Após 20 dias cobrando o ex-chefe de sua companheira, que ameaçava “mandá-la de volta para o Brasil”, o imigrante ameaçou quebrar-lhe as duas pernas dele e o restaurante inteiro. Ele pagou. Passa Palavra

17 COMENTÁRIOS

  1. REFORMISMO ARMADO
    as brigate rosse começaram assim
    e acabaram do jeito que se sabe…

  2. Ulisses, de um jeito ou de outro o patrão tem que pagar. Aqui na França histórias como essa se repetem todos os dias. No Brasil acho que é pior ainda. Não é sempre que se pode contar com o Estado Democrático de Direito, e isto em vários cantos. Bem ao certo a gente não sabe aonde isso vai dar. Convém nos lembrarmos do que tu escreveu, sim. O que não convém é ficar ainda mais no prejuízo. Não basta a exploração, ter que aguentar o roubo completo é demais, não? Às vezes a dignidade tem que vencer a humilhação.

  3. não se trata desse ou daquele patrão, ‘pagando’ ou não
    nem desse ou daquele proletário vingando-se dum patrão
    trata-se, isto sim, de uma implacável guerra de classes
    e da auto-emancipação insurrecional planetária dos escravos
    assalariados do capital

  4. Pergunto-me se Ulisses já trabalhou e, se trabalhou, se já foi roubado pelo patrão. Digo roubado, porque explorado todos somos ao trabalhar. Trabalhar, não receber e ser ameaçado por um patrão xenofóbico é outra coisa, e Fernando Paz sabe bem o que é isso. No mundo abstrato de Ulisses, um trabalhador que é roubado e ameaçado dessa forma precisa esperar a revolução mundial acontecer, pois, se partir para a ação direta para garantir o pagamento do seu aluguel e o sustento do seu filho, é um fascista em potencial. O trabalhador real deve dizer ao senhorio, “calma, vosso pagamento e a vossa vez irão chegar!”. Vingança, Ulisses, é outra coisa. Se o patrão pagou e ainda está andando, não houve vingança.

  5. Ulisses, quando a gente para para olhar o depois de amanhã, você tem razão. O problema é que amanhã vence o aluguel, o gajo já trabalhou o mês anterior, este mês já está acabando, e o pagamento ainda não veio. A maior parte da turma é sem papel nessas bandas de cá, o contrato de aluguel é na palavra, e o dono do barraco vai na porta todo dia atrás do dinheiro, às vezes acompanhado dos seus capangas. O beco sem saída é mais ou menos esse. Eu não tenho dúvidas que você sabe muito bem disso. A gente não pede para entrar, a gente é empurrada para esse beco, e sendo um beco, você tem que sair pela mesma passagem pela qual entrou, você tem que ir lá e conseguir o dinheiro, nem que pelo caminho tenha que deixar 50 euros na mão de cada homem que teve a coragem de ir contigo e resolver o problema; às vezes a coisa é resolvida assim. Até amanhã não vai dar para construir tudo isso aí que você lembrou e com o qual a maioria aqui concorda plenamente. Você pode dizer que é uma merda atrás da outra, ou que é uma merda maior que a outra, sim, é verdade, mas é a realidade na qual está metida boa parte da classe. Eu, sinceramente, em mais de dois anos aqui na França, conhecendo várias histórias dessas (aqui direto tem denúncias nas redes sociais, com fotos da cara deles e informações desses roubos feitos pelos patrões), eu mesmo já tendo passado por uma situação que só consegui resolver graças à coragem de mais dois amigos (amigos mesmo, não me cobraram nada e também se arriscaram), e isto depois de eu ter trabalhado por cinco euros a hora, não tenho visto nada ser criado que não seja esse tipo de ação que garante o pagamento ou essas denúncias que mencionei acima. Infelizmente o mundão está assim. É praticamente cada um por si e quem pode mais chora menos. Ainda bem que essa ainda não é a regra por todos os lados. Acontece vários casos porque é muita gente sem papel e isso dificulta bastante as coisas para o trabalhador, bem como torna mais fácil as tentativas de roubo feitas por patrões.

  6. Uma vez mais, recordamos que o Passa Palavra não publica comentários que contenham ofensas pessoais.

  7. Não se trata de “esperar a revolução mundial acontecer”, mas de fazer acontecer a INSURREIÇÃO -processo molecular e maquínico-desejante de satisfação hic et nunc das necessidades humanas- num cotidiano de resistências (nada heroicas, porém efetivas) como a paciente e não menos enérgica sabotagem dos mecanismos de extração do mais-valor (relativo ou absoluto) no âmbito do trabalho entendido como reprodução de uma sobrevivência penitenciária.
    Enfim, ação direta não é um dispositivo de ajuste de contas pessoal entre o trabalhador e o capataz ou patrão, indo das ameaças às vias de fato. Aliás, não chamei ninguém de fascista, posto que não tenho o hábito populista de jogar com as palavras, por ‘impressionantes’ que soem.
    Vingança, sim e por que não? Desde que coletiva e exercida num terreno classista (revolucionário-proletário) fundamentando em princípios uma justa relação de meios e fins, com vistas à auto-emancipação na luta final dos condenados da terra.

  8. A atual situação nos permite questionar, o que é Ulisses?
    Pois dos muitos anos que acompanho o site, para com o qual tenho um enorme respeito e carinho, são raríssimos os textos (de todos os tamanhos e estilos) que não tenha uma pitada ulissiana.
    Seria Ulisses uma inteligência artificial gerando versos por aqui? Ou um auto encarnado trovador passapalavriano? Ou um bobo da corte da luta de classes, que em sua ânsia de voltar a Ítaca, caiu na terra do lirismo meia bomba?
    Já ri, refleti, aprendi e me irritei com ele, mas sempre me perguntei, o que é Ulisses?
    Abraços, camarada.

  9. Por que se irritar com Ulisses se Ulisses é Ninguém?

    [Souvarine? Não sei se Ulisses é tão incendiário assim. Na verdade nem sei mais o que é ser incendiário.]

  10. Nuvem,

    Ulisses é Alguém, com A maiúsculo. E o Souvarine, do Germinal, não é Ulisses, mas o personagem deste Flagrante Delito que Ulisses tão bem analisou criticamente.

  11. Caro João Bernardo
    Tranquilizou-me saber que Souvarine não é ulisses, embora já soubesse que ulisses não é Souvarine – nenhum deles…
    Saúde & Alegria

  12. Ah, sinto muito então por este outro ulisses.  Antes ulisses fosse Ulisses. Antes Ulisses fosse Ninguém: Polifemo, quem te cegou? Ninguém. Voraz, quem te incendiou? Ninguém. Patrão, quem te quebrou? Ninguém. Polifemo acabou cego. Voraz acabou em chamas. Patrão acabou pagando.

  13. Aguardamos a profecia. Este flagrante delito denuncia os delitos! flagrados! de patrões contra os trabalhadores pulverizados geograficamente. Denuncia o desamparo do trabalhador precarizado que não encontra outra alternativa que a violência para evitar ser roubado pelo patrão no novo país. Denuncia também o individualismo da classe proletária que não acolhe o trabalhador que chega em seu país. Mas aqui analisamos o trabalhador que reage.

    Sorte a nossa que ainda não é possível (ou pelo menos ainda é considerado antiético) fragmentar o indivíduo e este continuar a produzir valor, senão a fragmentação continuaria. Vinde a nós INSURREIÇÃO!

  14. Após a leitura deste Flagrante Delito, observei repentinamente que se tratava de uma extensão do debate ocorrido após a publicação do artigo sobre o 25 de abril (https://passapalavra.info/2024/04/152647/). Artigo esse que, aliás, julguei bastante preciso – embora tenha desagradado aos espíritos mais nacionalistas portugueses e àqueles que acreditam numa espécie de “longa duração” dessa revolução, a qual, como observei em um comentário, é considerada por alguns extinta ainda em 1975.

    Deixando de lado as observações de Ulisses, que muitas vezes culminam em delírio (e que, nos últimos tempos, mais atrapalham do que contribuem para a resolução de questões teóricas e práticas), interpretei essas palavras do Flagrante de outra forma.
    Aliás, a fala deste último sobre a “auto-emancipação insurrecional planetária dos escravos assalariados do capital” é mais uma de suas frases que são reformulações, ou melhor dizendo, uma maneira de piorar a mensagem de frases há muito conhecidas, mas das quais ele quase nunca faz referência. Diferentemente, cito aqui um trecho do livro de Lungarzo sobre Cesare Battisti (aliás, alguém ainda lembra de prestar solidariedade a Battisti?), no qual ele fala da diferença entre as Brigadas Vermelhas e os PAC (até o início de 1978): “Sua prática se concentrava em ações cotidianas: operações rápidas e pequenas […], advertências aos empresários e colaboração com as greves” (Lungarzo, Carlos A. Os cenários ocultos do caso Battisti. São Paulo: Geração Editorial, 2012, p.120). Mais adiante, ele também menciona que eles “usaram ameaças ou ataques não letais” contra policiais, torturadores, etc. Veja a diferença entre “advertência”, “ameaça” e ataques reais não letais. Sabe-se que os PAC (até o início de 1978, é sempre importante salientar) restringiam o uso de armas como método de autodefesa, limitando o uso da violência. Battisti falou claramente sobre isso ao dizer: “Essas foram as razões primárias da minha afiliação aos PAC, já que o próprio documento de fundação diferenciava esse grupo dos outros por tomar posições claras ao limitar o uso das armas exclusivamente a casos extremos de legítima defesa” (ibid., p.358). Isso é muito diferente dos princípios das Brigadas Vermelhas, do MIR, do Sendero Luminoso, dos Montoneros etc. Por que a “sabedoria” de Ulisses não conseguiu distinguir isso?

    Sinceramente, desde que acompanho este site, nunca vi um artigo publicado por Ulisses, fora os seus comentários repletos de papagaiada pós-moderna. Se, nos últimos tempos, em nada contribuiu teoricamente neste site, fico imaginando suas contribuições práticas… Mas isso pouco importa. Ele parece ter sido bastante legitimado pelo artigo de Filoctetes que afirma que ele “ocupa-se apenas de textos curtos, os Flagrantes Delitos, que elucida com comentários mais curtos ainda”. Elucida? E Filoctetes achou bonito quando disse ele: “faço humor, não faço greve”. O elogio de Douglas Rodrigues Barros a este artigo devia ter servido de aviso para perceber em que se transformam os “ulissianos”. Observem os atuais artigos de Barros no site da Boitempo e se deparam com um identitarista que nega ser identitário. É interessante e oportuno brincar com as palavras, não é verdade?

    Ora, talvez haja ainda uma confusão. Talvez alguns vejam as irrupções de Ulisses como manifestações de teor dadaísta, ou de inspiração joyceana ou ainda imaginista ou vorticista. Para quem realmente lê os autores desses movimentos, sabe que Ulisses se inspira muitíssimo mal neles. Mas voltemos ao assunto, pois os comentários de Fernando Paz e de Irado também já deram resposta a essas questões.

    Dou ênfase ao último comentário de Paz, como lúcida contribuição para entender quem já viveu na pele este tipo de coisa. Normalmente, o problema do “acerto de contas” é enfrentado junto com a solidariedade de colegas de trabalho ou de amigos etc. Eu também já passei por isso. E tive sorte de ter colegas que enfrentaram o patrão junto comigo num momento desses. Agora fico pensando o quão difícil deve ter sido lidar com isso sozinho, como parece o caso de quem viveu este Flagrante. Como proceder sem ameaças, sem estratégias que chegam a esse ponto para não ser, além de explorado, roubado de forma insultuosa?

    Como já foi dito aqui neste site, os artistas são ótimos em analisar as questões sociais. Tal Flagrante fez-me lembrar de um filme recém-lançado do diretor Ken Loach, chamado The Old Oak.

    Vi, também, que uma professora de Lisboa fez oportunas considerações sobre esse filme, que se pode encontrar na íntegra aqui: https://aterraeredonda.com.br/the-old-oak/.

    Destaco apenas dois de seus trechos:

    “Ken Loach, aos 87 anos, derruba a xenofobia, as guerras, a desesperança e também, magistralmente, o identitarismo pilotado pelo Partido Democrata norte-americano e espalhado com ‘boas intenções’ pela ONU, as agências de igualdade, o combate ‘ao discurso de ódio’. Aqui toda a narrativa é universalista contra o multiculturalismo, de classe contra o identitarismo, de auto-organização contra o Estado, de organização política e sindical contra a solidão, recheada de confronto de classes.

    Aqui o caminho é estratégico, Ken Loach diz que é imprescindível a superação contra a fragmentação desta classe, que, sem consciência (sem conhecer o seu passado), se deixa enganar e dividir: o encontro belo, afetuoso, entre iguais, entre uma jovem mulher síria, e um homem, mais velho, filho de mineiros ingleses: quando o mundo de uma esquerda sem memória clama por chavões de ‘sul global’, ‘sindicalista machista branco’, ‘tolerância’, ‘caridade’, Ken Loach faz um filme sobre o imperialismo, a unidade da classe trabalhadora no coração do capitalismo, a Inglaterra, e toma partido contra os consensos, pela solidariedade de classe – contra as ideias de esquerda identitárias.”

    Sem tocar nos pontos ortodoxos defendidos tanto por Loach como por Raquel Varela, encerro dizendo que o fenômeno da xenofobia e do racismo nos locais de trabalho (incluindo pubs), principalmente no centro e no sul da Europa, e seu uso para a fragmentação de classe, ainda podem ser melhor explorados neste site. Mas encerro por aqui.

  15. Uliçes é um jênio da literatortura! Acaba de inventar um novo jênero literário, o Discurso de Miss Autonomista! Trocou a “paz mundial” pela “auto-emancipação insurrecional planetária dos escravos assalariados do capital”. Paumas para uliçes!

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