Biografia do combatente anarquista búlgaro que se exilou na Rússia durante o início da revolução. Por AF
Nascido em Yambol, na Bulgária, em 1896, Gueorgui Cheitanov se provou uma das figuras mais excepcionais (e houve várias) do anarquismo búlgaro, bem como de sua organização específica, a Federação Anarco-Comunista.
Aluno brilhante no colégio, desde a tenra idade revelou uma natureza rebelde. Ele se aproximou muito cedo do movimento anarquista. Aos 17, queimou os arquivos de um tribunal local e foi forçado a fugir ao exílio após escapar da prisão, indo à Paris com 18 anos.
Lá, juntou-se com vários outros anarquistas búlgaros, como Varban Kilifarski, que lecionava em La Ruche, a escola libertária e centro cultural mantida pelo anarquista francês Sebastien Faure.
Retornou secretamente à Bulgária em 1914, continuando sua propaganda revolucionária. Preso e torturado pela polícia, escapou novamente e, entre 1917 e 1918, foi o único revolucionário búlgaro a ir à Moscou no início da Revolução Russa, cruzando o Danúbio, Romênia, as trincheiras russas, Ucrânia e Rússia disfarçado como um soldado.
Em Moscou, fez contato com o velho marxista Plekanhov e outros bolcheviques e marxistas bem conhecidos, que propuseram que assumisse a tarefa de editar um jornal revolucionário em língua búlgara. Mas fazendo amizade com muitos anarquistas russos, ele logo percebeu o verdadeiro papel contrarrevolucionário dos bolcheviques.
Decidiu retornar à Bulgária devido às circunstâncias favoráveis à revolução após o colapso do front búlgaro com a revolta dos soldados. Atravessando a Ucrânia, ele caiu nas mãos do Exército Branco da reação russa, mas conseguiu escapar do esquadrão de fuzilamento! De volta à Bulgária, entrou em contato com o movimento anarquista, que em sua maior parte estava sendo forçado a atuar na clandestinidade. Lançou sua famosa carta aberta, Apelo aos Anarquistas, bem como o Manifesto aos Revolucionários, textos nos quais ele desenvolve uma posição claramente anarquista em defesa da Revolução Russa.
Participou de várias ações armadas contra o Estado, escapando da prisão duas vezes em circunstâncias espetaculares. Aos 26 anos, fez um balanço das táticas de guerrilha do movimento e apresentou uma autocrítica ao descrevê-las como inadequadas às lutas sociais em curso na Bulgária. O que faltava, a seu ver, eram ações e organização de massas, não só nos locais de trabalho, mas em todas as esferas da vida.
Talentoso propagandista, orador e poeta, exerceu uma grande e carismática influência sobre muitos. Como orador, evitava os truques comuns, comunicando-se de forma clara e concisa. Participou da libertação da prisão do célebre anarquista Peter Maznev, e discursou aos guardas capturados durante a ação sobre o anarquismo e a situação social. Esses policiais foram libertados após prometerem que deixariam a corporação – e eles mantiveram a promessa! Maznev morreu de tuberculose devido à sua prisão e à vida na clandestinidade. Enterrado em sua vila natal, seu funeral foi uma marcha massiva na qual participaram os anarquistas locais. Cheitanov fez uma fala apaixonada, que foi muito comentada depois e contribuiu para o rápido desenvolvimento do movimento anarquista na região.
Cheitanov colaborou com a Sociedade Livre, publicação teórica da Federação Anarco-Comunista, bem como com a revista literária Plamak (Flama), que influenciou muitos intelectuais. Também editou o jornal clandestino Acratia entre 1924-1925, que só foi publicado três vezes.
Em 1923, um golpe militar levou à chacina de 35 mil trabalhadores e camponeses. A resistência armada que se seguiu terminou com um atentado à bomba do Partido Comunista na Catedral de Sofia, mirando a elite do país. Fascistas e militares iniciaram uma campanha de repressão massiva contra o movimento revolucionário.
A polícia estabeleceu destacamentos especiais para caçar Cheitanov. Todas as guerrilhas foram unidas numa só divisão, sendo forçadas a dispersar a partir do fim de maio. Cheitanov e sua companheira de amor e luta, Mariola Sirakova, foram capturados e presos numa emboscada. Levaram-nos à estação ferroviária de Belovo e executados com outros 12 prisioneiros em 2 de junho de 1925. Cheitanov foi oficialmente reconhecido no regime comunista do pós-guerra, que batizou ruas com seu nome e ergueu uma estátua em sua homenagem em sua cidade natal, Yambol. Isso não impediu que eles continuassem perseguindo os camaradas ainda vivos de Cheitanov, mandando vários para prisões e campos de concentração!
Este artigo foi originalmente publicado em inglês na 52ª edição de Organise!, publicação da organização anarco-comunista britânica Anarchist Federation (AF), e está disponível aqui. Sua tradução ao português pelo Passa Palavra faz parte do esforço coletivo de traduções que o site está mobilizando no centenário da Revolução Russa – veja aqui a lista de textos e o chamado para participação.
Desisti de ler ao qualificarem os bolcheviques de contra revolucionários, faria o mesmo se a declaração fosse sobre os anarquistas. Como da pra acreditar no texto se não tem o mínimo de rigor?
Lucas, com esse adjetivo sabemos a posição da Anarchist Federation britânica – que escreveu essa biografia muitos anos depois – sobre o papel dos bolcheviques na Revolução Russa. Mas no próprio texto, os mesmos autores contam que Cheitanov fez a revolução ao lado desses bolcheviques, em 1917 na Rússia e na resistência armada após 1923 na Bulgária. Por outro lado, também se considerava bolchevique o governo que perseguiu os remanescentes do anarquismo búlgaro no pós-guerra.
Devemos esperar o que em nossa leitura? Da mesma forma, não parecem descartáveis para a compreensão do processo revolucionário as produções comunistas que qualificaram os anarquistas como bandidos, ou contrarrevolucionários.