Disponível também em FRANCÊS.
Por João Bernardo
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A operação ideológica fundamental do fascismo consiste na conversão da luta entre classes numa luta entre nações.
Entre 1908 e 1910, o político e intelectual nacionalista Enrico Corradini começou a apresentar o seu país como uma «nação proletária». «Há nações que estão numa situação de inferioridade relativamente a outras, tal como há classes que estão numa situação de inferioridade relativamente a outras classes», afirmou ele em Outubro de 1910. «A Itália é uma nação proletária; basta a emigração para o demonstrar. A Itália é a proletária do mundo». Nesta perspectiva, as classes ficavam diluídas na entidade nacional. «O nacionalismo é, em suma, a reafirmação da solidariedade nacional contra a luta de classes», proclamou Corradini em 1911; «é o esforço para repor as classes no seu lugar e para as subordinar novamente aos objectivos da nação». Poucos anos antes, no Japão, o socialista Kita Ikki encetara uma evolução convergente, apoiando a guerra de 1904-1905 contra a Rússia e estabelecendo uma analogia entre o confronto de classes no interior das fronteiras nacionais e a disputa entre Estados na arena mundial. A partir de então Kita evoluiu para posições nacionalistas cada vez mais extremas. «Tal como no interior de uma nação se trava a luta de classes pelo reajuste das desigualdades, também a guerra entre nações por uma causa nobre há-de resolver as actuais desigualdades injustas», escreveu ele num livro publicado em 1923. «Os socialistas ocidentais entram em contradição ao admitirem que o proletariado tem o direito de recorrer à luta de classes dentro do país e ao condenarem simultaneamente como militarismo e agressão a guerra travada pelas nações proletárias».
Gerado simultaneamente na Itália e no Japão, desde a sua génese o fascismo é universal, abrangendo todo o mundo capitalista, independentemente de geografias ou tradições culturais.
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O postulado fundamental do fascismo passou a caracterizar a esquerda após a segunda guerra mundial.
Os fascismos foram derrotados militarmente em 1945, mas a partir de então o seu postulado ideológico fundamental, transformando a luta entre classes numa luta entre nações, tornou-se hegemónico na esquerda. O terceiro-mundismo, assente na dicotomia de Centro e Periferia, limitou-se a actualizar a noção de uma luta das «nações proletárias» contra as «nações plutocráticas», e pensadores e políticos de esquerda ou mesmo de extrema-esquerda empregaram indiferentemente a terminologia de nações colonizadas e de nações proletárias, como se os conceitos não tivessem consequências. Mas tinham-nas. No interior das «nações proletárias» as classes sociais ficaram diluídas, e as elites do terceiro mundo puderam considerar-se, à semelhança do que haviam feito as elites fascistas, como representantes de toda a população numa comunidade nacional.
Como foi possível que uma base ideológica fundamental do fascismo açambarcasse a esquerda?
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A revolução russa não foi russa, foi europeia.
No Natal de 1914, ainda não haviam decorrido cinco meses desde o início da guerra mundial, soldados britânicos e alemães tomaram a iniciativa de estabelecer uma trégua para festejarem a data em conjunto, e entre franceses e alemães estas fraternizações reproduziram-se durante o Inverno de 1915-1916. O movimento de hostilidade à guerra avolumou-se e consolidou-se, até que entre Abril e Setembro de 1917 uma onda de revolta se propagou nas trincheiras francesas, atingindo o auge em Maio e na primeira metade de Junho. Durante estas seis semanas amotinou-se a maior parte do exército francês, hasteando bandeiras vermelhas e ameaçando marchar sobre a capital para derrubar o governo, e também na frente de Salónica as tropas francesas se sublevaram em Julho de 1917. Ao mesmo tempo as deserções eram cada vez mais numerosas, a ponto de um relatório do serviço de informações do exército referir, em Julho de 1917, a presença de dez mil desertores só na região parisiense. Embora com menores proporções, a indisciplina alastrou ao sector britânico e em Setembro de 1917 ocorreu um motim nas tropas australianas e neozelandesas. Também no Corpo Expedicionário Português, dependente do comando britânico, sucederam-se insubordinações e revoltas. E nas tropas italianas contou-se mais de um milhão de deserções. Aliás, antecipando-se aos confrontos nos campos de batalha, os trabalhadores italianos haviam desencadeado em Junho de 1914 um enorme movimento antimilitarista, com que procuraram garantir a manutenção da neutralidade do país, declarando uma greve geral que em alguns lugares se abeirou da insurreição. No lado oposto, a marinha alemã amotinou-se no Verão de 1917.
A agitação entre os soldados era inseparável da agitação entre os trabalhadores. De 1915 a 1916 o número de dias de trabalho perdidos por greve na Alemanha aumentou 500%, e 700% de 1916 a 1917, quando atingiu dois milhões. As greves de Abril de 1917 em Berlim mobilizaram entre 200.000 e 300.000 trabalhadores. Na mesma altura uma vaga de greves agitou o operariado do Império Austro-Húngaro, e os motins provocados pela fome tornaram-se cada vez mais frequentes em Budapeste e em Viena. No lado da Entente, de 1915 a 1916 o número de movimentos grevistas em França subiu 220% e a quantidade de participantes aumentou mais de 340%, sendo as cifras correspondentes entre 1916 e 1917 de cerca de 120% e de 610%. Entretanto o rendimento do trabalho diminuía consideravelmente nas fábricas francesas de material de guerra. Mais importante ainda foi o novo carácter assumido pela organização do movimento operário, pois na Grã-Bretanha as greves de 1916 e 1917 suscitaram a expansão e a generalização dos shop stewards, membros dos sindicatos eleitos pelos trabalhadores no quadro das unidades de produção e que defendiam as posições da base operária, opondo-se frequentemente às direcções sindicais. E na Itália a insatisfação generalizou-se em 1917 entre operários e camponeses, culminando em Agosto numa revolta de cinco dias em Turim, reprimida com uma violência tal que se contaram cerca de cinquenta mortos e duzentos feridos e mais de oito centenas de presos. Foi então que começaram a aparecer no norte do país as comissões internas de fábrica, cujas implicações só se iriam manifestar plenamente durante as grandes greves de Agosto e Setembro de 1919.
Assim, aquela revolução a que geralmente se chama russa foi uma componente inseparável do processo revolucionário europeu. Já em meados de 1915 as autoridades militares czaristas estavam plenamente conscientes da desmoralização das tropas e das proporções assumidas pela deserção, e em Setembro desse ano soldados reservistas juntaram-se aos protestos populares. No final de 1915 os marinheiros amotinaram-se em dois navios de guerra e em Abril de 1916 os soldados de quatro regimentos russos estabeleceram uma trégua com tropas do Império Austro-Húngaro para festejarem em conjunto a Páscoa ortodoxa. Entretanto, em Janeiro desse ano mais de 10.000 operários haviam entrado em greve numa base naval do Mar Negro, um movimento que depressa atravessou o país, paralisando 45.000 trabalhadores do porto de Petrogrado, e calcula-se que em Outubro de 1916 cerca de 200.000 operários estivessem a participar em 177 greves de carácter político. A situação agravou-se de então em diante, culminando na revolução iniciada em Fevereiro de 1917, e de nada valia aos novos governantes decretar a reforma agrária sem pôr termo à guerra, porque os soldados, que na esmagadora maioria eram camponeses, queriam regressar às suas aldeias, repartir e ocupar as terras dos grandes proprietários e começar a cultivá-las. A questão da paz e a questão agrária estavam indissoluvelmente ligadas.
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Lenin transformou uma revolução internacional numa operação geopolítica nacional.
A 3 de Março de 1918 o governo bolchevista assinou com as Potências Centrais o Tratado de Brest-Litovsk, que não só reconheceu a ocupação de uma parte da Rússia pelo exército alemão, como lhe entregou o controle absoluto sobre a população desses territórios. Isto significa que, através da repressão e das chacinas, os generais alemães poderiam destruir a obra de renovação social que os operários e os camponeses russos ali haviam encetado. Ora, a capitulação dos bolchevistas perante as imposições do militarismo imperial germânico desnaturou um processo revolucionário que até então fora exclusivamente internacionalista e — o que tornava essa capitulação muitíssimo mais grave — continuava a ser internacionalista, porque a agitação revolucionária avolumava-se nas Potências Centrais. Em Janeiro de 1918, poucos dias depois de ter terminado uma vaga de greves que, reivindicando a paz imediata, paralisara Viena e Budapeste, começou em Berlim e estendeu-se a meia centena de cidades alemãs uma série de greves que mobilizou várias centenas de milhares de operários e foi acompanhada por manifestações contra a guerra. Tal como sucedera na Entente, em ambos os países esta agitação operária deu lugar à criação de conselhos, assembleias de base que não alienavam o controle exercido sobre o processo de luta e podiam em qualquer momento revocar o mandato dos delegados eleitos. E na Hungria, em Maio de 1918, dois mil soldados insurreccionaram-se e recusaram-se a seguir para a frente de combate, recebendo o apoio dos trabalhadores das minas de carvão vizinhas. A agitação era incessante e em Viena e Budapeste, em Junho de 1918, ocorreram greves violentas e manifestações contra a fome, ao mesmo tempo que progrediam as deserções no exército austro-húngaro. Em Outubro desse ano, na frente do Piave, partes de duas divisões austro-húngaras amotinaram-se e negaram-se a contra-atacar. Entretanto, noutra das Potências Centrais, a Bulgária, a linha de frente desintegrara-se completamente em Setembro de 1918, quando os soldados se recusaram em massa a prosseguir o combate. E nas batalhas do Verão e do Outono desse ano sucedeu que milhares de soldados alemães se entregassem como prisioneiros sem oferecer resistência ou sequer disparar um tiro. Calcula-se que o número de desertores atingisse então na Alemanha mais de setecentos e cinquenta mil. Por fim, a revolta dos marinheiros da armada alemã do Báltico, no final de Outubro de 1918, estendeu-se rapidamente em Novembro por todo o país e sublevou os restantes soldados e os trabalhadores da indústria, dando início à revolução dos conselhos, que ressurgiu em repetidas ocasiões nos anos seguintes e deixou na classe trabalhadora marcas muito duradouras.
Em Brest-Litovsk o leninismo desligara-se do processo revolucionário internacional que lhe havia permitido o triunfo. Não são as causas desta capitulação que aqui me importam, mas as suas consequências.
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Toda a estratégia da Terceira Internacional consistiu em subordinar a luta de classes mundial à defesa da pátria socialista.
Em 1919 Lenin escreveu no primeiro número do jornal da recém-fundada Internacional Comunista: «A nova terceira “Associação Internacional dos Trabalhadores” já começou a coincidir em certa medida com a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas». De então em diante, a evolução do movimento comunista fez com que a Terceira Internacional coincidisse com a União Soviética já não «em certa medida», mas completamente. Ao mesmo tempo, enquanto expressão e condição deste processo, ocorreram notáveis alterações semânticas, no centro das quais a palavra internacionalismo passou a significar o seu exacto contrário, até que em 1935 Georgi Dimitrov, no seu relatório ao 7º Congresso do Komintern, declarou que «o internacionalismo proletário deve, por assim dizer, “aclimatar-se” em cada país, para se enraizar profundamente na terra natal». O internacionalismo fora transformado numa soma de nacionalismos, e a presidir à pirâmide estava a pátria do socialismo. Em vez de ser um quadro de solidariedade entre lutas, a Terceira Internacional foi uma correia de transmissão de directivas que subordinavam ao Kremlin os comités centrais dos partidos comunistas nacionais. E se para um lado se veiculavam decisões, em sentido inverso veiculavam-se informações. Assim, dissimuladamente, a Terceira Internacional converteu-se num vastíssimo aparelho de espionagem, o que explica que o movimento lançado pelo senador McCarthy conseguisse destruir tão rápida e definitivamente a esquerda comunista nos Estados Unidos. Onde antes havia confrontos entre classes, ancorados na sociedade, passaram a ser suficientes operações de polícia, resumidas a casos individuais.
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Na Guerra Fria a luta contra o imperialismo converteu-se numa oposição geopolítica.
Neste novo quadro ideológico da esquerda, reduzido a nações e agrupamentos de nações, o imperialismo deixou de ser entendido como um movimento expansivo do capital para se converter num sinónimo de Estados Unidos, por vezes numa acepção quase racista. Em vez de ser a dinâmica económica a explicar a supremacia política, passou a considerar-se a força política e militar como causa do predomínio económico, e deste modo a luta de classes travada no plano da economia foi substituída por um confronto geopolítico em que de um lado estava o bloco socialista e do outro lado estava o imperialismo americano. Era uma vez mais a ideologia fascista que triunfava, porque a esfera soviética apresentava-se como bastião das «nações proletárias», enquanto as «nações plutocráticas» convergiam em redor do imperialismo americano.
E assim ficou absolvido o imperialismo dos capitalismos de Estado governados por partidos comunistas.
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A dissolução da União Soviética facilitou a transformação da geopolítica em movimentos identitários.
A dissolução da União Soviética teve dois efeitos paralelos. Por um lado, já que a transnacionalização do capital tornara as fronteiras em grande medida obsoletas, as noções ideológicas do fascismo adquiriram um novo alento e as «nações proletárias» converteram-se em identidades marginalizadas, enquanto as «nações plutocráticas» passaram a servir de modelo a identidades consideradas opressoras. Pouco importa aqui o critério das identidades, quer seja a cor da pele e o formato do nariz ou o sexo ou as preferências sexuais ou mesmo a ausência de preferências. O que importa é que se assumam como identidades, tal como uma nação se define pelo simples facto de se assumir como nação. Iniciou-se então uma competição de vitimizações, e a identidade que demonstrar ter sido mais vítima é equiparada a uma «nação proletária», assim como, reciprocamente, a identidade considerada mais beneficiada é equiparada a uma «nação plutocrática». Ora, neste contexto a geopolítica não desapareceu, porque as identidades beneficiadas são assimiladas ao tão odiado eurocentrismo. E, embora esta nova geografia política já não diga respeito a nações, mas a identidades supranacionais, apesar deste deslizamento terminológico a semântica fundamental mantém-se, o critério e o objectivo dos confrontos permanece o mesmo, não a abolição das exclusões, mas a conversão dos excluídos em excludentes.
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A dissolução da União Soviética mostrou que a pátria socialista se convertera já na pátria russa.
Por outro lado, a dissolução da União Soviética tornou explícito que a pátria do socialismo já há muito não era senão a velha pátria russa. O primeiro-secretário do Partido Comunista da Federação Russa, Gennady Zyuganov, sustenta que no final da guerra Stalin estaria decidido a abandonar as referências ao marxismo-leninismo e a adoptar oficialmente uma ideologia baseada no patriotismo soviético. Com efeito, quando a União Soviética começou a participar na segunda guerra mundial, designada como Grande Guerra Patriótica, as referências à tradição revolucionária, mesmo sendo apenas superficiais, foram substituídas por símbolos mais poderosos, evocativos dos mitos religiosos e de nebulosas grandezas nacionais. Zyuganov lastima que a morte tivesse impedido Stalin de levar a cabo a remodelação estritamente nacionalista da entidade soviética, mas essa aspiração persistiu no interior dos serviços secretos, o KGB, onde a maioria dos quadros superiores considerava o comunismo como uma fase transitória, rumo à afirmação da Rússia enquanto potência mundial. Convém não esquecer que Vladimir Putin iniciou em 1975 uma carreira promissora nos serviços secretos; e o Partido Comunista da Federação Russa, o segundo maior do país, está na origem imediata da invasão da Ucrânia, porque foi ele que apresentou no parlamento a proposta de reconhecimento da independência de Donetsk e de Luhansk.
Este longo percurso, desde as «nações proletárias» até à invasão da Ucrânia, é um de profundis pela esquerda.
A fotografia de destaque é de Diego Herrera, a outra é de Sergey Bobok.
Há um tropeção no final do texto. Contudo, sem em nada abalar a relevância da análise como um todo.
Como muitas outras publicações do PassaPalavra, e não só aquelas de autoria de João Bernardo, o artigo se constitui numa imprescindível fonte de consulta para a compreensão do tema abordado.
Enfatizado isto, qual o tropeção?
Apontar o PCFR como origem imediata da invasão da Ucrânia, por seu apoio à independência de Donetsk e de Luhansk, é um evidente exagero.
Dentro das circunstâncias, qual outra opção senão reconhecer a autonomia das duas Repúblicas?
Por outro lado, a retrospectiva histórica apresentada no artigo deixa inconteste como a alternativa nacionalista conduz a um beco sem saída, em cujo tenebroso fundo se encontra o Fascismo.
Na seção “Pontos de Partida” de seu site, o PassaPalavra demarca: 《Não são os conflitos da geopolítica que nos interessam, mas a globalização da luta de classes; 》.
Como a Luta de Classes globalizada, inclusive entre as frações internas à classe dominante, se materializa na Ucrânia?
Como o Fascismo foi capaz de se manter enraizado com tanta firmeza na Ucrânia?
Junto com cada ascensão do Fascismo se ouve o grito mudo de uma revolução asfixiada.
Quais as revolução fracassadas na Ucrânia?
– no passado histórico, o aniquilamento da Makhnovtchina pelos bolcheviques sob a liderança de Trotsky;
– no passado imediato, a Revolução Laranja e o Euromaidan.
O evento geopolítico da invasão russa só pode ser devidamente compreendido sob a perspectiva da luta entre as frações do Capital globalizado.
Por sua vez, este conflito inter-imperialista se conduz através de Estados-Nação e das mega-corporações transnacionais.
Quais os interesses econômicos em jogo na Ucrânia?
As sanções contra a Rússia tendem também a ser um tiro pela culatra, inviabilizando o Dólar como padrão monetário, com um acirramento das disputas internas na classe dominante mundial.
Caso não desemboque numa guerra nuclear, esse período de reposicionamento político e econômico abrirá quais oportunidades para a luta internacional do proletariado?
Onde estariam as sementes de uma nova Revolução na Ucrânia? Nas Repúblicas do Donbass?
CAPITALISMO & ESQUIZOFRENIA
Resumindo a ópera: não é de hoje que esquerda e direita nada mais são do que ala esquerda e ala direita do kkkapital, duas facções criminosas que disputam entre si o poder (contrarrevolução permanente) no partido da ordem necropolítica.
Caro João,
Podemos de facto falar de desertores e rebeldes.
Isto fora das ideologias.
Mas não serão os dois grandes fracassos a da segunda Internacional (podemos também incluir os anarquistas) perante a primeira guerra mundial, e o da revolução alemã que isolou todas as possibilidades desde o início ?
Abraço
Paulo, arriscando responder à sua pergunta…. Quanto à Segunda Internacional não tenho o que dizer pois não estudei o suficiente para me arriscar nesse debate. Quanto à contrarrevolução na Alemanha e a “urgência” de acatar o tratado de Brest-Litovsk, veja que o fundamento já passa por um olhar gestor em que sacrificar os sovietes ocupados (ainda por cima por adversários, como era o caso dos maknovistas na Ucrânia) é lido como uma condição indispensável para assegurar o socialismo “em um só país”. Agora, o que aconteceria se Lênin não tivesse entregado esses territórios para as grandes potências? Teria aquela insurgência se avolumado ou morrido ainda em seu início? Aí já é difícil responder, mas na condição de proletários, tudo o que temos a perder são nossos grilhões. Uma vez mais me parece indispensável termos isso em mente quando nos solidarizamos com os ucranianos, e não com suas respectivas classes dominantes.
O mais otário dos proletários sabe, os intelectuais orgânicos ignoram: esquerda&/direita é a polaridade pseudoantagônica do kapitalestado. Samsara AnaBatista
Caro João,
Apesar de apontar semelhanças e trânsitos entre uma coisa e outra, entendo que na análise do fascismo você sempre tratou a URSS e demais países do “bloco socialista” como algo diferente, o que me faz sentido: eram regimes capitalistas de Estado que vinham de uma tradição revolucionária (nem sempre de revoluções, já que às vezes tratava-se de anexação militar). Se em alguns momentos da história, como no nacional bolchevismo, no Cambodia ou na Coreia do Norte, o chamado “socialismo” cruzou uma certa linha e adentrado mais claramente à zona indistinta do fascismo, ainda assim faz sentido ter o cuidado de tratar o stalinismo histórico como outra coisa.
Mas e hoje? Sem URSS, sem “socialismo real”, sem a Guerra Fria, o que resta para a esquerda que reivindica esses regimes? Na prática, a posição dos “neostalinistas” e afins – a “esquerda geopoliticista”, vamos dizer – não se tornou definitivamente mais uma vereda dentro dos labirintos do fascismo? Você acha que ela ainda conserva alguma diferença substancial, para ser tratada de outra forma?
Ou seria apenas em certos momentos/assuntos (a guerra da Ucrânia um exemplo evidente) que esses setores políticos se indistinguiriam com o fascismo? — o que também tem seu sentido, visto que o fascismo opera justamente mantendo essa área de confusão; e por isso precisaria manter uma área de circulação com a esquerda.
Boa noite
Caio
Paulo e Alan,
A Segunda Internacional não foi homogénea, e se houve uma facção partidária do desenvolvimento capitalista, ou mesmo uma ala que depois se somaria aos partidos e movimentos fascistas, houve outra facção, muito considerável, que combatia o capitalismo, mas combatia igualmente a ditadura exercida pelo partido bolchevista sobre a classe trabalhadora. O leninismo atacava esta ala esquerda da Segunda Internacional com uma violência maior ainda do que a exercida contra a ala direita, e assim contribuiu para que grande parte dos trabalhadores anticapitalistas se aproximasse do reformismo.
É a esta luz que devemos analisar o processo revolucionário europeu desenvolvido ao longo da primeira guerra mundial. Para além dos dados que indiquei muito sumariamente nas 3ª e 4ª teses, convém saber que em França as eleições de Abril e Maio de 1914, a escassos dois meses do começo do conflito, e cujo tema principal fora a ampliação do período de recrutamento obrigatório e, portanto, a preparação para um massacre que se previa iminente, haviam dado uma clara maioria às forças políticas contrárias à extensão do serviço militar e favoráveis a uma conciliação com a Alemanha. Aliás, nunca os socialistas franceses haviam conseguido uma tão expressiva votação. Igualmente no Reino Unido o entusiasmo popular pela guerra era pouco visível. E na Itália, antecipando-se aos confrontos nos campos de batalha, os trabalhadores desencadearam em Junho de 1914 o enorme movimento antimilitarista que mencionei na 3ª tese. Por seu lado, na Alemanha as greves espontâneas, organizadas fora do aparelho social-democrata, tinham-se tornado cada vez mais frequentes e amplas nos anos anteriores à guerra, o que indica a perda de influência daqueles dirigentes socialistas e sindicais que em breve haveriam de optar pelo campo patriótico. A derrota de todo este movimento revolucionário nos anos seguintes ao final da guerra deve-se a várias causas, mas uma delas foi, sem dúvida, a conversão da Rússia socialista na pátria socialista.
Caio,
O nacional-bolchevismo, na acepção ampla que eu uso no Labirintos do Fascismo, é um campo de convergência, ou de cruzamento, entre a extrema-direita e a extrema-esquerda, indispensável para a gestação do fascismo. Mas enquanto esse campo se mantiver, o fascismo não está ainda formado, sendo prematuro classificar como fascistas o pólo nacionalista ou o pólo socialista. No regime de Putin, porém, não existe nenhum pólo socialista, já que o Partido Comunista da Federação Russa abandonou o marxismo para adoptar exclusivamente o nacionalismo. Seguindo o modelo definidor do regime fascista proposto no Labirintos do Fascismo, em que um eixo que reúne partido, sindicatos e milícias se cruza com outro eixo que reúne a Igreja e o exército, então parece-me que o regime de Putin deve classificar-se como um fascismo. Talvez um fascismo conservador, como o de Salazar. Quanto ao apoio que uma certa esquerda presta ao regime de Putin, a invasão da Ucrânia serviu para colocar essa ex-esquerda ainda mais claramente no campo do fascismo.
Uma complexidade muito além do sectarismo e do dogmatismo: a verdade se demonstra na práxis
Como a Esquerda Revolucionária internacional pode apoiar concretamente a classe trabalhadora do Donbass, na Ucrânia?
a) – Redigir uma dura moção de protesto tanto contra a invasão russa como contra a ocupação da Ucrânia pelos EUA/OTAN.
b) – Organizar uma vaquinha on-line para arrecadar doações.
c) – Disparar um tuitaço.
d) – Formar uma brigada militar internacionalista, seguindo o exemplo da Guerra Civil Espanhola.
e) – Fazer campanha de denúncia das atrocidades cometidas pelos UkroNazis.
Atendendo ao princípio internacionalista da solidariedade proletária, formou-se uma brigada multinacional para combater na Ucrânia ao lado da classe trabalhadora das Repúblicas Populares do Donbass, há 8 anos sujeitas a ataques constantes dos nazistas ucranianos.
Logo em sua primeira missão, a Brigada Internacionalista foi designada para uma ação conjunta com as tropas russas, as quais consideram como invasoras da Ucrânia.
Qual a decisão a ser tomada pela Brigada:
a) – Recusar a missão e se dissolver, retornando aos seus respectivos países.
b) – Passar também a combater os russos.
c) – Manter uma aliança tática-operacional com os russos até a derrota dos nazistas.
d) – Fazer uma enquete nas redes sociais sobre qual a melhor opção.
e) – Sair da frente de atuação militar e se dedicar ao socorro imediato da população atingida pela guerra.
Os dogmas actuais da esquerda datam da primeira guerra mundial, quando dois blocos claramente imperialistas, a Entente e as Potências Centrais, se defrontavam num conflito entre imperialismos. Hoje temos a Ucrânia, a quem a Nato prometeu vagamente uma adesão, remetendo-a para as calendas, e uma sub-potência imperialista, a Rússia, que invadiu, sem provocação imediata, um país vizinho. O actual governo ucraniano não sofre uma influência directa dos grupos fascistas. Em, contrapartida, o regime de Putin não só é influenciado pelo fascismo, mas é tendencialmente fascista. Apresentar a invasão da Ucrânia como um conflito entre a Grande Rússia e a Nato é aceitar a demagogia de Putin. A invasão da Ucrânia é simplesmente uma agressão russa. E as milícias estrangeiras que o governo ucraniano convocou têm uma réplica nas milícias sírias e tchetchenas, além das milícias Wagner, mobilizadas por Putin. Agora há um agressor, o governo russo, e uma vitima, o povo ucraniano. É neste contexto que devemos pensar o que será a solidariedade de classe numa guerra moderna, o que não está explicado nos livros.
Na Rússia, as manifestações contra a guerra já levaram à detenção de mais de 14 mil pessoas em 112 cidades. São estes quem nos mostra o caminho.
Quais das opções abaixo indica que “O actual governo ucraniano não sofre uma influência directa dos grupos fascistas”?
a) – Desde 2014 o Batalhão Azov está oficialmente integrado à Guarda Nacional da Ucrânia, sendo a única unidade militar abertamente neonazista nos quadros de um exército regular no mundo.
b) – 2015: Dmytro Yarosh, na época líder do partido neonazista do “Setor de Direita”, foi nomeado conselheiro militar do coronel-general Viktor Muzhenko, então chefe do Estado-Maior ucraniano.
c) – 2018: o Azov cria uma unidade de patrulha (denominada National Druzhyna) como uma polícia militar, para “restaurar” a ordem em Kiev, fazendo da Ucrânia a única nação do mundo a ter oficialmente neonazistas em suas forças policiais.
d) – 2019: em seu primeiro dia como presidente da Ucrânia, Zelensky nomeia como seu chefe de gabinete Andriy Bogdan, advogado do bilionário Igor Kolomoisky (um dos principais financiadores dos grupos neonazistas da Ucrânia).
e) – 2021: mais uma edição impune da “Marcha das Tochas”, organizada pela extrema direita no centro de Kiev, para homenagear a unidade militar ucraniana SS Galizien, e o aclamado herói nacional criminoso de guerra Stepan Bandera, sob o lema “O nacionalismo é a nossa religião. Bandera é o nosso profeta”.
Aos leitores:
No meu último comentário, eu escrevi: «O actual governo ucraniano não sofre uma influência directa dos grupos fascistas». Usei o presente do indicativo e referi-me ao actual governo ucraniano, não aos governos existentes em datas anteriores. O facto de o presidente Zelensky ter como chefe de gabinete um advogado de um multimilionário que por sua vez apoia grupos neonazis é demasiado indirecto para ser considerado uma «influência directa». Quanto a um desfile fascista organizado nas ruas da capital, creio que não haverá nenhum país da União Europeia onde não se organizem desfiles fascistas. Faz parte da chamada democracia política.
Os apoiantes, declarados ou velados, do regime de Putin procuram que esqueçamos o facto fundamental — o exército ucraniano não invadiu a Rússia, mas foi o exército russo que invadiu a Ucrânia.
Um conhecido membro de um partido de esquerda e ex-candidato a governador pelo estado de SP escreveu sobre a atual guerra na Ucrânia:
“A neutralidade da Ucrânia e o fim das sanções contra a Rússia significa um recuo significativo dessa ofensiva imperial. Significa viabilizar a existência de um contrapeso forte ao unilateralismo da casa Branca.
De outra parte, a derrota russa implica o aumento sem freios do poder norteamericano, a anulação da União Europeia como ator político significativo e a predominância da direita e da extrema direita com peso real nas disputas internas em cada país.
NESSA DISJUNTIVA TERRÍVEL, a guerra tem de ser analisada por seu prisma mais geral. Há catástrofes humanitárias em curso e há problemas reais internos à Rússia, mas existe um espectro mais largo a ser levado em conta. Um superpoder único submete o sistema internacional à perspectiva de dominação sem espaço para qualquer tipo de autonomia ou negociações potencialmente democratizantes.
Num panorama realista de construção de um mundo de equilíbrio multilateral, é melhor que Moscou vença a guerra.”
https://www.diariodocentrodomundo.com.br/melhor-que-a-russia-venca/
A esquerda está abertamente justificando a guerra em nome de uma alteração no quadro da geopolítica entre os diversos Estados capitalistas. O interessante desse texto é que o autor falou abertamente o que pensa, e com ele está boa parte da esquerda, muitos dos quais não tem coragem de falar isso abertamente.
Paulo Henrique,
A esquerda — e não só no Brasil — tem uma necessidade absoluta dos Estados Unidos. Tudo o que sucede de mal, a culpa é do imperialismo; e o imperialismo deixou de ser um movimento do capital para ser identificado com um país, por vezes mesmo entendido como uma raça, os yankees. Desta forma a esquerda escusa de analisar as contradições da sociedade e nomeadamente das elites autóctones, e a sua incapacidade para lutar nessas contradições. O imperialismo americano é o álibi de que a esquerda precisa para se desculpar a si mesma.
A consequência mais grave desta atitude é o abandono da luta de classes em benefício da geopolítica. A esquerda adoptou aquele que foi o tema gerador dos fascismos, o confronto entre as «nações proletárias» e as «nações plutocráticas». E assim Putin é visto hoje como o campeão das «nações proletárias».
A ironia desta atitude — triste ironia! — é que Putin adopta também um modelo geopolítico para justificar o seu próprio imperialismo. O ideólogo fascista Aleksandr Dugin, muito influente no círculo dirigente que rodeia Putin, defende a noção de uma Eurásia animada pela Rússia, e aliás as ideias de Dugin têm repercussão sobre importantes comentadores políticos chineses, nomeadamente após a série de palestras que ele proferiu em Pequim em 2018.
Ora, a geopolítica é uma forma simplista, ou mesmo simplória, de entender os confrontos entre imperialismos, porque reduz a dinâmica do capital à definição estática de espaços. As lutas sociais, pelo contrário, permitem entender a economia no seu dinamismo. Mas infelizmente é ingénuo, nas circunstâncias actuais, dizer que os trabalhadores de um e outro lado das linhas de frente devem largar as armas e abraçar-se. É ingénuo porque as guerras ocorrem precisamente porque os trabalhadores não conseguiram impedi-las. Onde está então a luta social naquela guerra? Na actual invasão da Ucrânia pelas tropas russas a luta social está em dois lugares.
A luta social está nos 2,8 milhões de ucranianos que, segundo os dados fornecidos hoje pela ONU, fugiram do seu país. O pretexto ideológico que Putin fornece para a invasão, e que muita gente de esquerda adopta e repete, é que as tropas russas estariam a libertar a Ucrânia das cliques neonazis. Mas os ucranianos têm mostrado uma pertinaz resistência a serem «libertados». Aqueles 2,8 milhões constituem o mais flagrante desmentido das justificações apresentadas por Putin e pelos seus apoiantes no que ainda se chama esquerda.
A luta social está igualmente no interior da Federação Russa, nas mais de 14 mil pessoas em 112 cidades que foram detidas por se terem manifestado contra a guerra. No sábado, dia 12 de Março, foram presas duas pessoas, uma mulher e um homem, em manifestações em duas cidades diferentes, por ostentarem cartazes em branco. Em 1918, Kazimir Malevitch, num dos seus mais célebres quadros, em que irrompeu a modernidade artística, pintou um quadrado branco sobre fundo branco. Desde então, nunca a cor branca foi tão eloquente como naqueles dois cartazes. Quem os souber ler entenderá a luta social.
A essa altura do campeonato, pelo menos as direções sindicais têm se posicionado com uma perspectiva de classe diante dessa invasão russa.
No Brasil a CUT, a Conlutas e a Intersindical (que que não é central) estão tendo posições oficiais nesse sentido (as demais não tenho conhecimento da posição tomada). A Conlutas inclusive tomando a frente de lançar uma campanha de solidariedade aos operários ucranianos: http://cspconlutas.org.br/2022/03/internacionalismo-facamos-um-fundo-de-solidariedade-a-resistencia-operaria-na-ucrania/?fbclid=IwAR04VSx_OMOXJOJqoGInYLQwqWQk96S7Qzy-yxjMoDBTswP2fgNMfQkN4kg
Evidentemente se tem algo que pode ajudar a combater o fascismo em qualquer país é fortalecer as organizações consequentes da esquerda.
Segundo o dirigente da CUT para relações internacionais, na Europa a posição das federações sindicais é a mesma da CUT. Na Rússia é de apoio à guerra e na China é em cima do muro (ou seja, na Rússia e na China estão sendo correias de transmissão do governo). Creio que de uma forma geral, pelo mundo deve estar prevalecendo facilmente entre os sindicatos uma posição antiguerra, a partir de uma perspectiva de classe.
Isso se choca com a impressão que temos de que uma grande parte, provavelmente até a maioria, de indivíduos e figuras que se colocam na esquerda estejam de alguma forma apoiando Putin (mesmo que não abertamente, mas justificando a invasão reproduzindo a propaganda russa).
Também me parece que é a minoria das organizações de esquerda no Brasil que tomaram posição pró-Putin ou pró-guerra. A maioria das manifestações de organizações de esquerda que me chegaram foram contra a guerra, com uma perspectiva de classe. Das pró-guerra, estão algumas siglas insignificantes como LBI, além do PCO.
Por outro lado, as mídias que se dizem de esquerda ou progressistas estão adotando um visão aberta ou veladamente pró-Rússia. O que não surpreende pois elas nunca tiveram uma perspectiva de classe. Sempre apresentaram notícias a partir da perspectiva de gestores e chefes de Estado.
Uma forma de atrair indivíduos que se colocam na esquerda para uma posição e prática de classe consequente, seria as organizações sindicais e de esquerda que são contra a guerra, organizarem campanhas de solidariedade, de preferência unitária, mais ou menos como a Conlutas tomou iniciativa. Uma campanha que ganhasse visibilidade serviria de referência de uma posição de esquerda diante dos fatos, de modo a atingir indivíduos e eleitores da esquerda.
Bem, para variar o melhor comunicado foi dos zapatistas. Eles nunca erram, nunca perdem as referências, a memória, a história, o coração e a razão. https://enlacezapatista.ezln.org.mx/2022/03/04/nao-havera-cenario-apos-a-batalha-sobre-a-invasao-da-ucrania-pelo-exercito-russo/
A deputada do Psol, Fernanda Melchionna, em um minuto sintetizou tudo que precisa ser dito sobre essa guerra, no plenário da Cãmara dos Deputados: https://www.youtube.com/watch?v=XYq44dWtA_U&ab_channel=Desmascarando
Anarquistas britânicos realizaram uma ação de ocupação de uma mansão de um burguês russo, em solidariedade aos ucranianos e aos russos que estão contra a guerra: https://g1.globo.com/mundo/ucrania-russia/noticia/2022/03/14/invasores-ocupam-mansao-de-bilionario-russo-em-londres.ghtml
João Bernardo, agradeço a resposta anterior, entendi melhor o seu ponto.
Quanto ao assunto da vez: além das duas expressões de luta social que você identificou (a fuga de milhões de pessoas da Ucrânia e o movimento antiguerra na Rússia), você acha que há espaço para a luta social também no interior da própria Ucrânia, nos territórios conflagrados? Afinal os milhões de refugiados ainda são uma minoria na população total. Não consigo ir atrás dos links agora, mas li notícias sobre a resistência da própria população civil ucraniana ao avanço russo (o caso dos trabalhadores rurais que rebocaram tanques com tratores viralizou nas redes, por exemplo). Diante de uma invasão, falar em “resistência” significa engajar-se no combate… Ou você diria que esse tipo de situação acaba se somando à própria dinâmica destrutiva da guerra, não representando de fato uma oposição ao processo em si? E que a luta social não estaria exatamente na “resistência”, e sim numa oposição à guerra como um todo (o tal “derrotismo” que apareceu no outro texto aqui no PP…)?
Concordando com arkx, as Forças Armadas Ucranianas mantêm em seu efetivo grupamentos declaradamente neonazistas, como o Batalhao Azov.
Convém lembrar que a derrubada de Yanukovitch ocorreu tbm por forças paramilitares neonazistas e que a posterior eleiçao que sagrou Poroshenko Presidente contou com diminuta participaçao de eleitores de Donetsk e Luhansk, onde não detinha simpatizantes.
É sintomático o silencio de muitos aqui sobre os crimes do Exercito Ucraniano – incluindo neonazistas – com a populaçao dessas 2 localidades nos últimos anos de guerra civil.
E é curioso ler que a agressao Russa nao se deve a expansão da OTAN quando Moniz Bandeira escreveu em um dos seus ultimos livros (em 2015 ou 2016) que: ‘o presidente Putin sempre se manifestou no sentido de nao tolerar que a OTAN nao estendesse sua maquina de guerra às fronteiras da Russia, a ameaçar-lhe posiçao estrategica, nem o estacionamento do escudo antimissil nas fronteiras da Polonia e Republica Tcheca.’
Fato notório e reconhecido que os russos responderiam à expansão da OTAN.
Caio,
Quando estava ontem a escrever o meu comentário anterior hesitei perante a questão que você coloca, e acabei por me esquivar, porque ela exige demasiadas nuances e também porque, a este respeito, somos prejudicados pela falta de informação fidedigna. Mas vou tentar responder alguma coisa.
Um dos sintomas da fossilização daquela esquerda que, pelo menos em palavras, permanece anticapitalista, consiste em se apegar a soluções de outras épocas e outras circunstâncias. Num confronto entre imperialismos, como foi a primeira guerra mundial, a posição revolucionária era bastante clara. Consistia em depor as armas e fraternizar com os soldados do lado contrário, e foi o que sucedeu praticamente desde o início do conflito, mas sobretudo nas grandes revoltas de 1917 e 1918, como evoquei resumidamente nas 3ª e 4ª teses. Mas agora não se trata de um confronto entre imperialismos. Há uma potência agressora, a Federação Russa, ou, aliás, duas, porque devemos incluir a Bielo-Rússia, e há um país atacado e invadido, a Ucrânia.
Os defensores da invasão russa argumentam que a Ucrânia pretendia entrar na NATO, mas a própria NATO não tinha nenhuma intenção de admitir essa adesão nem a curto nem a médio prazo, e a declaração de intenções destinou-se sobretudo a fins de propaganda política. De qualquer modo, do lado ucraniano a posição da esquerda só deveria ser uma — recusar todas as forma de integração orgânica na NATO. Ignoro que movimentações pudessem existir neste sentido.
Porém, uma vez iniciada a invasão russa, para que pudesse haver um «derrotismo revolucionário» consoante o modelo da primeira guerra mundial seria necessário que os soldados de ambos os lados estivessem dispostos a isso. Ora, tal como escrevi no meu comentário anterior «é ingénuo, nas circunstâncias actuais, dizer que os trabalhadores de um e outro lado das linhas de frente devem largar as armas e abraçar-se. É ingénuo porque as guerras ocorrem precisamente porque os trabalhadores não conseguiram impedi-las». Vejamos, então, o que se passa num lado e no outro.
Na Ucrânia, nos primeiros dias parece-me — sublinho parece-me, porque a informação foi escassa — que o exército invasor deparou apenas com a resistência do exército ucraniano e das milícias de organizações fascistas, que tinham algum treino e dispunham de armas. Era o que The Economist de 26 de Fevereiro, referindo a situação em Kyiv, descrevia pudicamente como «sandbags protected the entrance to the offices of a political outfit that has its own militia affiliated with the security forces». Não há dúvida que uma organização política que dispunha de milícias próprias e estava ligada às forças de segurança era necessariamente uma organização fascista. Mas parece-me — de novo parece-me — que a situação mudou muito nos dias seguintes, sobretudo depois de o governo ter distribuído armas à população. Foi então que os «libertadores» russos começaram a deparar com uma resistência generalizada à «libertação», e os planos de Putin mostraram a sua fragilidade. A prova mais incontroversa de que se trata agora de uma verdadeira resistência popular, de modo nenhum circunscrita às milícias fascistas, é que em cidades ocupadas pelos russos tem havido grandes manifestações de descontentamento e de desobediência ao invasor.
Aliás, quando vemos o que o exército russo faz nos cercos às cidades, cortando-lhes a energia eléctrica e o abastecimento de água e de alimentos, entendemos que Putin está a demonstrar à população ucraniana que pretende «libertá-la dos neonazis» através da fome, da sede e do frio. Perante uma propaganda destas, será difícil que qualquer ucraniano abra os braços para acolher os invasores.
Que efeitos poderá ter esta resistência popular sobre as tropas invasoras? Têm surgido com alguma frequência notícias sobre o baixo moral do exército russo, mas serão propaganda do governo ucraniano? Ou serão propaganda apenas? Não me espanta que soldados, a quem Putin prometera que seriam recebidos de braços abertos e afinal foram recebidos com balas e insultos, comecem a estar desmoralizados. O problema é que por detrás deles está o governo russo, autoritário e aparentemente sem fissuras.
É precisamente aqui que assume grande relevância o movimento contra a guerra, cada vez mais disseminado no interior da Federação Russa. Num comentário colocado no domingo eu mencionei mais de catorze mil detidos em mais de cem cidades. No comentário inserido ontem falei dos cartazes em branco. Hoje é impossível não referir o nome de Marina Ovsyannikova, que na noite de ontem interrompeu o telejornal com maior audiência, no canal com maior público da televisão russa, para exibir um cartaz contra a guerra e contra a censura. Foi detida, evidentemente, por algo que, segundo a nova legislação, pode levar a quinze anos de prisão. E o mais que haja para além disto, o que ainda se possa transmitir pelas redes sociais, o que se diga boca a boca? Não sabemos. Mas o que sei, porque nasci e vivi num regime fascista, é que por cada um que avança há muitos mais que gostariam de avançar e nos prestam um apoio que pode ser silencioso, mas nem por isso deixa de ser importante.
Ora, a fuga massiva de ucranianos, à medida que for conhecida pela população russa, é outra demonstração de que aquele povo não quer ser «libertado» por Putin. Mais de 3 milhões de refugiados (segundo os números fornecidos hoje pela ONU) representam mais de 7,3% de uma população de 41 milhões, mas não devemos avaliar este êxodo por percentagens simples, porque são famílias repartidas, amigos separados, uma força de trabalho que se dissolve, estudos que se interrompem — o efeito de multiplicador é colossal.
No fim, o que teremos para além dos mortos? Cidades esburacadas, infra-estruturas destruídas, uma economia arruinada. Uma esquerda que é capaz de justificar isto com o argumento de que o fascista Putin está a lutar contra os fascistas ucranianos, ou com o argumento de que o imperialista Putin está a lutar contra o imperialismo americano, é uma esquerda que se compraz na abjecção.
Resta alguma esperança? Sem dúvida. Onde existem contradições, há motivos de esperança. Nos países do Ocidente o sentimento geral das populações é contrário à guerra, e as organizações de esquerda que dependam dos votos populares pensam duas vezes antes de tomar posição. Os sindicatos, por exemplo, dependem de votos dos trabalhadores, embora a taxa de sindicalização esteja a reduzir-se cada vez mais, nomeadamente na Europa. Mas é difícil considerar como organizações de classe, ou sequer de esquerda, empresas capitalistas vocacionadas para os fundos de pensões, que se distinguem das restantes empresas apenas pelo facto de os seus gestores serem eleitos. Quanto aos partidos com ambições parlamentares, e que, portanto, dependem do sentimento popular, em Portugal, por exemplo, o Bloco de Esquerda manifesta-se agora claramente contrário à invasão. Quanto ao Partido Comunista Português, nos primeiros dias o secretário-geral adoptou a argumentação de Putin e afirmou repetidamente que a Rússia estava apenas a defender-se da agressividade da NATO. Mas foi visível o mal-estar da base, nomeadamente quando algumas câmaras municipais (prefeituras) comunistas se manifestaram contra a invasão, e o Partido Comunista fez uma das suas habituais piruetas de cento e oitenta graus e agora defende a paz e o fim da guerra. Mas decerto não o faz sem grandes tensões internas, porque na reunião de ontem do Conselho de Estado esteve ausente o representante do Partido, uma velha figura dos tempos heróicos, dividido entre a impossibilidade de tomar uma posição contrária à actual linha oficial e as suas arreigadas convicções pessoais pró-russas. No resto da Europa os partidos comunistas são menos significativos do que em Portugal ou nem sequer existem. Restam os pequenos grupos vincadamente ideológicos e que se apresentam como extrema-esquerda. Ora, é entre eles que mais consolidada se encontra a passagem da luta social para a geopolítica.
Então, repito. Há alguma esperança? Esperanças há sempre, porque há desejos. Mas há também ilusões, das quais resulta o pior de tudo — a desilusão.
Denunciar a invasão russa sem também repudiar a presença dos EUA na Ucrânia, usando seu território como plataforma de guerra de baixa intensidade contra a Rússia, é se alinhar veladamente com o Nazismo ucraniano.
Em 13/03/2022, a Rússia destruiu uma base da OTAN em solo ucraniano, a 10 km da fronteira com a Polônia.
Sob a denominação de “Centro Internacional para Manutenção da Paz e Segurança”, o local tem sido base de treinamento das milícias nazistas da Ucrânia.
Lá também são reunidos os voluntários (inclusive brasileiros) para combater ao lado dessas milícias, bem como mercenários profissionais, com remuneração de até US$ 2.000 por dia, mais bônus.
Como vingança a este ataque, no dia seguinte as milícias nazistas dispararam um míssil com munição de fragmentação em pleno centro de Donetsk.
Há 8 anos o massacre da população das Repúblicas Populares do Donbass segue, numa autêntica limpeza étnica, sem provocar qualquer reação dos mesmos que agora denunciam a invasão russa.
Na Ucrânia temos hoje a repugnante face desnudada do fascismo contemporâno. Quem a ele não se opõe frontalmente, dele faz parte.
Quem foi Naninha…
Ontem eram tão desfavoráveis as tecnologias e as ciências quando estas eram voltadas para a vida e para o bem estar.
Hoje foram abduzidos pela maquinaria bélica e pelos cálculos balísticos arrastado-os para a ciência da morte.
O problema não era a tecnologia e a ciência mas a descoberta da essência do ser da técnica, e a guerra do Putin trouxe essa revelação. Acreditam que a essência da ciência é a destruição e o envenenamento quando são voltadas para a saúde e para a alimentação, e para qualquer coisa que seja. Quando essa tecnologia é voltada para a guerra e para a morte os primitivistas viram futuristas belicosos amarrados a uma ciência voltada para o genocídio e a destruição, tornando-se, assim, coerentes com a sua interpretação do que viria a ser a tecnologia e a ciência.
Os primitivistas querem conduzir a ciência e a tecnologia da morte
Não sei se o Fado explica a guerra. Talvez o samba, para o bom entendedor, o explique…
Lig, Lig, Lig, Lé
Castro Barbosa
Lá vem o seu China
Na ponta do pé
Lig lig lig lig lig lig lé!
Dez tões, vinte pratos
Banana e café
Lig, lig, lig, lig, lig, lig, lé!
Chinês
Come somente uma vez por mês
Não vai
Mais a Xangai
Buscar a Butterfly
Aqui, com a morena
Fez a sua fé
Lig, lig, lig, lé (
Lig, Lig, Lig, Lé
Castro Barbosa
Lá vem o seu China
Na ponta do pé
Lig lig lig lig lig lig lé!
Dez tões, vinte pratos
Banana e café
Lig, lig, lig, lig, lig, lig, lé!
Chinês
Come somente uma vez por mês
Não vai
Mais a Xangai
Buscar a Butterfly
Aqui, com a morena
Fez a sua fé
Lig, lig, lig, lé (https://www.letras.mus.br/castro-barbosa/lig-lig-lig-le/)
Quanto à ilusões…
Dona Felicidade
Castro Barbosa
No país da fantasia
Que habitei na mocidade
Eu também quis, certo dia
Ver dona felicidade
Enveredei pela estrada
Da esperança e lá, então
Mais linda do que a alvorada
Encontrei dona ilusão
Perguntei, então, a ela
Se onde morava sabia
A criatura mais bela
Do país da fantasia
E a ilusão, com ar risonho
Mostrou-me, numa colina
Da cordilheira do sonho
Uma casa pequenina
Prossegui na caminhada
Bem cansado, mas ufano
Bati na casa indicada
Onde o velho desengano
Deu, enfim, com gravidade
A informação que pedi
A dona felicidade
Já não mora mais aqui (https://www.letras.mus.br/castro-barbosa/dona-felicidade/#radio:castro-barbosa)
No jornal El País de hoje leio uma notícia intitulada Anarquistas ucranios toman las armas contra la invasión rusa, que ilustra e complementa o meu longo comentário anterior. Reproduzo em seguida as passagens mais importantes. Não traduzo, porque creio que todos os leitores entendem o espanhol.
«Vilka y Step [alias de dos jóvenes activistas ucranios] reciben a EL PAÍS en un taller mecánico en la provincia de Lviv, región ucrania limítrofe con Polonia. [… ] Vilka y Step acaban de recibir un cargamento a manos de tres compañeros polacos. Una furgoneta acaba de cruzar la frontera cargada de cajas que contienen, sobre todo, medicinas, material quirúrgico y elementos de protección antibalas. También hay generadores eléctricos, bidones de gasolina, compresas… Son bienes comprados por colectivos anarquistas de Polonia, Alemania y Holanda y van destinados al Comité de Resistencia, el batallón formado por militantes anarquistas, antiautoritarios y antifascistas. El Comité de Resistencia es parte de las Unidades de Defensa Territorial, la milicia formada por civiles auspiciada por el ejército ucranio. La mayoría de las Unidades de Defensa se forman con un criterio geográfico: por pueblos, por barrios, incluso por calles en las ciudades más grandes. Aunque la mayoría de quienes forman las Unidades no comparten la ideología de Vilka y Step, estos creen que la autoorganización y la autonomía por la que se rige la milicia encaja como un guante con sus ideas anarquistas. “La idea de los anarquistas que participan en la lucha armada es que no luchan por el estado de Ucrania sino por la gente de Ucrania” afirma Vilka.
«Desde 2014, los movimientos de extrema derecha han sabido rentabilizar la guerra en las provincias de Lugansk y Donetsk para aumentar su poder y su influencia. El Batallón Azov, formado por neonazis en forma de milicia, es ahora un regimiento integrado en el ejército regular que sigue utilizando simbología nazi. Sin embargo, Vilka y Step creen que, a diferencia de 2014, en la guerra de 2022 hay tanta gente diversa que ha tomado las armas en las Unidades de Defensa Territorial que la influencia de los grupos de extrema derecha ha quedado diluida. Siguen existiendo pero su influencia en menor, según Vilka. Es una idea compartida por otras soldadas entrevistadas por EL PAÍS en reportajes anteriores. La existencia de milicias de extrema derecha es utilizada por Rusia para calificar como nazi a la totalidad de las unidades militares ucranias. Step considera que Vladimir Putin hace un uso torticero del antifascismo. “Son falsos antifascistas que encarcelan a los verdaderos antifascistas de su país. En Rusia hay una feroz represión contra toda la oposición, también contra los anarquistas. Muchos de nuestros amigos están en la cárcel y muchos rusos se habían refugiado en Ucrania para escapar del régimen de Putin”, dice Step.
«[…] Ahora, el Comité de Resistencia ha hecho un llamamiento para que anarquistas y antifascistas de otros países se unan a su lucha en Ucrania. En su canal de Telegram tienen un formulario para unirse a su batallón en el frente de Kiev. “El régimen actual de Rusia es similar al fascismo y bajo él y sufriríamos mucho más bajo ese régimen homofóbico, sexista y xenófobo. Además, nuestra identidad nacional también es importante”, proclama Vilka para explicar por qué los colectivos libertarios han decidido responder con las armas a la invasión rusa.»
TEMPUS FUGIT
Já dizia Amadeu: “O antifascismo é o pior produto do fascismo”.
Essa aparente contradição na posição pró-Putin acerca da tecnologia, apresentada pelo comentarista Gogol em linguagem “existencial” de tipo heideggeriano, não é nova. É a base das posições “revolucionário-conservadoras” de autores como Ernst Jünger e Oswald Spengler, que influenciaram em vários aspectos tanto o ideário nazista, como o pensamento do próprio Heidegger. Sobre a questão específica da “técnica”, como em tantas outras, Heidegger se apropria das posições jüngerianas, expressas em uma linguagem mais bruta e diretamente política, transformando-as em um aparente discurso filosófico abstrato e apolítico, “existencial” e “ontológico”. Essa suposta ambiguidade presente na crítica “total” da tecnologia moderna, acompanhada de uma exaltação da aplicação militar dessa mesma tecnologia é própria da “ideologia de guerra” (Kriegsideologie) presente no ideário “revolucionário-conservador” pré-nazista e também nazista, tomada como instrumento da “comunidade guerreira”, do “niilismo ativo” (o nazi-fascismo) capaz de frear o “niilismo negativo” do ocidente. Como afirmou o “filósofo” nazista em seu testamento intelectual e político, em sua última entrevista dada ao Der Spiegel (realizada em 1966 e publicada apenas 10 anos depois a pedido do Próprio Heidegger, quando ele viesse a falecer):
“Eu não vejo a situação do homem no mundo da técnica planetária como uma dependência impossível de desenvencilhar e de separar. Considero, pelo contrário, que a missão do pensar, dentro dos seus limites, consiste precisamente em contribuir para que o homem chegue a conseguir estabelecer uma relação suficientemente rica com a essência da técnica. Efectivamente, o nazismo seguiu essa via, mas essa gente era demasiado incapaz de pensar para conseguir estabelecer uma relação realmente explícita com aquilo que acontece hoje em dia e há já três séculos que vinha a caminho”.
Heidegger deixa claro que apenas os nazistas, aqueles mesmos que criaram Auschwitz e tantos outros campos de extermínio, seguiram o caminho correto na relação com “a essência da técnica”. E não se enganem com suas subsequentes pseudocriticas ao “movimento”, pois tratam-se de divergências a partir do interior do próprio Nacional-Socialismo. Não surpreende, portanto, que os putinistas, influenciados diretamente pelo heideggeriano Dugin, estejam regurgitando a mesma cantilena nazista (“existencialista”) sobre a técnica. O que reforça a tese de João Bernardo de que o Estado russo hoje está fascistizado…
Caros comentadores, a que se deve a adesão às ideias de Heidegger por parte de muitos multiculturalistas hoje? Com frequência eu escuto que “não se encontra nazismo nas obras de Heidegger”, geralmente acompanhado de uma explicação do porquê de Heidegger não poder ser censurado, o que, ainda que o argumento seja verdadeiro, não mostra dependência entre premissa e conclusão. Pergunto honestamente. Na minha faculdade Heidegger só não é mais lido que Foucault, e vejo com frequência estudantes progressistas opondo-se à leitura de viés mais iluminista e embarcando na Filosofia da Natureza de Ser e Tempo. Esse debate sobre a técnica instigou-me ainda mais sobre essa dúvida.
Breno segue o caminho da preguiça… Otan.
Certamente Moniz Bandeira não estudou as práticas e ideologias da Rússia de Putin como o fez Rohini Hensman. Se for para pegar num livro uma explicação para a invasão da Rússia na Ucrânia, por que Breno não pegou o de Rohini Hensman?
“É difícil não concordar com Boris Nemtsov que a ameaça real que a Ucrânia representa para Putin é que ela pode se tornar um exemplo de uma revolução democrática bem-sucedida. Se Putin temesse a entrada da OTAN nos países vizinhos, a última coisa que teria feito seria impeli-los para lá com ameaças e agressões militares, como fez na Ucrânia, onde não havia a possibilidade de aderir à OTAN antes da anexação da Crimeia e da guerra no leste. O que se consegue com o início dessa guerra, no entanto, é paralisar todos os esforços para estabilizar a Ucrânia. O papel crítico da Rússia na guerra é revelado pelas palavras do ultranacionalista russo de direita Igor Strelkov, que afirmou, como vimos na Introdução, que ele “puxou o gatilho desta guerra” e que “a Ucrânia tem sido e continua a fazer parte da Rússia” (Dolgov 2014; Batou 2015);”
do livro Indefensible: democracy, counter-revolution and the rhetoric of anti-imperialism, de Rohini Hensman, 2018, p. 92. (o livro pode ser baixado no site libgen).
O fenômeno de gente que bate na tecla da Otan, e que precisa ser compreendido, é a da necessidade política e psicológica de se manterem ativamente cegas, diante das próprias falas e escritos do Putin, diante dos estudos já publicados sobre o horizonte político de Putin e de assessores seus.
Prezado Alan, Heidegger e Nietzsche são as principais referências filosóficas do Pós-Estruturalismo, especialmente por sua crítica elitista à modernidade, ao universalismo, ao iluminismo, à razão, etc. Quanto ao “não nazismo” de Heidegger, para alguns devotos até um “antinazismo”, esse é um dos maiores mitos acadêmicos do campo filosófico. Para estes incautos defensores do mestre, Ser e Tempo, publicada em 1927, seria uma obra-prima de filosofia pura, neutra e apolítica. Na mesma linha, Heidegger não era nazista até 31 de abril de 1933, antes de dormir. Então, na manhã do 1° de maio ( data não escolhida à toa) ele acorda e resolve se filiar ao NSDAP. Então por força dos eventos ele teria aceitado a reitoria em Freiburg contra sua vontade, ficando até 1934, tendo se desiludido com o nazismo e renunciando ao cargo e ao “movimento”, não só deixando de ser nazista, com se tornando um grande crítico e opositor “interno”. Essa é a lenda… Uma verdadeira farsa histórica já desmentida por vasta literatura seria especializada. Esses mesmos defensores construíram uma ampla rede de blindagem a qualquer crítica dirigida ao mestre….
No entanto, não devemos esquecer, mesmo que cada situação seja diferente, que a deserção ou insubordinação é uma luta possível. Muitos portugueses têm usado esta forma de lutar ou sobreviver.
Temos então de ajudar as pessoas nas suas migrações.
A “esquerda” não pode falar de solidariedade internacional porque ela não existe na prática.
Ou como uma paródia burguesa. Com as suas armas e perspectivas.
No que me diz respeito, o meu melhor antídoto neste momento é o Georges Brassens.
“Mourons pour des idées, d’accord, mais de mort lente”
https://youtu.be/iZpNgSaYWts
Entretidos uns com os Nirvanas dogmáticos e outros com as polémicas académicas, parece que todos os comentadores esqueceram o mais urgente, a única informação verdadeiramente urgente, que eu destaquei no meu último comentário e sintetizo agora.
No jornal El País de hoje lei uma notícia intitulada Anarquistas ucranios toman las armas contra la invasión rusa, que não traduzo, porque creio que todos os leitores entendem o espanhol.
«Vilka y Step [alias de dos jóvenes activistas ucranios] reciben a EL PAÍS en un taller mecánico en la provincia de Lviv, región ucrania limítrofe con Polonia. [… ] Vilka y Step acaban de recibir un cargamento a manos de tres compañeros polacos. Una furgoneta acaba de cruzar la frontera cargada de cajas que contienen, sobre todo, medicinas, material quirúrgico y elementos de protección antibalas. También hay generadores eléctricos, bidones de gasolina, compresas… Son bienes comprados por colectivos anarquistas de Polonia, Alemania y Holanda y van destinados al Comité de Resistencia, el batallón formado por militantes anarquistas, antiautoritarios y antifascistas. El Comité de Resistencia es parte de las Unidades de Defensa Territorial, la milicia formada por civiles auspiciada por el ejército ucranio. […] Aunque la mayoría de quienes forman las Unidades no comparten la ideología de Vilka y Step, estos creen que la autoorganización y la autonomía por la que se rige la milicia encaja como un guante con sus ideas anarquistas. “La idea de los anarquistas que participan en la lucha armada es que no luchan por el estado de Ucrania sino por la gente de Ucrania” afirma Vilka.
«Desde 2014, los movimientos de extrema derecha han sabido rentabilizar la guerra en las provincias de Lugansk y Donetsk para aumentar su poder y su influencia. El Batallón Azov, formado por neonazis en forma de milicia, es ahora un regimiento integrado en el ejército regular que sigue utilizando simbología nazi. Sin embargo, Vilka y Step creen que, a diferencia de 2014, en la guerra de 2022 hay tanta gente diversa que ha tomado las armas en las Unidades de Defensa Territorial que la influencia de los grupos de extrema derecha ha quedado diluida. Siguen existiendo pero su influencia en menor, según Vilka. Es una idea compartida por otras soldadas entrevistadas por EL PAÍS en reportajes anteriores. La existencia de milicias de extrema derecha es utilizada por Rusia para calificar como nazi a la totalidad de las unidades militares ucranias. Step considera que Vladimir Putin hace un uso torticero del antifascismo. “Son falsos antifascistas que encarcelan a los verdaderos antifascistas de su país. En Rusia hay una feroz represión contra toda la oposición, también contra los anarquistas. Muchos de nuestros amigos están en la cárcel y muchos rusos se habían refugiado en Ucrania para escapar del régimen de Putin”, dice Step.
«[…] Ahora, el Comité de Resistencia ha hecho un llamamiento para que anarquistas y antifascistas de otros países se unan a su lucha en Ucrania. En su canal de Telegram tienen un formulario para unirse a su batallón en el frente de Kiev […].»
Todos aqueles que defendem a invasão russa, a começar em Putin e a terminar nos seus cães de fila, proclamam que entre os defensores da Ucrânia há apenas fascistas. Vemos aqui que não. Este é um facto incontornável. Outro facto incontornável é que em torno de Putin, a começar por ele mesmo, só há fascistas e extrema-direita fascizante.
João, não entendi o seu mal humor com as supostas “polêmicas acadêmicas”… Da minha parte apenas aproveitei o comentário de Gogol para mostrar uma conexão direta entre Putin e o ideário nazista, inclusive para corroborar a sua tese do caráter fascista do governo Putin. Isso despertou a curiosidade de outro comentarista, a quem me dignei a tirar uma dúvida. Nada diferente do que ocorre a todo momento nos debates dos seus e de outros textos aqui no PP. Inclusive as suas obras estão repletas dessas “polêmicas acadêmicas”, todas bastantes pertinentes no meu entendimento. Nada disso significa que a intervenção concreta de grupos anarquistas na resistência à invasão russa esteja sendo ignorada ou secundarizada, o que seria uma conclusão bastante apressada…
Saudações sinceras
Em determinado momento a notícia de El País faz menção a essa outra matéria
https://elpais.com/internacional/2022-03-06/video-feministas-en-pie-de-guerra-la-lucha-de-las-soldadas-ucranias.html. Reparem que os uniformes das feministas em nada lembram aqueles do batalhão Azov, com excessão da mesma bandeira ucraniana, é óbvio. No início do video pode-se ver uma bandeira não ucraniana, mas vermelha e preta, posicionada ao lado das barricadas. Devem ser agentes da OTAN, segundo o Arkx Brasil e Breno.
Irado, obrigado pela resposta.
Irado,
Não se trata de mau humor, e eu próprio, como você observou, dedico uma parte do meu tempo às polémicas académicas. Inclusivamente, como você também sabe, no Labirintos do Fascismo não só indiquei a relação de Heidegger com o nacional-socialismo, como sublinhei, aliás na sequência de Lukács, a íntima relação entre a filosofia de Heidegger e a morte. E escrevi na última das referências a esse personagem: «A celebração de Nietzsche e de Heidegger como mentores dessa esquerda representa a forma contemporânea de repercussão dos temas da direita no interior da esquerda, condição indispensável do fascismo».
No entanto, quando se trata de intervenções políticas imediatas é indispensável pôr de lado tudo o que é secundário, incidindo apenas no principal, e o principal e o secundário são definidos não por quaisquer características essenciais, mas apenas pelas condições circunstanciais. Ora, contra a demagogia de Putin e dos seus cães de fila, que justificam a invasão da Ucrânia com o argumento de que o país estaria nas mãos de neonazis, parece-me indispensável focar as atenções nas iniciativas do Comité de Resistência. É o que tento fazer.
Ao ler a matéria sobre a organização do Comitê de Resistência encaminhei-a para alguns grupos que participo, em particular para um com alguns, não inteiramente assumidos, defensores do Putin. Ao contrário de boa parte dos textos lá enviados, este foi sumariamente ignorado, sequer críticas elaboraram.
Penso que essa iniciativa reflete bem o que um camarada disse em outro momento, que se fosse ucraniano neste momento não iria conseguir defender a “paz” uma vez que estava sob ação de um exército invasor ia querer o fuzil sim, e não ia se preocupar de checar a procedência deste.
No curto prazo me parece ser uma iniciativa importante em duas frentes, primeiro de combater a força ocupante de um regime com inspirações claramente neofascistas, segundo de diminuir o poder dos grupos paralimilitares fascistas ucranianos na sociedade. Espero que a experiência de disputa anterior durante o Maidan dê a esses grupos e aos trabalhadores ucranianos a capacidade de realmente isolar os neonazistas, sem que o pós invasão russa se torne apenas uma guerra civil.
A leitura da área de comentários do PassaPalavra nos leva a descobertas que sequer poderíamos imaginar.
Exemplos:
– em 04/03/2022, às 20:41h, se tem a informação da Rússia ter fronteira com a Polônia, talvez isto explique a impressionante dificuldade em se compreender a disputa geopolítica (interna às frações da classe dominante mundial) em curso no território da Ucrânia;
– em 16/03/2022, às 14:36h, caracteriza-se a Ucrânia a partir de 2014 (fica implícito), como “um exemplo de uma revolução democrática bem-sucedida”, conforme avaliação de Boris Nemtsov, o qual foi um dos responsáveis diretos pela devastação neoliberal da Rússia, após o fim da URSS.
Para contextualizar, antes de ser assassinado (provavelmente pela facção nacionalista da tecno-burocracia russa) Boris Nemtsov tinha sido uma espécie de Paulo Guedes na Rússia.
Resta ainda a ser feita, contudo, a descoberta principal, e a mais intrigante:
👉🏼 por que um site com um de seus focos principais voltado à pesquisa, e crítica, de todas as formas de fascismo, não apenas jamais abordou a ascensão do neo-nazismo na Ucrânia, como até mesmo chega a negá-la?
Como exemplo disto se tem o comentário de 13/03/2022, às 14:22h: “O actual governo ucraniano não sofre uma influência directa dos grupos fascistas.”
Neste aspecto, há uma reprodução da propaganda divulgada pela grande mídia corporativa ocidental, sendo esta repetidamente citada como fonte de informação por muitos dos participantes do PassaPalavra.
Qual seja:
1 – Não tem nazistas na Ucrânia.
2 – Há alguns poucos nazistas, como em qualquer outro lugar.
3 – São muitos os nazistas, mas a Rússia é pior.
E o próximo íten:
4 – Será mesmo que o nazismo é tão ruim assim?
Como raciocinar e debater, por arkx Brasil:
1. apresenta-se um determinado fato (existem neonazistas na Ucrânia, integrados às forças armadas);
2. esse fato é confrontado com diversos outros fatos (exemplos: a resistência ucraniana tomou as proporções de uma ampla resistência popular, inclusive com a participação de organizações anticapitalistas; os invasores têm mirado na população civil, para abalar a resistência popular);
3. reage-se afirmando então que a existência de neonazistas na Ucrânia foi negada;
4. em seguida, ataca-se a opinião de uma pessoa citada por um autor citado por um comentador, qualificando-a como neoliberal; claro, porque se um neoliberal expressa opiniões, elas só podem estar erradas;
5. chega-se, por fim, à seguinte conclusão: quem se opõe à invasão russa é nazista, porque reproduz a propaganda da grande mídia corporativa ocidental, que decerto é também nazista.
P.S.: arkx Brasil parece interessar-se muito pela geopolítica, mas desconhece o fato de que a Rússia faz sim fronteira com a Polônia. Sugiro que faça uma busca no Google pelo Oblast de Kaliningrado. Pode ser esclarecedor.
Seria cômico se não fosse trágico a caracterização dos völksturms ucranianos como resistência popular antiimperialista. Aparentemente os comentadores estão se fiando apenas em veículos de notícias mainstream do ocidente, sendo censurados os diversos vídeos de milicianos ucranianos executando sumariamente seus compatriotas, acusados de serem espiões ou sabotadores russos. Sortudos os que são apenas amarrados nus em postes. Também parece ter sido censurada pela mídia ocidental, suposta defensora da “democracia e liberdade” os protestos da população civil ucraniana contra o próprio exército ucraniano, que insiste em instalar baterias de artilharias em áreas residenciais, tornando essas áreas legítimos alvos de ataques russos. O desejo de ver anti-imperialismo no fascismo chega as raias do ridículo quando a bandeira vermelha e preta do tal “Setor Direito” é confundida com um estandarte anarquista. Enquanto isso Lvov se tornou a meca do fascismo mundial, reunindo de veteranos americanos e britanicos das guerras do Iraque e Afeganistão, legionários estrangeiros franceses, militares pop-stars sul coreanos até mesmo bolsonaristas brasileiros, cujos posts em redes sociais fornecem valiosas informações para os militares russos guiarem seus mísseis.
O delírio russo de “desnazificar” a Ucrânia acabou por ter o efeito de re-nazinificar o Ocidente a ponto deste site, que tinha como referência e imenso respeito, naturalizar e romantizar uma aliança entre anarquistas e neo-nazistas treinados e armados pela OTAN. O tal ocidente apressa-se a combater não o governo autocrático de Putin, instalado no poder com apoio do mesmo ocidente, mas a própria cultura russa, como vemos com a censura de cursos de literatura de autores russos, proibição de realizadores desse país participarem de festivais de cinema, demissão de regentes russos de orquestras europeias, desclassificação de atletas e equipes russas de competições esportivas e a expulsão de alunos russos de universidades ocidentais. Aliás os próprios russos parecem ter perdido sua condição de “europeus”, com apoio ativo do governo ucraniano que sublinha as diferenças raciais entre os ucranianos “eslavos puros” e a degenerada mistura de eslavos com hordas asiáticas que agora caracterizam a visão ocidental sobre os russos.
“völksturms ucranianos”. O cara realmente acha que está na década de 1940 lutando contra o nazismo. É simplesmente inacreditável.
Segundo Gustavo, a alegação do governo russo (impossível de verificar de maneira independente) de que o exército ucraniano estaria instalando baterias de artilharias em áreas residenciais, torna essas áreas “legítimos alvos de ataques russos”. E a isso se chama “esquerda”!
Sem deixar de lado as questões”secundárias” devido as condições circunstanciais da atuais intervenções políticas, compartilho um texto atual do heideggeriano Dugin que cujo o conteúdo é um exemplo do que o Irado pontuou aqui como “crítica “total”” da tecnologia a partir de uma visão existencialista que nega o caráter instrumental da tecnologia dando uma existência de ser.
https://novaresistencia.org/2022/03/17/a-tecnologia-e-inimiga-absoluta-do-homem/
Só lembrando que o que está sendo abordado aqui é sobre a guerra na Ucrânia e sobre o colapso da esquerda que está a ser influenciada pelo heideggeriano Dugin.
Gustavo está falando de neonazistas e neofascistas brasileiros entre a resistência ucraniana, mas convenientemente ignora que há quase dez anos a principal organização recrutadora de voluntários brasileiros para lutar do lado pró-russo era liderada e organizada por neofascistas duginistas no Brasil. De fato, Rafael Lusvarghi, principal figura brasileira desse esforço, tem seu perfil político “curioso” traçado nesta matéria:
https://elcoyote.org/desgraca-estas-de-pe-agora-toma-o-rumo-que-bem-te-parecer-um-perfil-de-rafael-lusvarghi/
Alguma palavra sobre você estar cerrando fileiras com duginistas, Gustavo?
Pois é Gogol, inclusive fui conferir se eu não havia acessado o link errado, e comentado um artigo sobre a organização concreta dos comitês de resistência na Ucrânia, mas de fato era um artigo sobre “Teses” acerca do colapso da esquerda. Por outro lado, vemos que esse artigo exemplar de Dugin que você nos indicou é repleto de “polêmicas acadêmicas” heideggerianas, todas “secundárias” para o momento…
Para quem acha que a situação na Ucrânia é “extremamente complexa”, vale a pena ler esse apelo do “Sindicato Independente de Proteção Trabalhista” da Ucrânia:
“Opomo-nos resolutamente à política anti-social de nosso governo, visando a adoção de leis antitrabalhadores e antissindicais para agradar aos oligarcas ucranianos e estrangeiros. Mas a agressão armada do capitalismo imperialista russo complicou a luta direta pelos direitos dos trabalhadores, pelos direitos dos sindicatos livres e das associações de trabalhadores. Mas estabeleceu a agenda atual para o movimento trabalhista ucraniano: deter a agressão armada russa contra a Ucrânia!”
https://lis-isl.org/pt/2022/03/18/ucrania-a-los-trabajadores-del-mundo/
Ao contrário do que dizem, a coisa é muito simples.
Muitos da esquerda putinista estão falando das comemorações da Comuna de Paris. Sinceramente, não entendo a confusão mental desses que hora defendem ultranacionalistas, hora defendem classistas. Tudo misturado e servido ao gosto do orador. Se as ideias que professam hoje fossem aplicadas para a época, deveria apoiar os invasores alemães contra o imperialismo francês. Alguém tem uma boa indicação de leitura sobre o tema? Obrigado.
Paulo Henrique, não sei se entendi bem o que você procura, mas sobre a Comuna de Paris vale a pena a seguinte aula do João Bernardo https://youtu.be/t7OVyuaboSc
Leio aqui e acolá, em textos anarquistas e libertários a propósito da invasão da Ucrânia pelos exércitos russos, não à guerra e paz entre os povos. São declarações bonitas e, sobretudo, deixam os autores de consciência tranquila — o que, nesta sociedade, é a pior coisa que pode suceder.
Porque todo o problema consiste em saber como passar à prática tão belas intenções. Ora, em 2018 eu escrevi num livro:
«A assinatura do tratado de não-agressão germano-soviético em 23 de Agosto de 1939 agravou a divisão de vontades no interior da esquerda, porque os comunistas franceses, para justificarem a atitude tomada pelos seus patronos, denunciaram como imperialistas os beligerantes de ambos os lados. Em consequência disto o PCF [Partido Comunista Francês] foi ilegalizado em 26 de Setembro e muitos dos seus dirigentes foram presos, o que contribuiu mais ainda para minar na classe trabalhadora francesa qualquer vontade de se bater contra o Reich. Para situarmos a actuação dos comunistas no devido contexto convém não esquecer que ia já a guerra no décimo dia quando o anarquista Louis Lecoin redigiu um abaixo-assinado que intitulou Paz Imediata, onde apelou à deposição das armas pelos exércitos beligerantes, e de que foram distribuídos cem mil exemplares. Mas como este voto pio só podia ter leitores do lado francês, ele correspondia a um incitamento à progressão das tropas germânicas. Caíam as barreiras, aparentemente tão sólidas, que haviam separado a direita e a esquerda e que até então tinham limitado a audiência das ligas fascistas. Enquanto os comunistas de Moscovo e os fascistas de Berlim assinavam o célebre pacto, o panfleto de Lecoin — numa escala mais modesta, embora não menos simbólica — recolhia, ao lado das assinaturas de outros anarquistas, como Henry Poulaille, da personalidade mais destacada da extrema-esquerda socialista, Marceau Pivert, e de catorze sindicalistas, as assinaturas também de uma grande figura do fascismo, Marcel Déat, e de meia dúzia de personagens próximos de Bergery e do seu jornal La Flèche, promotores da constituição de um fascismo francês. Em virtude desta iniciativa Lecoin foi preso a 29 de Setembro, o que mais ainda realça a simetria entre a actuação dos anarquistas e a dos comunistas».
Mas como este voto pio só podia ter leitores do lado francês, ele correspondia a um incitamento à progressão das tropas germânicas… E agora? Em que consiste, no contexto da invasão da Ucrânia, dizer não à guerra e paz entre os povos? Os novos problemas de hoje e amanhã não serão resolvidos pelas receitas de ontem, pior ainda, de anteontem.
E Zelensky usa a desculpa da guerra para proibir 11 partidos políticos, entre os quais partidos de esquerda. Com a justificativa de que teriam ligações com a Rússia. O fato é que pelo menos alguns deles estão lutando contra a invasão russa.
Por isso ou os trabalhadores do mundo vão de ‘nem Zelensky nem Putin’ e constroem sua resistência autônoma, ou serão liquidados por um ou por outro.
https://www.theguardian.com/world/2022/mar/20/ukraine-suspends-11-political-parties-with-links-to-russia
Putin, que segundo alguns comentadores deste site está apenas se defendendo da ameaça representada pela OTAN, e defendendo os russos que no leste da Ucrânia são oprimidos por neonazistas, ou invadindo um país já sob ocupação do Ocidente, pode estar se aproveitando dos corredores humanitários para deportar ucranianos para a Rússia.
Compartilho um trecho de uma notícia do jornal El País (https://elpais.com/internacional/2022-03-21/mariupol-la-ciudad-de-los-desaparecidos.html):
“Mientras se abren camino en la conquista de Mariupol, las tropas de Putin, que como parte de ese ultimátum ofrecen también un alto el fuego hasta las 10 de la mañana de Moscú (las 8.00 hora peninsular española) para organizar evacuaciones de la ciudad, han implantado la estrategia de capturar a población civil y deportarla en contra de su voluntad a Rusia, aseguran las autoridades ucranias. Y de derivar algunos de los corredores humanitarios para escapar del infierno de una ciudad en llamas al país agresor. “Lo que los ocupantes están haciendo hoy es familiar para la generación anterior, que vio los horribles eventos de la Segunda Guerra Mundial, cuando los nazis capturaron a la fuerza a las personas”, ha denunciado el alcalde de Mariupol, Vadym Boychenko, en una publicación en su canal de Telegram. “Es difícil imaginar que en el siglo XXI las personas sean deportadas a la fuerza a otro país”. La política de las detenciones también se repite en las ciudades ocupadas con alcaldes, concejales, periodistas y personas que han organizado marchas contra la invasión y las tropas rusas. Las fuerzas de Putin han conquistado Berdiansk, Jersón, Melitopol y otras. Pero tienen que conservarlas. No solamente frente al Ejército ucranio: allí la ciudadanía no les ha recibido con flores”.
Apesar de a informação ainda não ter sido confirmada, agências de notícias russas informam que centenas de pessoas, denominadas refugiados pelo governo russo, têm sido levadas para o território russo a partir de Mariupol em ônibus (https://www.reuters.com/world/europe/zelenskiy-says-russia-wages-terror-mariupol-says-thousands-deported-2022-03-20/).
Para quem quiser informações das organizações de esquerda e do movimento trabalhista da Ucrânia, vale a pena acompanhar o site da Campanha de Solidariedade para com a Ucrânia (hoje mesmo eles publicaram uma nota de uma organização que está engajada nos Comitês de Resistência condenando a proibição dos partidos de esquerda pelo governo ucraniano): https://ukrainesolidaritycampaign.org/
No domingo, dia 20 de Março, Zelensky suspendeu, durante o período em que vigorar a lei marcial, a actividade de onze partidos políticos, com o argumento de que seriam favoráveis aos russos. O único com dimensão significativa, já que os seus deputados ocupavam quase 10% dos lugares no parlamento, era encabeçado por Viktor Medvedtchuk, um oligarca com relações pessoais com Putin. Como não podia deixar de ser, trata-se de um partido activamente defensor do capitalismo e da Rússia. Entre os restantes, contam-se vários pequenos partidos de esquerda. Ignoro em que medida sejam ou não próximos de Moscovo, mas é certo que a suspensão decretada ontem por Zelensky deixou a esquerda ucraniana ainda mais fraca.
Essa debilidade, porém, não se deve apenas, nem fundamentalmente, às manobras políticas, mas decorre de razões muito mais profundas, que em última análise se radicam na invasão pelo exército russo. No sábado, dia 19, um camarada ucraniano residente em Kyiv enviou um e-mail dizendo que «now we have no left or right position here, there is only one position — on national defense» («agora não temos aqui posições de direita ou de esquerda, há só uma posição — quanto à defesa nacional»). E mais adiante insistiu: «The question of left-right point of view for now is quite blurred. No time for writing and reflecting-analysing» («Por enquanto, a questão do ponto de vista esquerda / direita é pouco clara. Não há tempo para escrever nem para reflectir e analisar»).
Não se trata apenas de sublinhar que, se existem fascistas e neonazis no lado ucraniano, no lado dos invasores o regime de Putin é, todo ele, alicerçado numa extrema-direita nacionalista e num misticismo racial fascista. Trata-se também de chamar a atenção para o facto de em todas as guerras o nacionalismo de um lado propiciar o nacionalismo do outro.
Aqui, porém, há algo mais, que é imediato e incontornável. Há uma grande potência imperialista invasora, e há um país invadido. E os invasores, com o argumento de que os invadidos são neonazis, bombardeia indiscriminadamente a população e destrói tudo. É este o facto fundamental e é perante ele que devemos tomar posição.
O PassaPalavra perdido em suas contradições:
-> “Há uma grande potência imperialista invasora, e há um país invadido. […] É este o facto fundamental e é perante ele que devemos tomar posição.”
Assim sendo, e considerando que a maior parte dos países europeus está ocupada militarmente pelos EUA desde 1945, outra posição não há, senão:
• Fora os EUA da Europa!
Entretanto, por algum motivo ainda não explícito, o PassaPalavra opta por vagar em seu labirinto de almas vencidas, noites perdidas e sombras bizarras.
Quando os mísseis hipersônicos cruzarem os céus, tudo o que tanto se negou será enfim aceito. Um tanto tarde demais, porém…
PS: para uma lúcida abordagem da complexidade, e do grave perigo, da situação em curso com a invasão russa na Ucrânia, se tem a participação de Virgínia Fontes na seguinte live:
OTAN: AMEAÇA À SOBREVIVÊNCIA HUMANA
https://m.youtube.com/watch?v=qDmQYPzUR9E
Matéria sobre o papel da igreja ortodoxa russa na legitimação da invasão da Ucrânia, defendida como uma “guerra santa”:
https://www.economist.com/europe/2022/03/21/russias-orthodox-church-paints-the-conflict-in-ukraine-as-a-holy-war?utm_campaign=later-linkinbio-theeconomist&utm_content=later-25523368&utm_medium=social&utm_source=linkin.bio
Alguns relatos in loco:
https://uneautreguerre.wordpress.com/
“Le patriotisme veut imposer l’image d’un peuple uni dans sa résistance, mais cette opération se produit au détriment de celles et ceux qui n’ont pas envie de mourir pour la patrie. Les classes et leur lutte continuent d’exister : nous nous intéresserons ici à ce qui, en Ukraine et en Russie, ne participe pas à la communion héroïque.”
Palavras de ordem, slogans, grandes conceitos abstractos, são indispensáveis, sem dúvida. Mas acho mais eloquente isto.
Sobre o comentário do JB acima, apenas uma observação: um dos partidos menores dificilmente poderia ser classificado como esquerda sem um alargamento conceitual bem generoso. Trata-se do Partido Socialista Progressista, liderado por Nataliya Vitrenko. Vitrenko assume abertamente que Lyndon LaRouche é uma de suas influências políticas (um “estadunidense”, se formos adotar a nomenclatura politicamente correta da esquerda tanquista). LaRouche, nunca é demais lembrar, era apoiado e apoiava ninguém menos que Enéas Carneiro aqui no Brasil. Poderia fazer uma digressão maior da relação de LaRouche com a extrema-direita brasileira e latino-americana. Mas voltando a Vitrenko, a questão não acaba aí: Vitrenko também é membro diretora da União Eurasiana Jovem, grupo liderado pelo infame neofascista Alexander Dugin.
Por que a esquerda tanquista silencia sobre esse Vitrenko ao falar das medidas de Zelensky? Ou é ignorância ou falta de caráter.
Não há mapas confiáveis do terreno que nossas lutas vão ocupar. Ninguém tem uma vantagem sobre a questão da libertação. Tanto foi tentado e tanto falhou, vamos finalmente admitir que não sabemos o que é “certo” ou o que “funciona”.
Deriva,
No entanto, sabemos o que não é certo e o que não funciona. É um começo, ou recomeço.
Agora milhares de russos fogem da Rússia para a Turquia…. Quando Erdogan é uma opção (ou a falta dela) é porque a situação está realmente difícil na Rússia…
https://www.economist.com/europe/2022/03/26/istanbul-has-become-a-refuge-for-thousands-of-russians-escaping-putin?utm_campaign=later-linkinbio-theeconomist&utm_content=later-25627617&utm_medium=social&utm_source=linkin.bio
A medida do desvanecer da espessa névoa da guerra, o bombardeio cerrado das fake-news disparadas pela grande mídia corporativa vai perdendo seu poder de fogo.
A realidade virtual das redes sociais cede terreno ao sofrimento concreto da população ucraniana acossada pelo neo-nazismo, em suas mais diversas formas e organizações – embora todas a serviço da potência capitalista hegemônica.
No fundo do fundo da alma do Capitalismo, jaz o Fascismo. Sempre a espreita do cio das bestas, para mais uma vez povoar o mundo.
Da extrema-direita à extrema-esquerda, entre aqueles que não se deixam dominar pelo negacionismo, há uma imensa angústia. Especiamente entre os ateus.
Só um “milagre” pode evitar a guerra nuclear?
Na arte e na cultura se encontram as mais intensas e flagrantes expressões do espírito de um momento histórico. Para o bem e para o mal, com todas as suas nuances e contradições, com a força de sua beleza e seu mais agressivo terror.
Não haverá retorno. Nada será como antes. Mas o Capitalismo prevalecerá?
Um mundo se decompõe diante de nós. Há um mundo por vir? Outros mundos conseguirão nascer?
Ou chegou, mais uma vez, o momento de tudo acabar?
Donbass is behind us
《A morte estava embriagada com sangue
Os céus vincados por nuvens de chumbo
Tudo sucumbiu, mas minha Terra não 》
https://youtu.be/LSlw9-qfAZM
Uma das formas usadas para se alagar conceitos é tomar o todo pela parte. O identitarismo costuma a fazer muito isso, como quando pega um exemplo particular de racismo de uma pessoa branca para dizer que todos os brancos, sem exceção, são racistas. Isso, é claro, acaba fornecendo combustível para os mais diversos tipos de arrivistas, sempre prontos para encobrir seus interesses pessoas alegando estarem fazendo luta antirracista, por exemplo. De forma parecida, vemos a esquerda putinista partindo de exemplos concretos de movimentos fascistas na Ucrânia para afirmar que toda uma população e o próprio aparelho de Estado ucraniano seriam nazistas, o que já está muito claro que isso está longe da verdade. Os comentários de arkx Brasil demonstram isso muito bem. Mas os identitários ao menos fazem isso em nome de seus interesses pessoais. A esquerda putinista faz isso em nome do que?
Arkx se expressa com uma linguagem profética e apocalíptica, ao mesmo tempo bélica, opondo-se a dados objetivos com uma mal disfarçada concepção de “verdade” como “revelação”. Gosta de enfatizar o caráter supostamente obscuro e “complexo” da realidade em tom pessimista existencial, negando os fatos mais crus, como a invasão da Ucrânia pelas tropas russas, afirmando que o ataque “real” é feito pelos próprios neonazistas ucranianos, reproduzindo aqui a narrativa demagógica de Putin. Enquanto mísseis russos devastam Mariopol, arkx vê uma ocupação militar estadunidense por toda Europa e grita “Fora EUA!”. Suas eventuais menções ao “proletariado” e à “luta de classes” não conseguem esconder sua análise puramente geopolítica, em favor do imperialismo russo. Parece que estamos lidando com alguém que vive “na encruzilhada da ordem e da revolta”…
Irado,
Ao que você escreveu no seu último comentário acrescento uma coisa, que é mais temível ainda. Esse senhor afirma que a Europa está desde 1945 sob a ocupação das tropas americanas. Você sabe quem afirmava isso? Precisamente os fascistas e sobretudo os apoiantes do Terceiro Reich. Para eles, os fascistas e os nazis defenderiam a Europa da agressão americana, e a sua derrota teria resultado na ocupação pelas tropas americanas. Eu nasci imediatamente depois da guerra e lembro-me bem de como era frequente ouvir esse discurso entre muitos adeptos de Salazar, a ponto de chamarem a Churchill «o coveiro da Europa», porque teria entregado a Europa aos americanos. E esse mito gerado pelos nacionais-socialistas e pelos fascistas italianos renasce agora, reactivado pelos apoiantes de Putin. É todo um novo fascismo, cada dia mais explícito.
Mas afinal, a Europa está ou não ocupada militarmente desde 1945 pelos EUA?
Um pergunta direta, cuja resposta, frente a todas as evidências, deveria ser simples e rápida.
Por que o PassaPalavra insiste em negá-lo?
Talvez pelo mesmo motivo que nega também o mais explícito exemplo de neo-nazismo contemporâneo. E ao invés de abordá-lo na Ucrânia, prefere procurar alhures…
Integrantes de coletivos fechados sobre si nesmos, como o PassaPalavra, tendem a se ver uns através dos olhos dos outros, num infinito jogo de espelhos.
Ao serem confrontados com qualquer perspectiva exterior às suas bolhas, reagem defensivamente. A cognição dissonante se impõe, manifestando-se através do sarcasmo, da irritação e da deslegitimação da interlocução.
A análise das diversas réplicas aos comentários por mim postados, e não só neste artigo, revela uma lamentável verdade:
👉🏼 O PassaPalavra não é de extrema-esquerda, nem mesmo de esquerda e muito menos autonomista.
Ao contrário, no limite se posiciona na defesa da Democracia Liberal e do Capitalismo, num alinhamento com a atual potência hegemônica.
Muito embora se apresente como anti-fascista, o PassaPalavra se recusa a tratar o fascismo como a forma desnuda e brutal do Capitalismo.
Sendo a Democracia Liberal não mais que fino e delicado véu, para ocultar a face monstruosa do Fascismo. Porém sempre pronto a ser rasgado, conforme os interesses das classes dominantes.
Daí o PassaPalavra estar perdido no labirinto que criou para si próprio. E do qual não manifesta a menor intenção de se libertar.
QUERER É PROCURAR
À maneira de Spinoza, tentemos compreender ark[eopteri]x – esse fóssil geopolítico. Com suas penumbrosas logomaquias criptofascistas (a pretexto de ‘complexidade’!), obteve mais do que os inicialmente almejados quinze minutos de atenção.
E, pelo visto, agora quer muito mais…
R.I.P.
Sim, João. E mais ainda… não sei se você teve tempo ou disposição para ver o videoclipe linkado por arkx. Trata-se de uma peça exemplar de estética fascista, exaltando a “Mãe Rússia”, a guerra, o sangue dos heróis que encharcam o solo da pátria, etc. Inclusive, nos versos citados referentes a um trecho da música, no final do comentário, a “embriaguez pelo sangue” é uma expressão retirada diretamente do Velho Testamento, mais especificamente do Apocalipse, o que não é nada surpreendente: “E vi que a mulher estava embriagada do sangue dos santos, e do sangue das testemunhas de Jesus. E, vendo-a eu, maravilhei-me com grande admiração” (Apocalipse, 17:6). A narrativa de Putin, reproduzida aqui por arkx, para quem não sabe é a mesma utilizada por Hitler conhecida por Lebensraum (ou a ampliação do “espaço vital”), que começou pelo Anschluss (anexação da Áustria, em 1938) e pelos Sudetos (região tcheca na franja fronteiriça com a Alemanha e com a Áustria). Mas, principalmente, com a invasão da Polônia em 1939, estopim para o início da II Guerra. A Polônia estava para o III Reich assim como Donbass está para Putin, inclusive utilizando-se este último da mesma narrativa demagógica de proteção dos povos faladores de russo, como Hitler dizia estar defendendo as populações que falavam alemão das ameaças e supostos ataques poloneses, que viviam naqueles territórios. Interessante ainda é ver como isso ocorreu na época em meio ao Pacto de Não Agressão entre Alemanha e URSS, em que Stálin reivindicava para si territórios da Bielorrússia e da Ucrânia, entre outros. Vejam o videoclipe indicado por arkx falando sobre a região de Donbass que ficará clara a ideologia expansionista de tipo fascista. Agora cabe ao Passapalavra avaliar se é o caso de permitir ou não comentários claramente pró-fascismo russo, cruzando em muito o limite do espaço libertário de debate e divergências, garantido desde sempre por este importante veículo…
Interessantíssimo texto no lundi.am (em francês) sobre as esquinas perigosas da esquerda sobre a ocupação russa da Ucrânia,e outras bolas divididas. UMA GUERRA INCONVENIENTE: O QUE FAZER QUANDO A RÚSSIA ATACA A UCRÂNIA, MAS VOCÊ ESTÁ NA ESQUERDA?
Originais em
https://lundi.am/Une-guerre-genante-que-faire-lorsque-la-Russie-attaque-l-Ukraine-mais-que-tu-es
Li usando deepl.com por suposto
Aqueles que na esquerda (ou no que, por uma terrível confusão de palavras, ainda se chama «esquerda») transferem a luta social para a geopolítica deviam reflectir que, para já, Putin fracassou em três aspectos, que para ele eram fundamentais.
1. A afirmação da Ucrânia, de que quer aderir à NATO, é uma mera demagogia com efeitos políticos exclusivamente internos. Quem esteja minimamente ao corrente da política externa americana e europeia e acompanhe os debates em curso sabe que a NATO não iria aceitar a integração da Ucrânia nem a curto nem a médio prazo. Além disso, a administração Obama e, mais ainda, a administração Trump conduziram ao definhamento da NATO, a ponto de na União Europeia se ter começado a pensar na conveniência de federar as forças militares, nomeadamente na sequência de propostas de Macron. Neste contexto, a invasão da Ucrânia pela Rússia provocou um aumento da coesão interna da NATO e o reforço dos seus meios militares nos países da aliança limítrofes da Rússia, precisamente o que Putin queria evitar.
2. Outro dos argumentos empregues por Putin para justificar a invasão foi o de que a Ucrânia partilhava com a Rússia uma mesma cultura e as mesmas tradições, o que é exacto. Mas a invasão e as atrocidades cometidas pelas tropas russas farão com que durante muitas gerações os ucranianos só sintam hostilidade aos russos. Como é regra, o nacionalismo de um lado estimula o nacionalismo do outro, sobretudo quando se trata de uma agressão militar imperialista. Em vez de um povo que podia ser amigo e eventual aliado, Putin conseguiu fazer um povo inimigo.
3. O outro dos fracassos de Putin diz respeito à União Europeia, que Putin tentou sempre enfraquecer, nomeadamente contrariando os movimentos no sentido de uma união mais estreita e de uma eventual federação. Nesse sentido, Putin tem apoiado política e financeiramente os partidos soberanistas e contrários à União, sejam eles de extrema-esquerda ou de extrema-direita e mesmo fascistas, como sucede na Holanda com o Fórum para a Democracia (Forum voor Democratie), em França com o partido de Marine Le Pen (Rassemblement National) e até o movimento político em torno de Eric Zemmour, na Itália com a Liga Norte (Lega Nord) de Matteo Salvini e na Alemanha com a Alternativa para a Alemanha (Alternative für Deutschland). E na Hungria é notória a proximidade entre Putin e o primeiro-ministro Viktor Orbán, um populista da extrema-direita mais autoritária. Putin tem sido o principal financiador da extrema-direita e do fascismo europeus. No entanto, a prática unanimidade com que a população da União Europeia reagiu à invasão russa da Ucrânia fez com que, exceptuando o Fórum para a Democracia, esses partidos se distanciassem publicamente do imperialismo militar russo. Mais grave ainda para Putin, a Hungria e os restantes países do Grupo de Visegrád (República Tcheca, Eslováquia e Polónia), os mais cépticos no interior da União Europeia, viram-se na necessidade de se apoiar nos restantes países da União, não só em virtude da ameaça militar russa, mas ainda para fazer frente às despesas suscitadas pelos milhões de fugitivos da guerra.
Porém, na perspectiva das lutas sociais e no contexto da presente invasão da Ucrânia, interessa-me apenas sublinhar uma coisa. É que Putin tem sido o principal financiador da extrema-direita e do fascismo europeus. Ao mesmo tempo, o actual regime russo é aquele em que mais claramente emergem as formas clássicas do fascismo. Com isto, está tudo dito.
*** *** ***
Acrescento duas coisas.
Uma, a respeito do comentário de Irado, que uma vez mais me fez reflectir sobre os enormes inconvenientes resultantes da censura exercida sobre os textos clássicos do fascismo. Por exemplo, há alguns anos várias figuras da esquerda brasileira protestaram contra a ideia de traduzir o Mein Kampf para português. Como frequentemente sucede, as boas intenções dão maus resultados, porque se as pessoas conhecessem o livro de Hitler, além de outras obras importantes do fascismo, mais facilmente dariam conta da deriva fascista que está a operar-se na esquerda. Não se pode lutar contra o que não se conhece.
A outra coisa é um apelo a que todos os que saibam francês leiam o artigo indicado por Garapa.
João, primeiro agradeço mais esses esclarecimentos acerca do campo de ação fascista de Putin. Fica ainda mais claro com que tipo de forças políticas estamos lidando.
Sobre a questão da “censura” tenho algumas palavras a dizer:
1) concordo plenamente com a circulação dos textos clássicos do fascismo e pelos mesmos motivos. Mas, arkx não é um produtor de textos clássicos, apenas um fomentador virtual de um certo ideário, inclusive, contrário aos princípio do PP, que afirma que não veiculará comentários fascistas, foi a isso que me detive.
2) Não veicular comentários fascistas no PP é diferente de uma censura do tipo citado por ti, que bane juridicamente uma obra ou um autor do território nacional, criminalizando a circulação do seu pensamento. Fascistas, neonazistas, putinistas etc. tem seus veículos e meios de circulação de ideias garantidos pela democracia, podendo um espaço como o PP refletir se deve ou não abrir espaço para isso. Ninguém estaria sendo socialmente proibido de se expressar ou de procurar conteúdo fascista na internet. Assim como o debate sobre o fascismo jamais deixaria de ocorrer nos comentários dos artigos. Outra coisa é a apologia direta…
De qualquer forma, cabe a reflexão, mas são decisões que cabem ao coletivo, sou apenas um leitor assíduo já há muitos anos.
Grande abraço.
já que o arkx faz questão de que respondam sobre a questão sobre ocupação militar, responderei: não, a Europa não está sob “ocupação militar” dos EUA desde 1945. por mais que a propaganda filofascista dos pró-russos tente mobilizar esse discurso entre os soberanistas, “ocupação militar” é um termo muito específico no direito internacional (reiteradamente violado por Moscou), que se refere à situação em que a administração de determinado território seja diretamente realizado por autoridades militares invasoras. não é o caso, evidentemente, de quase nenhum território europeu hoje – um exemplo de exceção, é claro, é exatamente o de frações do território ucraniano, mas o território sob ocupação militar no caso está sob ocupação russa, não dos EUA. repetir como se fosse verdade a propaganda moscovita é só falta de estudo e conhecimento técnico quanto ao discurso do direito internacional (o mesmo que putin, formado em direito, tenta sempre mobilizar quando conveniente).
quanto à origem desse discurso sobre “ocupação militar da Europa”, ele não se restringia, originalmente, aos Estados Unidos: ele englobava também a URSS, em boa parte dos casos do fascismo histórico durante a Guerra Fria. naquele momento, a explicação para “submissão da Europa” recorria a conspirações que quase sempre desembocavam em uma suposta “aliança judaico-maçônica” para submeter os povos europeus, que hoje em dia é ressuscitada de forma mais ou menos velada pelo putinismo e suas bases de apoio (ver, nesse sentido, o Movimento Imperial Russo, grupo czarista antissemita atuante há anos na Ucrânia, e cuja bandeira é compartilhada pelo Batalhão Esparta, pró-russo). a esquerda “tankie” mira nos EUA, mas acerta também o legado soviético que pretende defender.
Caro João, no seguinte comentário você menciona: “No sábado, dia 19, um camarada ucraniano residente em Kyiv enviou um e-mail dizendo que «now we have no left or right position here, there is only one position — on national defense» («agora não temos aqui posições de direita ou de esquerda, há só uma posição — quanto à defesa nacional»).”
Sou morador de Kyiv, no momento refugiado na Bélgica. Por muito tempo me senti isolado politicamente na Ucrânia, e não me senti comfortável politicamente em dar suporte aos meios oficias do governo. Por conta de não falar a lingua Ucrâniana ou Russa, sempre tive que ficar restrigindo aos poucos locos de informação em inglês. Seria muito interessante poder me conectar com grupos ou conteúdos locais que sejam afinados com os ideias do Passa Palavra. Deixou meu email em aberto para receber informações caso possível.
Segundo uma estimativa da ONU divulgada ontem, na Ucrânia o número de deslocados internos devidos à guerra atingia quase 6,5 milhões. Hoje, o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados anunciou que o número de ucranianos que fugiram do país na sequência da invasão russa já ultrapassou os 4 milhões, chegando a 4.019.287. Somando uns e outros, há praticamente 10,5 milhões de pessoas desalojadas. Como em Janeiro deste ano a população da Ucrânia, excluindo a Crimeia, era calculada em 41 milhões de pessoas, isto significa que 25% da população do país fugiu do exército russo.
Perante isto, além de tudo o resto, como pode ainda haver quem, invocando valores de esquerda ou mesmo de extrema-esquerda, encontre justificações para a beligerância de Putin? A cada dia que passa, o colapso da esquerda se torna mais evidente.
O colapso da esquerda foi sintetizado nos 26 min e 27 seg desta pérola publicada pelo blog da “oxtime”…
https://www.youtube.com/watch?v=2CiLnUKPfrI
Ué.. mas o vídeo de Von Hunty, em dados momentos, casa com a posição defendida em regra por aqui.
Lá pelo minuto 9, fala que de um lado está o ‘imperialismo da OTAN’ e do outro o ‘expansionismo da Rússia’. ‘Quem vai sair perdendo é a classe trabalhadora’.
Se você tem problemas com a linguagem de internet utilizada a história é outra.
Joaozim, um detalhe perdido num mar de identitarismo, ironizando as mortes das “loiras de olhos azuis”, minimizando o nazismo por não ser “nada além do que o colonialismo europeu aplicado à Europa”, comparando a guerra da Ucrânia a outras guerras de suposta menor visibilidade midiática, ou a polícia nas favelas brasileiras, etc. Um arremedo de marxismo com pós-colonialismo mobilizando todo o senso comum que tem rolado na internet sobre a guerra. Não sei se é bem isso que tem sido defendido por aqui…
A coisa chegou num ponto tão triste que, mesmo na esquerda (chamada), sempre se chega a uma dicotomia binária, que já seria pobre por ser assim mas é ainda particularmente mais pobre.
É como se as pessoas fossem necessariamente forçadas a escolher entre o “imperialismo ocidental-americano” e o “imperialismo russo” ou ainda “anti-imperialismo russo”….
Nessa dicotomia, como aponta o texto, o que acontece é que o esvaziamento e a naturalização do imperialismo em si como uma forma de ação expansiva e agressiva do capital. Não é possível escolher o lado do povo da ucrania, ou se alinhar ao russos que protestam contra a guerra porque a guerra está colocada dentro dos termos da dicotomia entre esses dois “imperialismos”…
Quanto ao texto, são teses bastante interessantes.
Sobre o desligamento do leninismo do movimento europeu tendencialmente revolucionário mais amplo, não seriam as causas desse desligamento tão importantes quanto suas consequências? No sentido de que é preciso entender profundamente as possibilidades da ação russa nesse momento, claro que não vamos ficar aqui especulando e transformando “que fazer?” em “o que deveria ter sido feito”, mas me parece importante de alguma meneira para o contexto desse assunto esclarecer também o contexto e os possíveis motivos do desligamento.
Acredito que a questão do nascionalismo talvez seja o de mais instigante. Precisamente porque o nacionalismo, mesmo na esquerda (ou sobretudo na esquerda, em alguns casos) parece de fato uma marca definidora fundamental. Mesmo a solidariedade de classe desaparece, por vezes, porque as pessoas sofrendo imediatamente as consequências da guerra aparecem como apêndices secundários de seus países. O nacionalismo é tão bom argumento que consegue ser usado por vários lados.
A invasão se justifica pela defesa dos interesses e da segurança de uma nação. Por vezes, os argumentos contra a invasão, que partem do país invasor, também podem convergir no sentido de apontar que a nação deve respeitar a soberania de outras, ou que não é do interesse nacional essa guerra. Do lado da defesa, nem se fala. Nada mais propício a uma onda nacionalista do que alguém invadindo seu país. E muitas vezes os argumentos principais em torno da guerra se colocam como “desrespeito à soberania nacional” antes de qualquer outra coisa.
Enfim, o texto nos coloca coisas interessantes para pensar.
Mas o que me pareceu mais interessante, de fato, foi esse trecho de comentário do autor:
“Quanto a um desfile fascista organizado nas ruas da capital, creio que não haverá nenhum país da União Europeia onde não se organizem desfiles fascistas. Faz parte da chamada democracia política.”
É tão cômico quanto triste. Mas é também uma síntese muito boa dessa tal democracia que o mundo tem como a melhor forma social possível para a humanidade.
Gabriel,
Você pergunta: «Sobre o desligamento do leninismo do movimento europeu tendencialmente revolucionário mais amplo, não seriam as causas desse desligamento tão importantes quanto suas consequências?». Mas não creio que em história haja causas. Há conjuntos de factores, que formam uma estrutura e cujo peso relativo varia com o tempo. Nas págs. 614-638 da 3ª versão do meu livro Labirintos do Fascismo, que pode encontrar, por exemplo, aqui, tentei analisar o contexto em que a revolução russa se desligou da revolução europeia surgida nas trincheiras da Grande Guerra. Tentei, mas não consegui ir além da formulação de problemas e da colocação de dúvidas. Também na 4ª versão do livro, que será em breve publicada por uma editora de São Paulo, tive de me limitar a um enunciado de perguntas. Há muito ainda a estudar e a esclarecer, mas parece-me que o mais importante é ter lançado a questão. Prefiro uma questão em aberto a respostas apressadas.
Quanto ao nacionalismo e à sua relação contraditória com o marxismo, procurei analisar a questão numa série de quatro artigos publicada no Passa Palavra, intitulada Marxismo e nacionalismo.
Recentemente li um pequeno artigo sobre a guerra entre Rússia e a Ucrânia que achei, pessoalmente, bastante esclarecedor. Deixo aqui o link (o texto começa na página 4 do pdf) e alguns comentários meus em seguida https://drive.google.com/file/d/1Cor6MrBZZ13SKukiEr-EuhUvlLgoSm2B/view
Acredito que devemos voltar mais para à economia e à política para explicarmos o que está ocorrendo nesta guerra, e não somente naquilo que os envolvidos diretamente com ela diz ou deixa de dizer. Pode existir uma diferença enorme entre aquilo que as pessoas dizem fazer e acreditar, e àquilo que elas realmente pensam e acreditam. Logo, devemos enxergar este conflito pelas lentes das lutas de classe e não de um suposto afastamento da esquerda dela, pois é impossível se afastar da mesma. A única cousa possível é se posicionar frente a lutas de classes de maneira a ocultar seus verdadeiros interesses, e é esta a posição da esquerda —- se posicionar em favor do Estado e do Capital de maneira a ocultar seu verdadeiro interesse neste posicionamento.
Fico impressionado que ninguém aqui mencionou os interesses do Capital bélico, que tem suas necessidades de reprodução e financia muitas ações e governos. Bem como não vi um comentário que desmascara os Estados-nação como instituições que servem ao capital e não somente à eles próprios. Uma guerra entre dois Estados é uma guerra entre duas frações de uma mesma classe, que é a burguesa. Também, não li nenhuma análise que tem como fundo a atual fase do capitalismo, se está ou não tendo um declínio da acumulação de capital, se as relações internacionais estão se reconfigurando… para interpretar da maneira mais correta as escassas informações que conseguimos é imprescindível ter esses parâmetros como plano de fundo das análises.
Por outro lado, as conclusões de Bernardo me parecem que são as mais contundentes: apoiar e fortalecer a UNIÃO dos trabalhadores, tanto russos quanto ucranianos, no intuito de combater a guerra e seus desdobramentos. É muito improdutivo discutir qual é o país fascista ou não, uma vez que, para um país capitalista existir, deve-se ter trabalhadores nele, que além de serem explorados, tem a capacidade de através da UNIÃO, abolir as relações sociais que gestaram a guerra e inclusive o fascismo.
O jornal Le Monde de hoje noticia que os estivadores suecos estão a mobilizar-se para recusarem efectuar cargas e descargas em navios, de qualquer nacionalidade, usados no comércio com a Rússia. Um dos sindicatos de estivadores decretou o boicote desde o dia 28 de Março. E o outro, visto que só existem dois sindicatos de estivadores, apresentou um pré-aviso, devendo aderir ao boicote a partir do dia 1 de Maio. Podem ver a notícia completa aqui.
Camarada 01: eu não entendo porque os libertários,assim como a esquerda anticapitalista preferem o autoritário Twitter, Facebook e outros,a alternativas federativas e descentralizadas.
Camarada 02: Onde mais eles iram se exibir e emular seu próprio sucesso? Não nas redes com muito menospessoas usam. Esta é a única escala que eles acham que merecem.
BEamongTWEEN
Entre a dissonância cognitiva e a oclusão semiótica, alguns ilustres passapalavrantes não vacilam: optam pelas duas…
“O presidente russo Vladimir Putin estabeleceu firmemente o objetivo da desmilitarização e da desnazificação da Ucrânia. Estas tarefas complexas não devem ser levadas a cabo de um dia para o outro. E não serão resolvidas apenas no campo de batalha. Mudar a consciência sangrenta e cheia de falsos mitos de uma parte dos ucranianos de hoje é o objetivo mais importante. O objetivo é a paz das gerações futuras dos próprios ucranianos e a possibilidade de finalmente construir uma Eurásia unida, de Lisboa a Vladivostok”, escreveu o ex-chefe de Estado russo.
https://www.rtp.pt/noticias/mundo/medvedev-objetivo-russo-e-eurasia-unida-de-lisboa-a-vladivostok_v1396486
https://cnnportugal.iol.pt/guerra/russia/nem-lisboa-esta-segura-agora-declaracao-intrigante-de-medvedev-deixa-ex-diplomata-ucraniano-a-pensar/20220405/624c18bf0cf21847f0b57d5f
No próximo dia 10 deste mês de Abril irá ocorrer em França a primeira volta, ou primeiro turno, das eleições presidenciais, cuja segunda volta ocorrerá no dia 24. Com a prudência requerida pela proximidade das eleições, e dada a simpatia generalizada que a esmagadora maioria da população da União Europeia sente pela Ucrânia invadida, nenhum candidato ousa apoiar Putin, pelo menos explicitamente. Mas por baixo dessa distância formal há outra realidade subjacente.
À frente do partido fascista, ou fascizante, Rassemblement National, Marine Le Pen é uma das candidatas previstas para a segunda volta das eleições e as sondagens cada vez mais a aproximam do favorito, o actual presidente, Emmanuel Macron. Ora, em 2014 o partido de Marine Le Pen obteve de um banco russo um empréstimo de nove milhões de euros, que, aliás, ainda não acabou de pagar. A proximidade não é só financeira. «Nos últimos anos surgiu um mundo novo», declarou Marine Le Pen em Março de 2017, quando foi a Moscovo visitar Putin. «É o mundo de Vladimir Putin, o mundo de Donald Trump nos Estados Unidos, o do senhor Modi na Índia. Provavelmente, sou eu a única a compartilhar com estas grandes nações uma visão de cooperação e não de submissão, não a visão belicista que, com demasiada frequência, tem sido expressa pela União Europeia».
O outro candidato da extrema-direita mais histérica e do fascismo, Éric Zemmour, declarou pouco antes do início da invasão que «não se fixam limites a Vladimir Putin», e considerou que as suas «reivindicações e exigências são totalmente legítimas». E ontem, no dia 5 de Abril, perante as notícias do massacre de Bucha (pronuncia-se Butcha), Zemmour afirmou: «Devemos ser prudentes e ter a certeza de que a responsabilidade dos massacres cabe às tropas russas. Faz falta uma investigação internacional. Se for verdade, é infame e ignóbil».
Esta prudência pública é partilhada igualmente pelo Partido Comunista Português, que mantém relativamente à invasão da Ucrânia o duplo discurso que lhe é habitual. Num voto que apresentou ontem, dia 5 de Abril, na Assembleia da República, a bancada comunista declarou que «expressa a sua solidariedade para com as vítimas da guerra na Ucrânia, que tem lugar desde há oito anos». Note-se a sugestiva cronologia, «oito anos». E em seguida o grupo parlamentar do Partido Comunista Português reivindicou o «indispensável, cabal e rigoroso apuramento das situações relatadas em Bucha, assegurado por entidades efectivamente independentes e determinado pela real avaliação dos factos e não por julgamentos predeterminados que, ao invés de contribuírem para apurar a verdade, se insiram na justificação da escalada da guerra».
Nesta convergência de posições dos comunistas portugueses e do fascista Zemmour insere-se igualmente Marine Le Pen, quando declarou que «não é nos estúdios da France Inter [a principal rádio pública francesa] que se decide o que sucedeu, quem é o culpado e que sanções se devem impor».
Na outra ponta do leque político, Jean-Luc Mélenchon, candidato da extrema-esquerda, ou da esquerda populista, já que pouca diferença resta entre ambas, proferiu declarações que não parecem ambíguas: «Os crimes do exército russo contra os ucranianos em Bucha são uma pura selvajaria assassina. Os responsáveis russos devem prestar contas. Não há esquecimento nem perdão». A ambiguidade, porém, não reside naquelas palavras, mas no contraste ente elas e outras posições recentes. Em 2014, quando a Rússia anexou a península da Crimeia, Mélenchon escreveu: «Claro que a NATO perdeu a Crimeia. Boa notícia». E ainda há pouco tempo, no dia 30 de Janeiro, Mélenchon declarava na televisão que «são os Estados Unidos da América, não a Rússia, quem está numa posição agressiva», e acrescentava que «a Rússia tem interesses próprios e não pode aceitar que a NATO chegue à sua porta».
A propósito da invasão russa da Ucrânia, tal como a respeito de outras questões importantes dos nossos dias, está a ocorrer um cruzamento, ou uma convergência, entre extrema-direita e extrema-esquerda que constitui sempre o mecanismo gerador do fascismo.
João, sobre esta passagem: “Mélenchon declarava na televisão que «são os Estados Unidos da América, não a Rússia, quem está numa posição agressiva», e acrescentava que «a Rússia tem interesses próprios e não pode aceitar que a NATO chegue à sua porta»”. Me parece que esta é a posição dominante na esquerda brasileira, que segue com uma série de “análises” da guerra que vão neste sentido. Isto somado a um identitarismo extremo, que segue com a sua agenda de minimização histórica do nazismo, contrapondo-o ao colonialismo, de onde o primeiro teria retirado suas práticas de extermínio deste último, mas agora aplicando-as contra “brancos europeus de olhos azuis”. A denúncia contra a falta de originalidade do nazismo, que supostamente só nos horroriza por ser uma violência contra brancos, em contraposição a um holocausto colonial sobre o qual o “supremacismo branco” que impera no mundo moderno não se importa, tem sido a desculpa para uma relativização da violência impetrada pela Rússia contra a Ucrânia, minando qualquer possibilidade de surgimento de uma solidariedade, especialmente a de classe. Quase que se diz o seguinte: “se os brancos não se importam com o holocausto colonial, que se matem entre si”…
Irado,
Sucede-me com certa frequência que algum tempo depois de ter publicado um texto, criticado como excessivo por muita gente, acabe por considerar que devia ter ido bastante mais longe. Lendo o seu comentário, e juntando-lhe outras posições entretanto tomadas pelos movimentos negros em vários países, concluo que devia ter sido muito mais drástico no Outra Face do Racismo. É pior ainda.
Já agora, acrescento uma informação que ainda não era conhecida quando escrevi o meu último comentário. Em Portugal, a Assembleia da República convidou o presidente ucraniano, Zelensky, a dirigir-se aos deputados numa intervenção por vídeo, tal como ele está a fazer noutros parlamentos da União Europeia. O convite foi aprovado por todas as bancadas, excepto uma. Sabe qual? Pois, essa, a do Partido Comunista Português.
Um comentário acima:
“Agora cabe ao Passapalavra avaliar se é o caso de permitir ou não comentários claramente pró-fascismo russo, cruzando em muito o limite do espaço libertário de debate e divergências, garantido desde sempre por este importante veículo…”
Concordo. É um escândalo que Pessoas Más com Opiniões Erradas possam comentar aqui no Passa Palavra. Ouvir a Palavra do Fascismo é o mesmo que ser Cúmplice deste.
Tb me escandaliza que me seja permitido postar este comentário sem que me tenha sido previamente requerido o indispensável Comprovante de Vacinação. O Passa Palavra é Cúmplice com o Negacionismo, o Genocídio e a Necropolítica?!?!?
Aguardo tb posicionamentos firmes contra a Bandidolatria e a Ideologia de Gênero.
Fica tranquilo NPC, falar bobagem segue liberado…
Constato, pelos comentários, que saltaram das teses do autor no texto postado para a questão da guerra da Rússia contra a Ucrânia, que a maioria dos comentadores é pró imperialismo norte-americano e o seu fantoche ucraniano. São coisas, quem haveria de dizer, a que se presta o chamado “marxismo heterodoxo”.
Não vou comentar esses comentários. Abordo apenas o comentário do João Bernardo acerca de o PCP ter sido o único partido português com assento parlamentar a opor-se ao convite para que o comediante Presidente da Ucrânia discurse na Assembleia da República (o Parlamento português).
Ele não ajunta nada sobre as razões invocadas pelo PCP. Apenas insinua, como é seu costume. E insinua que também por essa sua posição o PCP é pró fascismo russo.
Pergunto-lhe então se ele é pró fascismo ucraniano ou se a Ucrânia é um “Estado de direito democrático” ou se o comediante Presidente é ele próprio um democrata e que por isso deva ser convidado a discursar no Parlamento da República das Bananas (que ainda vai tendo algum verniz democrático). Coisas simples, nada comparáveis às complexidades geo-políticas em jogo.
Para confirmarem que sou também um pró fascismo russo deixo o endereço do meu sítio (www.aparenciasdoreal.blogspot.com).
Cabe a João Bernardo responder (ou não) às menções feitas a sua pessoa. Mas, agradeço JMC desde já, pois finalmente conheci o homem que refutou Marx. Muitos tentaram, outros tantos se regozijaram de o ter realizado. Mas, apenas JMC realmente o fez. Seu Blog “É UM UM SÍTIO ONDE SE PROCEDE À CRÍTICA DO MARXISMO E DA PROFECIA COMUNISTA”, onde, profeticamente, a “profecia comunista” foi desmascarada! Já não era sem tempo… Seu texto SOBRE A DECADÊNCIA E A SUPERAÇÃO DO CAPITALISMO resolve definitivamente a questão (https://aparenciasdoreal.blogspot.com/2016/10/sobre-decadencia-e-superacao-do.html), vejamos:
“Tal como ocorreu no passado, porém, um novo modo de produção estabelece-se, antes de mais, na esfera da circulação das mercadorias, para facilitar o escoamento da produção em crescimento, alastrando depois para a prestação de serviços produtivos e pessoais, desempenhando essas funções em simbiose com o modo de produção dominante, e só então se expande para a esfera produtiva, em concorrência com ele”.
Sim, um NOVO MODO DE PRODUÇÃO deve começar sempre, e invariavelmente, pela CIRCULAÇÃO! Como Marx nunca percebeu isso?! Além disto,
“Para o surgimento de um novo modo de produção, ou para a expansão de um já existente, mas dominado, basta a existência de três ingredientes: produto acumulado para adquirir meios de produção; força de trabalho disponível, que já não seja lucrativo ocupar sob as relações de produção dominantes; e mercado em expansão. A partir de então, o aumento das trocas desiguais entre os modos de produção permitirá ao modo de produção emergente ou em expansão maiores taxas de acumulação, as quais, por sua vez, facilitarão o seu desenvolvimento progressivo pela expansão e o aperfeiçoamento gradual das novas relações de produção”.
Eis que com tais “ingredientes” (ACUMULAÇÃO PRIMITIVA, FORÇA DE TRABALHO DISPONÍVEL E MERCADO EM EXPANSÃO) o mundo está prestes a receber seu novo rebento – o MODO DE PRODUÇÃO CAPITALISTA!! Mas, não acaba aqui. Também ocorre que,
“Um novo modo de produção será caracterizado pelas relações sociais verdadeiramente novas com que o trabalho será organizado e o produto repartido, distintas das relações de produção capitalistas ou salariais, as quais acabarão por surgir da evolução de algumas das formas de transição que actualmente despontam. Poderá acontecer serem baseadas na organização cooperativa do trabalho e na repartição equitativa do produto, mas é bem provável que não o sejam. Se não o forem, o futuro próximo não será brilhante, mas o mundo não acabará por isso”.
Enfim, o “novo modo de produção” será resultado de uma EVOLUÇÃO ocorrida no interior do “antigo modo de produção”. Tal evolução nos levará à “organização cooperativa de trabalho”, um fenômeno realmente NOVO, acompanhado de uma REPARTIÇÃO EQUITATIVA DO PRODUTO, uma palavra de ordem também inovadora, coerente com a visão do autor, contrária a todo “idealismo utópico-revolucionário”, como aquele proferido por Marx e Engels no Manifesto Comunista (palavras do autor). É com grande convicção que nosso último refutador de Marx afirma que o “novo modo de produção”, quem sabe, “poderá acontecer” nestas condições, “mas é bem provável que não o sejam”. No entanto, com bastante compromisso com o futuro da humanidade, JMC pondera: “Se não o forem, o futuro próximo não será brilhante, mas o mundo não acabará por isso”. Talvez o mundo não acabe por isso, mas talvez acabe, enquanto isso, sigamos com o “capitalismo realmente existente” mesmo. De fato, no pós-capitalismo de JMC, “o futuro próximo não será brilhante”.
E, com isso, Marx está refutado.
FIM.
Irado.
Antes de mais, obrigado por se ter dado ao trabalho de ler esse meu texto que comenta ao de leve, um tanto ou quanto desfasado do tema em discussão. Após uma leitura tão rápida desse texto, você parece ter ficado fazendo jus ao nome. Acalme-se, que o caso não é para tanto.
Não vou contribuir para desviar mais a discussão do tema em apreço. Dou-lhe apenas duas ou três dicas, para você ir pensando um pouco melhor sobre as concepções do Marx, de que deduzo seja um adepto.
A primeira: Marx está refutado por aquilo que é o fundamental da sua concepção — a força de trabalho ser a mercadoria vendida pelo trabalhador assalariado (uma impossibilidade física, porque ninguém consegue fornecer a outro a força de trabalho que produz e consome) e a génese do lucro residir num mais-valor produzido pela força de trabalho em relação a um seu suposto próprio valor (outra impossibilidade física, porque nada, nem mesmo a prodigiosa mercadoria força de trabalho, produz mais do que contenha, seja do que for que contenha, valor ou outra coisa qualquer) — está errado e não tem ponta por onde se lhe pegue. A segunda: não sou um grande, nem pequeno refutador do Marx. Julgo que refutei o que considerei essencial e na medida em que me foi possível e julguei suficiente para o que me propus. Embora o tema tenha cada vez menos interesse, estou seguro de que outros e melhores refutadores surgirão. A terceira: surpreende-me que os marxistas continuem a recitar baboseiras tão infantis do Marx, e não tenham tido a capacidade de se interrogarem sobre coisas tão elementares. Mas compreendo que fazer a distinção entre os conceitos “valor do custo de produção” e “valor de troca” seja para eles tão difícil quanto o foi para o seu mentor.
Agora, siga a dança, que a opção entre fascismos é o que está a dar.
Olhem as coincidências!
Na cidade ucraniana de Bucha (pronuncia-se Butcha) foram descobertos, nos primeiros dias deste mês, cerca de 300 cadáveres de civis assassinados pelas forças de ocupação russas. O semanário Der Spiegel de hoje informa que ao lado do exército russo se encontrariam os mercenários da milícia Wagner, fundada por Dmitry Utkin, um ex-militar russo que se embelezou com tatuagens de símbolos nazis e de quem se conhece uma fotografia ao lado de Putin, num evento no Kremlin em Dezembro de 2016. A milícia Wagner está integrada na rede de interesses económicos de Yevgeny Prigozhin, um dos oligarcas mais próximos de Putin, e funciona como um exército ao serviço pessoal do presidente russo.
Ontem, Irado escrevia aqui num comentário: «A denúncia contra a falta de originalidade do nazismo, que supostamente só nos horroriza por ser uma violência contra brancos, em contraposição a um holocausto colonial sobre o qual o “supremacismo branco” que impera no mundo moderno não se importa, tem sido a desculpa para uma relativização da violência impetrada pela Rússia contra a Ucrânia, minando qualquer possibilidade de surgimento de uma solidariedade, especialmente a de classe. Quase que se diz o seguinte: “se os brancos não se importam com o holocausto colonial, que se matem entre si”».
Ora, no Mali, um dos países do Sahel que sofre as incursões de milícias islâmicas fundamentalistas, o governo — na verdade, uma ditadura militar resultante de uma sucessão de golpes de Estado, mas esta é outra história — decidiu há pouco tempo expulsar as tropas francesas que o auxiliavam naquele combate e recrutar as milícias Wagner. Mais um êxito da luta contra o imperialismo americano, dirão os apologistas de Putin, zarolhos que só vêem o imperialismo de um lado e não do outro. A coincidência, neste caso, é que no Mali, também em Março e Abril, centenas de civis foram assassinados pelas forças governamentais e pelas milícias Wagner, em muitos casos com o pretexto de que seriam «combatentes». Que dirão, agora, os devotos do anti-racismo racista? Que foram russos de pele branca a matar negros de pele negra? Porém, como isso se passou sob a égide de um governo africano e com a colaboração maioritária de um exército africano, talvez digam que, se não foi racismo o extermínio de judeus brancos e europeus sob as ordens de um nacional-socialismo branco e europeu, também não o é o assassinato em massa de africanos negros sob as ordens de uma ditadura militar africana negra.
Gostava de saber qual é a opinião dos mortos, mas eles ficam calados.
Na análise geopolítica sobre essa guerra de um conhecido articulista da esquerda tradicional, parte-se de 2 pressupostos:
“A) O PRIMEIRO é atentar para o fato de que toda movimentação do país das estepes na região é defensiva, se realizarmos uma análise de largo espectro. A suposta demanda da Ucrânia por autonomia tem por trás uma nada sutil ofensiva ocidental para estabelecer bases da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte) às portas da Rússia. A chave das pautas da mídia tem sido inverter tal sentido, fazendo Moscou aparecer como parte agressora e Kiev como a parte que busca apenas o nobre objetivo da soberania e da independência.”
Logo, houve um movimento ofensivo da Ucrânia no xadrez geopolítico, que justifica a invasão. Mas, principalmente:
“B) O SEGUNDO é ver a Ucrânia como um país espremido por dois impérios. Entre Estados Unidos e Rússia, apenas o primeiro pode ser classificado como tal. Império é aquele Estado situado no topo da hierarquia do sistema internacional, capaz de exercer hegemonia e dominação pela dinâmica da expansão territorial ou do capital (no terreno das finanças). Após a queda do regime socialista, em 1991, a Rússia viveu uma década de profunda crise e virtual colapso econômico. Apenas para nos fixarmos num indicador, seu PIB atual é cerca de 12 vezes menor que o dos EUA. Não há o menor sentido falar em dois impérios nesse caso.”
Eis aqui a tese de que apenas os EUA são imperialistas, mais ninguém, inclusive a Rússia. Fica bem ilustrada aqui a tese de João Bernardo de que o identitarismo reproduz o esquema dos nacionalismos, onde a “branquitude” equivale aos EUA, os únicos capazes de exercer seu racismo (ou imperialismo) sobre outras “raças” (nações) que por estarem subordinadas ao “supremacismo branco” (imperialismo) não podem elas mesmas ser racistas (imperialistas).
Em seguida, o autor traz outra informação para validar seu raciocínio: enquanto a Rússia estaria com sua economia em declínio, “a Ucrânia é rica”. O típico antagonismo fascista apresentado nos termos de “nações pluocráticas” X “nações pobres”. Como se não bastasse tudo isso, o autor ainda tira da cartola o argumento de que “o chefe do Kremlin comanda um país que vive um insuperável trauma histórico, o das invasões externas”, retornando até as invasões mongóis do ano 1000 para comprovar sua tese. Logo, nada mais justo que a assustada Rússia estabeleça “cinturões de proteção”, o que por si só justificaria qualquer invasão de países vizinhos. Com medo de ser invadida o autor autoriza a Rússia a invadir a Ucrânia, mas se revolta com a mídia internacional a mando de Washington que pinta injustamente a Rússia como a “parte agressora” e a Ucrânia como quem “busca apenas o nobre objetivo da soberania e da independência”. Neste libelo exemplar de geopolítica, o ataque é defensivo e a defesa é ofensiva…
Estas e outras pérolas de contorcionismo historiográfico e analítico encontram-se aqui: https://blogdaboitempo.com.br/2022/02/25/ucrania-enfrentamento-local-razoes-globais/
Irado.
Ora bolas! Ainda pensei que você aproveitasse a embalagem para fustigar o que defende este apologista do fascismo russo sobre a guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia. Vejo que não tenho notoriedade suficiente para que você se desse a esse trabalho. Por isso, optou por dizer umas palermices sobre um meu texto sem nada que ver sobre o assunto em discussão.
Agora, foi buscar um pobre coitado (sem desprimor para o direito da criatura debitar palermices) que defende a tese oposta à sua e do Bernardo, mas tão simplória e falaciosa quanto ela, como se nesta guerra com um agredido e um agressor não houvesse mais envolvidos e interessados, e porventura mais importantes, além dos protagonistas directos Ucrânia e Rússia.
Suspeito que a geopolítica seja areia demais para a sua camioneta. Se você nem conseguiu deslindar as baboseiras falaciosas do Marx sobre coisas simples, como poderia nesta questão complexa ir além da aplicação da tese do Bernardo sobre o conflito entre “nações plutocráticas” e “nações proletárias”, que em tempos foi teoria propagandística de alguns ideólogos fascistas?
Como se não chegassem os argumentos falaciosos da criatura, você ainda os distorce, forçando o encaixe dos contendores directos nesta guerra na tese do “típico antagonismo fascista”, invertendo os termos da dicotomia por ela usada (a Rússia, com economia em declínio, “nação plutocrática” vs Ucrânia rica, “nação proletária”).
À tese do Bernardo é que se aplica a do “antagonismo fascista” — Rússia, “nação plutocrática”, o agressor vs Ucrânia “nação proletária”, o agredido — e você e ele é que a defendem, tomando partido pela “nação proletária” contra a “nação plutocrática”, de caminho tomando partido pelo imperialismo americano dominante que a usa descaradamente contra o imperialismo russo decadente.
Conhecendo o reaccionarismo, já antigo, do Bernardo contra tudo o que é luta dos trabalhadores que não seja preparação para a imaginada revolução comunista, numa contradição pegada com o seu revolucionarismo de boca e o seu retórico auto proclamado “marxismo heterodoxo”, a apologia que ele faz do imperialismo americano não me surpreende, pelo que não me admira que você, como seu seguidor, faça coro com ele.
Não comungo das concepções do arkx Brasil, mas acompanho-o quando afirma nesta questão concreta a “lamentável verdade: O PassaPalavra não é de extrema-esquerda, nem mesmo de esquerda e muito menos autonomista. Ao contrário, no limite se posiciona na defesa da Democracia Liberal e do Capitalismo, num alinhamento com a atual potência hegemónica”.
É uma vergonha ler o que escreve este JMC. Com uma população de 40 milhões de pessoas enfrentando todo tipo de privação e tendo que se locomover longas distâncias para fugir dos tiros e bombas, perdendo tudo que deixaram atrás, ele ainda quer invocar as “complexidades” do cenário para não ser solidário com este povo que não iniciou agressão alguma contra o país invasor e que só reivindica o direito de viver. Vamos esperar a posição do mesmo quando, se tiver azar suficiente, a água bater em sua bunda também.
ContraJMC
Por que raio estes comentadores não têm coragem de comentarem com seu próprio nome? Têm receio de quê? De que alguém lhes dê palmadas no rabo via internet? São inócuas.
Você está longe, não terá grandes possibilidades de ajudar o martirizado povo ucraniano, e é pena. Faz bem condoer-se com ele. Como não lhe é possível muito mais, reze, reze muito por ele, que não botou palavra sobre o seu sacrifício e que foi vendido como carne para canhão pelo comediante Presidente e “sus muchachos” a outros interesses que não os seus. E faça muita força, ponha muitas velas no altar à sua santa predilecta, porque a procissão ainda vai no adro.
Você tem no blog (www.aparenciasdoreal.blogspot.com) outras vergonhas do dito cujo JMC. Pode aproveitar uma visita para depois chingar como merece o desgraçado. Embora ele, que também não foi tido nem achado para a guerra indirecta em que o governo português o meteu, se sinta também culpado, porque das guerras acabamos todos culpados, estejamos de um ou de outro lado. E o desgraçado acha que esta guerra de agressão, que não deveria ter começado, ainda poderá parar, sem derrota de qualquer das partes, único modo de salvar alguns milhares de vidas, principalmente dos não guerreiros ucranianos.
E você, acha que a guerra acaba pelos apelos inflamados à sua continuação e pela escalada do apoio armamentista ao agredido? Diga-nos de sua justiça.
“Em Brest-Litovsk o leninismo desligara-se do processo revolucionário internacional que lhe havia permitido o triunfo. Não são as causas desta capitulação que aqui me importam, mas as suas consequências”. Acredito que seria mais preciso falar em recuo tático ou aposta desesperada na revolução alemã, e não em capitulação. Mais do que somente descrever corretamente a visão de Lênin, isso ajudaria a iluminar o fosso que separa a geração de marxistas oriundos da ala radical da 2a Internacional do que passou a se chamar de marxismo dos anos 1930 em diante.
O capitalismo Europa tem motivos reais para embarcar nesta canoa furada de apoio à Zelensky. Longe de aprofundar a crítica ao capitalismo e seu atual ecologismo, Passapalavra mergulha no antifascismo. O interessante é que adota um dos lados diretamente envolvidos no conflito em defesa de outro nesta abordagem que seria de qualquer forma equivocada. Ficam se perguntando se é fascista um governo que faz desfiles militares com apologia ao nazismo com outro que teria pretensões imperialistas.
Tentando serem materialistas ao modo de Marx encontram justificativa para a adesão incondicional da UE ao governo ucraniano na sua propensão a se utilizar da mais-valia relativa, civilizatoria e democrática contra a mais-valia absoluta representada pelo imperialismo russo. Prefiro a sinceridade do racismo e da xenofobia colonialista.
O fato é que hoje a Europa paga o preço através da irracional busca da independência energética e o Passapalavra paga este preço com o silêncio sobre os fatos
Diante da estátua de Maiakovski
Três poetas foram presos na Rússia por “incitação ao ódio com ameaça de uso da violência”. Artiom Kamardin, Egor Shtovba e Nikolai Daineko foram postos em prisão preventiva por dois meses.
No domingo, os três participaram da declamação de alguns versos em frente à estátua do poeta Vladimir Maiakovski, no centro de Moscou. No dia seguinte, Artiom Kamardin foi detido durante uma revista em sua residência. Segundo seu advogado, Leonid Solovev, citado pela imprensa independente russa, o jovem contou ter sido espancado e violentado com um haltere durante sua detenção.
O canal Telegram 112, próximo às forças de ordem russas, publicou um vídeo no qual o jovem aparece ajoelhado, pedindo perdão.
Ao tomar a palavra perante o tribunal nesta quarta-feira, segundo imagens gravadas pelo veículo independente SOTA, Artiom Kamardin disse que suas desculpas foram obtidas “sob tortura”. Ele apareceu na audiência com marcas e uma gaze no rosto.
https://www.estadao.com.br/cultura/literatura/tres-poetas-sao-detidos-na-russia-apos-lerem-textos-contra-a-guerra-na-ucrania/
Abaixo, o vídeo de Artiom Kamardim declamando seu poema “Mate-me, miliciano” diante da estátua de Maiakovski:
https://www.youtube.com/watch?v=tkIizHbHcDU
E aqui o vídeo onde o jovem denuncia sua tortura e aparece com curativos:
https://www.youtube.com/watch?v=rcIF7rPFlu8
Ponto 2. As lutas anti coloniais, pela natureza militar da ocupação europeia, não poderiam ser diferente de uma luta contra nações, e nem todas foram populistas.
Estava a ler os comentarios sobre Bucha, agora ficou claro que foi um false flag dos ucranianos.
Não faz sentido não apoiar o povo ucranianos, apoiamos os trabalhadores, mas não podemos apoia a classe dominante ucraniana, são nazis e totalmente submissos aos EUA e aliados.