pró Capitalismo.
Disto temos como pior exemplo o trecho abaixo:
《 Hoje, e pela primeira vez na história mundial, tornou-se possível dar uma resposta [às pandemias] 1) muitíssimo rápida, 2) coordenada e 3) global. E isto foi possível com o capitalismo. 》
Dado os milhões de mortes e sequelas ocorridas até o momento, deveria ser desnessário refutar tal tipo de afirmação.
Mas fiquemos só no tema subjacente a este post: a vacinação.
• Apenas 60% da população mundial recebeu pelo menos uma dose de vacina.
• África é o continente com menor vacinação (12,5%).
• Somente 9,6% da população dos países de baixa renda recebeu ao menos uma dose da vacina.
Esta é a resposta “rápida, coordenada e global” do Capitalismo à pandemia.
Haja negacionismo!
https://ourworldindata.org/covid-vaccinations
Não gosto de perder tempo com inutilidades. Ora, as fantasias que pretendem despovoar as cidades, desmantelar as indústrias e fazer as pessoas regressar aos campos são totalmente impossíveis de realizar. São ridículas também, porque usam para se difundir aqueles mesmos meios, a internet e as redes sociais, estritamente decorrentes das forças produtivas que dizem odiar. No entanto, apesar de risíveis e condenadas ao fracasso, podem ter efeitos perniciosos em certas conjunturas, como a que vivemos actualmente. O capitalismo permitiu um crescimento populacional espectacular e aumentou muitíssimo a esperança média de vida. Conseguiu-o por muitas razões, mas importa aqui destacar duas: a generalização de infra-estruturas sanitárias e o desenvolvimento da medicina e dos hospitais. Se compararmos os efeitos da actual pandemia do covid-19 com os resultados das grandes pestes e epidemias nas sociedades pré-capitalistas, se compararmos as taxas de mortalidade, medimos aquilo que a este respeito se alcançou na sociedade capitalista. Uma esquerda socialista ou comunista ou como lhe queiram chamar, digna deste nome, pretende construir para além do capitalismo, mas a partir do capitalismo. Até porque as relações sociais de luta, que são a base de toda a possível autogestão, são relações de luta no capitalismo, que surgem e têm a sua razão de ser no ambiente tecnológico capitalista. As máquinas e toda a gama de forças produtivas não são por si só determinantes. Também a domesticação do fogo, que inicialmente e durante muito tempo serviu de base social a sacerdotes e feiticeiros, laicizou-se depois e foi inserida, com outras conotações e outros efeitos sociais, em todos os sistemas tecnológicos posteriores. O mesmo com a roda e com a totalidade das inovações técnicas que se seguiram. Foram inseridas, ou puderam sê-lo, noutras tecnologias, tal como as palavras podem passar de uma língua para outra e obedecerem à sintaxe da língua em que se inserem. É lamentável que tenham sido necessários tantos comentários para defender o que neste momento é mais urgente: a vacinação contra a covid e o respeito pelas normas sanitárias, que são aquelas que hoje existem e aquelas que se conhecem e estão disponíveis, e não as que decorreriam algum dia de milenarismos apocalípticos.
https://noticias.uol.com.br/colunas/jamil-chade/2022/01/21/sem-quebrar-patente-farmaceuticas-terao-receita-de-meio-trilhao-com-vacina.htm
“Sem quebrar patentes, farmacêuticas terão receita de R$ 460 bi com vacinas”.
Mais um exemplo da resposta “rápida, coordenada e global” do Capitalismo à pandemia.
Daqui a pouco vai ter gente defendendo a ‘meritocracia’ das farmacêuticas que fizeram as vacinas de colher os lucros de seu empreendimento, simplesmente porque é assim que existe e se está disponível as vacinas…
Sei que não pensam assim, mas como todo mundo tá se batendo sem motivação nenhuma. Não entendendo a argumentação um do outro. Inventando ‘antivax’ onde não tem. Segue minha contribuição para a briga de bêbados.
Que tal postar uma comentário hoje, para somente alcançar seu objetivo ontem?
Talvez assim se possa considerar o que João Bernardo, ele mesmo, já nos mostrou:
《Cada modo de produção produz uma tecnologia específica, expressão e realização das suas contradições próprias.》
《Longe de serem independentes das determinações do capitalismo, as forças produtivas constituem, ao contrário, uma expressão material e direta das relações sociais do capital. 》
《Por isso a expansão de dadas forças produtivas facilita e apressa o desenvolvimento das relações sociais que as condicionam, e não de quaisquer outras. O desenvolvimento, das relações sociais de tipo novo, antagônicas das hoje prevalecentes, vai por seu turno constituir a condição prévia ao aparecimento de uma nova tecnologia. 》
《É certo que elementos de uma tecnologia, tanto tipos particulares de organização como utensílios e máquinas, podem vir a ser isolados do contexto geral em que surgiram e a que haviam pertencido e passarem a integrar outras tecnologias, de que se tornam então elementos componentes.
Porém, em primeiro lugar, isso acontece exclusivamente com técnicas particulares, e nunca com o sistema tecnológico globalmente considerado.
Em segundo lugar, nem todas as técnicas são suscetíveis de tal processo de desestruturação e reestruturação, e a análise histórica mostra que isso tem até ocorrido com um
número relativamente reduzido de técnicas particulares.
Em terceiro lugar, cada técnica não é uma forma estagnada e definitivamente fixada, mas caracteriza-se precisamente pela evolução e pelas mudanças que sofre, no interior das transformações globais do sistema tecnológico em que se integra.
Isolada do sistema converte-se num fóssil. E, integrada em outro sistema, passa a desenvolver-se de outro modo, para em breve se tornar uma técnica diferente. 》
《 Não há qualquer caso de um modo de produção fundado sobre o sistema de forças produtivas do modo de produção anterior. 》
O Capitalismo não representa nenhum “progresso”, como as fábulas da burguesia nos fazem crer.
Os dados e pesquisas mostram exatamente o inverso: nunca a desigualdade foi tão grande, disseminada e profunda.
Além de nunca ter havido tamanha e tão rápida destruição de recursos naturais, causando uma crise climática sem precedentes.
Também é inédita a grande possibilidade de uma guerra (tão necessárias ao Capital para sua reciclagem) capaz de inviabilizar nossa existência no planeta.
O estudo da História é, de fato, nossa melhor arma. Contudo, tal estudo não pode ser seletivo, visando apenas corroborar antigas e calcificacas certezas. Pelo contrário, deve colocá-las à prova. Para serem feitas as devidas correções, se for o caso.
Neste sentido, cabe pesquisar como foi debelada no séc. XIX (já sob o Capitalismo) a epidemia de Cólera na Europa. E antes destas, as epidemias de Escarlatina e Tifo.
Ou o surto de leptospirose em Cuba (2011).
No Brasil, temos os exemplos:
– febre amarela, na Bahia (1850 a 1852);
– cólera, no Pará, Recife e Rio de Janeiro (1855);
– febre amarela, no Rio de Janeiro (1870, 1873, 1875 e 1877)
– peste bubônica, Rio de Janeiro (1900);
– varíola e tifo, Bahia (1918 e 1925);
– meningite meningocócica, Guaratinguetá (1974).
– leptospirose, Cuba (2011).
– dengue, São José do Rio Preto e Macaé (2007/2012).
A principal lição a ser aprendida com a pandemia de COVID, vem do óbvio apelo que a História nos faz: mudem!
“In the long run we are all dead” – John Maynard Keynes
Daora arkx Brasil pagando de farol da revolução.
Tem uma pá interesses econômicos e geopolíticos por trás das vacinas, muita treta entre grandes farmacêuticas e governos pra ver quem sai por cima na pandemia.
Vacina não chega direito nos países mais pobres.
Tá viajando quem não manja disso.
É o capitalismo, estúpido!
Ninguém precisa de arkx Brasil botar a cara aqui com esse migué de “capacidade de permanente questionamento”, “epidemiologia crítica”, “abordagem crítica” e o iscambal pra saber.
Fazer o quê então? Colar com trabalhador da saúde, chegar junto dos parça que tão na linha de frente? Pressionar governos para darem vacinas a países pobres?
Não!
Olhar pra Chiapas, Curdistão e umas comunidades rurais, copiar o que tão fazendo e pronto. Partiu revolução!
Faz mili duque geral dizia “olha pra União Soviética”, “olha pra Cuba”, “olha para a China”, “olha pro Vietnã”, “olha pra Coreia do Norte”, “olha pra Gana”, “olha pra Angola”… Tava pronto o caminho da revolução!
Quem meteu o loko de paga pau da revolução dos outros terminou se lascando. Miou tudo. arkx Brasil quer fazer a mesma coisa. Na revolução dele tem essa brisa de “terra e território” igualzinho o povo da Teia dos Povos que ele paga pau, mas a fita é igual, copiar a revolução dos outros.
Daora isso de ficar atrás do teclado vermelho cagando regra da revolução mundial, não é? Dá uma “solução”, depois mete o dedo na cara todo mundo chamando de “capitalista” porque geral não colou na sua fita. Assim até minha coroa é revolucionária!
Eu vou é dar linha na pipa porque, na real, farofeiro revolts causando na internet pra mim passa longe e eu tô na correria. Trocar ideia é bom, bater tambor pra maluco não.
arkx Brasil é antivax. Avestruz, mas antivax.
Eu sou daqueles que reconhecem os avanços irrefutáveis e irreversíveis do capitalismo relativamente aos modos de produção anteriores e que pretendem, partindo do atual estado de coisas, lutar por uma sociedade urbano-industrial da abundância, só que pós-capitalista, uma que permita o livre desenvolvimento de todos e de cada um mediante relações sociais coletivistas e igualitárias. Ou seja, sou daqueles amantes do progresso que, em vez de uma “fábula da burguesia”, é uma aspiração que guiou a ação revolucionária de milhares, milhões de trabalhadores ao longo da história do capitalismo. Este debate não é de bêbados que não se entendem, mas de pessoas deixando muito claro o abismo que as separa. Mas, enfim, o progresso depende da universalização da vacinação e da exigência de certificados e passaportes vacinais, bem como da testagem o mais ampla possível, do distanciamento social, do isolamento dos infectados e do tratamento dos doentes em unidades hospitalares bem equipadas e bem abastecidas de tudo aquilo que hoje são as empresas capitalistas quem fornece. Essa é a realidade imediata, que não será modificada por ilusões de regressão social e cultural nem pela nossa vontade pura e simples. Defender qualquer coisa que vá na direção contrária é ir na contramão da história e na contramão dos interesses da classe trabalhadora e da sociedade em geral. Aliás, seria bom que os anticapitalistas não se esquecessem de que uma revolução proletária só ocorre quando os interesses da classe trabalhadora em luta contra a exploração confundem-se com os anseios da maioria da população.
É ignorância comparar a pandemia de COVID-19 com outras epidemias e pandemias históricas, de antes das medidas higienistas de saúde pública e da teoria microbiana das doenças. As duas combinadas atacam doenças infectocontagiosas com maior eficácia.
Antes delas, doenças como varíola, cólera, febre amarela e peste bubônica eram sentenças de morte. Existem dados sobre varíola em Salvador:
“Um dos mais graves surtos epidêmicos [de varíola em Salvador] irrompeu em 1897, quando 4.575 pessoas foram acometidas pela varíola [2,62% da população soteropolitana em 1890] e 1.676 foram a óbito [36,63% dos casos]. As taxas continuaram altas no ano seguinte: foram 780 casos [0,45% pop. 1890] e 168 obitos [21,53% dos casos]. […] A varíola retornou a Salvador em 1904, alcançou proporções epidêmicas entre 1908 e 1910 e assolou a cidade outra vez em 1919 e 1920. Só em 1909 os serviços municipais de saúde começaram uma campanha de vacinação, financiada com recursos do estado. Entretanto, as campanhas eram apenas esporádicas e grande parte da população permanecia sem vacinação. O ano de 1919 testemunhou uma devastadora epidemia de varíola, a mais trágica do estado. O governo federal interveio. Como a legislação federal de vacinação compulsória não vigorava devido à resistência popular, as autoridades federais anunciaram que só as pessoas portadoras de um certificado de vacinação seriam autorizadas a viajar entre os portos brasileiros.
Em 1919, nem bem a cidade descansou das turbulências causadas pela gripe espanhola (1918) e se deparou com outra epidemia de varíola. Essa epidemia matou muito mais pessoas do que a gripe espanhola, porém a gripe teve mais repercussão (talvez por seu caráter pandêmico) com uma posição de destaque em termos de produção histórica. Entre junho e dezembro daquele ano [1918], 4.612 pessoas [1,63% pop. 1920] foram acometidas pela varíola e 2.804 [60,79% dos casos] morreram pela doença. O primeiro posto federal de vacinação na Bahia foi aberto em setembro de 1919 e os casos de varíola desapareceram gradativamente do estado durante a década de 1920.”
(Fonte: Museu Interativo da Saúde na Bahia – http://www.misba.org.br/epidemia/epidemias-em-salvador-bahia/epidemia-de-variola/)
Quem leu Capitães De Areia sabe como a população sentiu esses surtos.
Qualquer análise histórica sobre as epidemias e pandemias citadas revela padrão parecido: altas taxas de mortalidade antes da saúde pública moderna e da teoria microbiana; redução, ou mesmo erradicação dos casos de doenças infectocontagiosas endêmicas cujos agentes patogênicos foram estudados, e para os quais foi desenvolvida alguma vacina ou outra medida preventiva.
Hoje a taxa de mortalidade de COVID varia muito entre os países. O pior caso é o do Yemen, com taxa de mortalidade de 19% sobre o número de casos. Depois tem Peru (7,5%), México (6,7%), Sudão (6,3%), Síria (5,8%), Somália (5,5%), Egito (5,5%), Equador (5,4%), Taiwan (4,7%), Afeganistão (4,6%), Bósnia e Herzegovina (4,3%), China (4,2%), Libéria (4%), Bulgária (3,8%), Myanmar (3,6%), Níger (3.5%), Indonésia (3,4%), Paraguai (3,3%), Macedônia do Norte (3,3%) e Tunísia (3,2%). Os dados são da Johns Hopkins University: https://coronavirus.jhu.edu/data/mortality .
Estamos muito melhor hoje que no passado. Por favor, vamos debater com um mínimo de informação adequada.
Esse mundo desmoronando, esfacelado e próximo da extinção é sintomático na esquerda apocalíptica, um perigo mortal nos ronda!
O que fazer? Se insular na Ilha da Bem Aventurança entre os puros cheios de instintos heróicos (ou de mártires?)e munidos da palavra sagrada, esperarão um próximo século, pois são homens que não pertencem a esse tempo, quando a hora chegar e o mundo estiver em decomposição e o governo do anti-cristo estiver agonizando, os insulares Bem Aventurados aparecerão com a palavra sagrada, ou melhor, com o programa revolucionário e tirarão toda a humanidade da escuridão em que ela se encontra, conduzindo-os a um bom fim, ao Milênio,( ou o Reich de mil anos?)
O decadentismo da virada do séc. XIX para o XX, e que alimentou o imaginário fatalista dos fascismos, foi o último sopro de agonia da decadente aristocracia, que perdia irreversivelmente o poder político, o seu último bastião de poder a época. O que acontece agora com o decadentismo nas fileiras ditas marxistas é muito similar com o decadentismo conservador da virada do século, quem agoniza hoje é o apparatchik bolchevique que decaiu no final dos anos 80 e vê na sua queda a decadência do capitalismo. Alguns são tão criativos e tão devotos, e para manter a sua devoção, usam a seu modo, uma nomenclatura marxista mínima para dar seriedade as suas palavras, esses “marxistas” acreditam que estamos em um desenvolvimento histórico regressivo, ou seja, que progressivamente o capitalismo está se desintegrando pelos seus próprios mecanismos, por um câncer maligno que tomou conta do seu corpo. (Já vi essa mesma tese em territórios nebulosos como: em Rene Guenon, o ocultista do tradicionalismo, “A Crise do Mundo Moderno”; ou podemos lembrar dos modernistas reacionários e a sua espiral em declínio. É curioso e tosco só conseguir entender o que pensa uma certa esquerda, extema-esquerda, ultra-esquerda, tomando como referência as Ciências Ocultas e a nova era(novo ciclo) do modernismo reacionário. Não entender os mecanismos de funcionamento do capitalismo acaba criando, dentro das fileiras do proletariado, os ideólogos do capitalismo, que confundi autocrítica do modo de produção em que vive com estar vivendo em um mundo em decadência. Mas assim como os aristocratas, os apparatchiks irreversivelmente não voltarão a idade de ouro perdida, vão construir somente espaços micros de vivências míticas e cheios de apetrechos místicos a espera das próxima revelações, que sempre chegarão, hoje é o coronavirus, amanhã um outro desastre comprovando o fim iminente de um corpo social doente, biologizando a história.
Acredito que o socialismo deva ser a superação do capitalismo pela subsunção revolucionária da classe trabalhadora daquilo que de melhor produziu a humanidade e através da luta de classes, e não restabelecer um mundo pre-capitalista em um território ideal livre das impurezas do capitalismo e de toda a história.
Não é brincadeira o novo grave momento da sindemia que o país está passando, neste início de 2022, com uma terceira onda muito contagiosa, sob predominância da nova variante Ômicron, ainda sob estudo e monitoramento. E a insistência de algumas pessoas, grupos sociais, uma parte significativa de “médicos”, além de uma ampla gama de “autoridades” federais, começando pelo miliciano que nos desgoverna, negando a importância urgente da vacinação em massa, tendendo à universalização, para todas as idades.
Ontem (22/01/22), o país bateu pelo quinto dia consecutivo o recorde de casos diários, testados e confirmados de Covid-19, de novo acima dos 200 mil em 24 horas, e sabemos que este número na realidade é muito maior, pois a maioria das pessoas infectadas não testam. E, mesmo se quiserem testar, a testagem já começa a rarear de novo. Isso somado ao apagão de dados confiáveis em partes dos sistemas do Ministério da Saúde e do SUS.
Neste contexto, também ontem, se por um lado foi dado início à vacinação infantil mais ampla em Estados populosos como São Paulo, por outro o presidente da república voltou a minimizar os riscos da doença para as crianças, convocando e insuflando de novo suas milícias físicas e digitais, municiando-as com as fake news de praxe, para seguirem sua espécie de cruzada contra a vacinação de forma geral, e a vacinação infantil em especial. O bolsonarismo precisa de uma mobilização permanente de suas bases sociais contra algum inimigo real ou imaginário, alguma forma de conspiração – como se não fosse o próprio que conspirasse cotidianamente contra a vida de nossa própria população.
Isso poderia parecer “apenas” mais uma bravata do fascista, mas a gravidade desse modus operandi recorrente vai muito além. Quem tem sentido o saldo mais letal dessas campanhas infodêmicas são, sobretudo, os estados e regiões do país onde o bolsonarismo e seu negacionismo necropolítico ainda tem muita força (especialmente as mais pobres, como por exemplo na Norte), inclusive entre profissionais da saúde.
Porém mesmo em regiões crescentemente desiludidas em relação à sucessão de groselhas do capitão, não é raro você ouvir dúvidas em conversas cotidianas pelas ruas do tipo: “as pessoas estão se vacinando várias vezes e continuam pegando, será que esta vacina funciona mesmo?”; “as crianças têm imunidade natural alta contra a Covid-19, por que obriga-las a se vacinar?”; “não é arriscada esta vacina produzida tão rápido, agora pra criança tb?”; etc.
E tem método, técnico e oficial, essa “loucura”. Ontem também, por outro exemplo, ficamos sabendo da existência de: “Nota técnica do MS coloca cloroquina como eficaz e vacina como não efetiva”
Brasília
22/01/2022 14h52
A nota técnica publicada pelo Ministério da Saúde para barrar as diretrizes que contraindicam o uso do chamado “kit covid” classifica a hidroxicloroquina como eficaz para o tratamento contra a covid-19 e afirma que as vacinas não demonstram a mesma efetividade, contrariando uma série de estudos e orientações sanitárias pelo mundo.
A nota é assinada apenas pelo secretário de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos em Saúde da pasta, Hélio Angotti Neto. O documento barra as diretrizes que contraindicam o “kit covid” no tratamento ambulatorial e hospitalar da doença e outras duas normas, mantendo o País sem uma recomendação oficial de como tratar pacientes de covid com quase dois anos de pandemia.
(Conforme: https://www.uol.com.br/vivabem/noticias/agencia-estado/2022/01/22/nota-tecnica-do-ms-coloca-cloroquina-como-eficaz-e-vacina-como-nao-efetiva.htm )
É isto mesmo que está escrito acima: chegando a quase 2 looongos anos de sindemia no país, mais do que comprovadas a importância vital da vacinação em massa para prevenir e amenizar os impactos sanitários e vitais da crise, bem como a ineficiência criminosa dos chamados “kit covid”, também conhecidos como “tratamento precoce”, Uma Nota Técnica oficial (endereçada pra toda Rede SUS do país) publicada pela Secretaria de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos em Saúde do Ministério, insiste na orientação e promoção genocida de negar a eficiência da vacinação e, ao mesmo tempo, afirmar a eficácia do experimento eugênico dos “kit covids” (contraindicado pela quase totalidade dos estudos científicos mais sérios mundo afora).
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Ato-contínuo, parte da Comunidade Científica e Médica Brasileira tem tentado se organizar para mais uma resposta prática, tanto técnica como política, ao crime continuado de genocídio praticado ativamente por muitos deste Governo Federal. Neste sentido, um esboço de Carta Pública foi feito ontem, e começa a circular nos grupos de enfrentamento da sindemia e apoio aos trabalhadores/trabalhadoras de saúde, às vítimas, seus familiares e amigos também. Segue o pré-documento:
“Nós, docentes, profissionais de saúde e pesquisadores brasileiros, vimos mostrar nosso repúdio à publicação da NOTA TÉCNICA Nº 2/2022-SCTIE/MS pela Secretaria de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos em Saúde do Ministério da Saúde, que trata da FUNDAMENTAÇÃO E DECISÃO ACERCA DAS DIRETRIZES TERAPÊUTICAS PARA O TRATAMENTO FARMACOLÓGICO DA COVID-19 (HOSPITALAR E AMBULATORIAL):
a) Os profissionais de saúde, que, unidos à população brasileira, mantivemos nosso País funcionando mesmo nas situações mais críticas, demos o melhor de nós frente ao desafio representado pelo enfrentamento da pandemia de COVID-19;
b) Contribuímos significativamente para elaborar medidas voltadas ao manejo das pessoas adoecidas, para o desenvolvimento de protocolos eficazes de tratamento, para o desenvolvimento e teste de vacinas e para o entendimento dos efeitos da COVID-19 em diferentes órgãos e sistemas;
c) Os esforços de nossos profissionais da linha de frente e de nossos pesquisadores tornaram possível o tratamento de milhares de pessoas afetadas, bem como auxiliaram a colocar nosso País entre os centros de pesquisa do mundo que mais contribuíram para o entendimento da COVID-19 (7287 publicações indexadas na plataforma Web of Science até 22/01/2022);
d) Neste cenário, nos sentimos perplexos quando lemos a vasta lista de estultices apresentada pela nota técnica em epígrafe. Resumidamente, a nota rejeita as normas de tratamento recomendadas por pesquisadores e médicos com experiência no tema, em favor de tratamentos não validados. Para facilitar o leitor sugerimos ir ao documento original (http://conitec.gov.br/images/Audiencias_Publicas/Nota_tecnica_n2_2022_SCTIE-MS.pdf) e observar a tabela da página 24, que, em nosso entender, é um exemplo primoroso de desinformação em saúde, ao apontar evidências conclusivas de efeitos positivos da cloroquina e negar a certeza dos benefícios das vacinas.
É espantoso que o Ministério da Saúde recuse normas propostas elaboradas por um grupo de pesquisadores, convocados pelo próprio Ministério, criando uma situação sem precedentes em nosso País.
Causa enorme preocupação o fato de que as rédeas do Ministério da Saúde estejam sob a posse da ideologia, da desinformação e, principalmente, da ignorância. O comportamento do Ministério da Saúde transgride não somente os princípios da boa Ciência, mas avança a passos largos para consolidar a prática sistemática de destruição de todo um sistema de saúde;
e) Considerando o acima exposto, solicitamos de forma urgente que as normas de tratamento hospitalar e ambulatorial da COVID-19, elaboradas pelo grupo representativo de especialistas convocados pelo Ministério da Saúde e aprovadas pela CONITEC, sejam adotadas pelo Ministério da Saúde em benefício da Saúde do povo brasileiro.”
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A gravidade da situação, a perplexidade diante do inominável, junto à vergonha de fazer parte de uma Sociedade/Comunidade compartilhada por cidadãos, técnicos e políticos agindo com tamanha irresponsabilidade para com a vida de nossa população, e assim na prática aprofundando, sem maiores pudores, um processo genocida que já nos levou oficialmente mais de 623 mil pessoas, foi também resumida por esta breve declaração de outro médico, trabalhador da saúde à linha de frente no combate à sindemia, sem qualquer envolvimento “político”, como se lerá, mas cuja situação limite deveria nos sensibilizar, e levar a respostas (coletivas e políticas também) à esquerda:
“Há tempos que eu prometi não escrever sobre temas políticos. Peço perdão por fazê-lo. A todas e todos que se sentirem incomodados me desculpo e peço que abandonem este espaço. Não quero causar a ninguém qualquer embaraço. Há tempos em que não se pode esconder na poesia, nem buscar consolo na memória do menino que um dia fui e que deixei perdido numa distante esquina do tempo. Escrevo por compulsão, quase um lamento por saber que hoje o Ministério da Saúde do Brasil não aprovou os protocolos de tratamento clínico da COVID-19. Sinto que devo uma satisfação às pessoas que ofereceram seus corpos para que eu estudasse a doença. Devo estar também ao lado das famílias com quem compartilhei a dor de perderem um ente amado. Falo particularmente em nome das crianças, cuja morte me fez recobrar, numa noite fria, a esperança de um encontro com Deus. Permitam-me falar também em meu nome, hoje como paciente e infectado. O dia de hoje é para esquecê-lo, de apagar da mente o pesadelo destes dias impregnados pela ignorância profunda, oriunda de gentes que pouco sabem, que não se compadecem dos aflitos, que desconhecem o amor, que se apegam a mitos. É uma ignorância convicta, presunçosa, pastosa e nefasta. Frente a este cenário, o silêncio dos órgãos de regulação médicos é ensurdecedor. Desde a minha janela, o dia de hoje foi quente e ensolarado. No interior da minha alma foi noite escura. Que vergonha senti hoje por ser médico”.
[Texto de Paulo Saldiva, Professor Titular de Patologia da USP e membro titular da Academia Nacional de Medicina.]
Refletir responsavelmente e agir coletivamente de forma consequente sobre este contexto, com emergência limite renovada, é mais que preciso. Caso contrário, continuarão agindo…
O abaixo-assinado em “Repúdio à Nota Técnica 2/2022 – SCTIE/MS”, acima citado, em pouco mais de 24 horas já atingiu mais de 60 mil assinaturas, numa velocidade crescente – mobilizando sobretudo pesquisadores e trabalhadores/as da saúde, bem como muita gente efetivamente solidária. LEIA, APOIE, ASSINE & DIVULGUE POR AQUI: https://chng.it/xTtv6qZD
Algumas outras medidas práticas também foram tomadas junto às quatro instituições acima citadas, começando pelo Ministério da Saúde, passando pelo Senado Federal – que por meio de alguns Senadores, como o sr. Randolfe Rodrigues (REDE-PA), entrou com uma notícia-crime, contra tal Nota e o seu infame Autor, no Supremo Tribunal Federal – em regime de urgência.
Esperamos que tais má orientações / desinformações – negacionistas e genocidas, repetimos – sejam revertidas imediatamente.
A saúde e as vidas de nossa população agradecem…
Na gênese do fascismo está a circulação de pautas, de formas de ação e de pessoas entre esquerda e direita.
A direita toma para si o ímpeto e formas de ação vindas da esquerda, pautas de direita começam a aparecer na esquerda. Militantes e intelectuais passam a circular de um a outro campo.
Por isso quando esquerda e direita se misturam, quando tudo parece confuso, o fascismo está batendo à porta. E haverá pessoas que tendo história de esquerdistas se juntarão e ajudarão com isso a ferver o caldo fascista, mesmo se dizendo e se firmando esquerdistas ainda.
E se você acha que a esquerda do Brasil está mal, espere até descobrir o quanto é comum na esquerda de países como França e Itália se colocaram contra o passaporte vacinal, ou achá-lo “inútil” (palavra sem sentido no contexto mas que é usada retoricamente, como poderia ser usada contra a vacina, contra a máscara…). É o que acha, por exemplo, Melenchon, o candidato a presidente da esquerda francesa. Ele que diz talvez apoiar o ‘comboio pela liberdade’, inspirado na manifestação dos caminhoneiros canadenses contra o passaporte vacinal.
Movimento esse que une em apoio e difusão a extrema-direita mundial, e que se colocam como lideranças, reconhecidas pelo governo canadense, pessoas conhecidas da extrema-direita canadense.
Os Coringas estão nas ruas e, como no filme, sua revolta é como a do fascismo histórico.
A novidade desse fascismo dos “comboios pela liberdade” é que, no lugar de um nacionalismo, o imaginário que está por trás é de uma ‘liberdade’ que significa um ultraindividualismo que exclui qualquer senso de coletividade… é como se o dizer da Margaret Thatcher de que não existe sociedade, apenas indivíduos, ganhasse uma base popular.
Os fascistas de hoje, na sua revolta dentro da ordem do individualismo neoliberal, negam qualquer possibilidade de uma ação coletiva pelo bem-estar comum. São a negação de uma política pública que só pode ser eficaz se for coletiva.
Nesse mundo de ultraindividualismo fascista já não existe espaço para uma ação comum pelo bem comum.
Na Roménia, um país onde pouco mais de 40% da população completou a vacinação contra a covid, as mais recentes sondagens colocam em segundo lugar, logo atrás dos sociais-democratas, a Aliança para a União dos Romenos (AUR, que significa ouro, em romeno), chefiada por George Simion. Como os leitores de um e outro lado do mar entendem facilmente o espanhol, não será necessário traduzir esta notícia publicada hoje por El País:
«Alineado con los postulados de los líderes ultraderechistas europeos como el primer ministro húngaro, Viktor Orbán, o la candidata presidencial francesa Marine Le Pen en favor de la soberanía nacional frente a la UE y la OTAN, AUR exhibe con este tipo de comportamiento belicoso su euforia tras subir en las encuestas. El partido pasó de un 1% en septiembre de 2020 a superar este mes el 20% en intención de voto en los sondeos, impulsado por una larga crisis política marcada por la pandemia y que se cerró con un pacto de Gobierno entre el Partido Social Demócrata (PSD) y el Partido Nacional Liberal (PNL). Y se propone escalar hasta convertirse en la primera fuerza en el Parlamento. […] El líder radical [George Simion], cuyos mensajes se hacen virales en su cuenta de Facebook, se ve a sí mismo como el abanderado en la lucha contra la vacunación tras frenar en diciembre el pasaporte covid en algunos centros de trabajo. Primero, mediante el bloqueo parlamentario; y, después, a través de otro asalto con violencia, esta vez al Parlamento. La formación ultranacionalista concitó a unas 2.000 personas frente a la sede de las cámaras legislativas para expresar su rechazo al pase covid. La manifestación se descontroló después de que más de 200 personas invadieran el perímetro del recinto sin que interviniera la gendarmería, lo que derivó en actos vandálicos. Los manifestantes dibujaron una esvástica en una bandera de la Unión Europea.»
E é com gente desta que muitos esquerdistas na Europa — poucos em Portugal, pelo menos explicitamente, mas muitos em França, na Alemanha, na Holanda e noutros países da União Europeia — se proclamam solidários. «Na gênese do fascismo está a circulação de pautas, de formas de ação e de pessoas entre esquerda e direita», escreveu Leo V no seu último comentário, e prosseguiu: «Por isso quando esquerda e direita se misturam, quando tudo parece confuso, o fascismo está batendo à porta».
P.S.: Para quem não o saiba, «esvástica» significa suástica.
Ainda sem tradução para o português, o texto ILL WINDS FROM OTTAWA explora, ainda que talvez com uma dose extremada de otimismo (ou ingenuidade) alguns elementos dessa mistura entre esquerdas e direitas no protesto dos “caminhoneiros” no Canadá contra a exigência de comprovação de vacinação para transitar pela fronteira com o Canadá. Além dos aspectos mais salientes da discussão, como o certo apoio que esse “protesto” recebe das forças repressivas e a possibilidade de um fortalecimento dos liberais em contraposição ao discurso antivaxx, aponta a contradição dessa categoria também lá onde cai muita neve, AFINAL seriam os ditos “caminhoneiros” que estão protestando ou as empresas de transporte?
Segue o link: https://pt.crimethinc.com/2022/02/14/ill-winds-from-ottawa-thinking-through-the-threats-and-opportunities-as-a-far-right-initiative-gains-momentum