Por Passa Palavra

Um pouco do contexto

Em 15 dias, durante uma jornada de luta do Movimento Passe Livre de São Paulo (MPL-SP), os protestos contra o aumento das passagens na cidade passaram rapidamente por três importantes momentos: 1. criminalização; 2. massificação, apoio popular e vitória; 3. polarização política da sociedade.

No primeiro momento, o MPL-SP, ao tomar como tática as ações de rua e a luta de enfrentamento (em detrimento da via pacificadora da negociação sem luta), conseguiu realizar um feito histórico: pôs em xeque, à extrema-esquerda do espectro político, a engenharia conciliatória solidamente construída por todos estes anos de hegemonia petista no Brasil. Vale lembrar que, dias antes, mobilizações parecidas já haviam acontecido em algumas capitais brasileiras e obtido com isso significativos triunfos, como o caso dos jovens de Porto Alegre e Goiânia, que conseguiram revogar os aumentos de tarifa. Fora preciso que um jovem movimento social, livre dos vícios e do pragmatismo que congelou as organizações de luta da classe trabalhadora erguidas em outro ciclo histórico, desse um salto para fora do que convencionamos, nos últimos anos, ser uma metodologia consequente de ação política (em nome de supostos resultados), para que a estabilidade petista não se apresentasse tão estável assim. O MPL-SP demonstrou, inclusive para muitos profissionais da militância sindical, social e estudantil, que há alternativas, sim, à ação política hoje travada somente em conselhos, fóruns, audiências públicas, redes sociais e outras instâncias de produção de consenso ou de diluição de propostas.

Alinhados e atentos, a imprensa e os governo estadual (PSDB) e municipal (PT) atacaram e tentaram por vários meios deslegitimar as manifestações que ameaçavam e deixavam sem reação os mantenedores da ordem. “Vândalos”, “baderneiros” foram alguns dos adjetivos aplicados. O prefeito Haddad (PT), num erro histórico de cálculo político, procurou minimizar os acontecimentos mas não deixou de cobrar dos manifestantes um certo “protocolo de civilidade”. Com isso, o jovem administrador municipal não só procurava esconder a barbárie que caracteriza o cotidiano de quem depende dos transportes públicos da cidade, mas também condenar qualquer forma de pressão política que ousasse extravasar a armação institucional conciliatória. Os protestos ainda assim continuaram na mesma intensidade e radicalidade, o que, para a surpresa de muitos, atraiu e agregou mais manifestantes, cheios de justas indignações generalizadas e ávidos por processos de luta combativos, há muito varridos pela própria esquerda do cenário nacional. A luta e a resistência contra o aumento estavam instauradas. A cidade se polarizou. O assunto teve uma audiência total e não se discutia outra coisa senão os protestos e o aumento dos transportes. A repressão continuou e os manifestantes detidos (aleatoriamente) eram acusados de formação de quadrilha, alguns sendo transferidos para cadeias de segurança máxima.

O governo federal, através do Ministro da Justiça José Eduardo Cardozo, condenou a “violência” dos manifestantes e disse ter acionado a ABIN (Agência Brasileira de Inteligência Nacional) e empenhado a Polícia Federal para investigar os líderes do movimento. Desta forma, até à manhã da quinta-feira, 13 de junho, os meios de comunicação de massa, em especial a Folha de S. Paulo em seu editorial “Retomar a Paulista”, apoiavam forças enérgicas para conter a manifestação contra o aumento. Neste dia aconteceu uma grande operação militar que utilizou um diverso efetivo policial para não permitir a chegada dos manifestantes à av. Paulista. O resto nós sabemos: a tal “revolta do vinagre”, as detenções em massa, agressões sérias a jornalistas da grande imprensa etc.

Nesse momento a polarização da opinião pública é revertida, com ajuda do enorme trabalho de contra-informação feito pelos manifestantes que haviam participado daquele desfile militar, e a revogação do aumento passa a ser amplamente apoiada pela população. Ocorre que, assistindo à quebra do equilíbrio de forças operado à esquerda pelas mobilizações em torno da tarifa, setores organizados da direita e da extrema-direita — do espectro político partidário, mas não só — enxergaram aí a possibilidade de instaurar uma crise de governabilidade em âmbito federal e catalisar o processo em favor de si; e aqui demarca-se uma virada substancial na conjuntura. A estratégia da elite conservadora passa então a ser outra. Revistas semanais como Veja e Época fazem capas e matérias “diferenciadas” com uma visão positiva dos manifestantes. Do dia para a noite, tornávamo-nos heróis nacionais, segundo a grande mídia, que passou a estimular os “cidadãos de bem” a tomarem parte nos protestos.

Na verdade, esse movimento de inversão dos sentidos das manifestações era algo bastante latente, tanto pela própria composição social heterogênea que as caracterizava desde o início quanto pelo sentimento generalizado e indefinido de indignação difundida em todas as camadas sociais. Isso já era perceptível nos comentários aos chamados publicados pelo MPL-SP desde o primeiro momento, mas tomou traços mais visíveis a partir do dia 13 de junho, no 4º Grande Ato. Notável é que nessa noite, enquanto milhares de pessoas ainda tomavam as bombas saideiras da Polícia Militar (PM) pelas ruas, um novo ato era convocado pelo facebook com um número de adesão espantoso: a quantidade de likes da página do MPL-SP, que vinha crescendo bastante mas com alguma regularidade, simplesmente duplica, triplica em pouquíssimas horas e, nos espaços de comentário, era dominada por discussões de conteúdo direitista ou por bases de apoio petista que procuraram também diluir a reivindicação em palavras-de-ordem abstratas.

Neste ínterim, o prefeito Haddad tenta pôr em prática outra estratégia de contenção do movimento: distancia-se da imagem de Alckmin e condena os exageros da última ação policial, procurando restaurar o seu perfil de homem público dialogador e democrático, e chega a arriscar uma nova forma de comunicação para convencer a população da justeza do aumento. Parte da militância petista ou simpatizante também põe em prática a tentativa de esquivar-se das pressões canalizando-as para uma luta contra a polícia truculenta de Geraldo Alckmin. Em vão. Alckmin, atento ao que se passava, recua a polícia e com a ajuda da grande imprensa libera a cidade para um outro desfile.

Foi no dia da realização do 5º Grande Ato, quando as mobilizações passavam a se alastrar por todo o país, que o problema se materializou por inteiro para a militância anticapitalista. Apesar de ser bastante comemorada pela sua enorme quantidade de participantes (mais de 100 mil), e mesmo decisiva para a conquista da pauta, a manifestação já apresentava de forma bastante tensa a presença de elementos inconciliáveis, o que gerou algumas pequenas brigas internas.

Curioso é que essa tensão interna, ou mesmo presença de elementos e pautas ambíguas, fez as manifestações incharem, pressionando em favor da reivindicação original colocada pelo MPL. A situação política tornou-se incontornável e Haddad foi unanimemente pressionado pelo Conselho das Cidades (fórum que reúne inclusive o empresariado da cidade) a revogar o aumento. A vitória estava próxima, era questão de mais algumas horas. O 6º Ato já acontece neste clima, o que dá vazão para que anseios moralizantes da dita classe média tomem, dominem e deem a tônica da manifestação. Aqui, a virada da direita já estava consolidada, éramos nós a fazer volume para um desfile que era seu.

Às ruas, claro! Mas quais, como?

Hoje, como já está devidamente divulgado pela imprensa de esquerda e as mídias sociais, está em curso um conjunto de protestos pelo Brasil afora, cada qual assumindo facetas e características bastante diferentes, mas que tendem para um processo de conservadorização bastante perigoso se não forem disputados. E agora, como reagir? Entre os meios da esquerda, um pouco tardiamente, mas enfim, instalou-se o dilema: saímos das ruas ou tomamos as ruas?

Entre os anticapitalistas convém levar em conta uma dupla movimentação que acontece neste momento. Parte da esquerda acredita estarmos na iminência de um golpe de Estado fascista ou coisa do tipo. Nós não iríamos tão longe. Não porque nossas elites mais retrógadas guardem preceitos democráticos ou humanistas, mas porque isso não seria feito sem muito derramamento de sangue, o que afastaria destas terras a estabilidade necessária para os negócios. Além do mais, o fascismo não necessariamente precisa consolidar-se como regime político quando ele está suficientemente distribuído na sociedade e nas ruas.

Por sua vez, a esquerda institucional que orbita em torno do PT, apesar de estar um tanto acuada neste exato momento, constitui um campo que deve sair desgastado eleitoralmente mas, por este mesmo motivo, prolonga a ilusão em torno de seu papel no seio da esquerda em geral. É que a histeria “estamos na iminência de um golpe” deverá produzir um discurso do tipo: “não ataquemos esse governo democrático-popular, é hora de TODA esquerda — sem distinções — se unir, não devemos fazer agitações políticas que aticem a sanha da direita raivosa”, como se pode ver aqui. Devemos sair às ruas com unidade para se defender do avanço direitista, o que é muito diferente de defender o governo de Dilma. Caso contrário, voltaremos à estaca zero, ao congelamento das nossas ações.

A rua, pois, é o lugar onde devemos estar, mas é o lugar de onde nunca deveríamos ter saído. Há anos que nossas siglas às vezes contêm mais letras do que militantes ou base social. Assim, a pura e simples manutenção das manifestações, se feita de forma irrefletida, pode representar inclusive um risco para a integridade física da parca militância de esquerda. Não temos condições de fazer frente, no corpo a corpo, às marchas ufanistas que deverão seguir pelas regiões centrais e mais higienizadas das cidades. Também seria um erro convocarmos atos em que defendêssemos o abstrato direito de estarmos nas ruas por sermos de partidos e organizações de esquerda. Procederíamos ao mesmo equívoco que criticamos nas manifestações teleguiadas pela mídia.

É preciso considerar o seguinte. Resultantes de uma tática de agitação pensada pelo MPL-SP, os últimos acontecimentos tiveram por efeito quebrar uma certa antipatia irrefletida que as pessoas tinham por qualquer forma de manifestação e resistência ativa. Essa tensão superficial foi rompida, de modo que por todo e qualquer canto pululam manifestações, marchas de ruas e até saques. Estas modalidades de protesto variam em tamanho e caráter e podem ser espontâneos, semiorganizados ou mesmo dirigidos por movimentos sociais. No caso de São Paulo, temos nos ocupado muito com o que acontece nas regiões centrais e pouca atenção tem sido dada às movimentações que acontecem nas periferias. Podemos estar desprezando o fato de pequenas organizações, movimentos e coletivos terem adquirido capacidade — que não deve demorar muito tempo — de agregar e mobilizar centenas ou milhares de pessoas. Bandeiras e camisetas da seleção brasileira deverão aparecer naturalmente, mas contando-se com o apoio de entidades locais, com algum trabalho de base prévio, seria possível elaborar palavras de ordem e pautas concretas mais próximas ou favoráveis ao nosso projeto — dirijam-se elas a qual governo for — e arrancar algumas pequenas vitórias. E é o que temos para hoje.

Cremos que o momento agora é de concentrar nossos esforços aí, onde os “coxinhas” não estão, onde as pautas populares encontram sua base real (e que por isso está sendo sistematicamente minimizado nos grandes meios de comunicação ou apresentado apenas como distúrbio social violento). Mas é claro que essa responsabilidade já não cabe exclusivamente ao MPL, e sim a um conjunto de forças da esquerda; sem desprezar, é claro, os muitos obstáculos e conservadorismo que decorrem dessa posição.

Como a nossa clivagem não é política, no seu sentido partidário, mas é de classe, saiamos às ruas, mas pelas bordas.

Novamente, recuperação das lutas sociais

O relato da manifestação de São Paulo ocorrida na Av. Paulista nesta quinta-feira, 20 de junho, não pode ser outro senão a operação de empresários e a extrema-direita para desestabilizar o país inspirando-se nos lockout que ocorrem na Venezuela. Não se trata de luta, mas apenas da renovação das elites do poder e demonstração do poder das elites. Aqueles que acompanharam e participaram dos grandes atos contra o aumento da tarifa organizados pelo MPL sabem bem que essas ruas já não nos pertencem mais, como antes dos protestos não nos pertenciam. Há agora um duplo desafio e um novo campo de batalha a ser travado: localmente, regressar ao trabalho de base e intensificá-lo; e, nacionalmente, construir uma plataforma de luta prática, não ideológica.

Porém, neste momento já está sendo levada a cabo uma operação de deslegitimação do MPL. “Não foi só por 0,20 que saimos às ruas!”, exclama alguém no facebook na página do Movimento. Em outro lugar o chamavam de “vendido”. Ora, o objetivo dos atos era, sim, barrar o aumento e essa era a pauta única de reivindicação. O MPL não é nem se coloca como vanguarda das mudanças sociais. Uma campanha maior pela tarifa zero começa agora. E atos com uma massa amorfa em cólera não serão um bom espaço para reivindicar que o transporte seja de fato público.

A maioria dos críticos mais à esquerda também ignora as potencialidades das pautas do MPL. Se, por um lado, a luta para barrar o aumento da tarifa de transporte é parte de um momento mais amplo de acúmulo de força e discussão, por outro, a questão do transporte se relaciona ao acesso à cidade em sua integralidade, à ruptura das barreiras sociais impostas pela segregação geográfica que o sistema de transporte excludente ajuda a fortalecer. Cabe lembrar o papel central da mobilidade urbana assumido nas lutas sobre o transporte, cujo protagonismo cabe a um trabalho de quase 10 anos de organização, estudo e militância. Desta maneira, a bandeira levantada pelo MPL incide sobre o como se pensar a estruturação da cidade em moldes mais democráticos, questionando a própria estrutura de classe subjacente a este aspecto. Mas as coisas não param por aí: ao propor a tarifa zero como horizonte de luta, o MPL ao mesmo tempo também questiona implicitamente a própria existência de espaços e acessos privatizados, incidindo na discussão sobre os modelos de estruturação da sociedade como um todo.

Assim, posições que buscam associar o próprio MPL-SP a posições de direita, por supostamente já ser “semicoxinha” em sua base social, são uma tentativa caluniosa de esconder o fato óbvio de as pautas e demandas do MPL incidirem mais diretamente sobre a população mais precarizada e marginalizada, sem contudo, se restringirem a ela. Se isto não bastasse, tais insinuações não mencionam o fato de o movimento ter antigo e prolongado trabalho de base nas mais variadas escolas e bairros de São Paulo, sendo, portanto, a preocupação com os trabalhadores mais pobres um de seus temas mais relevantes.

Outra crítica digna de nota foram as tentativas de certa esquerda, tanto partidária como independente, que durante o crescimento da luta se esforçou por sequestrar o movimento para suas respectivas bandeiras partidárias, como as PECs, as reformas políticas, a não privatização, etc., bem como as vãs tentativa de minar a credibilidade do MPL-SP com alusões descabidas a um suposto abandono da luta diante de um suposto golpe militar em curso, imaturidade e irresponsabilidade políticas.

As correntes que assumem tais críticas revelam, contudo, um ressentimento guardado por não terem sido elas a conseguir esta vitória, que em seu aspecto mais relevante diz respeito às formas e métodos de organização da luta, pautado em princípios não autoritários, horizontais, apartidários e independentes.

Assim, é importante destacar a legitimidade alcançada pelo MPL-SP como movimento preferencial para estas lutas, que saiu reforçado em sua posição pelo êxito conseguido na sua última campanha de redução da tarifa, algo que não poderá mais ser ignorado por todo campo de esquerda, abrindo novos horizontes à organização da luta anticapitalista.

16 COMENTÁRIOS

  1. Já que o título deste artigo, Uma nação em cólera, evoca uma frase de um dos mais lúcidos fascistas do pós-guerra, o francês Maurice Bardèche, vale a pena transcrever a passagem em que essa frase se encontra. Bardèche começou por afirmar «a impossibilidade de o fascismo se desenvolver fora dos períodos de crise», e explicou o motivo: «Porque ele não tem um princípio fundamental. Porque ele não tem uma clientela natural. Ele é uma solução heróica; onde não existe uma oportunidade de heroísmo, ele definha. Contrariamente ao comunismo, o fascismo não fornece uma explicação da história do mundo. […] ele é essencialmente um movimento de multidões e não um método de teórico. Por isso ele não tem como o comunismo uma clientela natural; não é o partido do proletário nem do camponês nem de qualquer outra classe. Ele é o partido da nação em cólera. E principalmente, em especial, o partido dessa camada da nação que usualmente se satisfaz com a vida burguesa, mas que as crises perturbam, que as atribulações irritam e indignam, e que intervém então brutalmente na vida política com reflexos puramente passionais, quer dizer, a classe média. Mas essa cólera da nação é indispensável ao fascismo. Ela constitui o próprio sangue que irriga o fascismo» (Maurice Bardèche, Qu’est-ce que le fascisme?, Paris: Les Sept Couleurs, 1961, págs. 93-94).

  2. Sobre a matéria da RedeBrasilAtual (http://www.redebrasilatual.com.br/cidadania/2013/06/contra-fascismo-grupos-de-periferia-se-articulam-em-sao-paulo-6181.htm), pode-se ver no título que a periferia está se organizando para defender a Democracia e a Dilma.
    A defesa da democracia, foi sim dito pela maioria das pessoas que estavam lá, inclusive com muita ênfase por causa dos fatos que ocorreram no ato de quinta-feira . A defesa da Dilma, só foi dita em algumas falas. Achei equivocado o título da manchete pois ela não refletiu a opinião da maioria das pessoas e grupos organizados que lá estavam. As pessoas e grupos que lá estavam, foram para organizar uma pauta conjunta de reivindicações e uma união contra a ascensão do conservadorismo.

  3. Aos argumentos que procuram desmentir a possibilidade de um golpe à direita, acrescentaria o fato de que o Capital anda de mãos dadas com o Governo. Tudo o que se poderia fazer para salvar a economia o PT faz. No macro e no micro. Mesmo a solução encontrada para a redução da tarifa foi nesse sentido – lucros intactos. Pra que golpe? (E nisso não implica em nenhum rebaixamento da importância da luta recém travada nem tampouco da conquista da redução da tarifa.)
    É certo que existe UMA nação em cólera… mas o governo, democrático-e-popular, conta com uma OUTRA nação, que não é pequena nem desorganizada. E, até o momento, esta OUTRA nação, oculta-se numa manutenção do cotidiano – trabalhando para um, e sustentando o governo do outro; quer dizer, sustentando o namoro.
    Fazendo referência ao trecho de Maurice Bardèche, será que esta nação precisa de um herói? Arrisco dizer que já encontrou um, eleito em 2002, filho do Brasil. Um herói sem nenhum caráter.

  4. Companheiros do passa palavra,
    tenho acompanhado cotidianamente as publicações de vocês a respeito dos últimos acontecimentos e gostaria de parabenizá-los por esse texto em especial, que atesta uma interpretação coerente e bem fundamentada do processo em curso.

    Relato brevemente que estive na passeata de Campinas da última quinta e que pude observar que a grande maioria dos manifestantes enquadrava-se na denominação de “coxinhas”. Eu, um dos poucos, com a minha velha camisa vermelha, logo me senti deslocado em meio a tantas jovens nacionalistas que diziam ter “saído do facebook” e que catavam entusiasmados o hino nacional e outras canções do tipo.
    Uma das coisas que mais me incomodou foi ver senhoras de classe média ostentando cartazes contra a corrupção e pedindo a prisão dos condenados pelo mensalão. Naquele momento, tive a certeza de que o movimento estava se transferindo para a direita, aquela direita tão ignorante que acredita que o PT é um partido comunista.

    Por fim, compartilho da opinião de vocês a respeito da improvável possibilidade de um golpe de direita, não apenas porque demandaria um derramamento de sangue, mas porque se mostra, em grande medida, desnecessário para o momento, uma vez que a conciliação de classes promovida pelo PT tem sido muito útil aos interesses do capital.

    A esquerda precisa sim se unir e enfrentar os fascistas. Para tanto, a união com os movimentos sociais é imprescindível, em especial com o MTST, que – salvo engano – ainda não foi absorvido pela máquina petista.

    Saudações.

  5. Em setembro de 1939, Otto Ruhle concluía A LUTA CONTRA O FASCISMO COMEÇA PELA LUTA CONTRA O BOLCHEVISMO [http://www.marxists.org/portugues/ruhle/1939/09/fascismo.htm#t4*] com as seguintes palavras:
    “Nacionalismo, autoritarismo, centralismo, direcção do chefe, política do poder, reino do terror, dinâmicas mecanicistas, incapacidade de socializar – todos esses traços fundamentais do fascismo existiam e existem no bolchevismo. O fascismo não passa de uma simples cópia do bolchevismo. Por esta razão, a luta contra o fascismo deve começar pela luta contra o bolchevismo.”

  6. De Conexão Jornalismo (http://www.conexaojornalismo.com.br/noticias/militante-de-extrema-direita-se-diz-arrependido-e-denuncia-esquema-de-manipulacao-das-passeatas-1-12179):

    “Militante de extrema direita se diz arrependido e denuncia esquema de manipulação das passeatas – denúncia é investigada

    Conexão Jornalismo acaba de receber o que seria o relato de um “integralista arrependido” que, diante da sucessão de violência de ativismo golpista deflagrado pelas manifestações, na qual seu grupo e outros mais estariam infiltrados, teria decidido denunciar e se afastar. Identificado como “Marcio Hiroshi”, o homem de 43 anos divulga também fotografias de encontros dos Integralistas e fala sobre os planos para afastar partidos de esquerda dos movimentos e provocar o caos. Diz ainda que policiais ajudariam o grupo e que alguns seguidores receberiam dinheiro para difundir as idéias no Facebook. (…)”

    Depoimento e fotos aqui:
    https://docs.google.com/file/d/0B7zim8GBEN4zWmdNZWxHOFpreUE/edit?usp=sharing

    “Meu nome é Márcio Hiroshi. Sou membro do Movimento Integralista há 5 anos.

    Sempre acreditei no Integralismo como forma de mudar o país. Mas o que venho narrar aqui me fez refletir e romper com o Movimento.

    Desde que as manifestações começaram temos nos reunido todos os domingos para traçar rumos de ação de nosso movimento. A ação é pautada em TUMULTUAR, EXPULSAR OS PARTIDOS DE ESQUERDA E ACABAR COM AS PASSEATAS PROMOVENDO A DESORDEM. Por que isso? Para acabar com as mobilizações dirigidas pela esquerda.

    Neste último domingo, as posições definidas pelo grupo me fizeram sair e denunciar o que está havendo. Como prova da veracidade dos fatos estou divulgando fotos e nomes de meus comandantes
    1 – Os integralistas estão desde os primeiros dias nas passeatas.
    2 – A linha de atuação do grupo é TUDO PELO BRASIL, retirar as bandeiras dos partidos de esquerda e prevalecer a do Brasil.
    3 – Nas manifestações gritar SEM PARTIDO e expulsar os partidos de esquerda.
    4 – Há um núcleo político e um núcleo de ação.
    5 – O núcleo político inicia a agitação e o núcleo de ação intervêm batendo nos militantes.
    6 – Há o movimento fortemente organizado em São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, BH e outras cidades.
    7 – O objetivo é acabar com as passeatas, sempre tumultuando.
    8 – Nas reuniões somos ajudados por pessoas do serviço reservado da PM e por dirigentes do PSDB, DEM e outros deputados e vereadores (depois direi nomes e fotos). Estes partidos nos financiam.
    9 – Em São Paulo os carecas de SP e Carecas do ABC são pagos para nos ajudar a bater e a gerar grande desordem. Eles são do núcleo de ação. De início eu participei ativamente do núcleo de agitação. Estava em São Paulo (onde moro) e todos íamos sempre para outras cidades, pois as datas não eram conflitantes.

    O que me fez sair do grupo? As ações previstas agora estavam sendo muito violentas, onde teve gente que que quebraram o braço, machucaram bastante. Meu chefe de agitação é Marcelo Coradassi Eiras. Ele aparece nas fotos à direita, onde estamos em Anauê. Em breve irei revelar mais nomes e endereços de todos. (…)”

  7. A citação de Maurice Bardèche no comentário de João Bernardo é a descrição do que vimos semana passada.

  8. “Os passos dos trabalhadores devem ir por onde as mãos dos patrões não alcancem…!” (Beto)

    “No capitalismo a classe explorada não se limita a sustentar o peso dos exploradores, mas recebe deles o quadro e as modalidades em que se organiza. […] Na sociedade actual uma classe domina na medida em que dita a organização interna da classe dominada. Princípio de auto-organização das classes capitalistas, o Estado é ao mesmo tempo o princípio da hetero-organização da classe trabalhadora” BERNARDO, João (2003) – Labirintos do fascismo. Porto: Edições Afrontamento.

    Se por um lado é óbvio, ou deveria ser óbvio que, dado o antagonismo de classes, a luta pelas vias institucionais, quer de direita, quer de esquerda, estão quase que inevitavelmente fadadas aos resultados que interessam à manutenção do status quo da burguesia e da burocracia, por outro, “concentrar nossos esforços aí, onde os “coxinhas” não estão, onde as pautas populares encontram sua base real”, parece ser o caminho ideal de enfrentamento e superação às amarras institucionais que nos são impostas, inclusive, por parte de nossas esquerdas…

    É na previsibilidade (e na visibilidade) das instituições que se assegura o controle dos exploradores sobre os explorados, por isso quando as lutas se desenvolvem no campo da elite, inclusive em termos espaciais/geográficos, acaba-se impondo uma imagem distorcida da realidade. A luta deve se passar no campo da realidade dos “fazedores’ para que se construa e se perceba a imagem da realidade, por isso entendo que um dos caminhos é que “Os passos dos trabalhadores devem ir por onde as mãos dos patrões não alcancem…!”

    Abraços fraternais,

    Beto.

  9. Qualquer que seja o ponto de vista que adotarmos,o presente é um beco sem saída. Não é essa a menor das suas virtudes. Aqueles que desejariam acima de tudo esperar, vêem ser-lhes retirado qualquer tipo de sustentação. Os que pretendem ter soluções vêem-se imediatamente desmentidos. Toda a gente sabe que as coisas só podem ir de mal a pior. «O futuro já não tem futuro» constitui a sabedoria de uma época que atingiu, sob a sua aparência de extrema normalidade,o nível de consciência dos primeiros punks.A esfera da representação política fecha-se. Da esquerda à direita, é o mesmo vazio que toma, alternadamente,a forma de cão de guarda ou ares de virgem, os mesmos técnicos de vendas que mudam de discurso conforme as últimas descobertas do departamento de comunicação. Aqueles que ainda votam parecem ter como única intenção rebentar com as urnas, à força de votarem como puro ato de protesto. Começamos a pensar que é efetivamente contra o próprio voto
    que as pessoas continuam a votar. Nada daquilo que se apresenta está à altura da situação, nem de longe nem de perto.

  10. Acredito que a análise seja pertinente, sobretudo, por ressaltar a importância que o MPL adquiriu não só nesse processo, mas nos quase dez anos de luta do movimento. São completamente descabidas as acusações feitas ao movimento, já que, como destaca o texto, a pauta era específica e ela foi vitoriosa.

    Concordo absolutamente que os espaços de luta da esquerda não ligada ao espectro petista e institucional seja muito longe dessa pequena-burguesia “nacional-alienada” que estão aí chamando de “coxinhas”.

    No entanto cabe, a meu ver, agregar ao trabalho de base que deverá necessariamente ser continuado ou mesmo iniciado nas periferias ao trabalho de base junto ao proletariado, e aqui me refiro especificamente ao operário de fábrica, real produtor do valor e do mais-valor nesta sociedade que vivemos. Sabemos o quão lesivo foi no último ciclo histórico e ainda tem sido a influência conciliadora do petismo nessas bases. Porém, é certo que se esses trabalhadores não começarem a se movimentar, as manifestações, por mais sejam quantitativamente grandiosas, qualitativamente não poderão fazer frente ao capital, e a burguesia sabe muito bem disso.

    Como organizar essas bases do operariado, para agudizar as contradições que ele vive no seu cotiano e que não podem ser resolvidas pelo modo de produção capitalista é uma, se não ‘a’, grande questão em aberto.

  11. Khaled,

    Dependendo do ponto de vista que se vê, os coxinhas não foram engolidos, eles simplesmente, como era de se esperar, pararam de ir às ruas, e só ficou praticamente, novamente, o pessoal de esquerda. Eles foram “engolidos” porque os 2 mil de esquerda continuaram indo e os 5 mil coxinhas voltaram pra frente do videogame, pro facebook, pros shoppings, pras baladas…

  12. Achei esse relato na internet. Não sei se é verídico, mas penso que sim:

    O gigante acordou e foi passear na Argentina. Relato de Fernando Sarti Ferreira:
    “O gigante acordou e expandiu suas ações para a esfera internacional. Desembarquei ontem no Aeroporto de Ezeiza em Buenos Aires por volta das 21h da noite. Quando cheguei nas esteiras, pude perceber que havia uma enorme aglomeração de gente – em sua maioria brasileiros de outro voo. Um funcionário, sei lá se do aeroporto ou de uma companhia área, nos informou que o desembarque das bagagens estava demorando, pois o pessoal de terra do aeroporto estava em greve. Depois disso, o que vi, foi uma das coisas mais deploráveis. A brasileirada começou a chutar vidros, bater nas esteiras pedindo sua mala. Um sujeito subiu na esteira e falou: “Galera, já estou em contato com a embaixada, essa palhaçada tem que acabar”. Tinha um pessoal querendo invadir a pista. Eu, como sou um completo imbecil, do meio do público que assistia ao discurso do líder das massas em cima da esteira de mala, fiz o pequeno comentário básico em voz alta: “Os funcionários estão em greve. É um direito deles”. Ai eu pergunto: pra que abrir a boca? A turba se voltou para mim. Um homem apontava o dedo na minha cara e me dizia “EU ESTOU COM MEUS FILHOS AQUI!!!!” Talvez, sob influência dos calmantes que tinha tomado – tenho pavor de viajar de avião -, consegui responder para o sujeito: “Então você não devia fazer esse papelão ridículo na frente deles”. O cara veio para cima, a turba começou a gritar para mim “Cuzão! Cuzão!”. Um argentino entrou no meio, gritou para mim “Kirchnerista marxista! Montonero de mierda” e me empurrou. Alguns outros argentinos me puxaram de canto e ficaram comigo até a poeira baixar, enquanto a turba cantava “Eu, sou brasileiro, com muito orgulho, com muito amor”. A revolução fascista da classe média é internacional? Só sei que, se defender direitos básicos constitucionais tem colocado minha integridade física em risco, acho que tá mais que na hora de eu começar a aprender a me defender de agressões físicas.”

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