Por que motivo continua a chamar-se esquerda àquela que hoje existe com este nome? Por João Bernardo
I
1.
As grandes derrotas que temos sofrido não se deveram principalmente aos ataques vindos de fora, aos inimigos explícitos, mas sobretudo ao inimigo insidioso, gerado pelo desenvolvimento das contradições internas da esquerda. Por isso a crítica da esquerda pela esquerda é pelo menos tão urgente como a crítica da direita pela esquerda.
Reina na esquerda um conformismo que garante o conforto mental, enquanto a grande preocupação deveria ser o estudo das causas das derrotas.
2.
O capitalismo goza hoje de uma indisputada hegemonia.
Por todo o mundo, a esquerda governamental perdeu a identidade e nada de significativo a diferencia da direita. Abandonando quaisquer transformações económicas substanciais e restringindo-se nesse campo aos paliativos, a esquerda governamental concentrou-se nas questões de costumes, mas mesmo aí deixa a desejar. Numa época recente ela ainda se singularizava por adoptar uma certa latitude moral, enquanto a direita era moralmente restritiva. Agora já nem isto sucede. Ao confundir-se com o politicamente correcto, a esquerda começou a pautar os comportamentos por normas muito mais estritas do que aquelas que o conservadorismo impõe. Até a defesa do direito ao aborto esqueceu a sua justificação originária, decorrente da má situação económica das mães que pretendiam recorrer a essa prática, e, pior ainda, em vez de assinalar uma progressão das fronteiras da imoralidade, invoca os argumentos da nova moral do exclusivismo feminino. Especialmente perversa, tanto nos pressupostos como nos resultados, é a institucionalização do casamento entre homossexuais, já que aplica o padrão tradicional dos casais heterossexuais e reprodutores àqueles de quem se poderia esperar que rompessem com esse formato moral.
A mesma perda de identidade atingiu a esquerda exterior às instituições estatais, que passou a repetir e desenvolver temas gerados na transição do século XVIII para o século XIX pela extrema-direita anticapitalista, conservadora ou radical. Nesta deslocação de sentidos e de referências, a esquerda exterior às instituições estatais, que em várias épocas constituiu uma efectiva ameaça, não passa agora de uma irrelevância. Exceptuando em alguns — poucos — países da Europa ocidental e da América Latina, esta esquerda tem sido ignorada nas principais lutas sociais dos últimos anos.
Por que motivo, aliás, continua a chamar-se esquerda àquela que hoje existe com este nome?
3.
Está em curso uma profunda transformação orgânica da classe trabalhadora, resultante da convergência de seis processos.
a. A mundialização da classe trabalhadora praticamente extinguiu os sistemas pré-capitalistas e se antes tínhamos formações económico-sociais constituídas por vários sistemas sob a hegemonia do modo de produção capitalista, temos hoje um só modo de produção capitalista com variantes internas. Ora, por um lado este processo foi correctamente entendido como uma globalização, mas por outro lado deu origem à falsa noção de que o capitalismo estaria a dissolver-se numa multiplicidade de formas.
b. A redução de todos os tipos de exploração ao sistema de exploração capitalista ocorreu muito mais rapidamente no plano económico do que no plano cultural, em que persistem tradições herdadas de sistemas pré-capitalistas entretanto assimilados pelo capitalismo. Assim, uma parte considerável dos trabalhadores pensa em quadros ideológicos que já não correspondem à sua base socioeconómica. Trata-se de uma falsa consciência resultante de um desfasamento temporal.
c. O capital está transnacionalizado, mas o mesmo não sucede com o mercado de trabalho, sujeito a barreiras nacionais ou regionais e onde se erguem obstáculos à migração. Ao contrário do que fora previsto pelos socialistas do século XIX, não foi o proletariado mas os capitalistas quem se internacionalizou e, perante o grande capital unificado mundialmente, os trabalhadores apresentam-se fragmentados. A esta situação de inferioridade corresponde uma falsa consciência, estando os trabalhadores divididos entre uma aspiração de globalização e as pressões do nacionalismo. O nacionalismo hoje difundido na esquerda é a expressão dessa falsa consciência. E este nacionalismo tornar-se-á tanto mais estridente quanto mais se confinar ao plano ideológico e cultural, tentando compensar assim a ausência de um substrato económico.
d. As profissões liberais extinguiram-se devido à proletarização dos seus processos de trabalho, que passaram a obedecer à padronização e a uma avaliação estritamente quantitativa. Por este motivo, a maior parte dos antigos profissionais liberais converteu-se em trabalhadores proletarizados e os restantes, uma pequena minoria, converteram-se em gestores. Porém, a maioria dos antigos profissionais liberais convertidos em trabalhadores, em vez de assumir a consciência deste processo, pelo contrário, reage contra ele mediante uma falsa consciência que implica um comportamento elitista relativamente aos trabalhadores assumidos como tais.
e. O sistema de relações de trabalho geralmente denominado pós-fordismo ou toyotismo recorre à terceirização extensiva, de modo que uma parte considerável da força de trabalho é apresentada no plano jurídico como profissionais independentes quando na realidade socioeconómica se trata de um assalariamento precário. Gerou-se assim uma cisão entre a consciência social dos trabalhadores precários e a dos trabalhadores integrados num assalariamento formal e de longo prazo.
f. A produção de bens imateriais desenvolve-se cada vez mais. Ora, apesar de o capitalismo ter sempre incluído serviços e de as relações de exploração se definirem em termos de tempo de trabalho e não de fabrico de objectos palpáveis, divulgou-se a noção de que a diminuição da percentagem dos trabalhadores encarregues de fabricos materiais corresponderia a um declínio da própria classe trabalhadora, o que implica que os produtores de bens imateriais sejam concebidos como exteriores à classe trabalhadora.
A convergência destes processos leva uma grande parte dos trabalhadores, ao mesmo tempo que perde a noção antiquada da classe, a não adquirir uma noção modernizada e pertinente. Enquanto a classe trabalhadora atravessa uma profunda transformação orgânica, que está longe de chegar ao seu termo, as ideologias hegemónicas na esquerda actual reflectem esta transformação em modalidades de falsa consciência. Generalizaram-se noções vagas e especulativas, a futilidade, a cisão entre o cultural e o fundamento socioeconómico e o distanciamento relativamente à economia, que é deixada ao bel-prazer dos tecnocratas. Este misto de ambiguidade e de falsa consciência reflecte-se nos intelectuais profissionais da esquerda mediante a ideia difusa de que o capitalismo actual dispensaria a classe trabalhadora. Houve épocas em que alguns intelectuais contribuíram decisivamente para a formação e a generalização de uma consciência de classe trabalhadora, mas sucede hoje o contrário e a nova consciência de classe, quando ressurgir, virá da multiplicidade de elaborações silenciosas, resultantes de uma acumulação de pequenas e grandes lutas e alheias ao discurso intelectual.
4.
Uma teoria revolucionária não é apenas uma teoria que revoluciona o panorama intelectual. No que diz respeito à sociedade, é também uma teoria da revolução. Não existe actualmente teoria social revolucionária, em nenhum destes dois sentidos.
a. O marxismo pereceu devido a duas implosões sucessivas: uma resultou da burocratização da revolução russa e do estabelecimento do regime soviético como capitalismo de Estado e a outra deveu-se à extinção dos regimes de tipo soviético e à sua fragmentação geopolítica.
b. O anarquismo pereceu em virtude de um duplo processo, repetido ao longo do tempo: a dissolução que o atinge quando se confunde com uma liberdade indeterminada ou com um naturismo primitivista e o congelamento que o imobiliza num museu de relíquias veneradas e indiscutidas.
Aquilo que hoje sobra de ambas as correntes restringe-se a alguns meios universitários, onde se limita a constituir um objecto de estudo e a alimentar os currículos. Nem contribui para revolucionar o meio intelectual nem para inspirar uma teoria da revolução.
5.
Não valeria a pena perder tempo aqui com a velha esquerda composta pelos saudosistas do capitalismo de Estado, viúva do regime soviético aguardando que a deitem ao lado do defunto, não fosse o facto de o capitalismo de Estado ter continuado a ser um atractivo, mas agora em sistemas mistos que não excluem o recurso a outras modalidades de inter-relacionamento das empresas.
Desde a sua origem, antes ainda da génese do marxismo, que na esquerda existe um acentuado pendor para o estatismo. Não se trata para essa esquerda de alterar as relações sociais de trabalho, mas de concentrar no Estado os principais mecanismos de decisão económica. Esta é a esquerda que corresponde exclusivamente aos interesses da classe dos gestores, cujo acesso ao capital passa pelo exercício de funções administrativas e não pela detenção de propriedades.
Os gestores podem ascender tanto no aparelho tecnoburocrático das grandes empresas como no aparelho tecnoburocrático do Estado. Todavia, as grandes empresas são muito exigentes nos seus critérios de selecção, que passam pela avaliação dos currículos e por entrevistas, intermediadas nas esferas superiores por firmas especializadas em recrutamento. É certo que há uma circulação entre os quadros administrativos das grandes empresas e a administração estatal, mas apenas enquanto assessores ou ministros técnicos, porque o acesso aos postos elegíveis obtém-se graças a clientelas partidárias ou simples compadrios. Ora, como não se trata aqui de convicções mas de oportunidades, pode ser conveniente usar com fins eleitorais um rótulo de esquerda, devido ao seu apelo populista. Esta diferença nos processos de escolha explica que os gestores candidatos eleitorais em listas de esquerda sejam muito menos competentes do que os seleccionados por recrutamento, o que leva a militância partidária na esquerda estatista a atrair sobretudo a tecnoburocracia de segunda e terceira ordens.
A armadura jurídica do capitalismo pode assim ser discutida pela esquerda no aparelho de Estado e eventualmente remodelada, enquanto nas empresas as relações capitalistas de trabalho se mantêm ou são mesmo reforçadas. Já na União Soviética o apreço pelo taylorismo fora levado a um grau extremo, a tal ponto que foi aí, durante os planos quinquenais, e não nos Estados Unidos, que se realizaram as maiores experiências fordistas. A situação não mudou e para esta porção da esquerda socialismo continua a significar ampliação do poder de decisão económica do Estado, ficando completamente posto de lado o problema das relações sociais de trabalho. É um socialismo de gestores, não de trabalhadores.
6.
Existe uma subespécie de eternos candidatos a gestores que têm como programa a ocupação do poder de Estado, mas com ilusões tais que nunca podem ser satisfeitas. Distinguem-se dos outros não pelos objectivos últimos, que em ambos os casos é a estatização da economia, mas pela ausência de noções práticas quanto ao caminho a percorrer. E como a sua vocação para o fracasso os leva a imaginarem-se revolucionários, consideram que é o sucesso eleitoral que classifica os outros como reformistas. Na verdade, trata-se de uma esquerda governamental in partibus, que só parece exterior às instituições estatais porque não consegue inserir-se nelas.
Nem conseguirá porque julga que o capitalismo perdeu as potencialidades de crescimento e o dinamismo interno. Esta esquerda é incapaz de se dar conta do aprofundamento do sistema de exploração e das novas formas de concentração económica que garantem ao capitalismo o aumento da produtividade e dos lucros e uma grande capacidade de absorção dos conflitos sociais. Embora invoque sempre referências marxistas, a sua compreensão nunca foi além da mais-valia absoluta. Os mecanismos da mais-valia relativa e da renovação das classes dominantes mantêm-se para ela envoltos em mistério.
O facto de arrastar uma história composta toda de fracassos não desanima esta esquerda, que se ocupa exclusivamente em dar lições aos governantes e aos patrões sobre a maneira de gerir o Estado e a economia e em profetizar o fim iminente do capitalismo. É estranho que não se dê conta de que traça assim uma distância crescente entre a sobranceria apocalíptica com que se refere ao capitalismo e a desconsolada mediocridade a que se confina. Qualquer teoria da revolução ficaria sem sentido se a crise do capitalismo não correspondesse à ascensão dos revolucionários e se a crise em que os revolucionários se encontram não indicasse a hegemonia do capitalismo.
Tudo isto seria trágico se fosse grandioso, mas como ocorre em esferas diminutas é só ridículo.
Este Manifesto foi publicado em quatro partes. Esta 1ª parte incide sobretudo na velha esquerda. A 2ª parte diz respeito à esquerda pós-moderna. A 3ª parte versa questões organizacionais. Finalmente, a 4ª parte trata do horizonte económico do anticapitalismo. Todas as partes foram reunidas aqui.
Na janela de destaques e nos thumbnails reproduzem-se obras de Ellsworth Kelly.
“É um socialismo de gestores, não de trabalhadores.”
Só por curiosidade, como o autor imagina que se organizaria os meios de produção no socialismo (ou numa sociedade pós-capitalismo)? Em cooperativas? Não haveria nenhum tipo de gestor? Como exatamente seria?
Não é uma provocação, é curiosidade mesmo.
Perguntador,
Não me parece que se resuma a mera «curiosidade», porque é essa a questão central. Todavia, a cooperativa é uma fórmula jurídica que cobre realidades sociais muito diferentes ou até opostas, desde aquilo a que Luciano Pereira e eu chamámos capitalismo sindical até modalidades de autogestão. O critério decisivo é a possibilidade de os trabalhadores determinarem o sistema de relações de trabalho e os rumos da produção, nomearem e demitirem os colegas encarregues da administração e os fiscalizarem de muito perto, em resumo, controlarem todo o processo, impedindo que a administração sirva de quadro à formação de uma classe social privilegiada e, portanto, exploradora. Tem sido esta a grande clivagem no escasso número de experiências revolucionárias que atingiu os processos de trabalho. Na Comuna de Paris dirigiram-se neste sentido os projectos da Comissão do Trabalho e das Trocas, e vale a pena compará-los com as lições que Marx e Engels, por seu lado, extraíram das incipientes experiências económicas da Comuna. Foi igualmente esta a clivagem na Rússia soviética durante os primeiros anos da revolução, como Maurice Brinton mostrou documentadamente num livro que deveria ser muitíssimo mais estudado. E foi esta a clivagem estruturante das lutas sociais em Portugal em 1974 e 1975. Ora, ao longo da história os trabalhadores conseguiram aplicar a autogestão — efectivamente autogestão — em empresas particulares, mas nunca conseguiram estabelecer no mesmo plano de autonomia uma coordenação económica sistemática e durável entre as várias empresas autogeridas. Tem sido este, até agora, o principal fracasso histórico da luta dos trabalhadores, responsável por todos os outros fracassos. Enquanto não se avançar na solução deste problema, as lutas dos trabalhadores acabarão inevitavelmente por promover a ascensão de uma nova elite, que irá renovar a classe dos gestores e, afinal, reforçar a base social do capitalismo. Em poucas palavras, é esta a tragédia interna do que se chama esquerda. No § 23 deste Manifesto indicarei as formas em que julgo possível exercer o controlo colectivo dos trabalhadores numa economia e numa sociedade muito complexas e em que impera a divisão do trabalho.
Olá João Bernando, tenho pleno acordo que esse assunto é inadiável e de suma importância para a luta de classes.
Gostaria que me esclarecesse alguns pontos do texto que não ficaram claros para minha compreensão:
1. “A produção de bens imateriais desenvolve-se cada vez mais”. Não esta muito claro o que seriam tais bens imateriais… seriam as necessidades da fantasia? Porque se forem, entendo que mesmo essas requerem um processo de produção material. A industria do merchandising é um ramo fundamental da produção capitalista, por exemplo.
2. Penso que os pontos mais polêmicos do texto sejam: a discussão sobre o nacionalismo e o internacionalismo, com o desaparecimento da categoria imperialismo; a velha esquerda e o capitalismo de Estado; e os gestores com seu programa de ocupação do poder do Estado e a não transformação das relações de trabalho. Desapareceriam as mediações táticas? Como enfrentar o poder centralizado no Imperialismo Estadunidense, nas grandes transnacionais e nos Estados Nacionais?
Um abraço, e obrigado pela persistência na luta!
Luiz Fernando,
1) Ao mencionar a produção de bens imateriais tinha em vista aqueles autores para quem a electrónica, a internet e o trabalho em computadores teria alterado substancialmente as relações sociais capitalistas. Estas teorias proliferam hoje. Mas elas não se teriam expandido a este ponto se não houvesse entre os marxistas quem confunda trabalho produtivo com o fabrico de coisas que podem apalpar-se e que caem quando largadas no ar. Ora, a produção de mais-valia diz respeito a tempos de trabalho e não à força da gravidade. Assim, de um lado temos os que obnubilam a exploração on line e temos do outro lado os que reificam as relações sociais — surgidos precisamente entre os supostos críticos de tal reificação.
2) Eu nunca afirmei que a categoria imperialismo perdera a razão de ser. Mas entendo o imperialismo como expansão do capital e não em termos obrigatoriamente nacionais.
3) Isto significa que não confundo o imperialismo com um ou outro país e que não o entendo como justificativa para o apoio a certos nacionalismos. Por exemplo, no Passa Palavra, numa série de artigos dedicados à economia brasileira actual, analisei o imperialismo brasileiro na América Latina e em África: «Brasil hoje e amanhã: 7) geografia do novo imperialismo» e «Brasil hoje e amanhã: 8) teia do novo imperialismo», um assunto sobre o qual se mantêm discretos aqueles «anti-imperialistas» brasileiros que se limitam a confundir imperialismo com Estados Unidos.
4) Por outro lado, tenho-me esforçado por mostrar que na época de transnacionalização do capital o imperialismo assumiu outras características e que já não se confunde com a emanação de capitais a partir de uma dada nação nem se circunscreve a fronteiras políticas. Por exemplo no artigo «A geopolítica das companhias transnacionais».
5) Isto não significa que não existam mediações. Eu tenho defendido que as empresas são elas mesmas um aparelho de poder dotado de soberania, a que chamo Estado Amplo, mas este poder é exercido através de inúmeras mediações, umas resultantes de alguns departamentos das administrações das próprias empresas, as outras constituídas por ONGs.
Por favor, note que se trata aqui de um Manifesto, com as vantagens e inconvenientes desse tipo de textos. Por um lado, o estilo incisivo, mas, por outro, a brevidade. A minha intenção é chamar a atenção para uma série de problemas.
Podia publicar a parte 4 e 3. Da parte 1 e 2 já tratou diversas vezes em artigos e outros manifestos.
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2014/04/1437916-maridos-agressivos-ficam-sem-sexo-e-bilhar-em-comunidade-em-campinas-sp.shtml
No link postado, há relato de uma ampla experiência de auto-defesa de mulheres populares e, no entanto, elas não se autodefinem como feministas. O mesmo se passa com os trabalhadores.
Onde moro, os trabalhadores organizam lutas em torno da saúde, lutas em torno do transporte, lutas contra a violência policial, lutas por melhor atendimento por parte do Estado, criam formas de solidariedade de base e comunitarismo e tudo isso se passa sem que haja uma única leitura, um único grupo de estudos, um único partido, um único grupo político. Mas há muitas reuniões, desde as formais até as que ocorrem no posto de saúde, nos ônibus, nos bares. Nenhum deles – de nós – se proclama de esquerda.
Hoje, um bom indício de que a pessoa não se preocupa com os populares – note que eles nunca moram no meio do povão – é o sujeito se definir como esquerda. Quando chego num trabalho novo, a primeira pessoa de quem levanto suspeitas é do cara do sindicato. E não dá outra. Cansei de pegá-los dizendo uma coisa ao tomar café com os peões e dedurando depois nas reuniões com os diretores. Se assumir de esquerda, hoje, é uma forma de ludibriar.
Caro João,
Me desculpe se você já tiver se referido a isso em algum texto seu (se for o caso, basta, por favor, mencionar a fonte); no momento, porém, não me lembro, daí a questão abaixo.
De maneira sintética, você diagnostica que
“a. O marxismo pereceu devido a duas implosões sucessivas: uma resultou da burocratização da revolução russa e do estabelecimento do regime soviético como capitalismo de Estado e a outra deveu-se à extinção dos regimes de tipo soviético e à sua fragmentação geopolítica.
b. O anarquismo pereceu em virtude de um duplo processo, repetido ao longo do tempo: a dissolução que o atinge quando se confunde com uma liberdade indeterminada ou com um naturismo primitivista e o congelamento que o imobiliza num museu de relíquias veneradas e indiscutidas.
Aquilo que hoje sobra de ambas as correntes restringe-se a alguns meios universitários, onde se limita a constituir um objecto de estudo e a alimentar os currículos. Nem contribui para revolucionar o meio intelectual nem para inspirar uma teoria da revolução.”
Minha pergunta é: você não considera que a realidade de certos movimentos sociais contemporâneos (especialmente na América Latina e na Europa), e aqui penso de imediato no exemplo dos neozapatistas, não serviria para relativizar a primeira frase do terceiro parágrafo? (Quanto ao grau em que a realidade desses movimentos serviria para relativizar a segunda frase, tenho uma dúvida bem maior…)
Não quero, com isso, dar a entender que vejo tais movimentos como isentos de problemas e, sobretudo, de limitações e vulnerabilidades. Contudo, seriam eles uma mera “nota de rodapé”, ou será que, com todos os seus impasses e desafios, não representam eles, muitas vezes, esforços significativos para, nas condições de hoje, reler e reinterpretar, justamente, o legado das duas supramencionadas correntes?… (As questões da coerência e do alcance efetivo dos hibridismos teórico-conceituais e políticos que vêm sendo produzidos em meio ou no contato com esses movimentos são, sem dúvida, cruciais; porém, será que objeções quanto a isso seriam suficientes para nos fazer concluir que o legado conjunto do marxismo e do anarquismo se acha basicamente restrito a uma espécie de exercício de necrofilia intelectual praticada no âmbito da megamáquina acadêmica burocratizada da atualidade, por mais que isso seja uma realidade maciça e que precisa ser denunciada e discutida?)
Desculpando-me por me alongar, aproveito, João, para fazer uma segunda pergunta: quando você observa que “[o] marxismo pereceu devido a duas implosões sucessivas: uma resultou da burocratização da revolução russa e do estabelecimento do regime soviético como capitalismo de Estado e a outra deveu-se à extinção dos regimes de tipo soviético e à sua fragmentação geopolítica”, será que não deveríamos recuar um pouco mais e admitir que o caráter contraditório e os problemas da própria obra de Marx (nos termos expostos e discutidos por você mesmo em várias de suas obras) desempenhou, ainda que indiretamente, um papel nos problemas que o marxismo viria a enfrentar, no século XX? Aliás, mesmo que, por alguma razão – a ser esclarecida -, se decidisse “pular” Marx, não seria o caso, no mínimo, de sublinhar (para usar o título de um texto de Castoriadis) “o papel da ideologia bolchevique no nascimento da burocracia”, o que nos obrigaria a não tomar como ponto de partida apenas a burocratização da Revolução Russa, conforme sugerido no seu item “a”?
Marcelo,
Não há ninguém que não seja contraditório, os escritores incluídos e nós mesmos também. A contraditoriedade, c’est le lot des humains. Quando estudo um autor procuro desvendar a teia das suas contradições até atingir o que chamo o ponto vazio, aquela contradição central que, na minha opinião, todo o resto do pensamento se destina a encobrir aos olhos do próprio e, já agora, aos olhos dos outros também. É este o sentido do meu estruturalismo, desvendar como um certo ponto vazio determina a estrutura construída em seu redor. Foi o que tentei fazer no Marx Crítico de Marx, mas só relativamente a O Capital. Depois, procurei analisar a contradição entre o internacionalismo de Marx e de Engels e o seu nacionalismo germanista e antieslavo, mas sem conseguir aqui penetrar no âmago da contradição.
Por isso não creio que o carácter contraditório do sistema ideológico de Marx seja mais significativo do que o carácter contraditório do sistema ideológico de qualquer outra pessoa. A revolução russa de 1917-1918 não saiu das páginas de O Capital como Palas Atena da cabeça de Zeus. Resultou de várias componentes políticas e sociais e inscreveu-se numa luta social pan-europeia, cuja derrota explica a evolução nacionalista da revolução russa e a concomitante hegemonia alcançada pelo Partido Bolchevista. Convém não esquecer que o mesmo Marx que serviu de referência à burocratização da revolução russa serviu também de referência à extrema-esquerda que lutou contra essa burocratização.
Mas esta foi a sua segunda questão. Quanto à primeira, note que eu escrevi que «exceptuando em alguns — poucos — países da Europa ocidental e da América Latina» a esquerda exterior às instituições estatais «tem sido ignorada nas principais lutas sociais dos últimos anos». Ora, Chiapas está na América Latina e poderia contar-se entre as tais excepções. No entanto, e mesmo tendo em conta que houve uma forte componente maoísta na origem do neozapatismo, não me parece que este movimento possa considerar-se uma corrente do marxismo, como não é uma corrente do anarquismo, os dois sistemas ideológicos a que me refiro na passagem que você destaca. Mas o principal problema aqui é outro. Apesar da simpatia que tenho pelos zapatistas de Chiapas, eles só tiveram um papel relevante há vários anos atrás, quando pareciam fornecer um modelo ou pelo menos uma inspiração. Não mais. No México deixaram de ter um papel relevante nas lutas sociais ou mesmo na vida política e foram postos de lado no resto da América Latina. Basta atentar na evolução daqueles que seriam os seus naturais apoiantes, a Via Campesina e o MST, convertido numa burocracia empresarial. Bem sei que há pessoas que vão todos os anos a Chiapas respirar o ar da revolução, mas também as há que vão a Lourdes e a Fátima, e olhe que estas são muitas mais, e não é por isso que o catolicismo conta hoje como um factor vital.
Assim, as frases que você me coloca como interrogação constituem o que eu tenho a dar-lhe como resposta: «o legado conjunto do marxismo e do anarquismo se acha basicamente restrito a uma espécie de exercício de necrofilia intelectual praticada no âmbito da megamáquina acadêmica burocratizada da atualidade».
Caro João,
Me permita ser chato e voltar àqueles dois pontos que levantei, pois o que eu disse foi parcialmente tomado por você, em sua resposta, em um sentido ligeiramente diferente do que o que está no que eu realmente escrevi.
A propósito da segunda questão (você começou por ela, então também iniciarei por aqui), note que, quando eu escrevi que “(…) o caráter contraditório e os problemas da própria obra de Marx (nos termos expostos e discutidos por você mesmo em várias de suas obras) desempenh[aram], ainda que indiretamente, um papel nos problemas que o marxismo viria a enfrentar, no século XX”, não se deve deixar de lado o fato de que, ao acrescentar “ainda que indiretamente”, eu não estou, por conseguinte, dando a entender que a Revolução Russa teria saído “das páginas de O Capital como Palas Atena da cabeça de Zeus”. Longe de mim sugerir qualquer coisa como uma relação linear no estilo “Marx-bolchevismo-Stalin”. Quanto ao fato de “todos sermos contraditórios”, é claro que eu me referia ao tipo de “tensão essencial” que fez friccionar a herança do “Marx das forças produtivas” com a herança do “Marx das relações sociais de produção”, ou ainda o “Marx libertário” de “A Guerra Civil na França” e o “Marx autoritário” e “centralista” (no sentido tradicionalmente atribuído aos anarquistas a estes termos). Seria razoável sugerir que a veia autoritário-centralista de Marx, entre outros problemas, não alimentou, de modo complexo e seletivo, os usos históricos efetivos que foram feitos e que desembocaram no bolchevismo, finalmente triunfante ao esmagar as oposições e impor as regras do jogo pós-revolucionárias? Não se trata, sem dúvida, de ignorar os fatores que levaram à ascensão do bolchevismo, mas sim de acreditar que, pelo fato de que houve também leituras antiautoritárias de Marx (Pannekoek, Korsch e outros tantos), não é o caso, por isso, de considerar o outro aspecto: a interpretação/apropriação “ortodoxa” e “autoritária” bebeu na mesma fonte.
A respeito da segunda questão, também o que eu realmente escrevi e tentei dizer foi algo distinto do que você deu a entender em sua resposta. O que eu perguntei foi: “(…) não representam eles [certos movimentos contemporâneos], muitas vezes, esforços significativos para, nas condições de hoje, reler e reinterpretar, justamente, o legado das duas supramencionadas correntes?…” Com isso, não estou, salvo engano da minha parte, dando a entender que o movimento dos neozapatistas (e outros tantos movimentos) possa “considerar-se uma corrente do marxismo, como não é uma corrente do anarquismo”, como você diz – e no que eu concordo inteiramente. Veja, inclusive, que eu, logo em seguida, faço referência aos “hibridismos teórico-conceituais e políticos que vêm sendo produzidos em meio ou no contato com esses movimentos”. Não se trata, assim, de imaginar que os neozapatistas poderiam ser redutíveis ao marxismo ou ao anarquismo, e nem mesmo a uma simples “salada” de ambas as correntes, mas de (e aí volto às minhas palavras) “esforços significativos para, nas condições de hoje, reler e reinterpretar” o legado daquelas correntes. Quando observamos tanto a produção textual (declarações, comunicados, textos de análise etc.) quanto as referências e homenagens simbólicas (como, por exemplo, a Flores Magón), percebe-se que elementos do legado marxista (sobretudo no uso de certos conceitos, nas referências e no estilo de certas análises críticas) se fazem presentes, recontextualizados; quanto ao anarquismo, talvez se faça presente, sobretudo, como uma espécie de “sombra”, pelo fato de que vários princípios zapatistas são, efetivamente, libertários em seu ânimo (no entanto, e a despeito de a obra e a vida de Ricardo Flores Magón serem tidas em elevada conta pelos neozapatistas, eu jamais sugeriria algo como uma forte e direta influência do anarquismo). A questão, no entanto, é que, em vários dos movimentos da atualidade ou do passado muito recente (“Autonomen”, “autónomos”, parte dos “piqueteros” argentinos, “Occupy”, neozapatistas…), percebem-se mesclas (aliás, variáveis de acordo com o movimento, o país e o momento) entre elementos teóricos e práticos marxistas e anarquistas (ou libertários, mais amplamente). Poder-se-ia, talvez, considerar que tudo isso é muito pouco promissor ou relevante (eu não penso assim), assim como seria possível acreditar que os “hibridismos” atuais, que tanto exasperam ou, pelo menos, confundem marxistas e anarquistas ortodoxos, são antes parte do problema que da solução (eu tampouco penso assim, mas aqui se fazem necessárias outras considerações, que deixarei de lado). Porém, os “hibridismos” são uma coisa; a ausência de referências e diálogos com as tradições marxista e libertária, outra… Provavelmente estamos caminhando a passos largos, já há décadas, para uma situação em que cada vez menos poderíamos falar de uma presença significativa, nas lutas sociais, do marxismo e do anarquismo históricos enquanto tais. Mas que a presença de elementos de seus respectivos legados – de um modo transformado, recontextualizado, às vezes “descaracterizado” e, não raro, “diluído” – continua a se fazer sentir (e muito provavelmente continuará a se fazer sentir ainda por um bom tempo), isso me parece um fato (e, quanto ao futuro próximo, algo mais que plausível). Contudo, será que estamos, em meio às confusões e armadilhas de hoje, mais próximos de uma sinergia que permita novas sínteses teóricas e expressivas rearticulações práticas das lutas anticapitalistas? Gostaria de acreditar, mas não consigo ser muito otimista.
Professor,
Muito instigante seu texto. Gostaria que comentasse um pouco mais sobre o ‘ponto b: O anarquismo pereceu em virtude de um duplo processo, repetido ao longo do tempo: a dissolução que o atinge quando se confunde com uma liberdade indeterminada ou com um naturismo primitivista e o congelamento que o imobiliza num museu de relíquias veneradas e indiscutidas.’
Confesso que não compreendi a referência a relíquias veneradas e indiscutidas.
Considero esse ponto relevante diante do cenário nacional em que os setores mais combativos e mais afinados com a juventude pobre nas últimas manifestações remetia a anarquistas e ao MPL (movimento com tendências libertárias).
Abraço.
Nordestino,
Antes de mais, note que eu me refiro ao longo deste Manifesto à situação mundial. Escrevi que «exceptuando em alguns — poucos — países da Europa ocidental e da América Latina, esta esquerda», ou seja, «a esquerda exterior às instituições estatais», «tem sido ignorada nas principais lutas sociais dos últimos anos». Entre as excepções, o Brasil é talvez a mais considerável, o que não significa que os anarquismos ortodoxos, do mesmo modo que os marxismos ortodoxos, estejam menos defuntos no Brasil do que nos outros lugares. Os Black Blocs constituem hoje o caso mais flagrante de confusão das teses anarquistas com «uma liberdade indeterminada», enquanto os estudantes que se consideram como anarco-ecologistas se caracterizam na verdade pela defesa do naturismo e do primitivismo tecnológico. Por seu lado, as organizações especificamente anarquistas, que procuram manter claramente definidas as suas fronteiras ideológicas, revelam-se incapazes de considerar o seu passado e as suas figuras de referência como algo que possa ainda ser animado por um novo sopro de vida. Para isso seria necessário analisar esse passado e essas figuras nas suas contradições, porque não existe vida sem contraditoriedade. Congelar um sistema de pensamento, qualquer que ele seja, é o meio mais seguro de transformar um ser vivo numa múmia. São as tais «relíquias». Sem disporem de uma vida própria, estes grupos especificamente anarquistas procuram encostar-se aos movimentos sociais para ver se navegam na crista da onda. Ao entrismo trotskista somou-se o entrismo anarquista. Foi assim que ficaram de boca calada quando mais se acentuou a burocratização do MST ou, pior ainda, vieram a pública declarar que essa burocratização não ocorria — ao mesmo tempo que se queixavam dela em privado. Por vezes caem-me sob os olhos textos destes grupos em que se defende a soberania alimentar e fico sem saber se hei-de rir ou chorar ao ver esta nova modalidade de anarco-nacionalismo. E depois indignam-se quando eu analiso processos comparáveis na génese do fascismo, por exemplo aqui. O caso do Movimento Passe Livre é muito diferente, porque não se trata de um movimento especificamente anarquista, e é só a estes que eu me refiro no § 4.b deste Manifesto. O MPL situa-se no cruzamento de diversas ínfluências e inspirações e, se o anarquismo é uma delas, o marxismo é outra e o multiculturalismo outra ainda, como pode sê-lo também o feminismo. É precisamente por não ser especificamente anarquista que o MPL é geralmente caracterizado como libertário.
Na parte 5, o autor parece seguir a mesma linha de raciocínio apresentada por Mises em “A Mentalidade Anticapitalista”. Neste livro, Mises argumenta que é a impossibilidade de ocupar os altos postos desejados, devido as suas baixas qualificações, que levam muitos a se situarem na esquerda. Eles buscariam, assim, pela luta política os postos que não conseguem com qualificações prévias. Segundo Mises, o ressentimento é um grande motor da esquerda.
Na parte 2, o que seria uma extrema-direita anticapitalista? E quais os temas da extrema direita que passaram a ser veiculados pela esquerda antiestatista?
A extrema-direita anticapitalista formou-se no mundo germânico na transição do século XVIII para o século XIX, no que na história das ideias se chama o romantismo alemão. Eram anti-jacobinos e, portanto, anticapitalistas, mas distinguiam-se dos tradicionalistas e eram ideologicamente inovadores. Contra o pensamento abstracto e o domínio racionalista da natureza defendiam uma noção orgânica da totalidade e uma noção de relação com a natureza que antecipam certas ideias do multiculturalismo e da ecologia. Talvez esta relação fique mais clara na 2ª parte deste Manifesto, que será publicada amanhã, dia 4 de Maio.
Meu caro João, sei que você fica bravo e também muitas pessoas ficam bravas contigo quando aponta nossas falhas de formação, de experiências, tanto teórica quanto prática.
Só queria que você entendesse que a maioria daquilo que é o campo anticapitalista no Brasil é composto por pessoas jovens que, se sabem algo, deve-se a muito esforço pessoal de participação, criação e auto estudo. Nós não tivemos um partido, um movimento ou uma escola que nos ensinasse. Nos jogamos muitos novos, desde os 16 ou 17 anos, em lutas várias e no caminho fomos lendo o que a gente conseguia. Excetuando o Tragtenberg que deixou um eco para fora dos cofres acadêmicos, o resto tivemos que fazer por nós. Talvez você sinta pena de a gente ter que fazer perguntas sobre coisas que supostamente deveríamos saber, mas lembre que o que sabemos nós sabemos por nossa conta e enfrentando dificuldades.
Outra, você pega muito como referência a revolução russa, mas no Brasil toda a esquerda tem como sombra Cuba e experiências na américa latina, a guerrilha e tudo o mais. Juntando com o PT e outros partidos, o peso da esquerda estatista sempre foi muito forte no nosso horizonte. A maioria de nós só descobriu a “Revolução dos Cravos” e a crítica ao stalinismo depois de ter passado pelo Tragtenberg. Por outro lado, o anarquismo que sobrou é demasiado teórico e acadêmico. Ainda, há forte poder da igreja católica e das evangélicas, o que dá algum valor ao debate no campo dos costumes. Saltar tudo isso com força e inovação não é fácil. Mas se existe um MPL hoje é porque muita gente, no passado, começou a desbravar campos desconhecidos. Tenha paciência, amigo. Abraços!
João Bernardo
Partilho em grande medida as ideias contidas no seu texto.
Eu militei no PCP de 1966 a 1991 e estou cansado desta esquerda retórica e inconsequente, incapaz de pensar um futuro.
Estou convencido de que as transformações ocorridas na sociedade por via das tecnologias e pelo deslocamento do trabalho para modalidades “não-repetitivas”, obrigam a revisitar e actualizar a teoria do valor.
Sem isso não é possível lançar uma nova dinâmica revolucionária.
Em 2003 publiquei um livro que aqui deixo em versão PDF ( http://www.dotecome.com/politica/digitalismo/LIVRO-PDF/Do_Capitalismo_para_o_Digitalismo-V-9-18Setembro2003.doc.pdf ) e que também pode ser visto num blog.
Eu não sou um académico, e tenho plena consciência das minhas limitações. No entanto creio termos (eu e a Maria Rosa) avançado com algumas teses interessantes, e originais, que merecem ser lidas.
Gostaria muito que o João Bernardo lesse o meu livro e dissesse o que pensa da minha (e da Maria Rosa) abordagem.
Fernando Penim Redondo,
Você entrou para o Partido no mesmo ano em que eu saí, cruzámo-nos. Muito obrigado pelo link e sem dúvida lerei o livro, até porque o assunto me interessa e também tenho escrito sobre ele. Em troca, deixo-lhe aqui o link para um livro que aborda em parte esse tema e que depois de duas edições em papel eu divulguei pela internet.
Para quem estiver interessado no livro “Do Capitalismo para o Digitalismo”, referido num comentário anterior, sugiro uma visita ao blog http://digital-ismo.blogspot.pt/ pois aí poderá encontrar também alguns textos percursores das suas teses e algumas versões sintéticas.