Por Passa Palavra

1.

Já escrevemos variadas vezes aqui no Passa Palavra que a esquerda portuguesa se opõe à federalização por dois grandes motivos. Por um lado, por motivos ideológicos, nomeadamente o seu nacionalismo. Por outro lado, nunca é demais desprezar o fenómeno da atracção pelo poder político. Para lá de todo o cardápio de proclamações socialistas e anti-sistémicas, a verdade é que a esquerda parlamentar e sindical portuguesa é uma parte do aparelho de Estado e é um dos concorrentes institucionais destinados a manter intactos os princípios de funcionamento da dominação política. A esquerda sabe que não são apenas potenciais lugares de destaque que perderia no conjunto das instituições europeias e supranacionais. Mesmo os cargos nacionais que controla no parlamento, nas autarquias e na concertação social seriam automaticamente desvalorizados no âmbito do câmbio institucional trazido pela federalização.

Nesse sentido, a orientação dos tecnocratas transnacionais condiciona o enquadramento de uma esquerda dos gestores que não tem hoje relevância prática. Se no fordismo a esquerda era parte integrante e central dos processos estruturais de enquadramento e de controlo da classe trabalhadora, essa esquerda hoje não tem uma base prática de utilidade directa para os capitalistas. Daí que a esquerda sustente cada vez mais as suas posições nacionalistas unicamente no plano ideológico, ao contrário do que sucedia no fordismo, em que as organizações verticais, a sua estrutura de comando e a sua cultura política eram cruciais para enquadrar, em termos práticos, contingentes massivos da força de trabalho industrial.

Esta discussão da posição da esquerda sobre o federalismo é de grande importância, não só porque demonstra o grau de desfasamento entre os quadros ideológicos e organizativos da esquerda e a realidade concreta do capitalismo existente, mas também porque permite recolocar a discussão do federalismo no espaço da minoritária esquerda anticapitalista e autonomista. Ora, como afirmamos num artigo há quase um ano atrás, o federalismo não é por nós defendido como um princípio político mas como uma condição estrutural, um instrumento menos nefasto para o futuro das lutas sociais do que o nacionalismo. Portanto, do nosso ponto de vista, e face ao desenvolvimento que tem ocorrido na União Europeia, o federalismo não deveria ser assumido à esquerda como uma mera questão de escolha política mas como uma realidade concreta em concretização quotidiana. Isso quer dizer que quanto mais rapidamente os que se consideram de esquerda compreenderem as condições políticas e económicas em que operam, maiores as probabilidades de as lutas sociais do futuro – que se quer breve – se balancearem para fora da influência do nacionalismo e das organizações hierárquicas e burocráticas.

Por isso, o federalismo permite que

«a classe trabalhadora beneficie de melhores condições de luta no interior da zona euro por se tratar de um espaço multinacional, ideologicamente mais aberto a uma superação dos nacionalismos do que o são os espaços estritamente nacionais, e onde as fronteiras são permeáveis e os contactos físicos são mais fáceis. Além disso, sendo o euro uma das moedas de reserva mundiais, a manutenção de um país na zona euro ergue um poderoso obstáculo ao nacionalismo económico, para cujos pressupostos demagógicos e consequências nocivas temos repetidamente alertado.
Mas para que a classe trabalhadora aproveite este quadro é indispensável que ocorra uma alteração no rumo das lutas. Em vez de se reclamar o abandono do euro, na ilusão de que isso traria o fim da austeridade, torna-se necessário exigir transferências compensatórias das economias mais prósperas para aquelas que se encontram em situação gravemente deficitária. Ora, para que essas transferências compensatórias possam ocorrer e comecem a fazer parte dos mecanismos económicos normais é necessário que a zona euro não se limite a ser uma união monetária e se converta numa verdadeira união fiscal. Mas para que a zona euro progrida rumo a uma união fiscal é indispensável que ela avance em direcção a uma união política. Só assim as transferências compensatórias entre as economias europeias mais prósperas e as menos prósperas serão tão óbvias como o são hoje as transferências entre as regiões mais e menos desenvolvidas de um mesmo país.
Assim, as transferências compensatórias devem ser o programa imediato; a união fiscal deve ser o quadro a curto-médio prazo; e a união política deve ser o quadro a médio-longo prazo». (Que fazer das fronteiras)

Em 2014 realizar-se-ão eleições europeias e a esquerda e a extrema-direita farão campanha pela dissolução da zona euro. No mesmo ano em que o primeiro pilar da união bancária europeia, o SSM (Single Supervisory Mechanism, Mecanismo Único de Supervisão bancária), deverá estar em fase de conclusão, as bandeiras da esquerda andarão em torno das investidas nacionalistas. Bizarra situação em que a esquerda pensa estar a lutar por algo exequível, quando nem o jogo parlamentar decide o que quer que seja relativamente às orientações políticas fundamentais dos capitalistas.

Descobrir onde está a realidade e onde está a ficção não será muito difícil. Para o leitor interessado em questionar-se sobre estes assuntos, difícil é perceber porque o que se convenciona chamar de esquerda continua a não discutir os processos sociais de reorganização do capitalismo e prefere reduzir as manifestações do capitalismo a uma gigantesca máquina manipulatória de poder e de saque evocadora da finança feudal. O quadro programático dessa coisa chamada esquerda não é muito mais do que uma colecção de teorias da conspiração.

2.

Dada a parcimónia discursiva dos gestores, é sempre útil analisar o que eles têm preconizado para a constante reorganização das relações sociais capitalistas em múltiplas escalas. Esta reorganização das instituições tem sido abordada pelos gestores de duas maneiras principais. Por um lado, o pragmatismo que os próprios assumem e que nós demos conta ao longo dos artigos anteriores.

Por outro lado, todos os que de alguma maneira defendem o que chamam de socialismo tendem a ver o maior ou menor sucesso do capitalismo pelos seus critérios pessoais e políticos do que acham que deve ser uma sociedade. Na realidade, o que para a chamada esquerda é uma anarquia e uma disfuncionalidade (por exemplo, as crises periódicas) é, no quadro do capitalismo reinante, a sua perenidade estrutural. Se o leitor tiver acesso, sugerimos a leitura do livro Globalizing Capital, de Barry Eichengreen, uma obra que traça a evolução do sistema monetário nos últimos 200 anos. O leitor encontrará ali uma desconcertante permanência de preocupações constantes de ajustamento das principais variáveis macroeconómicas: taxas de juro, taxas cambiais, inflação, desemprego, etc. E o que se aplica a este livro aplica-se a qualquer análise histórica da evolução económica no capitalismo. Para o exterior, nunca nada parece estabilizado. No interior, a estabilidade do poder dos gestores permite-lhes ir respondendo aos riscos do ciclo económico.

No fundo, sendo um modo de produção baseado no crescimento económico, a instabilidade é um eixo estruturante do modus operandi do capitalismo. Nas condições modernas, defender uma sociedade sem crescimento económico é defender uma estabilidade miserável e niveladora, muito por baixo, de situações económicas a níveis infra-humanos, na linha do que os nacionais-socialistas tentaram edificar no Leste europeu durante a segunda guerra mundial.

A instabilidade do capitalismo é sintoma dos ciclos económicos de criação, destruição, recuperação e nova criação de valor em índices mais elevados de produtividade. Ver a catástrofe final do capitalismo na instabilidade e nas crises económicas periódicas é, como diz a expressão popular, confundir o cu com as calças.

Como se teve oportunidade de verificar no decorrer da nossa análise dos documentos e testemunhos dos gestores, as crises económicas constituem formas de inovação e de reorganização institucional por parte da classe dominante. Enquanto as várias correntes da esquerda oficial pensam que os capitalistas andam à deriva, e enquanto a direita suspira por lideranças individuais à altura da situação, os capitalistas têm um plano estruturado, sistematizado e partilhado por todas as suas altas instâncias. Aliás, os murmúrios da direita portuguesa por personalidades e dirigentes fortes e carismáticas é um sinal da sua obsolescência política. O sucesso da reorganização institucional está cada vez mais sustentado em traços estruturais e organizacionais da classe dos gestores e é muito menos dependente de figuras especiais e marcantes. É isso que explica que os procedimentos institucionais levados a cabo pela tecnocracia europeia, no concreto e no imediato a união bancária, preparem a nova fase de recuperação económica e já estejam a ser aplicados. O que para a maioria da população não merece mais do que uma nota de rodapé no telejornal é, para a classe dominante, um avanço na sua coesão interna e na transnacionalização da sua actividade.

Enquanto por toda a Europa essa coisa que se chama de esquerda direcciona as suas fanfarras militantes para os governos e os casos de corrupção dos ministros, e enquanto essa esquerda pensa ver a crise económica como antecâmara para vias políticas nacionais, os capitalistas demonstram estar com vários passos de avanço. O facto de a realidade ser contrária aos nossos desejos não implica que se deva preferir a ilusão e a histeria à realidade.

Se a classe trabalhadora não souber contra quem e em que condições concretas pode lutar, todas as manifestações de luta não serão diferentes de investidas quixotescas contra moinhos de vento. Inventando monstros fictícios, os dirigentes da esquerda não são afinal mais do que Rocinantes a lançar a cabeça de activistas e de trabalhadores contra a parede.

A série A estratégia dos gestores é formada pelos seguintes artigos:

1) Crise económica europeia e instituições de regulação
2) As palavras e as acções dos gestores europeus
3) E o Bundesbank?
4) Dois discursos de Mario Draghi
5) A federalização, a esquerda e os capitalistas

18 COMENTÁRIOS

  1. Bela série de textos. Pedia-vos apenas, e digo isto sem qualquer espécie de ironia, para não se esquecerem de formular propostas ou sugerir pistas para a ação social e política concretas que tornem a tarefa de construção do “federalismo popular” uma possibilidade real e não apenas uma hipótese no plano teórico, uma distante miragem.

  2. Caro André,
    Para além das capacidades de acção de cada um de nós, o Passa Palavra é apenas um site e não um movimento social ou uma organização de massas a quem caiba formular palavras de ordem. Dentro destes limites, parece-nos que podemos ter uma intervenção eficaz alertando para os graves riscos e as contradições do nacionalismo. Esta tem sido uma das nossas preocupações sistemáticas. Ora, a crítica não é só um exercício teórico e tem igualmente efeitos práticos. Aliás, num artigo de Dezembro do ano passado http://passapalavra.info/2012/12/69300 , de que transcrevemos aqui uma longa passagem, demos o exemplo de uma iniciativa de internacionalização da luta dos trabalhadores. Na época actual, em que a economia está transnacionalizada, os capitais não conhecem fronteiras e milhões de trabalhadores procuram emprego noutros países, aquilo que é «apenas uma hipótese no plano teórico» e «uma distante miragem» é o nacionalismo — ou patriotismo — da chamada esquerda.

  3. E fazem-no muito bem. Como disse, tendo a concordar, em traços gerais, com o conjunto de análises que têm vindo a produzir que me parecem de grande qualidade. No entanto, dado o grau de devastação social e a irreversibilidade de muitos dos danos causados, pergunto-me se não ficamos (à esquerda) excessivamente reféns da análise, descurando a componente mais estratégica e instrumental da política. Sinais dos tempos (de profunda fragilização do movimento operário, popular), porventura? Por outro lado, no que diz respeito à ideia da economia transnacionalizada que evidenciam na resposta ao meu comentário inicial, a ideia de que o trabalho não conhece fronteiras não me parece corresponder inteiramente à verdade (contrariamente ao capital…). Há limites espaço-temporais à capacidade de deslocalização das estruturas produtivas (Harvey e Hartman parecem sugeri-lo) e parece ser aliás, a partir desse “spatial fix” que se têm articulado muitas das lutas sociais ao longo da história. Há, evidentemente, uma tensão entre a escala a que funciona o capital (não há fronteiras de facto) e a escala a que podem ser ativadas as “agências” humanas que é sempre (apesar da capacidade amplificadora da tecnologia) mais circunscrita e enraizada na materialidade concreta dos lugares onde a vida quotidiana se desenrola (emergindo o chamado localismo militante). Possivelmente, internacionalismo e nacionalismo não são mutuamente exclusivos mas correspondem a estratégias escalares que têm temporalidades distintas.

  4. A troca de comentários entre André e o colectivo do Passa Palavra levou-me a recordar algumas questões. Há cerca de duas décadas atrás, quando se estabeleceu a actual configuração transnacional do capitalismo, ficou assente entre os decisores (a palavra é horrível, mas já o Dicionário de Morais a registou) que as fronteiras deixariam de existir para os movimentos do capital mas seriam reforçadas para os movimentos da força de trabalho. Tendo isto em conta, poder-se-ia argumentar que a menor mobilidade da força de trabalho, que André invocou, seria uma construção do capitalismo e não corresponderia a nenhum desejo dos trabalhadores. Neste sentido, recordo o que li há algum tempo em The Economist, que os maiores lucros obtidos mundialmente pelo crime organizado vêm do transporte ilegal de migrantes e não do tráfico de estupefacientes. O mercado, sob a forma do crime organizado, encarregar-se-ia de colocar nos devidos termos aquilo que a política pretende impedir.
    Mas o problema é muito mais complicado, porque a migração não é suficiente, por si só, para desenvolver o internacionalismo. Portugal era, pelo menos durante a década final do fascismo, um país em que as remessas dos emigrantes em percentagem do PIB atingiam um dos níveis mundiais mais elevados. Ora, não parece que isto tenha suscitado qualquer ânimo internacionalista na classe trabalhadora portuguesa após o Vinte e Cinco de Abril.
    Pode argumentar-se que o internacionalismo, tal como todas as formas de solidariedade entre os trabalhadores, não resulta do mero facto de os trabalhadores se inserirem em conjunto nas hierarquias determinadas pelos empresários. Pelo contrário, a solidariedade entre os trabalhadores é gerada pela ruptura dessas hierarquias. E não me refiro aqui apenas às vagas seculares de luta, bandeiras desfraldadas ao vento, que alimentam o folclore revolucionário. Refiro-me sobretudo aos pequenos gestos discretos que constituem o quotidiano de todos os trabalhadores.
    Mas, se assim é, como explicar então o que está relatado num dos primeiros artigos publicados pelo Passa Palavra http://passapalavra.info/2009/02/772 ? O artigo introduz assim a questão: «Os operários de uma refinaria da empresa petrolífera Total, situada em Lindsey, na Grã-Bretanha, decidiram a 9 de Fevereiro terminar a greve selvagem [greve iniciada fora dos sindicatos] que durava há uma semana. Os grevistas protestavam contra o facto de a empresa empregar mão-de-obra portuguesa e italiana, que aceitava trabalhar com remunerações inferiores às dos seus colegas britânicos encarregados do mesmo tipo de trabalho, pondo em perigo o nível salarial. O movimento foi suspenso quando os sindicatos assinaram com a administração da empresa um acordo prevendo a oferta de uma centena de empregos a trabalhadores britânicos qualificados». Em seguida, o artigo evoca um importante precedente histórico, mostrando como na origem do estabelecimento do apartheid na África do Sul está uma violentíssima série de greves operárias, tendo as últimas, em 1922, sido conduzidas no quadro da Internacional Comunista sob o lema «Proletários de todo o mundo uni-vos, por uma África do Sul Branca». Não é elucidativo que casos como este sejam tão pouco falados, quando deveriam estar no centro das nossas reflexões?
    Assim, se aplicarmos a categoria marxista de falsa consciência, constatamos que hoje não são os agentes do capital transnacionalizado, mas grande parte dos trabalhadores, quem tem uma consciência equivocada da sua situação. E — o que é muitíssimo mais grave — verificamos que a esmagadora maioria da esquerda alimenta essa falsa consciência e vive dela. Se relermos o que vários marxistas da década de 1930, sobretudo a propósito da Alemanha, escreveram acerca da relação entre a falsa consciência e o fascismo, talvez nos apercebamos da gravidade do problema.

  5. É curioso o momento que vivem os trabalhadores europeus. Não sei se há muitos registros na história do capitalismo moderno em que se desenvolvem novos instrumentos de luta desacompanhados de bandeiras ou programas – talvez o luddismo seja um destes casos, assim como o atual. As “sabotagens” e greves, ocupações de fábrica e piquetes, passeatas e atos, por exemplo, nasceram como táticas para se lutar pela redução da jornada de trabalho, pelo sufrágio universal, o direito à sindicalização, férias etc.

    Nos último anos temos visto emergir formas de luta bastante radicais, sendo a principal delas as ocupações permanentes de praças por multidões determinadas em resistir. Estas táticas têm um potencial incrível, tanto maior quando associadas a um objetivo claro, haja vista o que se passou nos países árabes, em que regimes ditatoriais de décadas foram derrubados. Na Europa, porém, apesar das acampadas se constituírem como espaços onde se estabelecem novas relações sociais e se constitui a identidade e se aprofunda em organização um importante sujeito, os precários, não se observa a definição de bandeiras específicas de luta, e muito menos um programa – o que dizer então de um PROJETO de sociedade…

    O trágico é saber que, com a concentração do poder de decisão nas instituições europeias, essas mobilizações teriam grandes chances de impor limites ao programa de austeridade arquitetado pelos gestores da zona do euro, e assim conquistarem vitórias para os trabalhadores do espaço econômico mais importante do mundo. Uma pressão continuada sobre as instituições da União Européia, com possibilidades de paralisações de importantes setores da economia ou de vias de transporte (o que dá no mesmo), faria cair por terra o discurso da necessidade da austeridade como única solução ao problema da perda de competitividade da economia européia no cenário internacional. Afinal, com o atual grau de interdependência da economia mundial, a simples ameaça de paralisação da Europa teria um impacto imediato sobre os mercados de todo o mundo e exigiriam uma concertação dos gestores das principais economias para encontrar soluções à instabilidade. Provavelmente essas respostas seriam concessões, atreladas ao aumento da produtividade (ou da mais-valia relativa), o que já seria uma grande vitória para os trabalhadores, que se veem defrontados atualmente com o aumento da mais-valia absoluta e despossessão.

    Num cenário de mobilização articulada dos trabalhadores europeus na luta contra a austeridade, pode-se esperar que os capitalistas das outras regiões do mundo vejam-se forçados a nivelar “por cima” seus mecanismos de acumulação. O mais relevante, porém, seria o poder de contágio de uma tal mobilização sobre os trabalhadores do resto do mundo, tendo em vista a ressonância que já tiveram as acampadas na Espanha e na Grécia. Aí então teria início uma espiral de lutas, que primeiro desafiariam o modo de regulação e o regime de acumulação, para depois desafiar o próprio modo de produção capitalista.

    Se há alguma parte do planeta em que as “condições objetivas” de um novo internacionalismo dos trabalhadores se apresentam de maneira mais evidente, essa parte é indisputavelmente a Europa ocidental: linhas de comunicação onipresentes, uma moeda única, federalização político-econômica dos Estados-nacionais, o principal mercado do mundo e uma conjuntura econômica similar para a grande maioria dos seus países. Infelizmente o fardo histórico de ter sido o berço da instituição Estado-nacional segue impondo seu peso na consciência dos trabalhadores europeus, sempre prontos a sucumbirem a esse canto da sereia que é o nacionalismo.

  6. O pior, Eduardo Tomazine, é que o canto da sereia se tornou tão generalizado que passou a ser aceite como música das esferas. Hoje mesmo leio no Público que Jerónimo de Sousa, secretário-geral do Partido Comunista Português, insurgiu-se contra o que denominou «troika estrangeira» http://www.publico.pt/politica/noticia/reaccoes-a-decisao-do-tribunal-constitucional-1616979 , como se o problema fosse o facto de ser estrangeira e não de ser capitalista. De tanto ouvirmos este tipo de afirmações, esquecemos-lhes as raízes.

    Por isso convém lembrar que Lenin, nos seus trabalhos sobre o imperialismo, sistematizou a noção de que a classe operária das principais metrópoles imperialistas seria bem paga graças à sobre-exploração dos trabalhadores nas colónias e semicolónias. Esta sobre-exploração permitiria corromper uma aristocracia do proletariado, reformista e avessa a revoluções.

    Esta tese, porém, é desprovida de confirmação empírica. Já naquela época se sabia perfeitamente que a colonização de grandes espaços na Índia, bem como na África na segunda metade do século XIX, se devera a companhias privadas, que usaram em grande medida exércitos próprios e governaram os territórios com uma burocracia administrativa e judiciária própria. Mas os lucros esperados não se concretizaram, a tal ponto que as companhias colonizadoras privadas tiveram que entregar ou vender esses territórios aos governos das metrópoles. Em termos sociais, o fiasco económico da colonização privada deveu-se à resistência dos nativos à proletarização. Em África, só muito gradualmente os governos, através do imposto de palhota, ou hut tax, cobrado na moeda emitida pelo colonizador, pressionaram os nativos a assalariar-se para obter esse meio de pagamento.

    Dando um salto no tempo, a falta de sustentação empírica da análise de Lenin continuou a confirmar-se nas últimas décadas ao verificarmos que a maior parte dos investimentos externos directos emana dos países mais desenvolvidos e se dirige para países igualmente desenvolvidos. E, quando se dirige para países em desenvolvimento, procura as regiões mais desenvolvidas destes países. Uma síntese pode ser encontrada aqui: http://passapalavra.info/2011/05/39343

    Isto significa que a dinâmica da expansão imperialista não reside na exploração dos trabalhadores mais mal pagos, mas na dos mais bem pagos ou relativamente bem pagos. Ou seja, em termos marxistas, é a mais-valia relativa (assente na alta produtividade e em salários mais elevados) e não a mais valia-absoluta (condenada à baixa produtividade e aos baixos salários) que possibilita as maiores taxas de exploração e a maior acumulação de capital. É elucidativo que os marxistas esqueçam tão frequentemente os mecanismos da mais-valia, desprezando a principal contribuição de Marx para a crítica ao capitalismo. Afinal, Lenin ateve-se a uma visão arcaica, mais próxima do mercantilismo pré-capitalista do que de uma dinâmica capitalista.

    Ora, concebendo os mecanismos da exploração de maneira inversa aos seus processos reais, Lenin admitiu que o triunfo dos movimentos nacionalistas nos territórios colonizados e semicolonizados impediria a alegada sobre-exploração imperialista e tornaria impossível a existência da chamada aristocracia do proletariado nas metrópoles, criando assim condições sociais para se desencadear a revolução nos centros mais desenvolvidos. Nesta perspectiva as revoluções nacionais seriam a condição necessária da revolução social anticapitalista. O maoísmo actualizou esta estratégia com a noção do cerco das cidades pelos campos e o castrismo transpô-la, com as devidas adaptações, para a América Latina.

    O resultado está à vista, ou deveria estar, se os olhos servissem para ver. As revoluções nacionais nos territórios colonizados e nos países semicolonizados geraram, na melhor das hipóteses, novos capitalismos que estão a converter-se ou já se converteram em pujantes neoimperialismos, como no caso da China e da Índia, países onde vigora um sistema que, à falta de outro termo, tenho designado como capitalismo burocrático. Ou geraram, na pior das hipóteses, cleptocracias abjectas e governos dementes e disfuncionias, como sucede nos países africanos, com raras excepções.

    É sobre este século de lutas perdidas que nos cabe hoje reflectir, mas são poucos os que têm vontade de fazê-lo.

  7. Caro João Bernardo e demais companheiros do PassaPalavra,
    Por estar aqui no Brasil, tenho mais dificuldade em perceber a atual situação das lutas na Europa. Por isso pergunto: qual é a real influência da esquerda nacionalista sobre os trabalhadores europeus, e principalmente sobre as suas lutas de maior relevo nos dias de hoje?

    Pergunto isto porque a minha impressão (repito, de um observador à distância) é que os movimentos mais importantes da Europa, a saber, os precários, as acampadas, os M15 e outros do tipo, não apenas se organizam sob princípios políticos bastante distintos daqueles da tradicional esquerda nacionalista, como também não compartilham do seu nacionalismo.

    Posso estar muito enganado, mas, perante a história recente das lutas anticapitalistas na Europa, com destaque para o movimento altermundialista, a impressão que tenho é que a atual onda de protestos e indignação no continente está muito perto de estabelecer uma articulação orgânica na escala europeia, e de estabelecer as instituições da UE como alvo de pressão – assim como os encontros do G8 e de Davos se tornaram alvos privilegiados do movimento por uma outra globalização. Ou será que as lutas atuais estariam aquém das lutas de uma década atrás?

  8. Caro Eduardo,

    Como você sabe, estou longe de partilhar o seu entusiasmo pelas ocupações de espaços públicos, acampadas e movimentos afins, que não paralisam o aparelho produtivo e deixam incólumes as relações sociais de trabalho. Enquanto as acções se mantiverem nesse plano ritual os capitalistas dormem descansados. É certo que nas lutas sociais não existem fronteiras intransponíveis, mas até agora essas ocupações de lugares públicos não se repercutiram em greves sistemáticas e muito menos em ocupações de empresas, salvo no caso da Grécia, e mesmo assim sem continuidade.

    Por outro lado, é uma ingenuidade pensar que esses movimentos são autónomos pelo facto de não ostentarem siglas partidárias e se dizerem autonomistas. Pelo menos nos casos que conheço, sem excepção, partidos e articulações entre partidos têm mantido o controlo dessas ocupações de praças públicas. É uma regra sociológica bem conhecida, que uma pequena minoria organizada domina sempre uma grande maioria desorganizada. Só quando as lutas se processam nos lugares de trabalho, onde as pessoas têm laços de solidariedade já estabelecidos e portanto já dispõem de um certo nível de organização, é que ficam mais difíceis — embora não impossíveis — as actuações sub-reptícias. O que é outro factor para a minha desconfiança relativamente às acções circunscritas aos espaços públicos.

    Há ainda outro aspecto que se deve ter em conta. É que, contrariamente ao que é comum imaginar, as situações de crise não são propícias às lutas sociais. O desemprego é uma grande arma dos patrões, porque os trabalhadores que reclamam podem facilmente ser demitidos. Em regra, é quando a situação começa a melhorar e quando o desemprego diminui que os trabalhadores iniciam surtos reivindicativos.

    No seu comentário anterior fiquei sem saber se havia de rir ou de chorar quando li: «Nos últimos anos temos visto emergir formas de luta bastante radicais, sendo a principal delas as ocupações permanentes de praças por multidões determinadas em resistir. Estas táticas têm um potencial incrível, tanto maior quando associadas a um objetivo claro, haja vista o que se passou nos países árabes, em que regimes ditatoriais de décadas foram derrubados». Os resultados das formas de acção que caracterizaram a Primavera Árabe estão aí para todos verem, com a condição, evidentemente, de olharem. Basta observar a evolução da situação na Tunísia, mas sobretudo no Egipto. E será que o governo turco — já nem falo do capitalismo na Turquia — foi minimamente abalado pela ocupação da Praça Taksim?

    E agora você escreve que «a atual onda de protestos e indignação no continente está muito perto de estabelecer uma articulação orgânica na escala europeia». Até quando se continuará a ver a luta final em qualquer esquina de rua?

  9. Sim, João Bernardo: admito meu vício analítico em querer ver em cada esquina uma revolução. Mas talvez ele sirva de contrapeso a uma tendência em decifrar o fascismo em cada declaração de dirigentes desimportantes. Veja, fiz uma pergunta que permaneceu sem resposta, e que não foi uma pergunta retórica: eu gostaria de saber dos companheiros que conhecem melhor o atual cenário político europeu qual é a influência da esquerda nacionalista sobre os trabalhadores e os movimentos sociais daí. No fundo, o que quero entender com isso é se as dificuldades para a constituição de um movimento de trabalhadores na escala européia se devem mais a uma falsa consciência nacionalista, à incapacidade dos precários em detectar os reais centros de poder ou ao conformismo e o medo da precarização entre aqueles que ainda tem algum emprego não tão precário.

  10. Para que o Eduardo Tomazine tenha noção do grau de penetração do nacionalismo à esquerda basta lembrar que no passado mês de Março organizou-se o que a esquerda chamou de greve geral europeia e que a “grande mascote” da iniciativa foi a exibição continuada das bandeiras de Portugal, Espanha, Grécia e Itália. Ao mesmo tempo, as declarações e reivindicações em torno do lema “povos unidos contra a troika” demonstrou mais dois aspectos: 1) o resgate das teses das nações proletárias contra as nações plutocráticas; 2) a luta seria entre e através dos povos nacionais e não da classe trabalhadora. E isto foi transversal aos partidos, movimentos sociais de indignados e sindicatos.

  11. João, a sua sugestão de que o imperialismo europeu, sob a forma do colonialismo pós-Conferência de Berlim, teria sido menos lucrativo e feito menos uso da mais-valia absoluta do que se poderia supor, é de certa forma rechaçado pelo angolano Mário Pinto de Andrade no seu livro La Guerre en Angola, de 1971. Nele, MPA cita, entre outros, o exemplo da Companhia de Diamantes de Angola, a Diamang: empresa de capital estadunidense, britânico, belga, francês e português, obteve direitos de prospecção da maior parte do território angolano por 50 anos, a partir de 1921, e o direito de operação perpétuo nas jazigas descobertas durante esse período. Em 1960, a companhia operava 37 minas e empregava 26.000 angolanos, dirigidos por um reduzido quadro de 400 europeus. O salário médio anual dos trabalhadores era de 174 dólares (sim, anual!). MPA cita também a agricultura, onde o rendimento anual dos agricultores “contratados” era ainda mais radical: 62 dólares anuais.

  12. Gustavo,

    Em África o colonialismo especificamente capitalista iniciou-se na segunda metade do século XIX por acção de empresas privadas, que forneceram os quadros militares, políticos e administrativos para esse empreendimento. Para uma obra de conjunto sobre esse período aconselho-lhe os volumes VI e VII da General History of Africa publicada pela UNESCO (vol. VI org. por J. F. Ade Ajayi; vol. VII org. por A. Adu Boahen). Creio que tanto a edição em inglês como a tradução portuguesa se encontram agora na internet. Eu abordei esse assunto muito resumidamente num pequeno livro (Democracia Totalitária. Teoria e Prática da Empresa Soberana, São Paulo: Cortez, págs. 41-62). Penso que é possível encontrá-lo também na internet. O Tratado de Berlim assinalou não o início deste processo, mas o fim da sua primeira fase. O colonialismo da época mercantilista preocupara-se em estabelecer entrepostos comerciais e não em ocupar territórios, e só quando o colonialismo capitalista começou a ocupar espaços cada vez mais vastos é que se tornou necessário demarcar as novas áreas de influência, para evitar uma guerra generalizada. Aliás, a Conferência de Berlim ainda deixou alguns problemas menores por resolver.

    Na Índia a questão é mais complexa, porque a Companhia das Índias, que iniciou o colonialismo capitalista, fora criada na época do colonialismo mercantilista e, por isso, é necessário estudar as transformações internas seguidas pela instituição no começo do século XIX. Basta aqui recordar que o primeiro curso de economia na Grã-Bretanha foi inaugurado na escola de quadros da Companhia das índias, a cargo de Malthus, e que o funcionalismo público moderno na área de influência britânica e nos Estados Unidos veio na sequência das inovações introduzidas na organização da burocracia da Companhia das Índias. (Na Europa continental e na América Latina o processo foi diferente e deveu-se às reformas jacobinas e napoleónicas.)

    As companhias coloniais privadas defrontaram-se então com uma situação complexa e onerosa, porque tinham de manter o aparelho militar, policial, administrativo e judiciário exigido pela ocupação e governo de vastos territórios, assegurando ainda em vários casos a emissão de moeda. Ora, a obtenção de lucros mediante a aquisição de mercadorias a preços muito inferiores àqueles a que seriam vendidas caracterizara o mercantilismo, não o novo capitalismo. A forma especificamente capitalista da obtenção de lucros consiste na exploração da força de trabalho, o que obrigava as companhias coloniais a proletarizar populações que até então haviam sido exploradas por outros processos. As campanhas antiesclavagistas conduzidas nessa época, sobretudo pelos britânicos, deveram-se a esta necessidade de pôr termo às formas de exploração anteriores e generalizar a proletarização.

    Nem a Companhia das Índias nem as companhias de colonização privadas actuantes em África conseguiram levar a cabo aquela conjugação de funções militares, administrativas, judiciais e económicas e ao mesmo tempo prosseguir o processo de proletarização de maneira a obter lucros suficientes com a exploração da força de trabalho indígena. Tiveram de apelar para os governos das respectivas metrópoles, e foi a partir de então que o colonialismo privado se tornou, por assim dizer, público. Isto significa que a mais-valia absoluta extorquida aos trabalhadores africanos e indianos não foi suficiente sequer para assegurar a continuidade do processo de colonização e que os colonizadores tiveram de fazer apelo ao capital que havia sido acumulado graças à mais-valia relativa extorquida aos trabalhadores das metrópoles. A dinâmica foi a inversa da indicada por Lenin na sua teoria do imperialismo.

    O caso português constitui uma particularidade curiosa. Contrariamente à Grã-Bretanha à França e à Alemanha, Portugal era um Estado à beira da falência, o que fazia com que a metrópole dificilmente pudesse apoiar as companhias colonizadoras privadas. Por isso essas companhias, em Angola, em Moçambique e na Guné, continuaram a exercer a soberania — companhias majestáticas, como se lhes chamava — até uma data bastante tardia, quando as suas congéneres estrangeiras já há muito haviam passado armas e bagagens para os governos metropolitanos. Penso que a mais duradoura foi a Companhia de Moçambique, pois só no começo da década de 1940 o Território de Manica e Sofala passou para a administração directa do governo da colónia.

    Estudar a evolução do processo de proletarização em África e as dificuldades com que ele tem deparado, desde o imposto de palhota até hoje, é estudar a base social daquilo a que se chama subdesenvolvimento. O carácter cleptocrático das elites africanas — não em todos os países, mas na grande maioria — que colocam os lucros no estrangeiro em vez de os investir localmente, deve-se a essa insuficiência do processo de proletarização, incapaz de proceder a ciclos acelerados de mais-valia relativa.

    Em suma, a acumulação do capital, e portanto a dinâmica de expansão, processa-se a partir dos centros de mais-valia relativa e não à custa da extorsão de mais-valia absoluta, que nunca é rentável. O caso extremo foi o do Congo do rei Leopoldo, onde a extorsão de mais-valia absoluta atingiu as dimensões mais horrorosas e onde a falência do colonialismo privado foi a mais colossal.

  13. JB,
    Obrigado pelo aprofundamento desse ponto, é sempre estimulante tentar (eu) olhar as coisas por outros ângulos.
    Ou seja, o caso português é, de fato, único, e talvez tenha cumprido (junto com o belga, como você citou), de forma isolada, o vaticínio do eslavo: quem sabe Salazar não terá lido Lenin, às escondidas e gostado da idéia :)
    Para reforçar essa particularidade, lembro-me agora da forte onda migratória (espontânea) de homens moçambicanos para as minas na África do Sul nas décadas de 50 e 60, se não estou enganado: os portugueses não sabiam proletarizar, então os camponeses faziam-no no país vizinho, em troca de meia dúzia de rands. Deixavam as mulheres a cuidar das machambas e das crianças e partiam para temporadas de trabalho no país vizinho. E o governo português ainda recebia, de quebra, um pagamento por parte do governo sul-africano, por lhe facilitar a aquisição de mão-de-obra barata.
    No sentido de ilustrar todas essas “peculiaridades” lusitanas, penso que este trecho do documentário de Joaquim Furtado é bastante esclarecedor.
    Obrigado pelas indicações bibliográficas, sobre as quais me deterei em breve.

  14. Gustavo,
    Afinal esqueci-me de que todo aquele arrazoado foi inspirado por uma citação do Mário Pinto de Andrade, que tão importante foi para os portugueses da minha geração. Entre muitas outras coisas, foi ele quem mais cedo se apercebeu do rumo funesto que tomava o movimento nacionalista angolano, e logo em 1974 fundou em oposição ao MPLA o grupo Revolta Activa. Nessa altura eu colaborava em Portugal no jornal Combate (http://www.marxists.org/portugues/tematica/jornais/combate/index.htm ), em cuja criação participei, e no editorial do nº 6 (http://www.marxists.org/portugues/tematica/jornais/combate/pdf/06.pdf ) e sobretudo no editoral do nº 13, (http://www.marxists.org/portugues/tematica/jornais/combate/pdf/13.pdf ), que termina com a declaração: «Apoiamos os bandidos», é clara a inspiração directa da Revolta Activa e da orientação defendida então por Mário Pinto de Andrade. Estava ali claramente expressa a contradição entre a revolução social e as revoluções nacionais, que suscitou esta troca de comentários.
    A passagem da obra de Mário Pinto de Andrade que você citou revela bem a incapacidade do colonialismo português para proceder ao desenvolvimento capitalista das colónias, a tal ponto que os contratados eram uma espécie de força de trabalho escrava, na realidade uma forma de escravidão por dívidas. E há a emigração maciça dos moçambicanos para as minas sul-africanas, que você mencionou neste seu último comentário. Aliás, é interessante considerar que a burla de Alves dos Reis (http://en.wikipedia.org/wiki/Alves_dos_Reis ) (http://pt.wikipedia.org/wiki/Artur_Virg%C3%ADlio_Alves_dos_Reis ), talvez a burla mais colossal arquitectada no século XX em todo o mundo, tinha como objectivo reunir capitais para proceder ao desenvolvimento capitalista de Angola. Poucos anos depois, ao determinar que os orçamentos de cada colónia deviam ser equilibrados, e que portanto elas não podiam contar com o capital acumulado na metrópole, Salazar pôs definitivamente de lado o desenvolvimento colonial, e foi este o motivo do seu confronto com Cunha Leal, importante nos começos do Estado Novo. Só muito tardiamente, já iniciadas as guerras coloniais, é que Salazar autorizou um certo desenvolvimento capitalista nas colónias, que de qualquer modo seria estimulado pela mera presença do exército, esse agente keynesiano…

  15. JB,
    Mais uma vez, obrigado pelas referências e testemunho de quem viveu e acompanhou esse “peculiar” estado de coisas bem lusitano.
    Para quem tinha por hobby predileto de infância andar pelas ruas de Luanda a colecionar cartuchos detonados e não detonados de AK-47 e de G-3, e ir aos comitês dos três movimentos de libertação, sem distinção (o que é a ideologia para as crianças?), tornados legais depois do 25 de Abril, para lá obter o maior número de panfletos, pôsters e buttons, é sempre gratificante voltar a essa época, resignificando-a.

  16. JB,
    achei interessante sua análise acerca da aristocracia operária. Queria enriquecer mais um pouco minha leitura sobre o tema. Queria uma sugestão de alguns textos que abordem-no nessa perspectiva.

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