Sorel e tantos outros promotores do sindicalismo revolucionário, em França como na Itália, foram pioneiros do fascismo. Por João Bernardo
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A conjugação do proletariado com a nação, pensada à direita, não teria conseguido uma realidade prática sem que, à esquerda, se tivesse desenvolvido uma teoria da vanguarda revolucionária enquanto nova elite.
Em 1906, nas Réflexions sur la Violence, Georges Sorel escreveu: «[…] procurámos mostrar que uma nova cultura poderia sair das lutas travadas pelos sindicatos revolucionários contra os patrões e contra o Estado; a nossa maior originalidade consiste em ter defendido que o proletariado se pode emancipar sem lhe ser necessário recorrer aos ensinamentos dos profissionais burgueses da inteligência. E somos assim levados a considerar como essencial nos fenómenos contemporâneos o que outrora era considerado como acessório: aquilo que é verdadeiramente educativo para um proletariado revolucionário que faz a sua aprendizagem na luta» [1]. Encontra-se aqui claramente enunciada a precedência das formas da luta relativamente ao seu conteúdo, ou seja, a primazia do carácter pedagógico da luta relativamente às reivindicações imediatas. E se recordarmos que Sorel escrevia em França sob a Terceira República, essa «république des professeurs» («república dos professores») [2], para usar a fórmula de Albert Thibaudet, crítico literário que se celebrizaria alguns anos depois, maior valor devemos dar à tese de que a superstrutura cultural dos trabalhadores se forma a partir da luta autónoma, e não por herança de um saber legado por mestres. «[…] eu fundo a moral dos produtores não numa educação estética transmitida pela burguesia, mas nos sentimentos desenvolvidos pelas lutas que os trabalhadores travam contra os seus patrões» [3]. Ambos os aspectos, o das formas de luta e o da cultura, encontram-se combinados numa passagem lapidar. A única função dos socialistas, afirmou Sorel, «consiste em ocupar-se do proletariado para lhe explicar a grandeza do papel revolucionário que lhe cumpre desempenhar. É necessário, através de uma crítica incessante, levá-lo a aperfeiçoar as suas organizações. É necessário indicar-lhe a maneira de desenvolver formações embrionárias que aparecem nas suas sociedades de resistência, para que possa finalmente construir instituições que não encontrem qualquer modelo na história da burguesia, para que forme ideias que dependam unicamente da sua situação de produtor da grande indústria e que nada devam ao pensamento burguês, e para que adquira hábitos de liberdade, que a burguesia hoje já esqueceu completamente» [4]. Sorel nem desconhecia a génese («formações embrionárias»), durante a luta («nas […] sociedades de resistência»), de relações sociais de um tipo novo («instituições que não encontr[a]m qualquer modelo na história da burguesia»), nem ignorava que a partir daí se desenvolvem uma nova ideologia e novos comportamentos. «[…] a revolução será absoluta e sem emenda, porque terá como efeito pôr as forças produtivas à disposição de homens livres, quer dizer, de homens que sejam capazes de se comportar na oficina criada pelo capitalismo sem terem necessidade de chefes» [5].
Alguns anos depois estas noções foram retomadas com igual vigor em Les Illusions du Progrès. Avaliando muito acertadamente que a estabilidade da burguesia ficava consolidada graças ao funcionamento dos mecanismos da mobilidade social ascendente, Georges Sorel considerou que estes mecanismos eram facilitados pelo sistema de instrução popular promovido pela classe dominante e concluiu que era funesta para o proletariado a submissão ao sistema educacional burguês [6]. «Não é arriscado afirmar que não poderão ser úteis para o proletariado os tipos de educação destinados a fazer com que o povo participe em formas de raciocínio oriundas da antiga nobreza e adoptadas pela burguesia. [… … …] Todos os nossos esforços devem procurar impedir que as ideias burguesas venham envenenar a classe em ascensão» [7]. E, tal como o havia feito na obra anterior, Sorel apelou para que os trabalhadores desenvolvessem uma pedagogia nova, baseada nas suas instituições próprias. «[…] tanto os meus amigos como eu não nos temos cansado de insistir para que as classes operárias não sigam os caminhos traçados pela ciência e pela filosofia burguesas. O mundo sofrerá uma grande mudança no dia em que o proletariado adquirir, tal como a burguesia adquiriu a seguir à revolução [francesa], a noção de que é capaz de pensar a partir das suas próprias condições de vida. […] Já dissemos inúmeras vezes que o proletariado possui um sistema de instituições que lhe é tão próprio como o regime parlamentar o é para a burguesia. É do movimento sindical que pode provir a emancipação intelectual que há-de desembaraçar as classes operárias de qualquer respeito pelas balelas burguesas» [8].
Na verdade, a noção de que a origem do socialismo reside nas relações sociais desenvolvidas na luta é bastante anterior às Réflexions sur la Violence e a Les Illusions du Progrès, e cumpre lembrar neste contexto Louis-Eugène Varlin. Mas Varlin, as ideias que ele defendeu e a prática que ele representou haviam sido em boa medida sepultados na hecatombe da Comuna derrotada, e mesmo que se veja no Parti Socialiste Ouvrier Révolutionnaire (PSOR, Partido Socialista Operário Revolucionário), sob a direcção de Jean Allemane, um herdeiro daquela estratégia pedagógica dos conflitos sociais [9], a diferença era muito grande entre uma formação apesar de tudo burocrática e parlamentar e o desprezo pelos meios convencionais de acção política que caracterizava Sorel e os seus discípulos. Prosseguir e ampliar, na década inicial do século XX, uma reflexão revolucionária baseada no carácter pedagógico das lutas implicava uma ruptura drástica com a inércia dos sindicatos e dos partidos da Segunda Internacional. Sorel promotor da autonomia da classe trabalhadora e antecipador dos temas difundidos durante a Revolução Cultural chinesa?
Antes de responder a esta questão vejamos o que pensava sobre a autonomia do movimento operário Hubert Lagardelle, director de Le Mouvement Socialiste, a quem Sorel considerava, junto com Berth, «os representantes mais autorizados do sindicalismo revolucionário» [10]. Para Lagardelle a acção dos sindicalistas revolucionários devia converter as lutas numa prática pedagógica. «Os sindicatos por categoria profissional, através das lutas quotidianas contra os patrões, travadas no próprio campo da produção, constituem um poderoso factor educativo, do mesmo modo que as cooperativas na esfera do consumo. A classe operária aumenta por si própria, graças ao seu esforço persistente e à sua vontade pessoal, a sua capacidade técnica. Prepara-se naturalmente para a função que lhe cabe. Não tem qualquer necessidade […] de se instalar no cerne do regime capitalista. Fora deste regime, e em oposição a ele, é plenamente capaz de alcançar o seu completo aperfeiçoamento» [11]. Ora, uma luta que constituía ao mesmo tempo uma pedagogia tinha necessariamente de ser criadora de instituições. «O sindicalismo parte deste postulado: o que diferencia as classes sociais são as suas instituições e as suas concepções jurídicas, políticas e morais. Cada classe cria, em relação com a sua estrutura económica, os seus próprios órgãos de luta, afirmando deste modo a sua noção particular de direito». Por isso o objectivo de cada uma das classes em luta era «impor à sociedade a sua “ideia” própria e as instituições que lhe servem de base» [12]. Tratava-se, para o proletariado, de formas sociais inteiramente novas, em ruptura radical com o capitalismo. «O socialismo é elaborado pouco a pouco pela classe operária, organizada revolucionariamente nas suas instituições económicas. É a luta quotidiana que o proletariado se vê obrigado a sustentar contra todas as hierarquias, todas as autoridades, todas as crenças do mundo burguês, que lhe permite construir ao mesmo tempo que destrói. Não aspira a tomar nada à ordem capitalista, pois o seu papel essencial consiste em produzir criações originais» [13]. Ou, com um fôlego mais sintético: «O que acima de tudo importa é a acção prática, criadora de instituições e de ideias» [14]. Era esta a profunda novidade histórica, prosseguida no quadro do sindicalismo. «O grande facto revolucionário dos tempos modernos não consiste tanto na formação pela grande indústria de um proletariado crescente como na criação por este proletariado de uma série de instituições próprias, opostas às instituições do regime capitalista. No interior dos seus sindicatos e das suas cooperativas, a classe operária exprime as suas maneiras de pensar e elabora novas regras de vida, de moral e de direito» [15]. E Lagardelle repetiu mais tarde, em 1908: «Não se pode destruir uma sociedade servindo-se dos órgãos que têm como missão conservá-la, [porque] qualquer classe, para se emancipar, tem de criar órgãos próprios» [16].
Um pesquisador das origens do fascismo elucidou: «É esta a razão por que o sindicalismo revolucionário se dedicou a desenvolver os “instintos de revolta” dos proletários. […] Toda a originalidade deste sindicalismo residia, para os seus ideólogos, nessa criação de instituições proletárias, geradoras de um mundo novo, de uma nova realidade humana». E acrescentou: «Lagardelle insurge-se contra a escola enquanto meio de ascensão social e de integração intelectual do proletariado, e ridiculariza o “espírito igualitário” da “democracia avançada”, cujo objectivo é transformar em “aliados da classe inimiga” operários educados na escola da burguesia e “atafulhados de ciência indigesta”. Só “separando-se completamente do mundo burguês é que o mundo operário conseguirá descobrir as suas concepções novas da moral e do direito”». O mesmo autor recordou ainda as «inumeráveis advertências proferidas pelo director de Le Mouvement Socialiste, com o objectivo de incitar o proletariado contra qualquer tentativa de mobilização nas disputas em que se enfrentam as várias facções da burguesia» [17].
As mesmas teses foram defendidas por Édouard Berth, outro dos discípulos de Sorel, o mais duradouro e persistente de todos. «A acção directa», escreveu Berth em 1908 em Les Nouveaux Aspects du Socialisme, «é a glorificação da autonomia de todas as forças operárias; o sindicalismo faz apelo à energia, à iniciativa, à audácia de cada trabalhador» [18]. Para ele, «a ideia essencial» do sindicalismo revolucionário era a de que os trabalhadores não podiam usar o Estado em seu benefício; «por conseguinte, o triunfo da classe operária só pode realizar-se através da destruição do Estado, da sua decomposição ou reabsorção no seio dos organismos operários» [19]. Como o Estado é um prolongamento do capitalismo e ele próprio se tornou patrão, «entre a classe capitalista e a classe operária já não existem intermediários: a luta é um corpo a corpo, uma acção directa» [20]. «O sindicalismo é a glorificação da liberdade operária, da autonomia operária», e nisto se resumia, para Berth, a «acção directa» [21]. Ficaríamos deste modo «em presença de uma classe, de uma personalidade complexa, de uma colectividade espiritual, plenamente autónoma, ditando a si própria a sua lei, sem alienar o seu poder nas mãos de nenhum chefe, de nenhum estado-maior, de nenhuma facção, em suma, de nenhum Estado» [22].
Sorel não foi, portanto, um caso isolado. Ter-se-ia ele incluído, com Lagardelle, Berth e os demais sindicalistas revolucionários, entre os defensores da autonomia da classe trabalhadora?
2
Sorel e tantos outros promotores do sindicalismo revolucionário, em França como na Itália, foram pioneiros do fascismo. As palavras valem o que valem e as denominações são convencionais, mas quando os usos se tornam ambíguos e as convenções fluidas, impõem-se alguns esclarecimentos. Ao mencionar os sindicalistas revolucionários não me refiro aqui ao conjunto daquelas correntes, muito difundidas na Confédération Générale du Travail (CGT, Confederação Geral do Trabalho) francesa antes da primeira guerra mundial, que afirmavam a independência dos organismos sindicais perante o Estado burguês e perante os vários partidos socialistas ou, depois da unificação, perante a Section Française de l’Internationale Ouvrière (SFIO, Secção Francesa da Internacional Operária ou seja, na realidade, o Partido Socialista francês). Um autor da época, que sabia do que falava, atribuiu a essas correntes «talvez metade das forças sindicais» [23]. Mas na acepção em que emprego os termos, para designar Sorel e os seus discípulos, os sindicalistas revolucionários constituíram apenas uma das tendências daquele tipo de sindicalismo. Em Setembro de 1908 Georges Sorel suspendeu a colaboração com Le Mouvement Socialiste [24] e em 1909, três anos depois da primeira publicação das Réflexions sur la Violence e passado apenas um ano sobre a primeira edição de Les Illusions du Progrès, ele aderiu à Action Française (Acção Francesa), o partido monárquico que então dominava com a sua influência a extrema-direita radical em França, e começou a tomar posições públicas hostis aos judeus [25]. Ao mesmo tempo, através do grande número de contactos que mantinha do lado de lá dos Alpes [26], Sorel deu uma contribuição de vulto para a convergência entre o sindicalismo revolucionário italiano e o nacionalismo expansionista de Corradini, o que o situa na génese directa do fascismo, tanto mais que ele se apercebera das potencialidades de um Mussolini ainda jovem e socialista.
Num artigo publicado no final de 1940, Pierre Drieu la Rochelle observou que o movimento iniciado por Sorel perecera em França com a primeira guerra mundial e só encontrara continuidade na Itália, graças a Mussolini [27]. «É um italiano do século XV, um condottiero», comentara Sorel a respeito do futuro Duce, acrescentando que era «o único homem capaz de remediar as fraquezas do governo» [28]. E, além de o ter creditado com uma descoberta que pertence de facto a Corradini, escrevendo que «ele inventou algo que não está nos meus livros, a união do nacional e do social», Sorel viu em Lenin a única figura política a quem Mussolini podia ser comparado [29]. O elogio não era de desprezar, porque depois de ter passado da esquerda mais iconoclástica para a direita mais ousada Georges Sorel continuara a reflectir a partir daí as vertentes radicais do movimento operário e em 1917 declarara-se adepto da acção dos bolchevistas na Rússia [30]. Parece que, em privado, ele manifestaria mais tarde reservas quanto à actuação dos Fasci, e morreu antes de ter tido tempo para lhes apreciar a experiência governativa. Mas as ideias, como tantas vezes sucede, subjugaram com o seu peso o próprio criador, e não foi decerto um acaso que nos últimos anos de vida Sorel apoiasse publicamente as ambições do imperialismo italiano no Adriático e nunca tentasse impedir a promoção de que ele mesmo era alvo por parte dos fascistas. A sua crítica ao movimento fascista só seria divulgada numa edição póstuma [31].
Mussolini, aliás, que desde os anos inaugurais do século XX sofrera tão fortemente a influência do sindicalismo revolucionário [32], reconheceu em Georges Sorel um dos seus principais inspiradores [33]. «[…] na grande corrente do fascismo», escreveu ele, «encontrareis os filões que partiram de Sorel, de Péguy, de Lagardelle, de Le Mouvement Socialiste […]» [34]. Por seu lado, Lucien Rebatet evocou igualmente Sorel e Lagardelle, além de Renan e Maurras, entre os formadores de Mussolini [35], e um dos ideólogos de maior projecção do fascismo italiano acentuou a inspiração soreliana do Duce [36]. Com efeito, em 1908 Mussolini publicara, numa revista de que era director, a tradução de um artigo de Sorel [37] e no ano seguinte escreveu uma recensão da tradução italiana das Réflexions sur la Violence, elogiando o mestre porque «graças aos seus livros fomos levados a compreender melhor o marxismo, que nos chegara da Alemanha num estado irreconhecível» [38]. Apesar do papel secundário que os sindicatos ocuparam sempre no fascismo italiano, substituídos em grande medida pelas milícias no que tocava à mobilização e ao enquadramento dos trabalhadores, o sindicalismo revolucionário foi desde o primeiro até ao último momento um dos principais ingredientes do discurso de Mussolini, indispensável a essa encenação de mitos a que se resumiu o fascismo [39]. Num âmbito incomparavelmente mais modesto e de escassas repercussões, alguém que durante breves anos foi o nome destacado do fascismo radical português confessou, muito tempo depois: «Sorel é para mim o grande mestre. Foi ele que fez talvez tudo» [40].
Édouard Berth acompanhou Sorel na evolução do sindicalismo revolucionário para a Action Française, onde sobressaiu numa das experiências que anteciparam o fascismo. Mas em 1920 encontramo-lo filiado no Partido Comunista, e embora nos anos seguintes começasse a fazer-se ouvir na extrema-esquerda o eco dos temas do nacionalismo, que permitiria ao nacional-bolchevismo dar a réplica aos apologistas da nação proletária, tal evolução — paradoxalmente — não seduziu Berth, que em 1923 reeditou uma obra onde fizera críticas veementes não só ao nacionalismo mas ao patriotismo [41]. Em 1925 ele afastou-se dos comunistas e voltou às raízes sorelianas, zelando até ao final da vida por uma memória extinta, que já só vivia incorporada em correntes com outra existência e outras dimensões [42]. Édouard Berth só foi capaz de sair do fascismo para sair da história.
Em contrapartida, Hubert Lagardelle manteve-se até ao fim no âmago dos acontecimentos. Ele iniciara-se bastante cedo na vida política como marxista ortodoxo, militando no partido de Jules Guesde, mas o contacto com Sorel precipitou-o para uma postura mais radical, e no último ano do século XIX Lagardelle fundou Le Mouvement Socialiste, o principal órgão do sindicalismo revolucionário, onde escreveram intelectuais de renome e várias figuras cimeiras da esquerda europeia. Em 1909, quando Sorel e alguns dos seus discípulos começaram a colaborar com o partido de Maurras, a Action Française, não só Lagardelle mas os demais redactores do seu jornal repudiaram esta orientação e no ano seguinte romperam com o mestre. Teríamos encontrado, então, o promotor de uma alternativa coerente, ao mesmo tempo radical e anticapitalista?
Com efeito, era Lagardelle quem, na tribuna dos congressos do Partido Socialista, tomava a palavra para defender com intransigência as posições do sindicalismo revolucionário e as teses do congresso sindical de Amiens. Mas nada é simples na história desta época e nos personagens que lhe deram corpo. Pouco depois de se ter afastado de Sorel, Lagardelle descobriu as virtudes da democracia representativa e juntou-se, com o jornal que dirigia, à ala moderada do socialismo. Durante a Grande Guerra e nos anos seguintes, quando a efervescência social atingiu o auge e explodiu por toda a Europa, Lagardelle manteve-se alheio a estas questões vitais, dedicando-se à política regional numa cidade média de província. Deve ter aproveitado este hiato para reflectir muito, porque em 1926 vemo-lo militar, embora num plano secundário, no Faisceau, um dos primeiros partidos mussolinianos criados fora da Itália, o que não o impediu de frequentar simultaneamente a embaixada soviética e de visitar aí o seu amigo dos velhos tempos do socialismo, o embaixador Khristian Rakovsky, figura de proa da oposição trotskista. Em 1931 Lagardelle começou a aparecer num lugar de destaque na nova extrema-direita radical, promovendo um fascismo modernista e tecnocrático, e em 1933, a convite de Henry de Jouvenel, aceitou o posto de conselheiro para as questões sociais na embaixada francesa em Roma. Não nos pode espantar que, quase septuagenário, em Abril de 1942, Lagardelle tivesse sido nomeado ministro do Trabalho no governo colaboracionista de Vichy. A sua principal função consistiu em fornecer aos ocupantes nazis uma abundante mão-de-obra sujeita ao regime de trabalho forçado, o que mostra que se pode começar defendendo a autonomia e acabar praticando a escravatura. Depois da vitória aliada, Lagardelle foi preso, julgado e condenado a trabalhos forçados perpétuos [43] , um excelente exemplo de justiça retributiva.
Notas
[1] G. Sorel (1936) 51-52.
[2] Com efeito, segundo um estudo de Mattei Dogan referido por T. B. Bottomore (1967) 85, dos cerca de seis mil deputados que ocuparam os lugares do parlamento francês entre 1871 e 1958, nas Terceira e Quarta Repúblicas, mais de metade era composta por intelectuais, ou seja, professores universitários e do ensino elementar, cientistas, engenheiros, advogados, escritores e jornalistas.
[3] G. Sorel (1936) 54.
[4] Id., ibid., 113-114.
[5] Id., ibid., 240.
[6] Id. (1947) 122-123. A primeira edição desta obra data de 1908, mas a segunda edição, que foi objecto de vários acrescentos e modificações e que inclui o Apêndice I, data de 1910; posteriormente o autor acrescentou o Apêndice II, escrito em 1920.
[7] Id., ibid., 60, 285-286.
[8] Id., ibid., 135-136.
[9] D. Ligou (1962) 78-84.
[10] G. Sorel, «El Sindicalismo Revolucionario», em id. et al. (1978) 14.
[11] H. Lagardelle, «Los Caracteres Generales del Sindicalismo», em G. Sorel et al. (1978) 75-76. Esta antologia publica os textos sem data, mas pela referência ao ministério Combes vê-se que o artigo de Lagardelle foi escrito entre 1902 e 1905.
[12] Id., ibid., 53.
[13] Id., ibid., 68-69.
[14] Id., ibid., 61.
[15] Id., ibid., 78. Noutra passagem do mesmo artigo escreveu Lagardelle: «O movimento operário, […] ao organizar os operários no campo ecónomico, […] cria novas formas de vida sobre princípios proletários, que podem ser mais ou menos os de uma sociedade socialista. O triunfo do socialismo está, assim, subordinado ao desenvolvimento do movimento operário […]» — id., ibid., 70.
[16] Citado em Z. Sternhell (1978) 339.
[17] Id., ibid., 339-340.
[18] E. Berth (1923) 67.
[19] Id., ibid., 52.
[20] Id., ibid., 65.
[21] Id., ibid., 56-57.
[22] Id., ibid., 69.
[23] A. Milhaud [s. d.] 150.
[24] Y. Guchet (2001) 98.
[25] Z. Sternhell et al. (1994) 78 e segs., 85-86.
[26] Sorel previa que o sindicalismo revolucionário encontrasse em Itália um campo de desenvolvimento especialmente favorável. Ver G. Sorel et al. (1978) 22. Com efeito, em 1923 Berth pôde escrever «não esqueçamos que Sorel e as ideias sindicalistas são ainda mais populares em Itália» e «a Itália tem o direito de reclamar Sorel tanto quanto, se não mais do que, a França». Ver E. Berth (1923) 27 e 29. Acerca da popularidade de Sorel na Itália ver também J. Rossi (1946) 565.
[27] P. Sérant (1959) 69.
[28] Citado em G. Bortolotto (1938) 18 n. 2. Ver igualmente G. Seldes (1935) 24. Também um inspector-geral da polícia, num relatório secreto dirigido em 1919 ao primeiro-ministro, admitia que Mussolini pudesse tornar-se «um condottiero, um meneur temível». Citado em P. C. Masini (1999) 17. É curioso que Salazar tivesse procedido à mesma comparação, mas em sentido crítico, quando classificou o Duce como um «italiano descendente dos condottieri da Idade Média». Ver A. Ferro (1933) 74. Se soubessem um pouco mais de história, porém, equiparariam Mussolini a um podestà.
[29] Citado em P. Milza (1999) 277.
[30] Z. Sternhell (1978) 347, 372, 391, 414.
[31] Acerca do apoio pelo menos tácito dado por Sorel ao movimento de Mussolini ver E. Santarelli (1981) I 99 e Z. Sternhell et al. (1994) 26.
[32] P. Milza (1999) 67, 83, 105; E. Santarelli (1981) I 49, 52; Z. Sternhell et al. (1994) 33, 196.
[33] D. Guérin (1969) II 162; Z. Sternhell et al. (1994) 199. Numa obra de 1928, Croce mencionou «a teoria da violência de Sorel» entre os elementos formadores da ideologia de Mussolini. Citado em P. C. Masini (1999) 26. E devemos dar algum peso a esta opinião porque, segundo M. Lane (2003) 325, Croce fora amigo de Sorel. Note-se que, embora incluísse (pág. 17) Sorel entre as fontes de inspiração filosófica de Mussolini, G. Lukács (1980) 32 considerou que a sua relação com o fascismo italiano foi «muito mais ténue e formal» do que a relação do irracionalismo filosófico germânico com o nacional-socialismo.
[34] B. Mussolini (1935) 17-18, reproduzido em Ch. F. Delzell (org. 1971) 96-97. Ver também G. S. Spinetti (org. 1938) 240. Note-se ainda, como indicou G. Guy-Grand (1911) 9, que Charles Péguy fora um admirador de Sorel.
[35] L. Rebatet (2007) 66.
[36] G. Gentile (1929) 29, 58.
[37] P. Milza (1999) 112.
[38] B. Mussolini (1951) 167.
[39] E. Santarelli (1981) I 96-97, 564-565.
[40] Rolão Preto em entrevista a J. Medina (1978) 187.
[41] Em 1908, em Les Nouveaux Aspects du Socialisme, Berth atacara com vigor Jules Guesde por ser um patriota à maneira dos jacobinos. Ver E. Berth (1923) 46-49.
[42] Z. Sternhell (1978) 347, 372, 384; id. et al. (1994) 92-93.
[43] P. Broué (1996) 243; P. Novick (1985) 283; P. Ory (1976) 143-144; R. O. Paxton (1973) 260; Z. Sternhell et al. (1994) 88, 94-99.
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O artigo Ainda não sabiam que eram fascistas será publicado em cinco partes:
1) Corradini e os sindicalistas revolucionários
2) Da autonomia dos trabalhadores ao fascismo
3) Do vanguardismo a uma teoria das elites
4) Da apologia da elite a uma teoria dos heróis
5) Mussolini, o mais improvável dos fascistas
Por sinal, sobre o mesmo assunto (Sorel e fascismo), colo abaixo um trecho de um texto recentemente publicado em http://internationalcommunistconspiracy.wordpress.com :
“[…] My intention here is not to blame Sorel for the rise of fascism, which was a complex phenomena that cannot be understood purely in terms of ideas. Fascism ultimately develops because capitalist crisis and class struggle make the democratic form of the state less viable as means to secure the conditions for capital accumulation. Yet fascism is not simply a conspiracy on the part of the bourgeoisie or more specifically finance capital. While fascism certainly survives and finds a material basis to function in support from big business and the petty-bourgeois it ultimately develops through spontaneous mass movements which often strive for autonomy from capital. The masses are not inherently internationalist or class conscious, which is a flawed assumption that many syndicalists and councilists make. By diverting anti-capitalist sentiments into nationalistic channels fascism by default valorizes capital, regardless of its proclaimed intentions for “national socialism” or rantings against the evils of finance. Fascism would exist regardless of Sorel and ultimately he is as much to blame for fascism as Proudhon, Bakunin, Stirner or Nietzsche.
Ultimately Reflections on Violence and those it influenced exposes the poverty of voluntarism and demonstrates how attempts to force consciousness upon the working class ultimately fail and lead to reactionary politics. […] For Sorel the proletarian vanguard would be able to use myth of the general strike to awaken the other workers from their Menshevik-slumber. Rationalism could not be used, for the workers could not be convinced by the bookish doctrines of scientific socialism. Instead the irrational would have to be tapped into, and hence the general strike would carry its own power as an idea.
For foolish militants eager to organize the proles today this idea may sound tempting. But ultimately this strategy cannot work to mobilize workers for communism. Communism is not a myth, it is a material necessity for humanity to continue its development. A Sorelian mass only driven by myth and irrationalism will not create communism but will only be a tool for capitalist reaction to manipulate. Resorting to myth-making or just populist demagoguery to somehow make our ideas more popular ultimately leads to the opportunism and reaction provided by the Parliamentary Socialists that Sorel so deeply despises. As Communists we should take the opposite approach, which is to explain our positions with clarity and engage the class in a principled manner no matter how difficult it is. There are no shortcuts to class consciousness that we can force upon workers. Yet at the same time questions of consciousness cannot be ignored in hope that the eventual crisis will fix everything and put the proles in their place. Sorel bravely attempts to explore the problems of consciousness in Reflections on Violence but turns to irrationalism in order to offer solutions that only lead to opportunism. ”
Trecho do texto “Sorel’s Reflections on Violence and the Poverty of Voluntarism”
( http://internationalcommunistconspiracy.wordpress.com/2014/03/08/sorel-reflections-on-violence/ )
Gostaria de parabenizar o João Bernardo por mais um texto de qualidade.
Levanto uma reflexão a respeito dos atuais movimentos neonazistas que proclamam uma espécie de “autonomia”, porém uma autonomia nacionalista (nacionalismo autônomo). O que antes parecia confundir nesse fascismo de bandeiras pretas agora se esclarece com esse percurso intelectual de Sorel e demais que originaram o fascismo.
http://www.interfacejournal.net/wordpress/wp-content/uploads/2013/11/Interface-5-2-Schlembach.pdf
http://national-revolutionary.blogspot.com.br/2013/06/autonomous-nationalists-an-movement-in.html
http://ironmarch.org/index.php?/topic/986-autonome-nationalisten/
O que assusta é que esse discurso de extrema direita passa desapercebido pelos olhares da esquerda anarquista, e sobretudo, pela esquerda marxista ortodoxa.
Mais uma vez, as formas de organizações e práticas de extrema esquerda são apropriadas por nacionalistas.
Ralf Guth,
Será que esse discurso «passa despercebido» à esquerda? Ou será que ele é hoje reproduzido pela esquerda? Vemos neste artigo que Sorel atribuiu a Mussolini «algo que não está nos meus livros, a união do nacional e do social». Ora, recentemente o Passa Palavra publicou um artigo, «Pregar no deserto: 1) uma certa esquerda convergindo com a extrema-direita» (http://passapalavra.info/2014/03/92349 ), em que vemos algumas figuras portuguesas consideradas de esquerda proclamarem a necessidade de fundir a questão nacional e a questão social. Não se trata só de a direita se apropriar de formas organizativas criadas pela esquerda. Trata-se também de a esquerda — alguma esquerda — gerar uma movimentação que é já de extrema-direita. Em 1914-1915, como procurarei mostrar no último artigo desta série, era improvável a evolução de Mussolini em direcção ao que haveria de se chamar fascismo; pelo menos tão improvável como teria sido a daquelas figuras, e de outras, há pouco tempo atrás. Mas com uma diferença importante. Há um século o fascismo e os seus meandros eram realidades ainda ignoradas, enquanto hoje tudo isto é conhecido por quem quiser conhecer. Um dos fascistas mais lúcidos do pós-guerra, Maurice Bardèche, observou que «desde que a palavra fascismo não seja pronunciada, não faltam os candidatos ao fascismo» (Qu’Est-ce que le Fascisme?, Paris: Les Sept Couleurs, 1961, pág. 160). Temos aqui o segredo de tantos esquecimentos e distracções de alguma esquerda. É que para eles serem fascistas precisam que «a palavra fascismo não seja pronunciada».
SEGREDO DE POLICHINELO
Um dos autonomistas mais lúcidos observa que “um dos fascistas mais lúcidos” – cujo nome, além de ser dito com frequência, é elogiado neste sítio – teria observado que o fascismo é algo cujo nome não pode ser dito…
CORAÇÃO DE ESTUDANTE & POTLATCH DE JB
Uma querida amiga disse-me, em tempos idos: “És um coração de estudante!”.
Maiakovskianamente grato, acuso o recebimento de Labirintos do Fascismo (nova versão) em pdf, via e-mail, enviado por João Bernardo. No ensejo, divido com ele (a amiga concordaria…) a declaração de afeto.
Recentemente fiz a leitura de Reflexões Sobre a Violência de Sorel, um livro antigo e tão atual para se entender certas esquerdas, ou certos vicios de uma extrema esquerda que se diz revolucionária. A doutrina de Sorel é uma junção de concepções socialistas e conservadoras, ele vai de Marx ao catolicismo, amarrando elementos antagonicos e que se excluem criando-se uma sintese exótica. Uma crítica moralistas, afiada e muito bem fundamentada ao papel de conciliação de classes ao qual os chefes socialistas e os sindicalistas de resultado daquela época, ou de hoje, porque não, conduziam a classe operária, desmobilizando e tornando fraca o seu ideal de revolucão. A democracia em todos os tempos era o terreno aonde se moviam esse homens corruptos, dos demagogos gregos aos filantropos da paz social da 3° República francesa – A corrupção e a harmonia social fazem parte da essencia da democracia. Se valendo dessas conclusões para ele a democracia só teria a prejudicar os operários, na quantidade os elementos mais fracos, que para ele seriam a maioria, roubaria a energia dos elementos mais fortes e decididos, sendo assim, caberia ao sindicalismo revolucionário reunir os melhores, os mais fortes, qualificando sobre uma rigorosa seleção os homens de ação, cabendo as greves gerais proletária e não políticas essa tarefa de seleção. Agora veja, ele é um grande crítico dos utopistas que projetavam a sociedade do futuro, os falastérios, até ai tudo bem, mas é notavel que em Sorel desaparece a ideia de uma sociedade socialista, seus objetivos se restringe a ideia do mito da greve geral e sua ideia de autonomia não necessariamente tem a ver com a autonomia proletária, em muitas passagens ele fala dos produtores e é a esses que ele atribui a necessidade de autonomia, desaparece os operários, os tecnicos e os industriais e Sorel acaba fazendo o mesmo o que acusava os seus desafetos políticos na campo socialista, a harmonia aparece no ambiente de trabalho. Não existe autonomia operária em Sorel, a autonomia que Sorel defende é a autonomia dos produtores frente ao Estado e a bolsa de valores. Ao mesmo tempo que ele denuncia a harmonia social, conciliação de classes, pelos socialistas via parlamento, ele acentua o objetivo de criar uma harmonia de classes para o amanhã entre os produtores nos ambientes de produção ”reconsolidando a divisão em classes e devolver a burguesia alguma coisa da sua energia”. Tudo isso em um cenário apocaliptico de uma decadência econômica catastrófica. O ideal de autonomia dos produtores em Sorel é a desautonomização dos trabalhadores em seus ambientes de trabalho e a conciliação entre patrão, operário e os gestores.