Por João Bernardo
3
Os identitarismos introduziram nas disputas sociais uma inovação táctica, sem precedentes numa formulação tão explícita, inspirada pela noção de lugar de fala. A função que antes havia sido atribuída a vanguardas classificadas estritamente pela sua posição política passou a ser legitimada pelo facto de se ter uma dada cor de pele ou outras características físicas, de se ter nascido numa dada comunidade étnica ou se ter um dado sexo presumido ou declarado. Aliás, como estes critérios podem cruzar-se, o número de identidades tende a multiplicar-se sem limites. Assim definidas, cada identidade destaca-se das restantes e estabelece a sua própria hierarquia de prioritários e excluídos — nós e os outros.
Não me parece despropositado classificar o identitarismo como uma forma de calvinismo laico, e devo dizer que considero o calvinismo a pior das abominações teológicas geradas no âmbito do cristianismo. Por um lado, a doutrina da graça é transposta para o identitarismo através da noção de que alguém pertence a uma identidade pelas próprias características involuntárias com que nasceu, restabelecendo-se nestes termos profanos a dicotomia entre os eleitos e os irremissíveis. Por outro lado, o puritanismo extremo e agressivo do calvinismo ressurge no comportamento dos identitários. Se esta analogia for pertinente — e é um grande se — compreende-se que os identitarismos tivessem começado a ser formulados nos países anglo-saxónicos, inspirados pela tradição calvinista, e se tenham difundido no Brasil ao mesmo tempo que as Igrejas evangélicas. Mas, como sempre sucede na História, só pode chegar-se a uma explicação acertada, ou pelo menos sólida, ampliando o leque das comparações, e seria necessário averiguar aqui a cronologia e os canais da difusão do identitarismo nos demais países. Mesmo sem isso, porém, deixo registada a similaridade entre o calvinismo e os identitarismos.
Essa espécie de religiosidade laica do identitarismo transparece ainda noutro aspecto. Os marxistas haviam concebido a noção de uma classe explorada, que seria revolucionária pelo facto de se situar no âmago das contradições do capitalismo e que, portanto, ao eliminar a exploração abolir-se-ia a si mesma como classe, abolindo no mesmo gesto as outras classes sociais. Os personagens do identitarismo, porém, em vez de explorados são vítimas. Ora, numa sociedade como a vigente nas democracias desenvolvidas, com welfare state e companhias de seguros, a exigência da vítima não é outra senão a de ser indemnizada. Se o explorado, para deixar de o ser, tem de pôr fim à sociedade de exploração, para alguém deixar de ser vítima basta-lhe receber uma compensação. Todos os que se incluem numa identidade, qualquer que ela seja, concebem-se como vítimas e, enquanto tal, adquirem o acesso a um lugar de fala, que por si mesmo implica o direito a ser indemnizado mediante a integração na elite. Não se trata de criar uma elite nova, como sucedeu noutros processos de ascensão social, por exemplo nos regimes soviéticos, mas de se inserir na elite existente e renová-la. É esta a finalidade da política de quotas, que não se restringe às universidades e expandiu-se aos governos e às administrações de empresa. Note-se que a política de quotas se aplica unicamente em profissões prestigiadas, já que não se vê ninguém reivindicar a introdução de quotas em ofícios penosos e mal pagos, apesar de se caracterizarem por preferências e desequilíbrios que inevitavelmente afectam qualquer das identidades existentes. Aliás, a partir do momento em que as principais consultorias de empresa descobriram que a integração das identidades étnicas e sexuais nos órgãos de chefia e nas camadas intermédias aumenta a produtividade, a renovação das elites ficou facilitada.
Assim, ao mesmo tempo que a multiplicação dos identitarismos agrava a fragmentação dos trabalhadores e os enfraquece enquanto classe, a sua absorção pelas elites universitárias, políticas e económicas contribui para homogeneizar as classes dominantes, sobretudo os gestores. O identitarismo é uma válvula de escape com efeitos sociais estabilizadores.
O sexo, ou as preferências sexuais, eventualmente assumidas como se fossem outro sexo, ou a cor da pele, ou outras características físicas, ou qualquer combinação destes critérios ou mesmo a sua subdivisão, é este o crivo que serve para avaliar a pertinência com que alguém possa justificar o seu lugar de fala e reivindicar assim o direito de ser integrado na elite. Ora, a inspiração biológica destes parâmetros confere inevitavelmente ao identitarismo um carácter racial. Este carácter é tanto mais vincado quanto o membro de uma identidade, definido como vítima, é herdeiro natural de toda uma linhagem de vítimas e, quanto mais longo for o pedigree, mais a vítima de hoje terá legitimidade para se classificar como mártir. Assim, o racismo dos identitarismos não se restringe a uma afirmação episódica mas, como todos os verdadeiros racismos, pretende-se sucessor de tradições obtidas pela simples nascença.
Trata-se, no entanto, de um racismo diferente daquele que prevaleceu nas democracias coloniais e na generalidade dos fascismos, a que a eugenia conferiu um ilusório verniz científico. Este tipo de racismo limitava-se a postular uma hierarquia de inteligências, presumindo a inferioridade intelectual de pessoas com dadas características físicas e a superioridade de pessoas com outras características físicas, havendo ainda uma gradação de situações intermédias. O racismo identitário tem pressupostos diferentes e obedece a um esquema lógico idêntico ao das noções raciais que acompanharam a ascensão do partido de Hitler e depois foram sistematizadas e aplicadas pelos SS. O racismo nacional-socialista distinguiu-se do racismo comum pelo carácter triangular dos seus componentes e pela circularidade do seu percurso causal, e praticamente toda a incompreensão que a historiografia corrente, para nem falar do jornalismo, revela perante os acontecimentos do Terceiro Reich resulta da confusão entre aquelas duas modalidades de racismo.
Em primeiro lugar, em vez de uma hierarquia simples em que num extremo estava uma raça superior e, no outro extremo, uma raça inferior, os nacionais-socialistas concebiam uma relação tripla entre a raça de senhores, os sub-homens e a anti-raça, o que implicava uma dialéctica mais complexa do que a de uma ordenação linear. Antes de mais, entre os senhores e os sub-homens não havia situações intermédias, porque os sub-homens seriam literalmente infra-humanos e qualquer miscigenação ficaria excluída da verdadeira humanidade. Hitler e as demais autoridades foram claros a este respeito, insistindo que o acasalamento entre alguém da raça superior e uma pessoa da sub-humanidade nunca poderia promover os sub-homens e só provocaria a degradação racial dos superiores. Por outro lado, a anti-raça não se distinguia da raça de senhores por qualquer déficit intelectual, mas por possuir uma inteligência perversa, desagregadora, incapaz de proceder a sínteses concretas, tanto sociais como mentais, enquanto a raça de senhores erguia e mantinha as grandes construções sociais, edificando a cultura em vez de a destruir. Em termos muito simplificados, a raça de senhores destinava-se a dominar a sub-humanidade, mas para isto tinha de impedir que a anti-raça corroesse essa ordem estável.
Em segundo lugar, o nacional-socialismo germânico herdou uma noção de circularidade dos percursos causais detalhadamente formulada por Houston Stewart Chamberlain, um britânico que se naturalizou alemão durante a primeira guerra mundial e se inseriu na principal família da cultura alemã. Como é habitual em todo o racismo, Chamberlain supunha que uma dada constituição do corpo suscitasse uma dada formação da mente, ou seja, admitia uma relação de causalidade que partia da biologia para a ideologia. Mas admitia igualmente uma causalidade inversa. «[…] aquilo que designamos pela palavra “raça” é, dentro de certos limites, um fenómeno plástico», escreveu ele, «e assim como o físico reage sobre o intelectual, o intelectual reage do mesmo modo sobre o físico». Por isso Chamberlain presumia que uma dada ideologia pudesse suscitar uma biologia espiritual, quer dizer, uma característica física que, embora não fosse visível, nem por isso seria menos real, chegando até a mencionar a «dolicocefalia espiritual». Nesta inversão de percurso da causalidade, um alemão a quem faltassem traços físicos habitualmente atribuídos ao seu povo, mas estivesse mergulhado na cultura alemã, adquiria efectivamente esses traços, embora espiritualizados. Entretanto, outro alemão, apesar de a sua aparência física ser convencionalmente germânica, se frequentasse meios judaicos e se deixasse absorver pela cultura judaica não alteraria as suas feições visíveis, mas a sua biologia espiritual tornar-se-ia judaica e ele transferir-se-ia para a anti-raça. Por isso Hitler e os SS se opunham a qualquer definição estritamente biológica do Judeu. Um cientista nacional-socialista, Fritz Lenz, resumiu a questão ao afirmar que «poderíamos, na verdade, classificar os judeus como uma raça espiritual», e já à beira do suicídio Hitler repetia aos seus comensais que «a raça judaica é antes de mais uma raça mental» e acrescentava que «uma raça mental é algo mais sólido e duradouro do que uma simples raça».
A historiografia corrente do fascismo é vítima de um grande número de adulterações interessadas, provenientes de todos os lados, mas no caso específico do nacional-socialismo o falseamento é mais prejudicial ainda. No Terceiro Reich os marxistas, tanto comunistas como socialistas, sendo subversores da ordem, eram assimilados aos judeus, do mesmo modo que os judeus, gerados na anti-raça, seriam por isso mesmo subversores da ordem. O lugar apropriado para confinar, e depois liquidar, a anti-raça eram os campos de concentração, onde a pretensa circularidade entre biologia e ideologia provocou os seus mais trágicos efeitos, do mesmo modo que, durante a guerra, as brigadas móveis de extermínio actuando nos territórios conquistados no Leste confundiram frequentemente judeus e marxistas na contabilidade do genocídio. Como distingui-los, se por um ou outro lado ambos pertenciam à anti-raça?
Ora, o racismo identitário é similar ao racismo nacional-socialista naqueles dois aspectos.
Em primeiro lugar, entre todas as identidades possíveis existe uma que exerce as funções de anti-identidade — o homem, heterossexual, branco e culturalmente europeu. Por um lado, é uma identidade, porque seria difícil encontrar outra que manifestasse a sua presença de forma mais palpável e enraizada. Mas, por outro lado, é uma anti-identidade, porque a sua evocação serve apenas para afirmar melhor as identidades que se lhe opõem. Esta anti-identidade não possui nenhum dos aspectos positivos atribuídos às identidades, para as quais assumiria uma função meramente destrutiva. Os identitarismos pretendem legitimar-se com a luta contra a discriminação, mas, na medida em que assumem sempre a existência de uma anti-identidade, desenvolvem novas formas de intolerância e de discriminação.
Nos últimos anos tenho deparado em textos marxistas identitários com a sequência «capitalismo, colonialismo e heteropatriarcado», o que é uma curiosa transposição das contradições económico-sociais, de modo a que a anti-identidade passe a ocupar o lugar antes preenchido pelo explorador. Quando um sistema de ideias como o marxismo, nascido e enraizado numa concepção estritamente social da economia, se deixa assimilar pela lógica racial tripla adoptada pelo nacional-socialismo, não poderia haver um mais flagrante triunfo do identitarismo.
Em segundo lugar, a circularidade em que se passa da ideologia para a biologia com a mesma destreza com que da biologia se transita para a ideologia é o outro mecanismo constitutivo do identitarismo. Se, por exemplo, se confere a uma pessoa negra o lugar de fala, é porque se admite que ela tem as ideias que, segundo o respectivo movimento identitário, lhe devem biologicamente corresponder. Mas esse mesmo movimento negro considera que uma pessoa negra vivendo num ambiente socioecónomico e cultural geralmente atribuído aos brancos torna-se branca e por isso não deve beneficiar do lugar de fala nem da política de quotas. Quando se afirma, num edital oficial brasileiro, empregando uma terminologia muito comum, que «as cotas raciais destinam-se aos pardos negros e não aos pardos socialmente brancos», o que é esta passagem directa do social para o racial senão a biologização de uma cultura? A circularidade entre o biológico e o ideológico, e inversamente, em nada difere daquela que caracterizara o racismo nacional-socialista.
De maneira mais evidente ainda, um indivíduo do sexo masculino que adopte ideias e comportamentos considerados femininos pode assumir-se como trans, ou seja, adquirir ideologicamente uma biologia feminina invisível, tal como ocorre uma situação simétrica quando uma pessoa do sexo feminino adquire ideologicamente uma biologia masculina invisível. A «dolicocefalia espiritual» inventada por Chamberlain e a «raça mental» evocada por Hitler encontram aqui um terreno fértil. Podem eventualmente provocar-se algumas alterações físicas acessórias, e ilusórias porque não se dirigem ao fundamental. Aliás, sucede que a encenação vá longe demais, especialmente quando se recorre a bloqueadores da puberdade, com consequências muito nocivas para a saúde. E para quê mudar de género, se ao mesmo tempo se defende uma sexualidade não-binária? Mas os paradoxos não incomodam os identitários, e o aspecto que importa agora salientar é que, trans ou não trans, as mulheres continuam a ter certas características físicas indeléveis e os homens, outras. Aquela encenação mais não faz do que deixar explícita a biologia espiritual de que falava Chamberlain. A pretensa cisão sexo / género corresponde à circularidade entre biologia e ideologia adoptada pelo racismo do Terceiro Reich. Também me parece estranho, e este é outro paradoxo, que segundo a doutrina corrente a distinção entre sexo e género se aplique exclusivamente aos seres humanos, não aos animais, para os quais o género corresponde sempre ao sexo, quando esse mesmo meio político critica o antropocentrismo e insiste na integração da humanidade na natureza. Mas talvez venhamos a ter pets trans.
Concluindo, a sexualização e a racialização de todas as questões inserem os identitarismos na lógica racial do Terceiro Reich. É o que sucede quando se biologiza o social e se apresenta o corpo como terreno do político.
Definindo-se por exclusão dos restantes, cada identitarismo tende necessariamente a encerrar-se com barreiras, e fá-lo duplamente, por um lado procurando proibir as críticas e, por outro lado, evitando tudo o que choque as suas sensibilidades. Onde antes a esquerda reivindicava uma sociedade permissiva e a aceitação das diferenças, hoje cada diferença se converteu numa identidade protegida por censuras e tabus. Esta expansão de um stalinismo sem Stalin leva-me a perguntar se a esquerda estará condenada a acabar no stalinismo. Procurámos a liberdade e a libertinagem, para afinal depararmos com a multiplicação do puritanismo. E ai de quem seja acusado de violar as normas ditadas por quaisquer identitários, porque a presunção de inocência converteu-se em presunção de culpabilidade, não só para a opinião pública, mas igualmente para as administrações e os tribunais.
A censura tornou-se muito mais fácil com as redes sociais, que permitem a exclusão de pessoas e o seu silenciamento e podem até promover linchagens virtuais. É um curioso paradoxo, que a internet, nascida para facilitar a divulgação de conhecimentos e o confronto de opiniões, sirva agora para impor pontos de vista e suprimir o debate. Ao mesmo tempo, a política do lugar de fala ampliou-se na criação dos espaços seguros, onde as pessoas de uma dada identidade não correm o risco de sentir a sua sensibilidade ferida pelo encontro com pessoas de outras identidades ou, pior ainda, da anti-identidade. Aliás, a censura passou a permear tão profundamente toda a sociedade que atingiu o nível pessoal, já que qualquer disputa com alguém que se assuma como pertencente a uma identidade, mesmo quando essa identidade não é objecto nem argumento da disputa, é apresentada como um crime de lesa-identidade e reforça a pessoa no papel de vítima. E tal como o lugar de fala se pode exercer virtualmente, os espaços seguros também existem no mundo virtual, e a frequência de certos sites ou certas redes é vedada por serem consideradas espaços não seguros. Deste modo a censura amplia-se, impedindo o confronto de ideias, enquanto aumenta o controle que os chefes de cada grupo identitário exercem sobre os seguidores. O ideal do identitarismo é a conversão da sociedade numa colecção de gavetas independentes, unidas só pelo mercado.
Porém, se tudo o que chocar uma sensibilidade for evitado ou até punido, com o argumento de que põe em causa uma identidade, então ficam impedidas a arte e mesmo as rupturas científicas, porque não existe novidade que não provoque um mal-estar ou suscite inquietação. Mesmo no campo da física, aparentemente alheado das vicissitudes da política, basta pensar no desconforto mental provocado pelas grandes descobertas científicas da primeira metade do século XX. O simples humor e a ironia são vistos com enorme desconfiança. Com efeito, será que rir é um insulto? E o que é a ironia senão a arte de fazer tremer debaixo dos nossos pés um chão que julgávamos firme? Nos últimos anos têm-me perguntado algumas vezes, em entrevistas, por que motivo eu leio romances, como se na esquerda isso devesse ser uma razão para espanto. É que a ficção, quando é realmente ficção, consiste no desenrolar das contradições internas de personagens que nunca se resumem a um meio social ou ideológico restrito, e negam assim os limites que legitimariam as identidades. Observei há pouco, a respeito da censura e dos tabus, que a esquerda parece não se livrar do stalinismo, e verifico-o de novo, porque o stalinismo promoveu uma pseudo-ficção em que os personagens eram meros emblemas de uma doutrina. Sem pôr em causa as identidades nem chocar as sensibilidades, toda a vida intelectual fica resumida ao lodaçal do lugar-comum.
Ainda os identitarismos mal haviam começado a penetrar nos departamentos universitários e já um amigo, professor na Unicamp, me dizia que não lhe interessavam pesquisas em que a autora, antes de começar, sabia a que conclusão iria chegar. Ora, esta é hoje a regra da investigação nos estudos sociais, porque ai de quem chegue a um resultado que não seja do agrado da identidade dominante no departamento. E assim as publicações académicas destinam-se agora a apresentar nem sequer pratos requentados, mas comida já mastigada. O politicamente correcto é a distopia da estagnação intelectual.
As consequências nefastas da censura identitária não se limitam às artes plásticas e à música, à literatura, aos estudos sociais. Em todos os campos da actividade humana a liberdade de expressão e o confronto de opiniões geram a criatividade, e também não poderá haver produtividade económica sem originalidade intelectual. Os regimes ditatoriais têm procurado resolver o problema confinando o debate às ciências da natureza e limitando a censura e as imposições ideológicas aos estudos sociais, à arte e à ficção. Mas observo com muita apreensão que um caminho convergente está a ser trilhado nas universidades e nos museus das democracias ocidentais, onde a hegemonia adquirida pelos identitarismos na arte e nos estudos sociais tem permitido que as ciências — ou seja, as ciências da natureza — permaneçam imunes à praga. A questão consiste em saber se esta dicotomia poderá manter-se, e por quanto tempo. Se o identitarismo extravasar para o campo científico, a catástrofe cultural expandir-se-á numa calamidade global.
Este ensaio é composto por seis partes. Pode ler aqui a primeira parte, a segunda parte, a quarta parte, a quinta parte e a sexta parte.
As obras que ilustram este texto são da autoria de Paula Rego (1935-2022).
“Se o identitarismo extravasar para o campo científico…”
O identitarismo já influencia decisivamente dois aspectos centrais da pesquisa científica: o financiamento da pesquisa e seu prosseguimento em desenvolvimento (P&D) ou engavetamento. O desenvolvimento de uma descoberta só se dá quando atende aos requisitos políticos e ideológicos da marca, tanto em termos de visão de sustentabilidade ambiental quanto de afinamento com os valores identitários e estratégias empresariais (cada vez mais atentas a atender às pressões identitárias). Igualmente, é cada vez mais marcante a existência de bolsas de pesquisa para frações de pesquisadores: negros ou mulheres, o que impacta na qualidade da seleção de propostas, já que exclui parcela dos pesquisadores. Basta acessar qualquer agência de fomento e lá encontrará bolsas exclusivas para “jovens cientistas mulheres”, “jovens cientistas negros” e também bolsas exclusivas para pesquisas em certas áreas de interesse do identitarismo, como por exemplo bolsa para pesquisas sobre as raízes africanas de algo da cultura brasileira etc. Alguns exemplos de editais vigentes da FAPERJ:
Chamada conjunta Faperj-Serrapilheira de apoio a jovens cientistas negros e indígenas sem vínculo empregatício com Instituições de Ciência e Tecnologia
“A iniciativa vincula a grandeza da ciência brasileira ao crescimento do número de professores e pesquisadores negros e indígenas na academia. Entende, também, que o surgimento de uma nova geração de cientistas com igualdade de acesso a cargos relevantes, mesmo a longo prazo, depende de estímulos de inclusão agora. Com essa chamada, afirmamos a confiança nos resultados de uma ciência representativa, apoiando a pesquisa em ecologia e a formação de jovens talentos, de quem depende o futuro do país.”
Edital FAPERJ Nº 07/2023 – Programa de Apoio à Jovem Cientista Mulher com Vínculo em ICTs do Estado do Rio de Janeiro
2.1 São elegíveis como proponentes cientistas mulheres ou _que se identifiquem como_ mulheres e que tenham menos de 12 (doze) anos de doutoramento
1. História e Historiografia do Design: perspectivas contemporâneas;
2. O ensino de Design em perspectiva histórica: no Brasil e no mundo; 3. Ancestralidade, pertencimento e reparação: raça, gênero e sexualidade no Design;
4. Colonização e diásporas na formação da modernidade;
5. Geopolítica, assimetria tecnológica e ordem econômica: no Brasil e no Mundo;
6. Cultura material como consumo;
7. Cultura Visual, Design Gráfico, Memória Gráfica: perspectivas e territorialidades;
8. Linguagens e representações no Design em perspectiva histórica;
9 Design e trabalho: da emergência do Design aos desafios contemporâneos;
10. Cidade, políticas públicas, ativismo e democracia no âmbito do Design;
11. Da ecologia à cultura da natureza no Design;
12. Design e antropocentrismo
Este foi o programa da prova de um concurso público em uma das maiores universidades do país. Apesar de não haver uma bibliografia indicada no edital, uma ampla revisão sobre os temas e palavras-chaves dentro daqui que se está publicando na área levava: às teorias decoloniais e aos estudos sobre racismo e gênero na linha identitária e a autores como Quijano, Dussel, Krenak, A.B. dos Santos, Stuart Hall, Bell Hooks, Boaventura, Latour, entre outros, além de discussões como antropoceno, crítica do antropocentrismo, patriarcado, etc., Bem como os autores da área que dialogam com toda essa parafernália irracionalista e anticiência A prova disso é que todas as provas escritas dos candidatos citaram esses temas e autores invariavelmente. No máximo havia espaço para expressões convencionais de um nacionalismo amparado pelas teorias da dependência, nada além…
A situação está muito pior do que pode parecer…
Perguntas sinceras e sem pretensão de ser irônica, cínica ou raivosa feito os comentários que se lê neste site:
Entendo as críticas ao que aqui se chama extensamente de “identitarismos”, realmente, muitas críticas podem e devem ser feitas ao que estamos estudando e quais são as diferentes possibilidades de estudar temas diversos (por exemplo). Mas tenho a real dúvida se existe um entendimento deste coletivo e João Bernardo, sobre as singularidades de cada ser humano, pois elas existem. Fico pensando, há o entedimento de desigualdades sociais que são vividas por grupos específicos? Pois ao ler esses textos que se colocam abertamente como amargos ou antipáticos (como diz a descrição deste coletivo) e se fazem críticas a um “vitimismo”, soam como a própria extrema-direita falando que todas essas questões “identitaristas” são “mimimi”. Talvez essa não seja a crítica do texto, mas pergunto: não existe a possibilidade de pensarmos que existam alguns marcadores sociais (incluindo obviamente a classe) que deixem algumas pessoas em desvantagem desde a largada em seus direitos básicos? Posso estar errada, mas às vezes parece que esses argumentos todos se confundem muito aos que se tentam combater. Algum direitista poderia achar combustível suficiente aqui para dizer que algumas lutas são falsas e que todos nós somos iguais, não sendo necessário se pensar em algum tipo de diversidade, quando sabemos que não somos iguais.
Não acham que os passa-palavristas acabam afastando muito público (que já é esparso) com ironias que se propõem a ser sagazes mas pisam na linha tênue da grosseria? Qual seria o benefício de estar num espectro da esquerda e não dialogar sobre a sua crítica com um público maior… da própria esquerda e não bater em todos ao mesmo tempo?
Saudações.
DD: Não existe a possibilidade de pensarmos que existam alguns marcadores sociais (incluindo obviamente a classe) que deixem algumas pessoas em desvantagem desde a largada em seus direitos básicos?’
Talvez a resposta seja na seguinte linha: o real interesse é em acabar com a corrida/maratona e não torná-la supostamente menos injusta.
D.D. -> 《Fico pensando, há o entedimento de desigualdades sociais que são vividas por grupos específicos? […] soam como a própria extrema-direita falando que todas essas questões “identitaristas” são “mimimi”. 》
Já postei aqui várias vezes e torno a repetir: o PassaPalavra é um desperdício.
Todo coletivo fechado sobre si mesmo tende adquirir características de seita, desde o culto à personalidade até a exclusão da dissidência e a final autofagia.
Ao invés de se constituir como um vetor de constante renovação da Extrema-Esquerda, o PassaPalavra definha num deserto monstruoso.
Há várias críticas a serem feitas, e aprofundadas, tanto sobre os movimentos ecológicos como às lutas específicas. Entretanto, quanto a isto, o PassaPalavra apenas reproduz a mais típica argumentação da Extrema-Direita.
Chegando ao absurdo da defesa do agronegócio como modelo de produção agrícola e de negar a necessidade das lutas específicas.
Sobre a ecologia, João Bernardo & seguidores só conhecem aquilo pesquisado em fontes nazi-fascistas. O mesmo em relação às lutas específicas, sejam ou não identitárias. Carecem da vivência direta, déficit muito comum em intelectuais ausentes das lutas concretas.
Toda crítica e toda teoria devem nascer da prática cotidiana e a ela devem retornar. Só assim se elabora conhecimento revolucionário.
Agroecologia sem Luta de Classes é jardinagem. Identitarismo sem Luta de Classes é esquizofrenia. PassaPalavra sem autocrítica são monstros vagando no deserto.
Para uma avaliação da “identidade” do PassaPalavra, de quem se pretendeu vir a ser ao que se tornou:
《3. Dentro dos limites do anticapitalismo, do antinacionalismo e do anti-identitarismo, o Passa Palavra pretende estimular o confronto de opiniões e o debate. Consideramos que as inspirações teóricas únicas, os modelos únicos e os sectarismos de grupo são obstáculos à reflexão sobre as lutas. Não somos, nem pretendemos ser, portadores da verdade revolucionária.》
Concordo com o Pedrinho só em parte, pois no caso do identitarismo não se trata do velho reformismo socialdemocrata, que buscava arrancar do capital pequenas concessões para os trabalhadores e diminuir sua miséria. No caso identitário trata-se de uma renovação das elites, situação bem diferente. Mas, gostaria de saber de D.D. que diz estudar o tema, que autores, ideias e conceitos utiliza sobre o tema, só por curiosidade…
O trecho de D.D. que menciona “marcadores sociais” “que deixem algumas pessoas em desvantagem desde a largada em seus direitos básicos” contém um erro gritante ao falar em classe como um marcador e ainda por cima como um marcador “óbvio”, e isso justamente pelos motivos q levam D.D a falar na sequência em… “pessoas”. Classe não é marcador social tal como identidades, e só é mencionado entrevirgulas pelos identitarismo, como se fosse uma particularidade como qualquer outra: sou negro, careca, gay e trabalhador. A luta é “interseccional” de “classe, raça e gênero” etc. Isso destrói a potencialidade de uma organização para a luta social anticapitalista. Se a preocupação for com pessoas, indivíduos, é óbvio que toda a trajetória de vida e singularidades da história da pessoa são determinantes importantes para… a pessoa. E esse é um dos segredos q tornam o identitarismo tão atraente para as… pessoas. Qualquer pessoa quer ser ouvida e que seus interesses particulares sejam considerados. Mas luta social não diz respeito a pessoas e sim a grupos, que atuam em confluência de interesses e até mesmo contra interesses pessoais. Luta social radical implica muitas vezes abrir mão de interesses pessoais, incluindo até mesmo, nos casos trágicos, a própria vida. Ora, no contexto atual de domínio do neoliberalismo os indivíduos não querem sacrificar interesses pessoais e, pelo contrário, vêem a luta como um meio para atingir resultados bons para si mesmos. Não atoa se tornam elite e ainda são aplaudidos como se isso fosse uma conquista da luta e do grupo. O indivíduo é posto como “representante” do grupo. Os indivíduos se organizam pensando em melhorar individualmente de vida, e não por valores de grupo (futuros) e muito menos como “vingança” pelos que lutaram e morreram antes deles. O identitarismo é, sob todos os ângulos que se olhe, uma ideologia liberal e fascista, que se apoia no rancor (pelo indivíduo sofrer discriminações específicas e estar atrás nas filas dos “privilégios” etc) e no quanto atualmente valorizamos o ego. Não se trata de pontos de vista diferentes dentro da luta de esquerda e sim da intromissão de uma ideologia de extrema direita, que age se apresentando como se fosse algo de esquerda. E consegue essa façanha justamente ao valorizar e dar lugar de destaque às experiências individuais ao invés de trabalhar com um conceito de experiência de grupo. É claro que o grupo está a todo momento sendo mencionado, mas a prática social identitária é de indivíduos mais ou menos amontoados e o grupo (e a história) só surgem como fundamentos legitimadores dessa prática individual e individualista.
Luta radical não se faz dando destaque à diferença e sim às confluências de interesses apesar das diferenças.
O identitarismo é tão destrutivo que tem conseguido levar a recuos até mesmo em termos de garantias legais de direitos humanos, pois atua pressionando as organizações (ONU etc) a cada vez mais abrirem e ampliarem o leque de garantias legais (formais) para minorias e grupos de interesse específico, o que tem enfraquecido essas organizações (que, com recursos financeiros e humanos escassos, se vêem obrigadas a gerir uma miríade quase infinita de demandas e de documentos, o que levado à perda de sua autoridade e prestígio) e tornado elas impotentes para garantir a realização de patamares mínimos de direitos humanos, historicamente conquistados, como por exemplo o combate a ditaduras, fome, tortura. A prática identitária leva a recuos civilizacionais, enfraquece a luta social e leva ao ganho de força dos fascismos: o fascismo identitário e o fascismo que o identitário pensa que combate, mas que é sua contraface.
arkx Brasil parece querer que o Passa Palavra seja um Partido e que formule uma estratégia completa. O Passa Palavra já faz muito ao dizer o que ninguém diz e analisar o que ninguém analisa por prismas que ninguém leva em conta. Se isso leva o Passa Palavra a uma lógica de seita, fazer o que, é um preço que se paga por se manter fiel a certos princípios e tarefas. Já as tarefas mais amplas e profundas, que o Passa Palavra não cumpre e nem tenta cumprir, são função da classe e não do Passa Palavra. E se arkx Brasil acha que o Passa Palavra poderia e deveria fazer mais do que faz devia entrar para o coletivo, combater o sectarismo e escrever e analisar as coisas como acha que deveria ser feito, em vez de lamentar o “desperdício”.
Pedrinho: Logo que postei o comentário, fiquei pensando a respeito da analogia à uma corrida que escrevi. Talvez não tenha sido o melhor jeito de “explicar o mundo”. Concordo contigo, acho que não deveria existir corrida alguma e que todas as pessoas pudessem viver sem concorrência ou que correr não fosse o objetivo da vida. Porém, partindo da realidade (que pode e deve ser alterada) existem materialmente desigualdades e historicamente alguns grupos de pessoas possuem menos direitos que outros. Isso é um fato.
arkx Brasil: Concordo com seu comentário integralmente. Sou uma nova leitora e interessada a aprender novas ideias sem preconceitos, busco os posts antigos e entender como se estabeleceu o coletivo. Mas tenho me deparado com muitos exageros conceituais nas postagens e quase um “culto ao líder” nos comentários, que parecem colocar um teórico acima do bem e do mal. A obra de João Bernardo sobre os fascismos é muito importante, não há dúvidas quanto ao longo e árduo trabalho que dedicou uma vida inteira de pesquisas. Entretanto, o mesmo não deixa de ser humano e controverso (como todos os outros seres humanos que pisam na terra). E teoricamente, não é esse exato culto ao líder o que se tenta destruir? Sei que não estou inventando a roda nestes comentários, afinal, muitas outras pessoas já o fizeram, mas penso que é sempre importante relembrar.
Curioso: Bom dia, não disse em meu comentário que sou estudiosa deste tema (qual tema?). Eu precisaria ser uma pesquisadora ou dar “carteiraços” para ler e querer entender sobre diferentes teorias num site? Acredito que posso fazer uma crítica ao que tenho lido aqui e sobre minhas percepções sobre os comentários deste coletivo de ideias. É um espaço aberto à todas as pessoas, certo? Mas talvez possam estar me taxando como “identitarista” (que não sou) por estar fazendo uma crítica, então meu comentário não seria válido pelas diretrizes do site…
“Entendo as críticas ao que aqui se chama extensamente de “identitarismos”, realmente, muitas críticas podem e devem ser feitas ao que estamos estudando e quais são as diferentes possibilidades de estudar temas diversos (por exemplo)”.
D.D., pelo que você escreveu acima ficou parecendo que voce estudava o tema. “Que tema?”. Ora, estamos falando de identitarismo, não?! Portanto, se você dá a entender que estuda esse tema, qualquer pessoa pode te perguntar sobre qual a sua perspectiva teórica sobre isso, já que você está realizando uma crítica ao texto em questão e ao próprio Passapalavra. Se você discorda e estuda o tema, gostaria de saber a partir de qual perspectiva você está criticando o texto. Agora, se você de fato não estuda nada disso e é só um curioso como eu, está tudo certo. Sobre você ser ou não identitarista, quem sou em para rotular os outros, mas todos os seus argumentos são identitários, independente da consciência que tenhas disso. É muito comum acharmos que não nos enquadramos em uma determinada perspectiva, mas eis que é a nossa perspectiva. Não se trata simplesmente do que eu afirmo que sou ou não, como nas “ações afirmativas”, mas de uma questão objetiva determinada por nossas práticas e concepções.
https://www.instagram.com/reel/CupEIM9LOXv/?igshid=YTUzYTFiZDMwYg==
Muito interessante o vídeo acima, trata-se de uma discussão sobre como um indivíduo pode “chegar lá”, mas questionando pq algumas pessoas “já nascem lá”, enquanto uma suposta crítica à meritocracia a partir da questão “racial”. Mas, não há nenhum questionamento da estrutura social, da exploração, do capitalismo, nada. Apenas questiona as dificuldades que uns têm em relação a outros para se “chegar lá”. Lá aonde?! No topo, na elite? Como alguém acima comentou, trata-se de “pessoas”, indivíduos querendo apenas conquistar um lugar ao Sol, já que não tiveram a “sorte” de já ter nascido “lá”…
Pois é, D.D.
Acho que sua metafora com uma corrida foi brilhante porque é justamente o que o mundo neoliberal é: uma corrida em que todos competem contra todos atentos exclusivamente aos proprios passos.
O movimento identitario, como corrigiu Curioso, busca renovar as elites, ou seja, ‘pretos no poder’ significa que uma pessoa preta será a CEO de uma multinacional, mas a tia do cafezinho continuará sendo…adivinha: uma mulher negra.
Isso porque os identitários não põem em causa a exploração, a extração de mais valia: a corrida. Desejam apenas que exista maior representatividade entre os donos do sistema. Se antes você era assediado no trabalho por um branco, que tal ser assediado por uma mulher preta?
Parece que a queda da URSS significou um corte no imaginário das organizações proletárias. ‘Já que a revolução virou um pesadelo, podemos ao menos adornar o capitalismo’ – será?
Pablo -> “O Passa Palavra já faz muito ao dizer o que ninguém diz e analisar o que ninguém analisa por prismas que ninguém leva em conta.”
Quanta soberba! Quanto auto-referenciamento! E a cria dos dois é uma total aversão a crítica, principalmente quanto a autocrítica.
A reação é a de um adolescente mimado: “Vem aqui e faz melhor!”
Sem autocrítica mesmo uma brilhante inteligência se apaga na cegueira. No caso, a cegueira impedindo de se ver arkx Brasil como parte do PassaPalavra.
Aqueles postando comentários neste site, até mesmo os leitores silenciosos, todos se relacionam com o coletivo PassaPalavra. Portanto dele fazem parte, embora sem vínculo formal ou direto.
Há muito o PassaPalavra perdeu seu rumo. Mas sem nenhuma exclusividade nisto. Estamos todos perdidos. E a chance de nos encontrarmos é bem remota.
Talvez a única possibilidade para o PassaPalavra (assim como para todos nós) seja se abrir para as lutas concretas.
Movimentos ecológicos e lutas identitárias não devem ser abordadas no abstrato, e sim a partir da experiência de vida daqueles diretamente envolvidos com estes movimentos e lutas.
Exemplo: mulheres, pretas e periféricas usam a agroecologia como arma de emancipação.
👉🏽 Quintais produtivos do Morro do Sossego
Como levar a cabo a grande luta de emancipação? Talvez seja através dos pequenos encontros.
Quem muda o mundo são as pessoas. Por isto precisamos nos encontrar através da luta concreta em nosso ambiente de vida.
O pequeno tem um poder imenso. Porém, para este poder se exercer as pequenas iniciativas precisam estar interligadas em rede, movendo-se para o amplo horizonte da grande luta.
Este vídeo é uma pequena contribuição para estas lutas conhecerem umas as outras. E para do encontro entre elas se abrir o caminho da emancipação de todos nós.
https://youtu.be/-nAkCoMn1Dk
Está na Odisseia do Odisseu: “Sutilezas óbvias de troglodita arremedando poliglota, delicado como um rinoceronte entre vasos de porcelana…”
É sempre uma questão de “classe”… nem sempre sútil, nem sempre óbvia: quem são os trogloditas e quem são as porcelanas?
Dica: Como saber se a porcelana é verdadeira? “Para testar, basta apontar a lanterna do celular para o produto. Se conseguir identificar a luz do outro lado da peça, trata-se de uma porcelana verdadeira. Se não conseguir, é provável que o material seja outro”(https://global.tramontina.com/blog/inovacao/conheca-os-diferenciais-da-porcelana)
Agora é só fazer o teste…
D.D.,
Marx e Engels certamente não tinham as posições nem as atitudes mais avançadas em sua época, com respeito ao tema da igualdade entre os sexos.
João Bernardo tem uma sensibilidade muito mais próxima da nossa quanto a isso.
Ele também não é o mais avançado de sua época, isso é bastante claro. A sensibilidade entre os seres humanos é um fenômeno histórico e caminha à revelia de nossos desejos. A nova sensibilidade não é inteiramente boa, nem inteiramente melhor daquelas que a precederam, somos nós que devemos saber interpretá-la e reivindicar o que consideremos melhor.
Os fascistas de esquerda conseguem, como os fascistas de direita, revelar ao mesmo tempo um enorme grau de vitimismo e um sentimento de superioridade maior ainda. O comentário de UwU, acima, é só mais uma prova disso.
Obrigado, João Bernardo, parabéns por sua série de artigos e por tratar de tão variados assuntos como sempre, instigando a pensar. Os ataques pessoais daqueles que lutam contra a reflexão, própria e alheia, são na verdade elogios.
Os desertos e o monstro
Desertar da luta
Quando diante de um colorido deserto?
Deflagrar a cura
Quando adiante um aborrido decerto?
Rir-se das absolutas
Posto que irresolutas
Cavar
Cavar
e Cavar
o que estava extinto
Forjar labirinto
Manter-se faminto
E entre livros,
memórias
e ombros
mais ou menos amigos
Denunciar a usura
a interna censura
a insuportável
frescura
dos tantos
tantos
ignorantes
Eis a sua sina
Catar ferro
Fazer aço
Para a usina
Pontos de um concurso para professor substituto no Departamento de História da UNB:
1. Raça, gênero e sexualidade como eixos estruturantes da sociedade brasileira e de outras formações nacionais no Mundo Atlântico.
2. Racismo e sexismo como problemas das matrizes analíticas hegemônicas nas Ciências Humanas no Brasil e no Mundo Atlântico.
3. Agência histórica de pensadores/as negros/as na construção de agendas epistemológicas antirracistas e antissexistas no Brasil e no Mundo Atlântico.
4. Agência histórica de pensadores/as indígenas na construção de agendas epistemológicas antirracistas e antissexistas no Brasil e no Mundo Atlântico.
5. Agência histórica de pensadores/as LGBTQIA+ na construção de agendas epistemológicas antirracistas e antissexistas no Brasil e no Mundo Atlântico.
Notem que os pontos 3 a 5 demandam saber a cor da pele, a etnia e as preferências sexuais de autores e autoras. Então, o próximo passo será exigir que no asterisco passemos a colocar tais informações.
E há quem considere que o João Bernardo e todos os críticos severos dos movimentos identitários exageram.
VdR,
Para o autor de inscrever ao Prêmio Jabuti de literatura (a premiação mais prestigiosa da literatura brasileira), já é solicitada a cor de pele do autor ou autora.
Pelo que estou lendo aqui nos comentários, tenho que agradecer o período que passei na universidade, pois hoje em dia deve ser uma realidade distópica, na qual o policiamento deve imperar. Para qualquer lado que se olhe parece que o mundo está encolhendo. E pelo jeito UwU que comentou acima não tem sensibilidade para isso.
Há um erro muito comum na crítica aos identitarismos, presente também tanto nos comentários como no próprio artigo.
O Identitarismo é uma praga criada pelo Capital para nos dividir. ENTRETANTO, é uma armadilha dupla: seja pela desvinculação das pautas específicas da luta geral, ou pela negação da legitimidade delas.
A crítica aos identitarismos não pode se erguer da negação das situações concretas, envolvendo opressão e exploração, a que eles se referem.
Como tudo o mais no Capitalismo, as diversas opressões e explorações se exercem de modo desigual e combinado. Mesmo entre os oprimidos há também os que oprimem. Existem muitos exploradores entre os explorados.
O melhor caminho para se compreender a complexidade referente aos identitarismos não passa por questionar critérios para prêmios literários ou concurso público para professores universitários (vide Leo V e VdR), como se alguma vez tais critérios tenham sido imparciais e pautados pelo interesse da classe trabalhadora.
Pior ainda é o saudosismo de um tempo “a que se deve agradecer” (vide Leo V), como se também não houvesse sido tão “distópico” como o atual – a começar por uma década de 1990 caracterizada pela devastação neoliberal.
O atual caso da denúncia de violência sexual sofrida pela ex-mulher de Arthur Lira exemplifica as contradições incontornáveis das lutas identitárias.
Confira-se a estas lutas o conteúdo da luta geral (a Luta de Classes) e elas se tornam uma via insubstituível de transformação das relações sociais.
Este último comentário de arkx Brasil tem muitos pontos para debate. Um deles é esse enquadramento da luta de classes como “geral” e da luta antirracista, feminista etc. como luta “particular” ou “específica”. A questão assim posta só traz confusão.
A luta de classes é uma luta pela remodelagem econômica das relações sociais, rumo a uma nova sociabilidade em que seja posto uma prática social de livre desenvolvimento das individualidades (onde, portanto, não há espaço para qualquer discriminação ou hierarquização social). Luta de classes contra o capital é simultaneamente luta contra o racismo e o machismo ou “patriarcado”, a começar nas próprias fileiras da militância. O que o identitarismo faz não é nada disso e sim enquadrar o próprio racismo e machismo e lgbtfobia e xenofobia como um confronto de “identidades” onde há distintas hierarquias de vivência e, daí, lugares de fala (e hierarquias inversas de fala).
O modo como o identitarismo formula e responde ao problema do racismo e das opressões é
0) IDEOLOGIA: um modo a seu modo racista e fascista, que articula o biológico e o social de modo pendular, conforme a conveniência.
1) ECONOMIA: um modo adequado e fortalecedor do capital, por meio da renovação das elites (e é este o centro da questão e o motivo da luta contra o capital ser uma luta contra o identitarismo) e do revigoramento de uma lógica nacionalista em tempos transnacionais.
2) POLÍTICA: um modo adequado para o enfraquecimento e cisão da classe trabalhadora, na medida em que coloca trabalhadores contra trabalhadores.
3) SOCIAL: um modo punitivista e excludente dos divergentes (pune-se o “esquerdomacho”; o “negro palmiteiro” que se relaciona com brancas; o “privilegiado”; etc.) por meio do trashing, a destruição de reputação.
4) LINGUAGEM: combate-se o racismo e as opressões por meio de simulacros, centrados na linguagem.
O identitarismo não é uma bandeira específica e a luta de classes uma bandeira geral. O identitarismo é a intrusão de valores de extrema direita no bojo da esquerda.
DOUGLAS rides again:
https://revistarosa.com/douglas-rodrigues-barros/teatro-orfao
Pablo -> “A questão assim posta só traz confusão.” “O identitarismo não é uma bandeira específica e a luta de classes uma bandeira geral.”
Sobre Luta de Classes, lutas específicas e identitarismos
A catastrófica confusão é a de se abordar problemas sociais concretos de modo abstrato e desvinculado da prática.
Neste momento há uma ocupação no Centro do Rio de Janeiro, portanto já se tem aqui a questão geral da Luta de Classes através da luta específica pela moradia.
Mas se trata de uma ocupação feita por mulheres, então a luta geral se entrelaça com a “luta identitária” (usando a expressão apenas para demonstrar como não importam tanto as palavras e sim as relações sociais).
Ainda por cima, são mulheres sujeitadas a grave violência doméstica, inclusive com risco iminente de vida, exigindo que a identidade (note a perigosa ironia) delas, assim como sua localização, não sejam amplamente conhecidas.
Ou seja: uma situação absolutamente fora da zona de conforto dos debates teóricos nas redes sociais.
Essas mulheres não tem como aguardar alguma hipotética “revolução socialista”, quando então seu problema concreto virá a ganhar alguma solução: a vida é urgente para os mais oprimidos e explorados.
Para garantir a sobrevivência das mulheres é imperioso criar laços de solidariedade ativa com os participantes de outras lutas específicas, integrando todas estas lutas na grande luta geral (a Luta de Classes).
A ocupação precisa ter condições básicas de existência (energia, água, comida, instalações sanitárias), as mulheres necessitam de apoio sócio-psicológigo além do quesito vital de segurança 24×7.
Isolada e fechada em si mesma a ocupação tende a fracassar, podendo trazer consequências trágicas, mas se esta luta específica se aliar com outras lutas todas elas tendem a fortalecer umas as outras.
A Luta de Classes não se processa no abstrato, mas ao pé do chão das lutas concretas e específicas.
Cabe aos intelectuais se integrarem organicamente nestas lutas para conhecê-las, apoiá-las, divulgá-las, pensar sobre elas e assim construir o autêntico conhecimento revolucionário.
arkx Brasil,
o caso que vc relata não parece ter nada de identitário. Uma organização de mulheres não é necessariamente identitária. É identitária se esse fato, ser uma organização de mulheres, for o fator central e indiscutível, a ponto de, por exemplo, não se aceitar apoios de homens ou se deixar a pauta original da moradia de lado em prol da manutenção da pureza “feminina” da organização. Quando se critica, nesse site, o identitarismo, não se está de modo algum pretendendo cagar-regra de como os coletivos devem ou não se organizar e por tal ou qual pauta. O que se faz é apontar os labirintos fascistas que se pode adentrar se se aderir a práticas de luta centradas na identidade e se seguir pensando que se está fazendo uma luta de esquerda, quando não se está. O caso que vc relata parece ser muito interessante.
Caro Arkx Brasil, o arranjo identitário dos gestores não deveria ser motivo suficiente para que os trabalhadores desenvolvam pautas e métodos de organização exatamente compatíveis com a lógica da exploração. Um exemplo, a categoria dos terceirizados de uma universidade é majoritariamente feminina e esse arranjo culturamente pode ser explicado pela suposta resiliência feminina, o que as tornaria mais confortáveis com o trabalho da faxina. Quando eu e uns universitários denunciamos a segregação que ocorria nos elevadores(esses trabalhadores não poderiam ser vistos utilizando os mesmos elevadores dos alunos e professores) algumas denúncias oferecidas foram de auxiliares de serviços gerais e trabalhadores da manutenção, de ambos os sexos. Aqui, se as mulheres rejeitassem a solidariedade e protagonismo dos homens isso sim seria identitário, não é propriamente a organização de mulheres que é identitária. Quando você diz que “Essas mulheres não tem (SIC) como aguardar alguma hipotética ‘revolução socialista'” não é um postulado essencialista das mulheres, mas é algo que se insere na objeção à exploração a nível geral. Outro exemplo: vendedoras de cosméticos se organizam contra um assédio deliberado de seus(suas) gerentes. O que se revela uma postura observada localmente, revela-se um problema comum a trabalhadores de outros segmentos, uma vez que, independente de seus sexos, acabam por sofrer. Você evoca uma luta geral, que não diz respeito somente às mulheres, para criticar uma noção de identitarismo que pensa nele como obstáculo à generalização das lutas locais. A crítica ao identitarismo é devido ao seu essencialismo, subjacente à sua crítica, referida por você como “concreta”, ao contrário deste artigo que você chama de “abstrato”. Reflita.
arkx Brasil,
Não me parece que a melhor estratégia em um debate seja ler o que não está escrito. Eu desconheço algum texto publicado pelo PP em que se nega as “situações concretas”. Alguma vez alguém aqui negou que exista racismo, machismo, patriarcalismo e homofobia nas relações sociais? Alguma vez alguém aqui negou que é necessário lutar contra essas e outras formas de opressão que frequentemente contribuem para se intensificar a exploração econômica daqueles que vivem da venda de seu tempo de trabalho?
Como os camaradas que comentaram pontuaram, as críticas são centradas aos movimentos centrados exclusivamente nas múltiplas identidades e que abdicam da luta contra as relações sociais fundamentadas na exploração do tempo de trabalho alheio.
Compreendo que cause incômodo a muitos as associações feitas por JB entre os atuais movimentos identitários e os fascismos da primeira metade do século XX, mas nunca li algum texto do JB em que ele afirme que inexiste racismo, machismo, homofobia etc. Tampouco, que se deva ficar sentado esperando uma revolução socialista que ponha fim à propriedade privada dos meios de produção e que num passe de mágica acabe com todas as formas de opressão.
A respeito dos pontos de concursos, o que se observa é como os movimentos identitários resultam em bizarrices na atual conjuntura e expressam o que o JB define como fascismo pós-fascista. É um, entre inúmeros exemplos, dessas práticas.
Hoje, no meio universitário vive-se sim um clima de policiamento constante. A esquerda denunciou em peso o “escola sem partido”, mas pessoas que também se definem como de esquerda promovem um patrulhamento ideológico constante. Não tenho saudosismo, mas constato que desde que ingressei numa universidade como estudante até hoje, quando ganho a vida como professor, a situação só piorou.
Da legítima e necessária luta contra o machismo, o racismo e a homofobia, chegamos a uma situação distópica. Ser homem, hetero e, para os padrões brasileiros, branco tornou-se, pra muitos, sinônimo de privilégio e ameaça de ser um assediador, um estupadror em potencial e assim por diante.
O que mais vejo na minha vivência cotidiana de trabalho são jovens incapazes de se mobilizar em torno de questões universais. Há uma obsessão por pronomes neutros, por temáticas sexuais, raciais etc. e um desinteresse cada vez maior pela temática do trabalho, da exploração econômica e das lutas sociais que coloquem em questão as relações sociais centradas na exploração do tempo de trabalho alheio.
Arkx confunde o fenômeno (machismo, racismo, etc ) com sua interpretação teórica e movimento político reacionários (identitarismos), que para ele são a mesma coisa. Se duas ou mais mulheres se juntam para reivindicar qualquer coisa, lá ele já enxerga o identitarismo em ação. O identitarismo enquanto fenômeno é outra coisa, já devidamente identificado aqui com o fascismo, um verdadeiro atraso para as lutas anticapitalistas. Para arkx concreto é o que lhe interessa, o que já ilustra o particularismo identitário com o qual ele lê o mundo. De resto, aguardo considerações do autor do artigo acerca do debate, pois alguns comentaristas o interpelaram diretamente…
Geralmente, procuro reduzir ao mínimo as minhas intervenções nos debates acerca de artigos meus. Houve algumas excepções, mas foram raras. Tenho todo o artigo para me exprimir, parece-me justo que deixe aos leitores o espaço dos comentários, senão arriscar-me-ia a ser um monopolista. Acresce que, no caso deste ensaio, têm surgido vários leitores a explicar a questão de uma forma que me poupa esclarecimentos. O que teria a responder foi já dito em alguns comentários.
Joker -> “Reflita.”
Dei um exemplo sobre mulheres que tomam tanta porrada em casa a ponto de correrem risco de vida. Não chega a ser uma situação de exceção. Ao contrário, é algo bem comum desde a divisão social do trabalho entre homens e mulheres. A exceção é quando são os homens quem apanham, o que também acontece.
Por outro lado, a violência não é exclusividade de casais hetero. Tampouco a violência incide apenas nos relacionamentos, sejam ou não monogâmicos. A violência (física ou não) está presente em todo tipo de relações sociais.
Resumindo:
• A luta contra a violência é uma luta geral que só pode ser bem sucedida com o fim da divisão da sociedade em classes (Revolução Socialista) e a constituição de relações sociais comunitárias (Comunismo).
• A luta contra a violência de gênero (mulheres, LGBT+) é uma luta específica que só pode ser bem sucedida se articulada com a luta geral (Luta de Classes).
• Os diversos casos concretos de violência de gênero NÃO tem (sic) como esperar uma hipotética vitória da luta geral, exigem uma atuação imediata (inclusive por haver ameaça à integridade física e risco de vida).
☆ Os identitarismos isolam as lutas específicas uma das outras e também não as articulam com as lutas gerais e a Luta de Classes, criando a fatal ilusão de ser possível desta forma superar os diversos tipos de opressão.
Caso concreto: ocupação cujas moradoras são mulheres com histórico de sofrerem grave violência doméstica.
Ação imediata: garantir a continuidade da ocupação e fornecer as condições básicas de habitação (energia, água, comida, instalações sanitárias).
Estratégia não identitária: estabelecer laços concretos de apoio recíproco com outros movimentos, sejam ou não do mesmo tipo.
PS: alguns dos que se referiram aos meus comentários parecem não os terem lido ou pouco compreenderam, provavelmente é responsabilidade minha pois me expreço (sic) no idioma Português apenas razoavelmente.
Para os que pensam que é exagero afirmar que o identitarismo se aproxima da lógica do Terceiro Reich, sugiro que leiam o que a professora Bárbara Carine escreveu no seu Instagram (que conta com mais de 300 mil seguidores!):
«Um dos espaços que palestrei nesse mês de junho estava com problemas na autodeclaração profissional: segundo dados cadastrais a instituição já tinha alcançado a meta de pessoas negras para os próximos anos, contudo o teste do pescoço não indicava isso. Uma sacanag3m imensa.
Gente, existe uma diversidade de pessoas brancas em virtude da estratégia genocida de extermínio negro, chamada eugenia, popularmente conhecida como democracia racial. A meta era miscigenar para branquear. Desse modo, no nosso país existem desde brancos “retintos” que são brancos beeem brancos” a brancos escuros.
O que é um branco escuro, Bárbara?
Uma pessoa um pouco bronzeada, mas lida socialmente como branca (nunca levou um baculejo, nunca foi seguida numa loja, nunca esteve na lista das pessoas mais feias da sala, sempre teve seu cabelo penteado na escola, nunca pediram pra ela ir trabalhar com o cabelo penteado, nunca duvidaram que ela era a gerente da empresa, nunca se sentiu solitária nos espaços brancos, até namorou fácil nessa escola, se cresceu na favela a galera até chamava de galego (aí qnd entrou na faculdade começou a discutir o seu pertencimento racial…). No Brasil ser negro ou negra é uma experiência fenotípica social
Com as cotas, muitas pessoas passaram a se declarar negras por afro-conveniência ou para não integrarem o grupo opressor da branquitude, pois psicologicamente isso não é legal para a pessoa. Mas entenda, que ser uma pessoa branca não te transforma em um opressor, mas sim em uma pessoa que se beneficia dos privilégios da opressão. Você pode ser uma pessoa aliada e lutar contra isso. Contudo, entenda que ao se declarar parda em qualquer senso você está se dizendo negra e isso não é bacana… essa instituição que eu citei, por exemplo, já atingiu a meta de negros sem ter atingido. Bote a mão na consciência.»
https://www.instagram.com/p/Ct4HkmzgFYL/
E antes que digam que isso é um caso excepcional, que esse discurso não tem influência no mundo real, gostaria que lembrassem que esta professora já foi finalista do Prêmio Jabuti por dois anos consecutivos e foi premiada pela Câmara Municipal de Salvador com uma honraria concedida a mulheres negras que “se destacam na luta contra o racismo”.
É este discurso que tem sido hegemônico atualmente no movimento negro. São essas pessoas que a maioria da esquerda considera “aliados”. Assim como o nacionalismo, o identitarismo é hoje o senso comum na esquerda. E, assim como o nacionalismo, me parece que essa “contaminação” de temas oriundos da direita no interior da esquerda seja irreversível.
Caro Joao,
Como estou no processo de tradução dos teus artigos para o francês, gostaria de fazer dois esclarecimentos: o primeiro sobre o termo vago “campos de concentração”, o segundo sobre a “confusão” entre judeus e comunistas na mesma anti-raça a ser exterminada, pelo menos de acordo com os dados que encontrei sobre a Alemanha, não sobre a Europa Oriental e a URSS, aos quais você se refere, mas parece-me que a extensão dessa “confusão” deve ser detalhada, se possível.
1) Sobre a diferença entre campos de concentração e centros de extermínio
Havia muitos tipos de “campos”, sendo que as fronteiras entre eles às vezes eram fluidas: campos de trabalho forçado (campos de concentração), campos de prisioneiros e campos de trânsito (geralmente antecâmaras para extermínio). Com relação aos “campos de extermínio” (Chelmno, Belzec, Sobibor, Treblinka II na Polônia) e locais que combinavam ambas as funções (concentração para trabalho forçado e extermínio, como Auschwitz-Birkenau e Majdanek), agora usamos a expressão mais precisa de centros de extermínio, na medida em que os deportados judeus eram levados para lá para serem assesinado imediatamente e não detidos por um longo período
Conforme explicado no site do Holocaust Memorial Museum nos Estados Unidos: “Entre março de 1942 e novembro de 1943, a SS e a polícia deportaram cerca de 1.526.000 judeus, a maioria de trem, para os centros de extermínio da Operação Reinhard: Belzec, Sobibor e Treblinka. Entre 8 de dezembro de 1941 e março de 1943, e novamente em junho e julho de 1944, oficiais da SS e da polícia deportaram cerca de 156.000 judeus e vários milhares de ciganos e sinti para o centro de extermínio de Chelmno, de trem, caminhão e a pé.
Entre março de 1942 e dezembro de 1944, as autoridades alemãs deportaram cerca de 1,1 milhão de judeus e 23.000 ciganos e sinti para Auschwitz-Birkenau, a grande maioria por trem. Menos de 500 sobreviveram aos centros de extermínio da Operação Reinhard. Apenas um punhado de judeus sobreviveu aos transportes para Chelmno. Talvez 100.000 judeus tenham sobrevivido à deportação para Auschwitz-Birkenau por terem sido selecionados para trabalhos forçados na chegada.”
2) Sobre a “confusão” operada pelos nazistas entre comunistas e judeus… na Alemanha soa
Não tenho estatísticas sobre a eliminação dos militantes comunistas em toda a Europa, portanto não posso dizer até que ponto os judeus e os comunistas foram “confundidos” pelos nazistas quando eles invadiram até a Rússia, como escreve João Bernardo.
No que diz respeito à Alemanha, cerca de 60.000 ativistas comunistas alemães (de um milhão de membros do KPD) foram presos sob o nazismo e 2.000 foram executados imediatamente em março-abril de 1933; alguns permaneceram na prisão até o fim da guerra; outros foram libertados (principalmente no aniversário de Hitler, em 20 de abril de 1939), presos novamente por atos de resistência e condenados à morte; outros foram fuzilados muito tempo depois do início de seu encarceramento em campos de concentração, até abril de 1945.
Não encontrei nenhuma estatística específica sobre os prisioneiros políticos comunistas que foram fuzilados pelos nazistas, mas o número total de prisioneiros políticos alemães mortos pelos nazistas provavelmente não ultrapassa 77.000, somadas todas as tendências.
De acordo com Joachim Fest, 3 milhões de oponentes dos nazistas foram presos e encarcerados entre 1933 e 1945 (e às vezes não era preciso muito para ser rotulado de “oponente”). 225.000 opositores foram condenados entre 1933 e 1939. Outro historiador estima que havia cerca de 600.000 “combatentes da resistência” (de todas as convicções) na Alemanha, ou 1% da população. E cerca de 77.000 deles foram assassinados – “legalmente” ou não. Gilbert Merlio (Les Résistances allemandes à Hitler, Tallandier, 2003) estima que 25.000 oponentes foram condenados à morte durante a guerra, de um total de 100.000 prisioneiros políticos em 1942. Além disso, os nazistas escreveram muito menos relatórios detalhados sobre a eliminação de seus oponentes políticos de esquerda do que sobre o extermínio dos judeus.
Mas o regime nazista nunca aplicou uma política de extermínio sistemático contra seus oponentes não judeus de esquerda (ou de direita). Os números disponíveis, por mais parciais que sejam, estão aí para provar isso e não podem ser discutidos.
Dos 525.000 judeus alemães presentes no território do Reich em 1933, cerca de 250.000 fugiram. Dos 275.000 restantes, cerca de 170.000 foram assassinados.
Na Alemanha, uma comparação entre o número de comunistas (cerca de 77.000 em um milhão) e o número de judeus assassinados (cerca de 170.000 em 275.000) mostra claramente a diferença de tratamento entre os dois, mesmo que todos eles pudessem ser assimilados pelos nazistas a uma “anti-raça”.
Um abraço
(e desculpa a todos pela qualidade da traduçao em portugues feita pelo um software !)
* * *
Das vítimas não judias mortas durante as invasões de Hitler, cerca de 1,8 milhão eram poloneses (incluindo 50.000 a 100.000 membros da elite polonesa); 3 milhões eram prisioneiros de guerra soviéticos, 312.000 eram civis serbos e 5,7 milhões eram civis soviéticos. (Fonte: https://encyclopedia.ushmm.org/content/fr/article/documenting-numbers-of-victims-of-the-holocaust-and-nazi-persecution ). Esses números são objeto de controvérsia política tanto na Rússia quanto na Polônia e, portanto, são mais indicativos de uma ordem de grandeza do que precisos.
Não sei quantas dessas vítimas não judias eram comunistas, mas talvez seja razoável pensar que os critérios políticos de exterminar a “anti-raça” judia e os “sub-humanos eslavos” foram misturados aqui com critérios nacionais e raciais e objetivos militares (espalhar o terror matando o maior número possível de civis) sem que os nazistas se preocupassem em verificar se as pessoas que eles mataram ou deixaram morrer de fome tinham cartões do Partido Comunista o nao.
Cher Yves,
Os campos de extermínio foram tardios, enquanto os campos de concentração simples foram criados logo em 1933. Quando refiro campos de concentração sem especificar, estou a referir-me a todo o universo concentracionario (estou a escrever sem acentos).
No Labirintos do Fascismo indico os numerosos factos, as citações e as referências que monstram a concepção de uma anti-raça definida por critérios tanto biológicos como ideológicos, e nunca estritamente biológicos. Neste momento estou longe dos meus livros (aliás, estou longe de tudo) mas creio que é no quarto volume da ed. Hedra. Não sei indicar as páginas, mas não será difícil encontrar.
Salut et abraço.
Caro Joao, tems razao é no volume 4
A tua tese de uma “confusão” entre os objetivos de extermínio de judeus e comunistas, que se baseia nos ESCRITOS dos nazistas, parece-me frágil em sua aplicação PRATICA, primeiro na Alemanha e depois no resto da Europa: enquanto, em geral, 80 a 90% dos judeus foram exterminados pelos nazistas na Europa Oriental e nos territórios soviéticos ocupados pelo exército alemão, os comunistas nesses mesmos países nunca foram dizimados em tais proporções. Isso ocorreu, entre outras razoes, porque os comunistas tinham tradições de organização clandestina e eram (às vezes, mas nem sempre) apoiados materialmente pela URSS, o que não era o caso da população civil judea, mas é preciso dizer que os planos de extermínio nazistas tiveram efeitos muito diferentes nos dois grupos, por mais macabra que seja essa contabilidade.
Um abraço
Traduzido com a versão gratuita do tradutor – http://www.DeepL.com/Translator
Pets trans eu não sei, mas pets gays e bissexuais já se diz que existem:
“Talvez, muitas espécies seriam melhor descritas como bissexuais, pois transitam facilmente entre os dois comportamentos e não mostram uma orientação sexual definida. Talvez o preconceito de se relacionar com indivíduos do mesmo sexo seja um tabu para humanos, mas não para os nossos peludos.
A reportagem abaixo mostra bem o pêndulo entre o mental e o corporal, biológico.” https://www.estadao.com.br/emais/comportamento-animal/sera-que-caes-e-gatos-podem-ser-homossexuais/
E sobre a integração da humanidade na natureza, o pêndulo entre o mental e o biológico e a relação entre performance, espetáculo e identidade não deixa de ser interessante o movimento dos “transespécie” (destaque para o último parágrafo):
Transespécie: performer que não se identifica com a forma humana vive como cão e boneca
Mais uma forma de existir em sociedade está reunindo cada vez mais pessoas com a mesma identidade. Embora tenham nascido como seres humanos, essas pessoas não se identificam como tal. Gato, cachorro, aves e até camaleão já foram performados por quem não quer ser humano, mas sim assumir outra forma.
No caso do performer e designer brasileiro Raio Gama, não foi diferente. Hoje com 31 anos, o artista disse que se identificou com um animal quando colocou uma máscara de cachorro. Antes disso, quando ainda vivia exclusivamente como humano, Gama disse não se sentir representado e não se identificar com essa forma.
Todos os afazeres do cotidiano dos transespécies são realizados sempre com sua identidade. No caso de Gama, o performer faz tudo com a máscara e outros acessórios de cachorro. Quando não se expressa como animal, o artista usa elementos de boneca. Muitas pessoas estranham a condição do artista, enquanto outras até tentam fazer com que ele se comporte como humano.
Nos EUA, cada vez mais pessoas estão descobrindo a possibilidade de outras identidades que não sejam humanas. A artista Moon Ribas, moradora do Texas, fundou uma organização sobre transespécies. A Transespecies Society é uma organização local que reúne pessoas com a mesma condição. O trabalho da associação acontece de forma independente e busca refletir e promover a liberdade de expressão dos transespécie.
De acordo com Ribas, a necessidade de um movimento específico surgiu porque várias pessoas são transespécie. O transhumanismo, como ela chama as transições entre humanos, não representa pessoas que não se identificam dentro da ideia de humanidade. Assim, a ideia não é superar os seres humanos, mas ter a liberdade de exercer outra identidade.
Cirurgia
Algumas pessoas pensam em intervenções cirúrgicas para adequar o corpo à espécie de identidade. O brasileiro Raio Gama disse que prefere manter as suas formas originais. Assim, ele vive sua performance apenas com acessório e expressão corporal de acordo com a identidade.
Já nos EUA, cada vez mais transespécies são adeptos das cirurgias. Algumas pessoas colocam implantes para ter capacidades de animais. Presas, sensores, garras, pelos e outras características são implantadas. No caso de Moon Ribas, há um sensor nos pés que a permite detectar tremores de terra. Dessa forma, ela fica com a sensibilidade aguçada como a de um animal. Outro transespécie que fez alterações corporais é um amigo de Ribas. Neil Harbisson, também membro da Transespecie Society, tem sensores nas orelhas e consegue prever quando vai chover.
https://revistaladoa.com.br/2019/06/noticias/transespecie-performer-que-nao-se-identifica-com-a-forma-humana-vive-como-cao-e-boneca/
Mais um caso de transespécie: o Homem-Lobo.
https://youtu.be/LtH7l-dhHZQ
Transetarismo vem aí também
https://youtu.be/HvuCIwejwqw