Por João Bernardo

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Se a inspiração biológica do identitarismo lhe confere o carácter de um racismo, e se a noção de uma anti-identidade e a circulação entre biologia e ideologia revelam a matriz nacional-socialista desse racismo, a tradição nacionalista é outro elo que liga os identitarismos aos fascismos. Nesta perspectiva, o identitarismo é a actualização do nacionalismo na época da transnacionalização económica. Por um lado, ele é transnacional, já que a definição de cada identidade pela cor da pele, pelo sexo ou pelas preferências sexuais ultrapassa as fronteiras. Por outro lado, porém, cada identitarismo herdou do nacionalismo a memória mítica, a aspiração à supremacia, o impulso de expansão, o ressentimento combinado com a agressividade.

Escrevendo em 1931, Paul Valéry traçou o retrato impiedoso dos nacionalismos. «A História é o produto mais perigoso que a química do cérebro elaborou. As suas propriedades são bem conhecidas. Faz sonhar, embriaga os povos, gera-lhes falsas memórias, exagera-lhes os reflexos, nutre-lhes as velhas mágoas, atormenta-os no repouso, condu-los ao delírio das grandezas ou ao da perseguição e torna as nações amargas, arrogantes, insuportáveis e vaidosas». Substituam nações por identidades, e estas linhas não têm uma ruga. Ora, como é indispensável para os identitarismos a noção de uma anti-identidade que lhes sirva para se definirem de forma negativa, eles apresentam-se na linhagem dos nacionalismos anti-imperialistas, o que significa que o carácter falacioso de um conceito está intimamente ligado ao do outro.

No âmago deste emaranhado de questões reside o conceito de nação proletária, gerador de todo o fascismo, e até nos incidentes da sua formulação este conceito antecipou a história futura. Antes de mais, foi concebido na primeira década do século XX no Japão, por Kita Ikki, e na Itália, por Enrico Corradini, o que indicou o âmbito mundial em que o fascismo haveria de vigorar. Além disso, ele tanto proveio da esquerda, a que Kita pertencia, como da direita, onde Corradini se situava, e o fascismo, até hoje, nunca deixou de resultar de um permanente cruzamento destes dois extremos.

As nações proletárias definiam-se por oposição às nações plutocráticas. Mas se os proletários, para o marxismo, pretendiam deixar de o ser na medida em que queriam eliminar o capitalismo, para os adeptos da nação proletária não se tratava de abolir as fronteiras, apenas de assegurar que a nação proletária deixasse de sê-lo mediante a sua expansão e o seu enriquecimento. Todo o nacionalismo contém em gérmen um imperialismo — é esta a questão crucial.

Quando Mussolini lançou o exército italiano à conquista da Etiópia, disse num discurso que «a guerra que começámos em terras de África é uma guerra de civilização e de libertação», e explicou: «É a guerra dos pobres, dos deserdados, dos proletários». E a rádio oficial repetia que «pela primeira vez na história das guerras coloniais, esta foi uma guerra proletária». Sem dúvida, porque era a guerra de uma nação proletária que, conquistando uma enorme colónia, pretendia abandonar aquela condição e tornar-se plutocrata. Como eu lastimo que a esquerda actual não leia o que os fascistas escreveram e disseram! Mas correriam o risco de lá encontrar a sua imagem reflectida. Na Alemanha a ascensão do partido nacional-socialista fez-se evocando incansavelmente as condições impostas pelo tratado de Versailles, e foi este também o tema do confronto com o Partido Comunista, cada um procurando mostrar que era o mais firme opositor aos ditames dos vencedores de 1918. Aos olhos da população, foi com a luta contra tudo o que tratado de Versailles havia simbolizado que Hitler legitimou o seu regime, justificou o desencadeamento da guerra mundial e encetou o sonho de colonizar as terras eslavas. A esquerda nacionalista devia ler os discursos com que Hitler fustigou o grande capital da Entente e depois os Estados Unidos de Roosevelt. Talvez isso a fizesse pensar. Do mesmo modo, o fascismo militar nipónico atribuiu-se como missão a luta contra o imperialismo europeu e americano e foi sob o lema A Ásia para os Asiáticos que definiu o seu próprio imperialismo na Esfera da Co-Prosperidade e participou na guerra mundial. Eis uns precursores do decolonialismo! Que todo o nacionalismo anti-imperialista contém a promessa, ou ameaça, de um novo imperialismo — esta é uma realidade múltiplas vezes demonstrada pela história e que não devemos esquecer se quisermos entender a dinâmica dos acontecimentos posteriores à segunda guerra mundial.

O Terceiro Mundo foi, até terminologicamente, o ressurgimento da nação proletária nas novas condições de internacionalismo económico. A expressão é de origem francesa, tiers-monde, mas tiers é uma forma arcaica de terceiro, cujo sentido é inteiramente obscurecido nas traduções. A palavra tiers remete para uma expressão histórica bem conhecida da época da Revolução Francesa, tiers état, designando todos aqueles que não se integravam no clero nem na nobreza ou na burguesia enobrecida. A nação proletária de antes da segunda guerra mundial viu-se depois transformada em tiers-monde, sendo o monde equivalente à nação numa época de internacionalismo económico e remetendo o tiers para a noção de proletariado.

A dinâmica foi a mesma de todo o nacionalismo anti-imperialista, num âmbito mais modesto, mas não menos efectivo, como mostra a inveja com que alguns países desse Terceiro Mundo olharam e olham para os vizinhos. A última expressão, hoje verdadeiramente arcaica, do imperialismo anti-imperialista é a invasão da Ucrânia pelo exército da Federação Russa, com o funesto auxílio de uma milícia privada. Os pretextos são do mesmo tipo, a ameaça latente representada pelo imperialismo dos Estados Unidos e da União Europeia, e basta esta evocação do anti-imperialismo para legitimar a versão russa do imperialismo, tentando conquistar e anexar um país vizinho. O facto de haver uma numerosa esquerda putinesca a aplaudir a aventura militar russa mostra até que ponto essa esquerda se submete à dialéctica fascista da nação proletária. Todavia, com a derrocada da União Soviética a realidade política do Terceiro Mundo definhou, porque estava demasiado ligada à Guerra Fria, e a operação ideológico-militar de Putin é mais um indício do carácter antiquado do seu regime.

O Terceiro Mundo ressurgiu agora na forma de Sul Global, e não se trata de uma mera substituição de palavras, porque no interior de um quadro nacionalista o Sul Global inclui todos os identitarismos. Num inevitável reflexo negativo, define-se um Norte Global, onde reside a anti-identidade. A expressão última desta fusão do nacionalismo com o identitarismo consiste na transformação da noção económica de imperialismo num insulto nacional e racial, dirigido aos norte-americanos e aos europeus enquanto povos. É esta realidade complexa que se encontra sintetizada no Sul Global. A geopolítica agora não abrange só as entidades nacionais, mas também os identitarismos, o que mais uma vez confirma que eles actualizam o nacionalismo na época da transnacionalização.

Outra expressão do entrelaçamento do identitarismo com o nacionalismo é o silêncio discreto que o movimento negro mantém relativamente à situação em África. Não se encontra hoje um continente em que a corrupção dos governos, o desvio de fundos, o enriquecimento parasitário e o desprezo pela população pobre sejam tão elevados e ostensivos como em África, além das guerras civis que, como habitualmente, martirizam quem fica a meio entre os bandos rivais. Este silêncio indica a percepção de que cá e lá se trata das mesmas elites, ou candidatos à elite, e podemos assim ver qual é o tipo de política que o movimento negro aceita ou deseja prosseguir. Talvez mais graves ainda, porque mais dissimuladas e menos conhecidas, são as manifestações de racismo no interior dos países africanos, não só entre etnias tradicionalmente rivais, mas também entre os trabalhadores locais e os imigrantes. Desde os atritos quotidianos até às guerras fratricidas, quantas centenas de milhares de mortos fez já este racismo de negros contra negros na África independente? Atingimos assim o cerne do problema, porque nem o racismo é uma questão de cor da pele nem a expressão movimento negro deixa entender a que negros se refere. Do mesmo modo, as justificadas campanhas que os identitarismos feministas, gays e trans conduzem contra o ostracismo e a discriminação nos países ocidentais contrasta com a indiferença e o silêncio que mantêm perante situações muitíssimo mais graves e generalizadas que imperam em numerosos países do Sul Global.

Esta assimetria mostra, uma vez mais, a dinâmica de ascensão social que inspira tanto os identitarismos como os nacionalismos. No seu íntimo, todos eles partilham com as elites dirigentes dos países do Sul Global os mesmos interesses económicos e os mesmos pressupostos políticos.

Entretanto, do outro lado da clivagem de classes ocorre a mundialização do mercado de trabalho, que suscita os grandes movimentos migratórios, acelerados pelo desgoverno e pelas guerras internas que grassam nos países de onde provêm os emigrantes. Por mais barreiras políticas que se ergam, a pressão dos mercados é superior e a imigração é imparável. Todavia, nos países de acolhimento os imigrantes concorrem no mercado de trabalho com a mão-de-obra local menos qualificada ou cujas qualificações deixaram de interessar, exercendo uma pressão para a baixa dos salários. É esta a base social da hostilidade aos imigrantes manifestada em vários países europeus e nos Estados Unidos, e que se repercute na ascensão eleitoral de partidos populistas, da extrema-direita ou cripto-fascistas. Uma vez mais, a classe trabalhadora tem contradições internas, que a esquerda insiste em ignorar, e o facto de hoje os trabalhadores não existirem sociologicamente como classe só agrava essas contradições.

Apesar dos obstáculos, porém, os imigrantes continuam a chegar, porque num lado fogem e no outro os patrões precisam deles. Em muitos casos vão trabalhar para redes de angariação de mão-de-obra, organizadas por máfias da mesma etnia, que os separam dos trabalhadores locais. E em muitos casos também vão morar em bairros ou prédios onde residem outros imigrantes da mesma proveniência, reduzindo-se ao mínimo os contactos com a população do país de acolhimento. Mas os mercados exigem uma mobilidade que a prazo prevalece sobre as barreiras, e mais ou menos rapidamente, ou mais ou menos lentamente, estreitam-se as relações entre os trabalhadores de diferentes origens, a mão-de-obra mistura-se, os ghettos habitacionais diluem-se e caminha-se para uma fusão cultural que não é só uma assimilação, mas um esboço da indispensável reorganização sociológica da classe trabalhadora.

Nestas circunstâncias os movimentos identitários mostram claramente a sua acção nociva, esforçando-se por acentuar as divisões sociais e geopolíticas, com o argumento falacioso de que a formação de um quadro cultural comum impediria a manutenção de certas tradições. Porém, todos os países, por mais pequenos que sejam, reúnem culturas variadas, que potenciam o conjunto, em vez de o diluir. Mas os identitários, tal como procuram dividir a população dos seus países de origem consoante os critérios que levam à demarcação de identidades, apelam também para critérios étnicos, culturais e geopolíticos que dividam as comunidades imigrantes e acentuem o fosso entre todas elas e a população local. E assim a acção dos identitários converge com o populismo de partidos de extrema-direita e cripto-fascistas, exactamente do mesmo modo que há cem anos Marcus Garvey, que se gabava de ter inventado o fascismo, convergia com o Ku Klux Klan. Por enquanto a audiência dessas tentativas identitárias quase não ultrapassa os meios universitários, mas a situação manter-se-á assim?

Encontra-se com alguma frequência nesses meios o argumento de que, em vez de dividirem, as identidades podem interseccionar-se e, por aí, estabelecer um tipo diferente de unidade. Esta formulação teórica não resiste, porém, à verificação empírica, porque o cruzamento de identidades tem tido como única consequência multiplicá-las ilimitadamente e multiplicar os conflitos entre elas. Por exemplo, quando as identidades baseadas na cor da pele intersectam outras baseadas no sexo ou na propensão sexual, surgem as disputas de qual prevalece e a tendência tem sido para a formação de novas identidades que combinem os traços das originárias. Além disso, existem identidades que se chocam frontalmente, como é o caso de feministas e de trans originariamente homens, mas que pretendem ter assumido o género feminino ou, no sentido inverso, de gays e de trans originariamente mulheres e que pretendem ter assumido o género masculino.

Combinados com as distinções geopolíticas que são fortalecidas pela noção de Sul Global, os identitarismos têm procedido somente no sentido de acentuar a fragmentação já existente entre os trabalhadores e de a agravar com novas divisões. Não me parece possível admitir que sejam diferentes os resultados da sua actuação numa época em que cresce o fluxo migratório, e apenas contribuirão para isolar e enfraquecer os imigrantes perante a ofensiva dos populismos.

Este ensaio é composto por seis partes. Pode ler aqui a primeira parte, a segunda parte, a terceira parte, a quinta parte e a sexta parte.

As obras que ilustram este texto são da autoria de Wilfredo Lam (1902-1982).

7 COMENTÁRIOS

  1. Esta série de artigos está excelente, mas por curiosidade, indago ao autor, diante do trecho transcrito abaixo, sobre que referências bibliográficas nos indicaria que poderiam demonstrar o argumento descrito: o dos nacionalismos do Sul Global atualizados com a fusão com os identitarismos antípodas da anti-identidade do Norte-Global (se entendi bem o argumento apresentado). O que o João Bernardo acha da obra de Abdias do Nascimento, Guerreiro Ramos, Enrique Dussel, Clóvis Moura entre muitos outros… Seriam esses autores referências adequadas para construir a crítica ao quadro ideológico que o argumento abaixo descrito sugere?
    Se foram instituições como a Fundação Ford, entre outros organismos norte-americanos a fomentar pesquisas que há décadas vêm balizando no Brasil as configurações ideológicas do identitarismo (Sul Global), como tais identitarismos se fariam em anti-norte-Global? O que há de nacionalismo no identitarismo do Sul-Global se o Sul Global não sugere em si uma demarcação geopolítica de fronteiras nacionais?

    “O Terceiro Mundo ressurgiu agora na forma de Sul Global, e não se trata de uma mera substituição de palavras, porque no interior de um quadro nacionalista o Sul Global inclui todos os identitarismos. Num inevitável reflexo negativo, define-se um Norte Global, onde reside a anti-identidade. A expressão última desta fusão do nacionalismo com o identitarismo consiste na transformação da noção económica de imperialismo num insulto nacional e racial, dirigido aos norte-americanos e aos europeus enquanto povos. É esta realidade complexa que se encontra sintetizada no Sul Global. A geopolítica agora não abrange só as entidades nacionais, mas também os identitarismos, o que mais uma vez confirma que eles actualizam o nacionalismo na época da transnacionalização”.

    Grato pela atenção e meus parabéns pelos excelentes artigos!

  2. Gabriel,

    Quanto a uma bibliografia que fundamente a análise crítica do Tiers Monde, o Terceiro Mundo, remeto-o para as págs. 55-149 do sexto volume do Labirintos do Fascismo (São Paulo: Hedra, 2022). Lá pode encontrar a progressão que levou ao Terceiro Mundo partindo, por um lado, da área de influência do fascismo nipónico, a Esfera da Co-Prosperidade, e, por outro lado, da constelação formada pela Economia Dirigida, pelo corporativismo teorizado por Mihail Manoilescu e pelo fascismo de Perón, até chegar à CEPAL. O Terceiro Mundo resultou da convergência destas correntes, formando o que eu considero «um dos mais duradouros resultados do fascismo» (pág. 149).

    A internacionalização económica levou à ultrapassagem das fronteiras, por isso a Nação Proletária teve de se transformar em Terceiro Mundo, a Nação a transformar-se em Mundo, mas o fundamental do aparelho ideológico e político que antes envolvia a Nação Proletária pôde sustentar o Terceiro Mundo.

    Depois, o fim da Guerra Fria e o aparecimento dos identitarismos levaram o Terceiro Mundo a converter-se em Sul Global. A denominação não é geográfica, mas geopolítica, porque os identitarismos — não só o movimento negro, mas outros também — existentes nos Estados Unidos e na União Europeia consideram-se integrados no Sul Global, do mesmo modo que os brasileiros da anti-identidade são remetidos para o Norte Global.

    Neste contexto, se eu fosse estudar Abdias do Nascimento começaria por colocá-lo a par de João Cândido para analisar a forma como o Integralismo apresentou a miscigenação enquanto especificidade étnica brasileira, e os ecos destas ideias na obra de Gilberto Freyre. Em seguida, compararia esse fascismo assente na miscigenação com o fascismo de Marcus Garvey, que recusava qualquer forma de miscigenação. E terminaria comparando o Integralismo, enquanto fascismo brasileiro originário, com a hostilidade à miscigenação proclamada pelo actual movimento negro brasileiro, concluindo que em cem anos se passou de um fascismo de inspiração mussoliniana para um pós-fascismo directamente inspirado pelo racismo do Terceiro Reich.

  3. Obrigado pela suas respostas, João Bernardo e, se me permite, deixo a seguir umas rápidas observações.
    O Brasil teve na década de 1930 um movimento negro integralista-fascista – a Frente Negra Brasileira (1931-1937) – articulada em torno dos escritos de Arlindo Veiga dos Santos, que em retórica aproximação foi um similar tropical do Marcus Garvey. Aliás, a UNIA do Garvey teve escritório, uma sucursal, na cidade do Rio de Janeiro. Arlindo Veiga dos Santos foi um destacado intelectual negro que poucos conhecem no Brasil, um maurrasista prestigiado internacionalmente com prêmios na França e nos EUA. Era um fascista-monarquista e as suas bases ideológicas eram mesmo nacional-corporativistas.
    O Abdias do Nascimento nasceu das fileiras da Frente Negra Brasileira, foi um integralista, mas que em 1944, com a organização do Teatro Experimental do Negro (TEN) aproximou-se da esquerda pecebista em conexão que durou pouco porque o PCB (como o stalinismo em geral) não dava grande sentido às lutas antirracistas dos negros porque a pauta deveria manter-se na perspectiva da luta de classes. Abdias caminhou depois junto ao brizolismo fazendo-se senador pelo PDT e é um dos grandes centros ideológicos do identitarismo negro no Brasil. Sua tese sobre o “quilombismo” reitera a mitopoesia e as ancestralidades das lutas do Quilombo de Palmares nos séculos 16, 17 e começo do século 18, por vezes colocou-se contra o racionalismo das historiografias por desvirtuarem o real sentido das lutas quilombolas.
    Clóvis Moura tem outros timbres. Do marxismo foi o precursor em ver as lutas do Quilombo de Palmares como um antissistema ao colonialismo português no nordeste brasileiro e tratou essas lutas – a quilombagem – como lutas de classe justamente porque o sistema dos quilombos foi globalmente um antissistema escravocrata.
    Mais uma vez, muito obrigado por esta série de artigos.
    Gabriel.

  4. Como o ensaio tem seis partes, não sei se o autor tratará do argumento da interseção classe, raça e gênero, que tem sido usado frequentemente pelos movimentos identitários, como resposta ao critério da classe , quando contestados, e quando aparecem contradições internas nos movimentos. Nesta quarta parte, tratou da intersecção entre identidades. Vou continuar acompanhando as publicações. Espero não ter “comido barriga”.

  5. Marcos,
    Na última parte abordarei a questão da interseccionalidade, de forma muito breve. O meu objectivo neste ensaio não é o de fazer uma crítica extensiva, porque para isso seriam necessários vários volumes, mas o de fornecer um arcaboiço de análise que permita ao leitor — se assim o desejar — proceder a essa crítica e mesmo ir mais além.

  6. Marcos e demais,

    Estou lendo um livro ‘A Leftist Critique of the Principles of Identity, Diversity, and Multiculturalism’, do sociólogo estadounidente Richard Anderson-Connoly (pode ser baixado aqui: http://library.lol/main/860CC876FF4141C94D7532C3C3B34FD0). É bem interessante. Ele segue a tradição de filosofia analítica estadounidense, com uma linguagem bastante clara, didática e paciente, em que desenvolve uma lógica formal para desmontar algumas afirmações frequentes dos adeptos das políticas identitárias, principalmente no meio acadêmico estadounidense.

    Embora ele não tenha como alvo uma crítica ao conceito de interseccionalidade, ele acaba apontando a inadequaçãodesse conceito ao longo do livro, como na parte na qual retiro o trecho abaixo: “Leading concepts in the discourse, like intersectionality and lived experiences, do little to explain either the way the world actually works or what a just world would look like”.

    Há uma seção bem ao final do livro chamada Intersectionality, Identity, and the Real Me, porém ainda não cheguei nela. Imagino que ali apareça a crítica mais longaao conceito de interseccionalidade no livro.

    O autor mostra como os eixos da política identitária que ele faz a crítica não são de esquerda, mas sim conservadores e na melhor das hipóteses, em alguns casos, de centro. E isso que ele usa um conceito de esquerda que é liberal e não socialista. A referência é John Rawls para conceituar o que seria de esquerda. E ele acaba aceitando o conceito de privilégio branco no livro, me parece que como recurso para desmontar as concepções da política identitária que ele elege no livro.

  7. “Acontece que os eventos na Escola Primária Mary Lin não são a continuação de uma história antiga e familiar; eles fazem parte de uma nova tendência ideológica. Num número crescente de escolas por toda a América, educadores que acreditam estar a lutar pela justiça racial estão a separar as crianças umas das outras com base na cor da sua pele.”
    – Yascha Mounk, em The identity trap: a story of ideas and power in our time, Penguin Press, 2023.

    *** *** ***

    As muitas faces da distopia…

    “Uma conversa entre especialistas convocada por uma organização proeminente que trabalhou em estreita colaboração com a escola e é apropriadamente chamada de EmbraceRace aponta que quando os alunos são jovens, “até mesmo uma pessoa de cor ou negra pode dizer: não me vejo como um ser racial. Eu sou apenas humano.” A tarefa de uma boa educação é mudar essa atitude: “Somos seres raciais”. E o primeiro passo em direção a esse objetivo é rejeitar a “ideia de que a cor não importa”, de que os nossos pontos em comum são mais importantes do que as nossas diferenças.”

    – Yascha Mounk, em The identity trap: a story of ideas and power in our time, Penguin Press, 2023.

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