Os descaminhos da extrema-esquerda no passado podem servir como um contraponto ao que vive a extrema-esquerda de hoje sob o ímpeto neodesenvolvimentista. Por Manolo

O Brasil vive uma profunda mudança de sua inserção na economia e na política globais. Nunca antes na história deste país se produziu, exportou e investiu tanto, em especial fora das fronteiras – desenvolvendo as empresas transnacionais de origem brasileira. Nunca antes a política externa brasileira foi tão independente – com base na exploração dos recursos econômicos da América Latina e na disputa de mercados e de espaços de investimento em África. Nunca antes o Brasil foi tão engajado – ao ponto de grandes capitalistas apoiarem políticas compensatórias “de esquerda”. Na verdade – e é o que queremos investigar com esta série de artigos – nunca antes o Brasil foi tão imperialista.

Leia aqui as demais partes do ensaio: [1][2][3][4][5][6][7][8][9][10]

g_foto54Com este ensaio pretendo resgatar a história das lutas da extrema-esquerda brasileira contra as políticas nacional-desenvolvimentistas no Brasil entre 1950 e 1964. Através deste esforço tentarei deitar as bases para outros ensaios posteriores, que ajudarão a fazer paralelos com a situação atual da extrema-esquerda diante da retomada do crescimento econômico no Brasil e das mudanças na sua inserção geopolítica global. Os descaminhos da extrema-esquerda no passado podem servir como um contraponto ao que vive a extrema-esquerda de hoje sob o ímpeto neodesenvolvimentista iniciado em 2007, ano que marca o início de sucessivos crescimentos no PIB e na produtividade (total e dos fatores) [1]. Antes de começar, é preciso fazer algumas observações para facilitar o debate.

Em primeiro lugar, escolhi circunscrever o período estudado entre os anos 1950 e 1964 por tratar-se de um intervalo “democrático” na política brasileira, com relativa liberdade de atuação do movimento operário e sindical (campo preferencial de atuação da extrema-esquerda no período). “Pulei” de propósito o período do governo Dutra (1946-1950) porque, em primeiro lugar, a arrancada econômica ocorrida durante a era Vargas sofreu uma brecagem brusca neste período, e em segundo lugar porque em tal momento, apesar da máscara democrática, se nem setores importantes da esquerda conseguiram manter suas estruturas organizativas intactas diante da verdadeira ditadura exercida contra os trabalhadores sob a justificativa do combate ao “comunismo”, que dirá a extrema-esquerda de cuja história de lutas este artigo trata.

Em segundo lugar, não dou qualquer sentido especial às expressões esquerda e extrema-esquerda além daqueles em curso cotidiano, sujeitas sempre às variações impostas por cada conjuntura política específica. Assim, se na atualidade, confirmando a amplitude da categoria, podem ser consideradas de esquerda organizações como o Partido Democrático Trabalhista (PDT), o Partido Socialista Brasileiro (PSB), o Partido dos Trabalhadores (PT) e o Partido Comunista do Brasil (PCdoB), estão na extrema-esquerda organizações com programa e prática à esquerda destas organizações, como o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), o Partido Comunista Brasileiro (PCB), o Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU), o Partido da Causa Operária (PCO), a Consulta Popular, todas as organizações trotskistas (LER-QI, LBI, POR etc.) e todas as organizações anarquistas (Resistência Popular, Fórum do Anarquismo Organizado, as várias federações anarquistas etc.). Da mesma forma, se no período abrangido por este ensaio a esquerda era composta pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB) e pelo Partido Comunista Brasileiro (PCB), a extrema-esquerda era então composta pela Organização Revolucionária Marxista – Política Operária (ORM-POLOP), pelo Partido Operário Revolucionário (POR), pela Liga Socialista Independente (LSI), pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB) e pela Ação Popular (AP).

Em terceiro lugar, alguns estranharão a exclusão proposital deste estudo de duas organizações extremamente importantes para a história da extrema-esquerda brasileira. A Ação Popular (AP), fundada em 1962 e de grande importância para o movimento estudantil anterior ao golpe de 1964 – marco final deste artigo – originou-se numa ampla frente de massas da esquerda católica que se pretendia alternativa ao PCB; analisá-la seria entrar na longa história da esquerda católica no Brasil, o que foge aos limites já bastante dilatados deste ensaio [2]. O Partido Comunista do Brasil (PCdoB), fundado também em 1962 a partir de uma cisão do Partido Comunista Brasileiro (PCB), ela própria resultante dos debates posteriores ao XX Congresso do Partido Comunista da URSS [3], teve também pouco tempo para consolidar-se antes do golpe de 1964 [4]; até seu alinhamento com o Partido Comunista da China em 1963, o partido enviara emissários a Moscou (Pedro Pomar) e Havana (Lincoln Oest) em busca de apoio político internacional, sem sucesso [5]; e ademais suas análises políticas em pouco diferem daquelas do Manifesto de 1950 e das resoluções do IV Congresso do PC (1954) [6]. Embora a AP tenha tido bastante relevo na luta pelas reformas de base, em especial na agitação estudantil e cultural, é apenas na resistência à ditadura pós-1964 e após a imagem de falência das propostas do PCB que ela e o PCdoB incorporarão grande número de egressos do PCB e mostrarão sua verdadeira importância. Como este ensaio será posteriormente continuado por outro referente ao período 1964-1974, reservo-me o direito de analisá-las mais adiante, em momento mais oportuno.

Em quarto lugar, a documentação da maior parte das organizações políticas da extrema-esquerda existentes no período coberto por este ensaio (1950-1964) encontra-se ainda à espera de quem lhe faça uma sistematização precisa e rigorosa e disponibilize tais resultados ao público. Um exemplo destas lacunas, anterior ao período delimitado mas de extremo interesse para o ensaio, é o do Partido Socialista Revolucionário (PSR), cujo jornal, Orientação Socialista, publicou importantes artigos de crítica à política agrária do PCB [7]. A Liga Socialista Independente (LSI), organização da qual participaram militantes do PSR rompidos com o trotskismo, recentemente teve dois documentos reunidos numa pequena coletânea de textos de seu principal dirigente, Hermínio Sacchetta [8]; apesar disto, seu jornal, Ação Socialista, teve outras edições, cujo conteúdo dorme em algum arquivo, longe do debate público a que originalmente foi destinado. Igual destino certamente tiveram os doze números de Bandeira Vermelha, a publicação da organização sucessora da LSI no começo dos anos 1960, o Movimento Comunista Internacionalista (MCI) [9]. Na medida do possível a um historiador diletante, sem bolsas de pesquisa ou recursos para viajar a outras cidades e lá permanecer pelo tempo necessário à pesquisa arquivística rigorosa, tentei fazer um quadro amplo do contexto em que surgiram e atuaram tais organizações para tentar ajudar a integrar estas lutas num contexto econômico e geopolítico global, mas pode ser que haja falhas grosseiras, de minha inteira responsabilidade. Nada obsta a complementação ou contestação através de comentários, que serão muito bem-vindos.

Em quinto lugar, é impossível desconectar este resgate histórico do contexto mais amplo de duas fases da Guerra Fria: a primeira, que vai desde as conferências finais da Segunda Guerra Mundial (mais especificamente as de Teerã, Bretton Woods, Dumbarton Oaks, Quebec, Moscou, Malta, Ialta e Potsdam) até 1953, com a morte de Josef Stalin e o fim da Guerra da Coreia; e a segunda, que vai de 1953 até a crise dos mísseis em Cuba em 1962. Muito embora as lutas da extrema-esquerda hajam continuado após esta data, seu período formativo já estava encerrado; sua participação na terceira fase da Guerra Fria (1962-1979) correlaciona-se ao aprofundamento da “terceiro-mundização” do conflito entre as superpotências, já iniciado na América Latina ainda durante a segunda fase, e nele se inspira.

Em sexto lugar, neste ensaio “nacional-desenvolvimentismo” também não tem qualquer conotação especial. Trata-se, em termos bastante amplos, das políticas de industrialização implementadas entre 1930-1945 e 1950-1964, independentemente de serem “ortodoxas”, “heterodoxas” etc. Se em dados momentos foi necessário discorrer sobre a história destes períodos, foi por julgar que há detalhes destas políticas que são ou polêmicos – fazendo necessário expor minha posição sobre eles – ou ou pouco conhecidos. Qualquer bom livro de história econômica do Brasil suprirá perfeitamente as lacunas existentes [10].

Por fim, sabendo que se trata de um ensaio longo, gostaria de adiantar algumas das conclusões a que cheguei para que o leitor interessado possa acompanhá-lo sabendo mais ou menos o que o aguarda:

1) Tudo aquilo escrito anos depois por ex-militantes trotskistas do PSR ou do POR (Florestan Fernandes, Tullo Vigevani, Leôncio Martins Rodrigues, Boris Fausto, Vito Letizia, Maurício Tragtenberg, Maria Hermínia Tavares de Almeida etc.), por ex-militantes da ORM-POLOP (Ruy Mauro Marini, Michael Löwy, Luiz Alberto Moniz Bandeira, Vânia Bambirra, Emir Sader, Eder Sader, Paul Singer etc.) e por outros intelectuais de peso citados neste ensaio ainda enquanto simples militantes guarda alguma relação com sua passagem por organizações de extrema-esquerda, mesmo que apenas para negá-la. Este ensaio tentará, no labirinto dos fatos históricos, localizar na prática política da extrema-esquerda a origem de tais teses e compreender como influenciaram suas trajetórias futuras.

2) Para revolucionários não basta a crítica à realidade, mas sua fusão com a ação que a transforma. Apesar das críticas certeiras a alguns aspectos do nacional-desenvolvimentismo e da sua encampação por setores da esquerda, a extrema-esquerda foi incapaz de criar alternativas políticas fortes o suficiente para impor-se no cenário de então, ou de criar o instrumento para o movimento de massas que tanto pretendeu. Este ensaio tentará localizar algumas das possíveis causas deste sucesso de crítica e fracasso de público.

3) Como se verá adiante, o isolamento da extrema-esquerda não raro levou-a a alianças políticas que podem hoje parecer chocantes, como aquela firmada em 1952 entre o POR e um certo candidato à prefeitura de São Paulo chamado Jânio Quadros, ou ainda, às vésperas do golpe de 1964, a aproximação entre a ORM-POLOP e o nacionalismo radical chefiado por um certo Leonel Brizola. Este ensaio tentará lançar as bases para localizar nestes ziguezagues pistas para o atual isolamento da extrema-esquerda e para alguns de seus flertes mais controversos.

Feitas estas observações, já se pode tatear pelo caminho aberto pelas lutas – a começar pela composição das classes no Brasil no início do século XX.

(Continua na segunda parte deste ensaio.)

Notas

[1]: Os cálculos são da revista Conjuntura Econômica, vol. 65, nº 03, mar. 2011, uma interessante edição desde instrumento ideológico da Fundação Getúlio Vargas (FGV) – think tank dedicado à formação de gestores – totalmente dedicada aos desafios econômicos do governo Dilma.

[2]: O leitor interessado em aventurar-se na longa história da esquerda católica precisará passar pela história da Juventude Agrária Católica (JAC), da Juventude Estudantil Católica (JEC), da Juventude Independente Católica (JIC), da Juventude Operária Católica (JOC), da Juventude Universitária Católica (JUC), de setores do Partido Democrata Cristão (PDC) e de outras organizações surgidas no seio da Ação Católica Brasileira (ACB) que deram origem à AP; na história da participação da AP nas lutas pelas “reformas de base” do governo João Goulart (1962-1964); na famigerada “integração na produção” dos militantes da AP; na sua progressiva rejeição do cristianismo e aproximação do marxismo-leninismo, resultando em sua transformação em Ação Popular Socialista (AP Socialista) e Ação Popular Marxista-Leninista (APML); na cisão desta última em uma ala que se dissolveu no PCdoB em 1974 e em outra que permaneceu com o mesmo nome; por fim, na fusão da APML remanescente com o Movimento de Emancipação do Proletariado (MEP) em 1982 para formar a Organização Comunista Democracia Proletária (OCDP). Para tudo isto, vale a pena ler ARANTES, Aldo e LIMA, Haroldo. História da Ação Popular, da JUC ao PCdoB. São Paulo: Alfa-Omega, 1984;  GALLEJONES, Eustáquio. AP: socialismo brasileiro. Rio de Janeiro: Centro de Informação Universitária, 1965; GÓMEZ DE SOUZA, Luiz Alberto. A JUC: os estudantes católicos e a política. Petrópolis: Vozes, 1985; LIMA, Luiz Gonzaga de Souza. Evolução política dos católicos e da Igreja n Brasil. Petrópolis: Vozes, 1979; MURARO, Valmir Francisco. Juventude Operária Católica (JOC). São Paulo: Brasiliense, 1985; OLIVEIRA JR. Franklin de. Paixão e revolução: capítulos da história da Ação Popular. Tese de doutorado em História. Recife: UFPE, 2000; SANTANA, Cristiane Soares de. “Notas sobre a história da Ação Popular na Bahia (1962-1973)”. Em ZACHARIADHES, Grimaldo Carneiro (org.). Ditadura militar na Bahia: novos olhares, novos objetos, novos horizontes. Vol. 1. Salvador: EdUFBA, 2009, pp. 151-173; SOUZA, Herbert José. No fio da navalha. Rio de Janeiro: Revan, 1996; _________. Revoluções da minha geração. São Paulo: Moderna, 1996.

[3]: Para uma explicação sucinta do surgimento do PCdoB em 1962 a partir da Carta dos Cem, cf. POMAR, Wladimir. “O partido e a guerrilha”. Em: POMAR, Wladimir (org.). Araguaia: o partido e a guerrilha – documentos inéditos. São Paulo: Brasil Debates, 1980, pp. 1-63. Aqueles interessados em acompanhar o desenvolvimento do partido a partir de seu jornal (A Classe Operária) e de seus principais documentos internos – “Duas concepções, duas orientações políticas” (1960), “Em defesa do partido” (1961 – a Carta dos Cem), “Manifesto-Programa” (1962), “Resposta a Khruschev” (1963), “O golpe de 1964 e seus ensinamentos” (1964), “União dos brasileiros para livrar o país da crise, da ditadura e da ameaça neocolonialista” (1966), “Guerra popular – caminho da luta armada no Brasil” (1969), “Cinquenta anos de luta” (1972) e as resoluções da 7ª Conferência (1979) – acessarão com bom proveito o site do Centro de Documentação e Memória da Fundação Maurício Grabois, que os disponibiliza gratuitamente na internet. Alguns documentos da Guerrilha do Araguaia, apesar disso, só foram disponibilizados até o momento na já referida coletânea organizada por Wladimir Pomar. Para quem prefira versões impressas destes documentos, dois deles – o “Manifesto-Programa” e a “União dos brasileiros” – encontram-se junto a outros documentos das organizações clandestinas da esquerda brasileira na imprescindível coletânea organizada por Daniel Aarão Reis Filho e Jair Ferreira de Sá (Imagens da revolução: documentos políticos das organizações clandestinas de esquerda dos anos 1961-1971. 2ª ed. São Paulo: Expressão Popular, 2006). Também de bom proveito para compreender a história do PCdoB são as dissertações de mestrado de Daniel Ilirian Carvalho (O surgimento do PC do B na crise do comunismo brasileiro entre 1954 e 1962. Dissertação de mestrado em História. São Paulo: PUC-SP, 2010) e  Jean Rodrigues Sales (Partido Comunista do Brasil – PC do B: propostas teóricas e prática política – 1962-1976. Dissertação de mestrado em História. Campinas: UNICAMP, 2000).

[4]: O próprio partido o admite no documento “O golpe de 1964 e seus ensinamentos”: “Infelizmente, o PC do Brasil não dispunha de suficiente influência entre as massas para levá-las a interferir de maneira adequada nos acontecimentos. Ainda que tenha conseguido notável crescimento, tanto numérico quanto na ligação com as massas, o Partido era uma organização pequena para a envergadura das tarefas que tinha a realizar. Isso resultou de uma série de dificuldades inerentes ao próprio processo de sua reorganização. Nele, também se manifestaram tendências sectárias. Estas, consistiram em certa fuga ao trabalho nas organizações de massas, particularmente no movimento sindical, em não dar a atenção necessária ao contato mais estreito com as correntes políticas democráticas em alguns exageros no combate ao que havia de errôneo na política do senhor João Goulart. Essas tendências, sem dúvida, obstaculizaram a maior participação do Partido no movimento democrático e antiimperialista e não permitiram que exercesse uma influência mais positiva nesse movimento”.

[5]: SALES, Jean Rodrigues, op. cit., p. 89.

[6]: Jean Rodrigues Sales (op. cit. p. 131) coloca como únicas diferenças entre os dois PP. CC. durante os primeiros anos do PCdoB as questões da liderança na revolução democrático-burguesa e do uso da violência nesta revolução.

[7]: A observação desta lacuna historiográfica foi feita por Osvaldo Coggiola (“O trotskismo no Brasil (1928-1964)”. Em: MAZZEO, Antonio Carlos e LAGO, Maria Izabel (orgs.). Corações vermelhos: os comunistas brasileiros no século XX. São Paulo: Cortez, 2003, p. 263.)

[8]: Cf. SACCHETTA, Hermínio. O caldeirão das bruxas e outros escritos políticos. Campinas: Pontes/EdUNICAMP, 1992

[9]: O número de edições do jornal do MCI foi apresentado por Jacob Gorender (Combate nas trevas. A esquerda brasileira: das ilusões à luta armada. 2ª ed. São Paulo: Ática, 1987, p. 162).

[10]: Vale a pena referenciar as obras de Guido Mantega (A economia política brasileira. Petrópolis: Vozes, 1984), Ricardo Bielschowsky (Pensamento econômico brasileiro: o ciclo ideológico do desenvolvimentismo. 5ª ed. São Paulo: Contraponto, 2000), Maria Rita Loureiro (50 anos de ciência econômica no Brasil: pensamento, instituições e depoimentos, Petrópolis, Vozes, 1997 ) e os dois volumes das Conversas com economistas brasileiros (São Paulo: 34, 1995 e 1999).

 

35 COMENTÁRIOS

  1. Parece interessante a proposta dos ensaios. Certamente trará bons debates.
    Mas, a propósito, não se pode deixar de notar como o autor, ao fazer a sua lista de organizações de esquerda e extrema-esquerda na atualidade, simplesmente ignora o Movimento Sem Terra – uma organização que conta com alguns milhares de militantes por todo o país -, para não falar de inúmeros outros movimentos/organizações populares no campo e na cidade, que não me parecem menos relevantes que muitas das organizações que foram elencadas. Enfim…Curioso…

  2. Marco, não se trata de curiosidade alguma, mas de método. Preferi não confundir movimentos sociais e organizações de esquerda. As diferenças entre ambos são ridículas, a meu ver, pois tem muito movimento com cara de partido por aí, e vice-versa; mas elas existem e precisam ser respeitadas na análise. Se eu não empregasse critérios distintivos e fosse incluir nesta série o MST, pois ele não detém o monopólio da luta pela terra no Brasil. Teria que tratar não apenas dele, mas também do CETA, do MLT, do MLST, das inúmeras pastorais rurais e obras diocesanas e paroquiais, da CPT, tudo isto somando em torno de sessenta e oito movimentos de luta pela terra. E olhe que estes são apenas aqueles ligados à luta pela terra no campo; há também os movimentos de luta pela terra urbana — os sem-teto — que são tantos quantas são as cidades no Brasil. E isto para tratar apenas da luta pela terra, pois há movimentos sociais de luta de cadeirantes, de surdos, de consumidores, de usuários de saúde mental etc., cada um deles comportando suas alas esquerda, direita, de centro, de extrema-esquerda, de extrema-direita etc..
    Eis os critérios (há outros, mas prefiro estes):
    a) Pauta: enquanto as organizações de esquerda e extrema-esquerda pretendem tomar o poder — pelos meios que consideram mais legítimos — para realizar um programa amplo de modificações políticas, econômicas e sociais, movimentos sociais podem inclusive ser pautados por programas amplos, mas tendem a focar-se numa pauta central. Afinal, por exemplo, o MST não vai à cidade luta com os cadeirantes por melhores condições de acessibilidade, enquanto uma organização de esquerda — qualquer uma dentre as citadas nesta introdução — pode.
    b) Coesão ideológica: enquanto organizações de esquerda, em especial aquelas da extrema-esquerda, costumam derivar seu programa tanto de questões práticas quanto de posturas ideológicas mais ou menos “fechadas”, movimentos sociais podem igualmente fazê-lo, mas em geral derivam seu programa mais da prática que da ideologia. Afinal, enquanto a reforma agrária é muito mais uma necessidade prática urgente que uma ideologia, e que por isto é componente de diversos campos ideológicos (que vão das ideologias burguesas às tecnocráticas e às fascistas), não se pode imaginar que o PCdoB seja movido somente a aparelhamento.
    c) Interpenetração: enquanto organizações de esquerda são em geral refratárias à interpenetração de organizações, restringindo-a, quando permitida, à existência rigidamente regulada de tendências, movimentos sociais não criam qualquer obstáculo formal a esta interpenetração, e até estimulam-na. Para comprová-lo, basta ver: enquanto o MST tem até secretários de Estados filiados ao PT dentro de governos hegemonizados por este partido e nem sequer cogita estabelecer qualquer regulamentação a esta influência recíproca, é impossível a algum petista sê-lo e ao mesmo tempo ser também do PDT, do PSB ou do PSTU. (O entrismo, exceção a esta regra, será visto na hora certa.)

  3. Uma observação, a respeito da classificação da consulta popular enquanto estar à esquerda da situação. É uma classificação dúbia, se considerarmos que, enquanto organização que se abstém à via eleitoral, mas que no entanto se entrega à prática de analisar os turnos eleitorais individualmente, e se posicionar da maneira que considera “o menor retrocesso para a classe trabalhadora”. Logo, nesse último processo eleitoral, a consulta popular logrou ceder apoio à candidatura de Dilma Roussef, somente no segundo turno, diferenciando-se das demais organizações citadas.

  4. Não acho dúbio não… Acho que a análise sobre se estão à esquerda ou não tem sempre referenciais diversos. Na utilizada por Manolo me parece coerente a classificação da Consulta, já que não leva em conta o posicionamento nas eleições, mas sim em relação a política geral dos partidos considerados de esquerdas, para essa análise (já que se utilizarmos outros referenciais PT já deixou de ser esquerda há muito tempo, sem contar com as outras organizações!).

  5. Manolo, muito bom esse começo de artigo, parabéns. Fica-se na vontade de ver o próximo. Como num filme ou novela incompletos…hehhhe
    No entanto, tenho algumas perguntas ou considerações. Você irá desenvolver a noção de “desenvolvimentismo” com o passar do artigo? Me parece um termo que tem sido usado ultimamente. Inclusiveo Stédile aqui (na minha cidade) numa fala de análise de conjuntura também citou esse “desenvolvimentismo”…

    Bem, outra questão que me fez pensar, principalmente a partir de uma edição da revista Caros Amigos intitulada A DIREITA BRASILEIRA. Se trata de uma série de artigos em que estuda/comenta/debate a “nossa” direita (brasileira). E coloca que discutimos pouco e sabemos poucos dessa direita, conservadora,etc.
    Ai minha questão é: Você não acha que estudamos muito a própria esquerda? Não estaria na hora de nos adentramos também no estudo dessas ramificações conservadoras, direitistas, etc no intuito de conhecer mais o inimigo e com isso criarmos táticas e estratégias menos mesquinhas e sectárias dentro da própria esquerda? Enfim. Abraços.

  6. Olá,

    Alexandre Mourão e pessoal:

    – De certa forma, concordo e discordo de suas considerações. Ou seja, e tentando ser mais claro, entendo sim que existe um claro desinteresse (de uma parte das organizações da extrema-esquerda) em estudar as dinâmicas da classe capitalista (burguesia e, principalmente, gestores) brasileira e internacional – o que, de fato, compromete severamente o fortalecimento da leitura crítica que os movimentos sociais e trabalhadores devem realizar para a construção de novas relações sociais diante da expansão atual do capitalismo;

    – Por outro lado, sinto que, na verdade, grande parte da extrema-esquerda (e pesquisadores inclusos) estuda a esquerda no Brasil de forma pouco criativa – com estudos que apenas re-afirmam “conclusões-slogans” sobre a “resistência dos trabalhadores ao Neoliberalismo”. Por esse motivo, entendo que o estudo que o Manolo irá apresentar, daqui em diante, é fundamental para espantar um pouco dessa “paz de consenso” que permeia as interpretações da esquerda brasileira.

    Sei que essas parecem ser conclusões muito fortes e contundentes. Cabe dizer, no entanto, que esse é o momento certo de encarar nossas debilidades enquanto extrema-esquerda – deixando assim de lado a reiterativa alegação de “culpa da direita, do refluxo e do Neoliberalismo”.

    Caro Alexandre: sei bem que você não fez as afirmações que imputo acima. Estou apenas dando minha opinião sobre o assunto que você brilhantemente levantou acima. No geral, concordo contigo.

    Por fim, e desculpem-me pela extensão do comentário, sugiro ao Alexandre e demais a leitura de alguns artigos aqui do Passa Palavra – que, na minha visão, permitem uma consideração geral excelente e crítica do que o Alexandre chamou de “direita brasileira” (e até, ainda, também fornecem vias para investigar as encruzilhadas em que a esquerda brasileira se envolve). Seleciono alguns deles aqui, dentre vários outros:

    a) do Passa Palavra

    “Nunca antes na história deste país…” – http://passapalavra.info/?p=37696

    b) do João Bernardo

    “As raízes ideológicas do Brasil Potência: 1) a política da «nação proletária»” – http://passapalavra.info/?p=38251

    “As raízes ideológicas do Brasil Potência: 2) a economia da «nação proletária»” – http://passapalavra.info/?p=38257

    “A viagem do Brasil da periferia para o centro: 1) o roteiro” – http://passapalavra.info/?p=38691

    “A viagem do Brasil da periferia para o centro: 2) o novo horizonte” – http://passapalavra.info/?p=38693

    “A geopolítica das companhias transnacionais” – http://passapalavra.info/?p=39343

    Abraços!

  7. Na verdade, Alexandre, eu quase nem uso mais a divisão entre “esquerda” e “direita”. Digo isto porque vivo na Bahia, onde a esquerda chegou ao governo estadual para realizar mais eficazmente o que a direita foi incapaz de fazer, e a direita vai minguando (enquanto conjunto de organizações políticas) ou migrando para o arco de alianças de esquerda (enquanto políticos individualmente considerados).
    Prefiro analisar quais interesses de quais classes tal ou qual organização representa através de seus programas ou práticas, pois esta análise é sempre mais precisa e acurada que definir “esquerda” e “direita”.
    Um exemplo, para adiantar assunto: em termos muito gerais e esquemáticos e sem levar em conta nuances de grande importância, entre 1950 e 1964 a linha definidora entre esquerda e direita era desenhada pelo conflito entre oligarquias agrárias e o bloco burguesia industrial/gestores/trabalhadores em torno da mudança de pauta da economia brasileira rumo à industrialização (contra a agricultura extensiva para exportação) e da mudança do modo de vida rumo à urbanização (contra os “arcaísmos” e “folclorismos” agrários). Desta maneira, um fascista como Getúlio Vargas poderia ser colocado no campo da esquerda, como de fato o foi, e um reacionário como Jânio Quadros poderia ser classificado como um “progressista”, como de fato o foi.
    Mas isto não é tão “dialogável” quanto estes dois conceitos surrados, então preferi usá-los a criar conceitos novos ou a usar conceitos abstrusos. Se uso a distinção entre “direita” e “esquerda” nesta série, é porque não consegui encontrar palavras que designassem de modo simples aquilo que o senso comum conceitua de modo menos preciso. Mas no decorrer do ensaio espero poder mostrar as relações entre esquerda e direita, tentando dar alguns traços desta última.

  8. Falei da “esquerda” e da “direita” e me esqueci do fundamental, que é o “desenvolvimentismo”. Pretendo, sim, tratar do assunto, mas não vou fazer nenhum debate acadêmico mais aprofundado. Levantarei traços gerais sobre o tema, dentro daquilo que se discutia sobre o assunto entre 1950 e 1964, para depois apresentar como a extrema-esquerda tratava do assunto.

  9. Concordo com as colocações feitas por Manolo sobre esquerda e direita e interesses de classes. Mas tomaria cuidado com algumas argumentações apontadas, como a questão de Getúlio Vargas ou de Jânio Quadros… Em primeiro lugar, Vargas não foi um fascista, acho um equívoco a reprodução dessa idéia e pode ser uma armadilha apresentar isso como uma adjetivação, já que o principal “mérito” de Vargas foi exatamente se utilizar dos conflitos políticos-ideológicos do período para se benefeciar dentro deles.
    Além disso, se analisamos a partir dos interesses de classe isso se complexifica ainda mais. Há uma falsa idéia de que houve uma oposição entre burguesia e oligarquia. A construção da burguesia brasileira esteve de mãos dadas com a oligarquia. A própria primeira etapa da Era Vargas (1930-1945) só saíram de cena alguns dos grandes oligarcas da “Velha República”, outros foram com mala e cuia para o lado de quem estava no poder, como o próprio Vargas, que até 1929 estava de mão dadas com os “velhos oligarcas”… Enfim.. Às vezes o que parece novo, não é tão novo…

  10. Fico assombrado com a leviandade com que podem ser feitas certas afirmações taxativas, como a de que «Vargas não foi um fascista». Quanto trabalho historiográfico sobre o fascismo deitado fora com cinco palavras! Mas é lógico. Como reconhecer que o pilar fundamental do Brasil contemporâneo foi um fascismo?

  11. É lamentável que esta posição de David Rehen, de que Getúlio Vargas “não foi um fascista” e de que seu principal mérito fora “se utilizar dos conflitos políticos-ideológicos do período para se benefeciar dentro deles”, está longe de ser voz isolada nos meios da esquerda brasileira. Muito ao contrário, este posicionamento sobre Getúlio talvez seja dos mais emblemáticos a respeito de como a esquerda brasileira anda absolutamente mergulhada numa visão nacional-estatista e (neo)capital-desenvolvimentista, ao ponto de cegar-se para práticas de ultra-capitalistas e fascistas como as de Vargas, ou mesmo de “estadistas” atuais.

    Para ficar em apenas duas passagens recentes das mais lamentáveis sobre o tema, daquelas que ecoam este absurdo na esquerda e extrema-esquerda por aqui, cito o artigo “Getúlio e Lula: o mesmo combate”, de Emir Sader (http://www.cartamaior.com.br/templates/postMostrar.cfm?blog_id=1&post_id=524), publicado em 23/08/2010. Nele o intelectual ex-militante da POLOP, atualmente um de nossos lulistas-mor, escreve coisas do gênero: “Getúlio liderou o processo popular mais importante do século passado no Brasil, dando inicio à construção do Estado nacional, rompendo com o Estado das oligarquias regionais primário-exportadoras, e começando a imprimir um caráter popular e nacional ao Estado brasileiro.”

    Noutra pérola ainda mais recente, o candidato derrotado à presidência pelo PSOL em 2010, logo após as eleições do ano passado, denuncia a injustiça histórica cometida por setores da esquerda contra o Pai dos Pobres. Interpreta esta injustiça – de forma semelhante ao juízo do comentador David Rehem – por acreditar que a esquerda “tem certa dificuldade em fazer isto [este bom resgate da figura de Getúlio] porque Vargas, durante o período em que fingiu flertar com o nazismo a fim de coagir os norte americanos a ceder o know how e a conceder empréstimos para a construção da siderurgia brasileira – peça fundamental para a industrialização do país – deportou a mulher do líder comunista, Luiz Carlos Prestes, para a Alemanha, onde ela foi morta em uma câmara de gás.”

    E, no mesmo texto (“Por que São Paulo odeia Getúlio Vargas?”, Dez/2010, em http://www.correiodopovo.com.br/Opiniao/?Blog=Juremir%20Machado%20da%20Silva&Post=235609 ), publicado logo após ter se apresentado como uma “alternativa anti-capitalista no processo eleitoral de 2010”, conclama os seus demais companheiros à prioritária tarefa: “Cabe à esquerda resgatar a figura de Vargas. (…) O resgate dessa figura maior da nossa História é indispensável, a fim de que as novas gerações possam inspirar-se na sua visão e, sobretudo, em seu nacionalismo para defender o país das agressões externas.”

    E assim seguimos formando as novas gerações…

  12. Não baseio minhas argumentações em sensos comuns ou em alguma defesa de Vargas, mas sim em abordagem histórica, e fontes… Pesquiso sobre o anti-semitismo da AIB e discuto sobre fascismo. Dentre a bibliografia que discuto estão teóricos como Thalheimer, Arendt, Gilberto Vasconcelos e Leandro Konder, além do próprio João Bernardo.
    Acho leviano e reducionista apontar Vargas como um fascista. Aliás, é reduzir o conceito marxista de bonapartismo a fascismo… Vargas pode ter sido sim um bonapartismo, um fascista, nunca… Mas existem aqueles que preferem generalizações levianas… Enfim… É uma forma de se tentar fazer História, mesmo que se quem critérios…

  13. Sobre trabalhos do tema, a historiografia já debateu por muito sobre se Vargas seria fascista ou não… Mas apenas trabalhos mais antigos afirmam isso… Hoje, qualquer historiador responsável, ponderaria que o governo Vargas poderia ter traços fascistas (prefiro bonapartista), mas não que era um governo fascista… Enfim… Depois mando bibliografia, caso se interesse ler sobre o assunto…

  14. Ah! Danilo, não me encontro no que vc define como esquerda, se é que segue a definição a partir da dada por Manolo, só não preciso concordar com leituras estreitas sobre o assunto e falta de argumentação teórica e empírica sobre o assunto… Sem mais!

  15. E assim o João Bernardo ficou arrumado como historiador leviano, reducionista e não responsável. Soma e segue.

  16. Bem… Sempre procuro ser respeitoso com quem debato, mas não foi esse o caminho que o senhor mesmo seguiu. Não ataco ninguém e nem seus posicionamentos políticos de forma desrepeitosa e caricatural, mas foi dessa forma que a minha contribuição foi atacada, logo aqui, um lugar que se coloca como alternativa para a falta de liberdade de imprensa, etc. Segue abaixo a bibliografia que disse que estaria trazendo:

    BARROSO, Gustavo. Brasil: Colônia de Banqueiro (História dos empréstimos de 1824 a 1934). 5. ed. Rio de Janeiro. Civilização Brasileira S/A, 1936.

    CARVALHO, Brasilino de. O Anti-semitismo de Hitler… Salvador, Companhia Editora e Graphica. 1934.

    SALGADO, Plínio. O que é integralismo. Rio de Janeiro. 2.ª ed. 1933.

    CARNEIRO, Maria Luiza Tucci. O antisemitismo na Era Vargas (1930 – 1940). Editora Braziliense, São Paulo. 1988

    CRUZ, Natália dos Reis. A questão judaica. O anti-semitismo na doutrina integralista. IN: O Integralismo e a questão racial. A Intolerância como princípio. Tese de doutorado. Niterói. Universidade Federal Fluminense. 2004

    CYTRYNOWICZ, Roney. CALDEIRA, João Ricardo de Castro. Integralismo e política regional: a ação integralista no Maranhão (1933-1937). Em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-01882001000100015 acessado em 11 de setembro de 2007.

    CYTRYNOWICZ, Roney. Além do Estado e da ideologia: imigração judaica, Estado-Novo e Segunda Guerra Mundial. Revista Brasileira de História, São Paulo, v. 22, n.ª 44, p. 393-423. 2002.

    DIMITROV, Georg. A unidade Operária contra o Fascismo. Contagem, MG: Coleção Fundamentos- História/Aldeia Global, 1978.

    FAYE, Jean-Pierre. Introdução às linguagens totalitárias – teoria e transformação do relato. Coleção Estudos, vol. 261. São Paulo. Editora Perspectiva. 2009

    FERNANDES, Florestan. “A Concretização da Revolução Burguesa”. In: IANNI, Octavio (org). Florestan Fernandes: sociologia crítica e militante. São Paulo: Expressão Popular, 2004. p. 425-450

    FERREIRA, Laís Mônica Reis. Educação e Assistência Social: as estratégias de inserção da Ação Integralista Brasileira nas camadas populares da Bahia em O Imparcial (1933-1937). Dissertação de Mestrado. Salvador, Universidade Federal da Bahia, 2006.

    KONDER, Leandro. Introdução ao Fascismo. Coleção Assim Lutas os Povos. São Paulo: Expressão Popular, 2009.

    LIMA, Aruã Silva de. DEMOCRACIA CONTRA O POVO: Juraci Magalhães, Otávio Mangabeira e UDN na Bahia (1927 – 1946). Dissertação de Mestrado. Feira de Santana, Universidade Estadual de Feira de Santana, 2009.

    MAIO, Marcos Chor. Nem Rotschild Nem Trotsky – O pensamento anti-semita de Gustavo Barroso. Rio de Janeiro, Imago Ed., 1992.

    MARX, Karl. O 18 Brumário de Luis Bonaparte. In: A Revolução antes da Revolução. Coleção Assim Lutam Os Povos. São Paulo, Expressão Popular. 2008

    MENDES, Antônio Celso. O real e o legal no Brasil revolucionário. In: Filosofia Jurídica no Brasil. São Paulo. Editora Universitária Champagnat. 1992.

    MOTTA, Rodrigo Patto Sá. Em Guarda Contra o Perigo Vermelho. São Paulo, Perspectiva, 2002.

    PEIXOTO JÚNIOR, José Carlos. A Ascenção do nazismo pela ótica do Diário de Notícias da Bahia (1935 – 1941). Um estudo de caso. Dissertação de Mestrado. Salvador, Universidade Federal da Bahia, 2003.

    RIBEIRO, Ivair Augusto. Sob o signo do fascismo e do anti-semitismo: o integralismo na imprensa de Olímpia / SP (1929-1937)

    SEITENFUS, Ricardo. O Brasil vai à guerra – O processo do envolvimento brasileiro na segunda guerra mundial. Barueri, SP: Manole, 2003.

    SENA Jr., Carlos Zacarias de. O Impasses da Estratégia – Os comunistas, o antifascismo e a revolução burguesa no Brasil. 1936-1948. São Paulo: Annablume, 2009.

    SOARES, João Bernardo Maia Viegas. Labirintos do Fascismo. Tese de Doutorado. Campinas/SP: Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), 1998.

    THALHEIMER, August. Sobre o fascismo. Coleção Marxismo Militante, n.º 1. Salvador: Centro de Estudos Victor Meyer, 2010.

    TOTA, Antonio Pedro. O Imperialismo Sedutor – A americanização do Brasil na época da Segunda Guerra. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.

    TRONCA, Ítalo. Revolução de 1930: a dominação oculta. Coleção Tudo é História. São Paulo, Brasiliense. 1982.

    VASCONCELLOS, Gilberto. A Ideologia Curupira – Análise do Discurso Integralista. São Paulo: Editora Brasiliense, 1979.

  17. E agora?? Meus comentários continuarão sendo moderados? Por que? Não é um espaço aberto para debate? Existem donos da verdade, doutrinadores que não se permitem ser contrariado?? Estou perplexo e decepcionado com a atitude do site em moderar meus comentários… Lamentável… Com certeza um ranço stalinista e/ou maoísta de alguns…

  18. Serão apagados?? Todos os meus comentários?? Absurdo, mesmo… Não tem problemas… É infantil essa reação… Não é um espaço para debate??

  19. Desde sempre o Passa Palavra tem seguido a orientação de moderar os comentários, em todos os casos. Não são aprovados spam nem comentários de extrema-direita e fascistas, insultuosos ou irrelevantes, como está explicado em http://passapalavra.info/?p=200

  20. David, imagino que você, como historiador e ex-militante de um partido trotskista, tenha consciência dos limites fluidos entre o bonapartismo e o fascismo empregues como conceitos estanques entre a militância comunista, empregues indiscriminadamente para descrever regimes bastante parecidos. Nem o próprio Marx o recomendaria, pois se cunhou o termo “bonapartismo” no 18 Brumário foi para marcar a especificidade histórica do regime de Luís Bonaparte diante de outros militantes que, à época, qualificavam-no como “cesarismo”. Se seguíssemos a metodologia de Marx ao pé da letra, estaríamos obrigados a particularizar cada regime nacional do período da vigência ostensiva do fascismo como “varguismo”, “peronismo”, “rooseveltismo”, “hitlerismo”, “mussolinismo”, “franquismo”, “salazarismo”, “falangismo”, “kataebismo”, “tojoismo”, “sionismo” etc., sem buscar-lhes pontos em comum para articular uma síntese global. A meu ver, isto é reflexo de uma epistemologia que tem o nacionalismo como axioma, e trata das particularidades e minúcias de cada regime nacional sem tentar compará-lo com outros regimes seus contemporâneos que apresentem traços semelhantes para articular um quadro geral.
    Para ilustrar aquela fluidez entre bonapartismo e fascismo a que me referi, apresento alguns exemplos. Imagino que você esteja familiarizado com a disputa entre a primeira e a segunda geração de trotskistas brasileiros sobre o caráter do regime varguista: enquanto a primeira (Mário Pedrosa e Lívio Xavier principalmente) qualificou-o como bonapartista, a segunda (Hermínio Sachetta principalmente) qualificou-o como fascista. Os próprios comunistas, assim como os anarquistas, qualificaram-no diretamente como fascista.
    Por outro lado, ao menos ideologicamente, Vargas começa no campo positivista/castilhista antes de chegar ao poder, mas ao lá chegar derivou para campos cada vez mais próximos ao fascismo à medida em que se agravam os conflitos econômicos e sociais que facilitaram sua ascensão ao poder. Sem contar as práticas de governo, elaboradas por uma equipe ministerial fortemente infuenciada pelo fascismo.
    Talvez fiquem mais claros os critérios que emprego para definir o fascismo no decorrer das demais partes deste ensaio. Por isto, peço-lhe que aguarde os próximos artigos. Neles, você talvez compreenda por que qualifico Vargas diretamente como fascista, e aí poderemos debater mais detalhadamente.

  21. Danilo, interessante você citar estas referências — ou deferências — a Vargas feitas pelo Emir Sader e pelo Plínio de Arruda Sampaio. Ilustra bem o que escrevi no item 1 das conclusões a que cheguei.
    Emir Sader, você bem o aponta, militou na POLOP, e como esta organização será objeto de análise mais adiante neste ensaio, abstenho-me de comentar qualquer coisa sobre ela no momento. Como se verá muito mais adiante neste ensaio, não foi só Emir Sader na POLOP a se deixar seduzir pela sereia varguista — ao menos no início da organização.
    Mas faltou você falar das origens políticas do Plínio de Arruda Sampaio. Todo mundo sabe que ele militou na Ação Popular (AP). Mas ninguém, ou quase ninguém, fala de sua eleição à Câmara dos Deputados pelo Partido Democrata Cristão em 1962, cuja ala esquerda liderou. Curiosamente, o PDC era a mesma legenda de ninguém menos que… Jânio Quadros, mestre do nacionalismo conservador, eleito presidente em 1961 com apoio de uma dissidência do PTB (o PTN organizado por Hugo Borghi), de uma dissidência da UDN (o PR criado por Artur Bernardes), de um partido gaúcho (o PL de Raul Pilla) e da própria UDN. Bons companheiros, estes. Mas, como se verá muito mais adiante neste ensaio, na esquerda não foi só Plínio a se deixar seduzir pelo canto da sereia janista. Trotskistas e socialistas compartilharam desta triste sina.

  22. O termo “bonapartismo”, desde Trotsky, tem sido uma categoria para definir uma ampla gama de fenômenos políticos de natureza “burocrática”, mas seu principal alvo era Stalin e sua “camarilha”. Esse foi um recurso utilizado por Trotsky para não reconhecer a natureza de classe do regime que ajudou a instaurar na URSS, o capitalismo de Estado. Assim, Stálin se tornou o “traidor” da Revolução de Outubro e a URSS virou um “Estado proletário degenerado”. Após a morte de Trotsky, ficou comum entre setores trotskystas analisar determinados regimes como bonapartistas. Método bastante temerário, considerando o conteúdo ideológico dado pelo bolchevique. Assim, varguismo, lulismo, etc., têm sido classificados por muitos trotskystas como “bonapartismo”, termo vazio de historicidade, trazendo apenas uma ligação semântica com a noção de burocracia. Logo, se um Estado não é “proletário”, é bonapartista. No entanto, me parece também temerário identificar como a mesma coisa, o sentido de bonapartismo em Marx, em Trotsky e entre os trotskystas. Apesar da presença da componente nacional nos 3 casos, politicamente bastante diversos, não se trata da mesma coisa. Ainda que muito se tenha comprovado com dezenas de referências as ambiguidades nacionalistas de Marx, associar sua análise do golpe de Luís Bonaparte com as análises trotskystas atuais não me parece correto do ponto de vista teórico, político e histórico. Além disso, Marx nunca apontou o “bonapartismo” como um fenômeno político universal, geral, aplicável na análise de qualquer outro regime, em qualquer outro momento histórico. Se pecou por “nacionalismo” em sua análise do caso francês, não o fez por ahistoricismo, como fazem alguns trotskystas que onde não veem stalinismo, veem bonapartismo, reduzindo muitas vezes a luta de classes às diferentes formas assumidas pela máquina estatal.

    Bom, isto quanto ao debate. Quanto ao texto, gostei bastante.

  23. Manolo, para o debate em torno à POLOP, queria apenas lhe sugerir a consulta à revista “Movimento Socialista”, publicada em 1958 e dirigida pelo Eric Sachs, que pouco depois seria o principal mentor da POLOP, sobretudo após o golpe. No primeiro número dessa revista ele publica um artigo titulado “Marxismo ou apologética nacionalista?”, onde faz a crítica ao nacionalismo vigente em sua época. Neste mesmo número tem um artigo titulado “Verso e reverso do desenvolvimento”, de ampla crítica ao desenvolvimentismo, sobretudo quando vem da esquerda (é quase certo que a autoria desse texto é de Ruy Mauro Marini). Trata-se de um material difícil de conseguir, mas, se você tever interesse, entre em contato comigo e buscamos uma forma de eu lhe enviar. Ainda que não possa ser tomada como base, acho que essa referência ajudará na leitura crítica sobre a POLOP. Aliás, para quem não sabe, o Centro Victor Meyer (http://www.centrovictormeyer.org.br/) tem disponibilizado bastante material sobre a POLOP. Era só isso. Aguardo os demais textos e felicito por encarar esse tema fundamental!
    Saudações!

  24. Iraldo, não sei se você percebeu, ou se escrevi truncadamente, mas coloquei o problema no uso do bonapartismo como leito de Procusto por parte dos epígonos. O problema do nacionalismo em Marx, como já se escreveu aqui alhures, é de outra natureza, e acarreta outros problemas, não este.
    Fernando, acabei de te escrever sobre esta revista. Dê uma olhada. Como disse na mensagem, trabalho na sala em frente à sala do Centro Victor Meyer, apesar de conflitos de agenda nos dificultarem encontros de corredor. E é muito com base no material publicado por eles, em papel ou no site, que trabalharei a história da POLOP. Mas isto será bem mais adiante.

  25. Estou com o David Rehem neste debate sobre varguismo e peronismo. Não é possível qualifica-los como o mesmo tipo de movimento político e de regime que o hitlerismo, franquismo, salazarismo, mussolinismo e a Action Française. A esquerda latino-americana, por muito tempo, cometeu este erro grave que é o de fazer uma analogia, ao invéz de uma pesquisa mais aprofundada e uma reconstrução de conceitos à partir da realidade concreta da América Latina, ou, em outras palavras, fazer aquilo que a tradição marxista tanto preza: CONTEXTUALIZAR. Felizmente, a maior parte dos estudiosos já revisou as teses que definiam Perón e Vargas como “fascistas”, destacando tanto elementos contextuais que não existiam no fascismo europeu, como instituições e políticas econômicas, externa, etc. inexistentes nos regimes nazifascistas europeus.
    Sem dúvida é interessantíssima a idéia de que rooseveltismo, varguismo, peronismo, mussolinismo, hitlerismo, salazarismo, franquismo, bonapartismo, lulismo, etc., deveriam ser articulados em uma síntese. Só que essa síntese seria algo como “Estado capitalista”. Se eliminarmos os governos e regimes que possuíam elementos democrático-liberais ou social-reformistas, como Roosevelt, Mitterand e Lula, e nos concentrarmos, nas ditaduras, teríamos apenas o conceito de autoritarismo ou de autocracia burguesa. Se nos concentrarmos em um grupo menor – Franco, Salazar, Hitler, Mussolini, Pétain – aí sim, poderíamos construír, por meio da história comparada, uma teoria do fascismo.
    É claro que a comparação, p.ex., de Perón, Vargas e Mussolini poderia sugerir alguns traços em comum, como a analogia da CLT com a Carta del Lavoro, da propaganda que estimulava um culto à personalidade, da idéia de que um “governo forte” poderia acabar com a luta de classes, por meio da reconciliação “corporativista” entre os interesses das classes antagônicas. As semelhanças, porém, param por aí. Os nazifascismos europeus não apenas possuíam uma política externa agressivamente expansionista e militarista, como também uma política interna religiosa e racialmente intolerante, de organizavam-se em torno de um partido único (característica essa que, aliás, gerou algumas comparações apressadas e equivocadas com o stalinismo, estabelecendo o conceito-xingamento de totalitarismo).
    Vargas, p.ex, reprimiu seus adversários tanto à esquerda quanto à direita. Tanto a ANL quanto a AIB foram banidas, seus líderes presos ou exilados e suas rebeliões esmagadas, e, no entanto, Vargas se apropriou de objetivos programáticos de ambos os partidos, como a legislação trabalhista e a criação de empresas públicas (ANL), o autoritarismo e o culto à personalidade (AIB).
    Portanto, a idéia de “bonapartismo”, ou seja, de uma ditadura de centro-direita, que estabelece um domínio de classe (burguesa e latifundiária) dissimulado como domínio “acima das classes, essencialmente burguês mas capaz de realizar concessões aos setores populares, se encaixa com perfeição em Getúlio Vargas e Juan Domingo Perón. Dizer isso é elogiá-los, fazer apologia, querer que eles levantem da tumba para governar o Brasil e a Argentina? Não! Chega a soar intelectualmente desonesto que alguém seja acusado de fazer a apologia do varguismo por construír uma análise deste (e aí o argumento parece o inverso: como assim, analisar o varguismo à partir dos fatos históricos é elogiá-lo, e, para não elogiá-lo, seríamos obrigados a transformar o fascismo em um conceito-xingamento? Creio que não).
    Quanto aos elogios de algumas figuras da esquerda brasileira à Vargas, creio que são uma reação aos anos de “liberalismo autoritário” de FHC, que (custa lembrar?) pôs como objetivo principal “enterrar a herança de Vargas”. Qual? Os direitos trabalhistas e previdenciários e as empresas estatais, é claro!

  26. Matheus, espero que você tenha lido as demais quatro partes deste ensaio, já publicadas. Lá estão expostas — assim como nas partes vindouras — as razões que me levaram a considerar o regime varguista como parte do fascismo internacional. Por outro lado, considerar que o fascismo no Brasil esteve restrito à sua organização formal — a AIB — equivale a querer fazer história das lutas sociais apenas pela leitura das atas de congressos dos partidos comunistas. Convenhamos, isto é de uma ingenuidade política sem tamanho.

  27. Sim, li as outras partes, e não vi argumentos para dizer que Vargas era fascista. Na verdade, o regime militar de 64-85 possuía uma estrutura e uma política econômica, externa e de repressão política muito mais próximas do fascismo do que Vargas, e, mesmo assim, eu não comungo mais com a idéia de que ele era fascista, e por que? Faltava à ditadura civil-militar o culto à personalidade de um chefe, e, assim como em outros regimes latino-americanos da mesma época, faltava um partido político capaz de mobilizar as classes médias (o partido oficial da ditadura militar não passava de um apêndice sem relevância para o funcionamento do regime). Não digo com isso que estes regimes fossem leves, ou menos ruins, mas, pelo contrário, que eles eram exatamente o equivalente ao fascismo nas sociedades periféricas, onde as elites burguesas e rurais são dependentes do capital-imperialismo. Para a elite alemã o discurso nacional-racista do nazismo, que afirmava uma identidade racial acima das classes, e superior aos extrangeiros (entre os quais as minorias étnicas e os adversários políticos) era útil, afinal, essa elite possuía autonomia e ambições de hegemonia regional e mundial. Você vai apontar a mesma coisa na burguesia brasileira, argentina ou venezuelana, cuja maior aspiração é ser estadunidense ou européia? Analise com cuidado a evolução intelectual do Brasil: teóricos racistas brasileiros não diziam que nós seríamos uma “raça superior”, e, pelo contrário, apontavam o próprio povo brasileiro como bárbaro e degenerado, em razão da mestiçagem e das origens africanas e indígenas. E não era apenas no Brasil, isso era um fenômeno geral! Procure saber quem eram Nina Rodrigues, leia algo sobre o “Civilização ou Barbárie” do caudilho argentino Sarmiento, ou mesmo os excelentes textos de Guerreiro Ramos sobre a “questão do negro” no pensamento social brasileiro. Mesmo no campo do pensamento econômico, temos Roberto Campoes, ministro da ditadura civil-militar e ideólogo autoritário que, de tão anglófilo, foi apelidado de Bob Fields.
    Meu argumento NÃO é que o fascismo estava restrigo ao partido integralista (que foi esmagado pela ditadura varguista, o que não é uma objeção pequena à sua tese). É que realmente o varguismo (desde 1930 até o suicídio do seu líder) foi um movimento de centro-direita, com oscilações para a centro-esquerda, que buscava reformar as instituições políticas e econômicas, de uma maneira que permitisse às classes dominantes manter o controle do processo de revolução política e econômica. Mais próximo, portanto, de outros políticos autoritários e reformistas, como Napoleão Bonaparte e Otto von Bismarck, se você quer comparações européias. Por outro lado, ele se encaixa também na longa tradição de caudilhos latino-americanos. Finalmente, Vargas não possuía o irracionalismo, o misticismo e o romantismo racial e religioso dos fascistas europeus, sendo, na verdade, de formação intelectual positivista, ou seja, da direita do Iluminismo. Rotular (porque se trata, no fundo, apenas disso) o varguismo e o peronismo de “fascistas” é desconhecer ou a história do nazifascismo europeu, ou a história dos próprios “populismos” latinoamericanos, que de modo algum são simplesmente redutíveis a algum tipo ideal disso ou daquilo.

  28. Matheus, sua argumentação concentra-se nos seguintes pontos: (a) o racismo fascista diz serem seus proponentes uma “raça superior”, enquanto todas as formas históricas de racismo colocam o “povo brasileiro” como uma “raça inferior” — e, deduzo disto, como todo fascismo tem um componente de “raça superior”, não pode haver fascismo onde as elites burguesas e rurais são dependentes do capital-imperialismo ou onde a ideologia racista aponta haver “raças inferiores”; (b) o culto à personalidade de um chefe é elemento do fascismo; (c) um partido político capaz de mobilizar as classes médias é elemento do fascismo. Você fala também dos regimes correspondentes aos nossos vinte e cinco anos de tragédia, mas como isto não é assunto deste ensaio, prefiro concentrar no que importa. Analisarei detidamente cada um dos pontos.

    Quanto ao primeiro ponto, sobre o racismo, há duas questões. Em primeiro lugar, o racismo, infelizmente, não é privilégio do fascismo. Um exemplo, entre muitos: o barão John Maynard Keynes, aquele mesmo que todos conhecem da Economia, foi diretor da Sociedade Britânica de Eugenia entre 1937 e 1944, e dizia ser a eugenia “o mais importante, significante e, diria mais, genuíno ramo existente da sociologia” (Keynes, John Maynard. “Opening remarks: The Galton Lecture”. Eugenics Review, vol. 38, nº 1, 1946, pp. 39–40). Da mesma forma, na fase pré-Franz Boas do ensaísmo “social” brasileiro no início do século XX (e mesmo após ela), não faltaram racistas da escola de Galton, Lombroso, Agassiz e Gobineau, e nos debates parlamentares de qualquer província ou estado não era incomum encontrar referências negativas não apenas a africanos, mas a chineses, árabes etc. Do que me lembro de haver lido do próprio Nina Rodrigues anos atrás, ainda na faculdade, além de ele defender códigos penais diferentes para raças diferentes, ele era a favor da “repatriação” dos africanos, pois o problema com esta “raça” “degenerada” não era apenas social ou “genético”, mas sim de inadaptação ao ambiente e às instituições sociais.

    Por outro lado, nem todo fascismo foi, ou é, racista. Fico com um exemplo tirado da relação entre os dois paradigmas básicos de fascismo. Mussolini sempre foi muito ambíguo quanto à questão racial, preferindo legitimar o fascismo italiano pelo viés histórico, não genético, da ligação entre italianos e romanos. Desqualificou, com os piores adjetivos, toda e qualquer forma de racismo, inclusive aquele propalado pelo seu colega alemão Adolf Hitler. Chegou a dizer: “Raça! É um sentimento, não uma realidade: noventa e cinco por cento, ao menos, é sentimento. Nada jamais conseguirá me fazer crer que existam raças biologicamente puras na atualidade” (GILETTE, Aaron. Racial theories in fascist Italy. Londres: Routledge, 2002, p. 44). Isto pelo menos até 1938, quando, no auge de sua “lua de mel política” com Hitler, mandou publicar o Manifesto da Raça. Em 1943, entretanto, confidenciou a um jornalista: “O manifesto racial poderia ter sido evitado. Ele lidou com a abstrusão científica de alguns poucos professores e jornalistas, um consciencioso ensaio alemão traduzido em mau italiano. Ele está muito longe do que eu teria dito, escrito ou assinado sobre o assunto. Sugiro que você consulte as edições antigas de Il Popolo d’Italia. Por esta razão, estou longe de aceitar o mito de [Alfred] Rosenberg”. (GILETTE, ob. cit., p. 95)

    Mas se continuarmos a observar as coisas pelo ângulo dos fascismos não-racistas, todos estes regimes veem-se como representantes de “nações proletárias”, “exploradas” pelo imperialismo e/ou pelo colonialismo etc. Mesmo os alemães, cujo racismo não é outra coisa além da síntese confusa de antigos preconceitos como reação às indenizações de guerra, à ocupação do vale do Ruhr etc. — ou seja, a “raça ariana” estava a ser explorada por “raças inferiores”, forma enviesada de compreender-se a “exploração” por trás do conceito de “nação proletária”.

    Ou seja: o racismo não é traço identitário de todos os regimes fascistas, e o fato de o povo brasileiro ser considerado “raça inferior”, levando em conta a teoria da “nação proletária” elaborada pelos fascistas, apenas legitima qualificar o regime de Getúlio Vargas — em especial no Estado Novo — como fascista.

    O segundo ponto é o culto à personalidade. Se este não foi um ponto no qual o regime varguista notabilizou-se, em especial através do DIP, saio ano que vem no carnaval fantasiado de Carmem Miranda.

    O terceiro ponto é a questão do partido — faltou apenas que você dissesse “partido único” — inexistente sob o regime de Vargas. Em primeiro lugar, você o sabe tanto quanto eu, somente no Estado Novo os partidos políticos foram dissolvidos. É algo semelhante ao que ocorreu no regime de Ioannis Metaxas na Grécia. Você dirá: “mas Metaxas compartilhou o poder com um rei! Isto não é fascismo!” Respondo: mas não foi Mussolini apenas o primeiro-ministro de Sua Majestade Victor Emanuel III? Miklós Horthy, fundador na Hungria do talvez único fascismo pluripartidário jamais existente, não foi ele chamado de “Sua Serena Alteza o Regente do Reino da Hungria” – um reino sem rei regido por um almirante sem frota de um país sem costa?

    Você menciona o fato de os integralistas terem sido esmagados pelo regime varguista como um dos elementos que abalam o caráter fascista deste último. Pergunto: você lembra da Noite dos Longos Punhais? É um exemplo de conflito dentro de uma mesma organização política fascista. Conhece a luta do Integralismo Lusitano e de seu movimento sucessor, o Movimento Nacional-Sindicalista, contra o Estado Novo de Salazar? Guardadas as diferenças entre o Estado Novo de lá e o de cá, não penso que você deixe de qualificar o regime de Salazar como fascismo pelo fato de uma organização fascista fora do poder de Estado lutar contra outra que lá se encontra. Da mesma forma, pergunto: conhece os conflitos entre o regime de Engelbert Dollfuss — conhecido na historiografia como “austrofascismo” — e o Partido Nazista austríaco, conflitos estes que resultaram na morte do próprio Dollfuss? É outro exemplo, desta vez de como um partido fascista externo pode apoiar um partido fascista interno em sua luta pelo poder travada contra outro partido fascista. Por último, pergunto: conhece a guerra de conquista movida pela Itália governada por Mussolini contra a Grécia governada por Metaxas? Trata-se agora não mais do conflito interno a uma organização fascista, ou de rusgas entre duas organizações fascistas, ou de golpes de Estados movidos por uma organização fascista contra outra, mas da guerra aberta entre dois países com governos fascistas. Como se vê, há conflitos interfascistas em todos os níveis imagináveis.

    Por último, chamar um regime de “caudilhismo”, a depender do regime a que tal denominação se aplique, é o mesmo que chamar o regime de Luís Bonaparte de “cesarismo”. Quanto ao “populismo”, não apenas a historiografia recente é crítica a este conceito quanto veteranos das lutas sociais deste período o criticam por fazer dos resultados das intensas lutas do período apenas o resultado de “cálculos políticos” de tal ou qual regime. Assim como não cabe chamar de “fascista” todo e qualquer regime policialesco, pois é preciso avaliá-lo segundo suas características específicas, vale o mesmo para estas duas peças de museu.

    Com isto, apenas “limpei o meio de campo”, demonstrando que os argumentos de seu comentário mais recente não se sustentam. Isto, entretanto, não apresenta os elementos que me levam a concluir que o regime de Vargas foi fascista. Para entendê-lo, continue lendo os artigos da série. Mas leia bem.

  29. Eu me divirto com os comentários do Matheus. São sempre de uma certeza que nunca terei. Quando li

    //Finalmente, Vargas não possuía o irracionalismo, o misticismo e o romantismo racial e religioso dos fascistas europeus, sendo, na verdade, de formação intelectual positivista, ou seja, da direita do Iluminismo.//

    confesso que me engasguei. Veio-me a imagem da construção localizada na Av. João Pessoa, 1058; a lembrança do Templo Positivista de Porto Alegre, um dos quatro templos da Religião da Humanidade existentes no mundo. Era precisamente lá aonde o Vargas ía, em companhia do Borges de Medeiros, para cultuar a memória de Júlio de Castilhos, o Patriarca do positivismo no Brasil.

    Se não fosse esse comentário do Matheus para me iluminar as ideias, eu ainda acharia que o irracionalismo, o misticismo e o romantismo racial e religioso eram também coisas do positivismo.

  30. Pronto, agora, Astolfo veio com a grande revelação, o positivismo de Comte e Spencer é uma vertente do romantismo religioso e místico! Só pode ser um grande gênio, pois contraria TODA a historiografia intelectual digna deste nome.

    Astolfo, um conselho: pegue o Discurso preliminar sobre o espírito positivo, ou ao menos um bom comentador de Comte e Spencer, e da sua influência no Brasil, antes de saír falando que Augusto Comte era nazifascista. Alain e Sérgio Buarque de Holanda são duas leituras que eu recomendo.

  31. “Com isto, apenas “limpei o meio de campo”, demonstrando que os argumentos de seu comentário mais recente não se sustentam.”

    Não, não demonstrou coisa nenhuma. Aliás, algumas pessoas que comentam aqui possuem a péssima mania de achar que algumas idéias-força podem “demonstrar” algo. Assim, o JB foi parabenizado por “demonstrar” que a teoria da dependência é uma filosofia fascista. Demonstrou coisa nenhuma! Fez um artigo com uma única fonte de segunda mão (o tal livro do acadêmico estadunidense que acusa Prebisch e Furtado de terem influência de Manoilescu, como se fosse a única influência e como se o contexto fosse irrelevante), confundindo ainda a teoria da dependência com as teses da “substituição de importações” da CEPAL. Enfim, demonstrou, isso sim, que não sabia bem do que falava, saindo ainda com um papo de “nação proletária”, esquecendo toda a retórica de Hitler sobre o “povo superior”, “povo aristocrático”, e toda a defesa do imperialismo feita pelo fascismo, esquecendo, principalmente, que o fascismo recrutava os seus militantes na classe média e era financiado pela alta burguesia, pregando antes uma idéia de “nação orgânica”, de união de todas as classes, que de “nação proletária”. De resto, havia sempre a teoria da conspiração: TODA a direita (e não apenas a fascista) tende a procurar um culpado personalizado, um “inimigo interno” identificado em termos raciais, religiosos, ideológicos, que introduz como que intencionalmente os elementos da contradição e conflito em uma sociedade concebida como orgânica, funcional e espontaneamente equilibrada. O que os nazifascistas fizeram foi levar ao extremo, transformando isso em uma grande teoria da conspiração. Mas sua pretensão sempre foi a da hegemonia mundial, por meio do expansionismo colonial e territorial de governos-fantoche. Onde entra a “nação proletária” aí, senão em algumas figuras de retórica? Se você quiser, pode achar uma defesa do individualismo em Mein Kampf (Domenico Losurdo cita em sua crítica ao conceito de totalitarismo), em Mussolini pode encontrar acusações de “totalitários” aos seus inimigos. Por outro lado, salta aos olhos que o terceiro-mundismo, que surgiu após a II Guerra Mundial, seja responsabilizado por uma ideologia que surgiu antes da II Guerra Mundial. O próximo “artigo demonstrador” deve revelar que Nehru, Tito e Nasser possuíam máquinas do tempo.

    Mas vamos lá, não elaborei um “tipo-ideal” de fascismo, apenas apostei em uma história comparada. Se você comparar os regimes reconhecidamente fascistas (Hitler, Franco, Salazar, Mussolini) com alguns acusados de fascismo (Vargas), você de imediato encontrará diferenças fundamentais. Vargas, como todos deveriam saber, teve a formação de um político oligarca, formado no positivismo de Comte e Spencer, e chegou ao poder em 1930 por meio do que foi chamado de revolução, dando fim à República Velha. Sem qualquer partido único, mobilização de massas, sistema ideológico, em uma nação caracterizada pela monocultura latifundiária e capitalista, voltada para a exportação e com fraco mercado interno. E uma pífia classe média, setor onde os fascistas recrutam seus MILITANTES (e esse aspecto ultramilitante do fascismo foi ignorado pelo Manolo). Na verdade, se apoiou em um conflito entre oligarquias regionais e no movimento tenentista, e, aliás, substituiu os governadores por “interventores” militares ligados a este movimento. Logo se viu diante de uma rebelião paulista em 1932, que conseguiu controlar, sendo entretanto obrigado a convocar uma Assembléia Constituinte, que elaborou uma constituição razoavelmente avançada em 1934. Muito do conteúdo nacionalista e reformista que veio a assumir a política de Vargas foi idealizado neste texto constitucional, que não durou três anos. Em 1935, o governo aboliu a ANL e venceu a rebelião militar dirigida pelos comunistas; pouco tempo depois, se aproveitou de uma boataria divulgada pelos fascistas católicos da AIB (Plano Cohen) e impôs o estado de excessão ao país, dissolvendo e reprimindo o próprio movimento fascista, que em vão tentou tomar o poder por meio de um golpe. Fico até intrigado pelo Manolo não ter comparado a ditadura varguista com as nazifascistas neste aspecto de regime de excessão, mas isso o obrigaria a comparar a ambos com as administrações coloniais, o que quebra a espinha dorsal de toda a alegação de que o fascismo é antiimperialismo e vice-versa. Nos oito anos seguintes de ditadura, a política social e econômica de Vargas evidencia uma acomodação entre a burguesia industrial e a oligarquia rural, além de concessões ao operariado e às classes médias urbanas, e, no plano externo, a adesão à aliança antifascista na II Guerra Mundial. Vargas montou uma máquina de propaganda para construir uma imagem de “pai dos pobres” (e os críticos completavam: “e mãe dos ricos”), outorgou uma legislação trabalhista e previdenciária avançada, embora submetendo os sindicatos ao Estado, e criou algumas empresas estatais, investimento vital para a industrialização do Brasil. Enquanto isso, o regime nazista PRIVATIZAVA empresas nacionalizadas pelos governos da república de Weimar.

    Segundo o argumento repetido ad nauseam por Manolo e cia., a combinação de nacionalismo econômico, autoritarismo e concessões aos trabalhadores significa fascismo, especialmente (ainda segundo Manolo e cia.) se esse nacionalismo fosse antiimperialista, uma forma de intervênção do Estado na economia para defender a independência do país, o que não deve ser confundido com o nacionalismo imperialista, que intervêm nas economias e Estados estrangeiros, para impôr-lhes o interesse de suas elites, como faziam tanto a Inglaterra, EUA e França liberais quanto a Alemanha nazista. Deste modo, teríamos a estranha conclusão de retirar a Alemanha nazista do conjunto de regimes fascistas, incluindo entre os fascistas apenas Vargas, Perón, Nasser, os paraguaios Francia, Lopes pai e Lopes filho, Simón Bolívar, quiçá mesmo os presidentes estadunidenses Abraam Lincoln (gráças ao protecionismo, reforma agrária, poderes extraordinários durante a guerra civil e a abolição!), James Monroe (“a América para os americanos”, já viram melhor exemplo de “imperialismo antiimperialista”?) e FD Roosevelt (com seu New Deal e seus 12 anos de governo, com poderes especiais para enfrentar a crise econômica e a guerra) . Pensando bem, até mesmo Salazar e Franco não poderiam ser incluídos no fascismo: tinham uma postura demasiado aristocrática, o primeiro um economista e professor, o segundo um militar profissional, muito afeiçoados à tradição colonialista das suas nações para falar de terceiro-mundismo, proletariado, etc.. Preferiram, aliás, aderir à Otan após a II Guerra Mundial, demonstrando que não possuíam qualquer entusiasmo pelo antiimperialismo. Segundo essa definição de fascismo=”ideologia da nação proletária”, não eram fascistas! Sobrou o Mussolini, que, segundo o Manolo, era antiimperialista, reformista social e antirracista. Espere aí, a invasão e colonização da Etiópia, Albânia, Líbia e Grécia, que resultou na imposição de um apartheid colonial, não foi um imperialismo racial análogo ao inglês, francês e alemão-nazista? Pronto, agora nem mesmo Mussolini era fascista, segundo a definição manolina, apenas Vargas, Perón, Cárdenas e Nasser!

    Quanto ao “conflito interfascista”, menos. Vargas não apenas exilou Plínio Salgado, ele dissolveu a AIB e criminalizou o nazifascismo. Quando Hitler exterminou as SA e alguns dissidentes internos, ele queria de fato impôr a sua linha mais burguesa e racista aos quadros agraristas, e acabar com rivais como Ernst Rohm; todo o aparelho do partido nazista, e, é claro, toda a ideologia dele, foram preservados e até reforçados. Salazar pode ter reprimido as dissidências internas, e certamente Franco assassinou alguns rivais ao cargo de ditador de Espanha. Mas nenhum deles se dissolveu “o” partido fascista, criminalizou a ideologia e usou a polícia política para persegui-la, porque essa era a ideologia do Estado, e o partido era o instrumento de mobilização popular pelo regime. A política interna e externa de Vargas mostram que ele estava, na prática, à esquerda da AIB, ou seja, na centro-direita, embora fizesse concessões para o proletariado urbano, geralmente como faca de dois gumes. Esse “morde e assopra” na política social não foi invenção fascista: Bismarck, ao mesmo tempo em que fundava a previdência social, outorgava leis repressivas contra as organizações socialistas. Napoleão III, enquanto reprimia o movimento operário independente com seus espiões e paramilitares, também fazia algumas pequenas concessões (menos concretas e efetivas que as de Bismarck, diga-se de passagem). Aliás, poucos governos se enquadraram tão bem na definição de “bonapartismo” aparesentada no “XVIII Brumário de Louis Bonaparte” por Karl Marx que o Estado Novo: um regime capitalista autoritário, personalista e contrarrevolucionário, apoiado na burocracia civil e militar, e capaz de realizar um reformismo seletivo para cooptar a classe trabalhadora, ao mesmo tempo em que reprime as suas organizações autônomas. Enfim, não nego que, de alguma maneira, Vargas tenha sido influênciado pelo fascismo, enquanto que Perón foi COM CERTEZA influênciado. Mas a diferença de contexto econômico-social, de tradição cultural e de posição do país nas relações internacionais modificou decisivamente o tipo de regime (que, aliás, não foi antecedido por um movimento fascista), e, além do mais, tanto Vargas quanto Perón chegaram também a governar democráticamente, e estes governos democráticos dificilmente poderiam ser acusados de fascistas, a não ser por alguém que realmente não faz idéia do que significa um regime fascista (não discarto que algum louco ou ignorante acuse o PTB de 46-64 de ser um partido fascista, mesmo sabendo que ele representava a centro-esquerda da política brasileira da época). Ao menos eu acredito que a discussão polêmica, aqui, se restrinja ao fascismo do Estado Novo, e não àquele de 1930-37 e de 1951-54. Eu também sou crítico da teoria do populismo, mas, sinceramente, diante da superbanalização do termo fascismo, eu prefiro a tese do populismo à tese do “fascismo terceiro-mundista”, monstrengo teórico sem fundamentação factual.

    Gostaria de pedir, também, que você lêsse o que eu escrevo com maior cuidado. Nunca disse, p.ex., que o racismo é privilégio dos fascistas, e, além disso, você cometeu um erro grave, ignorando toda legislação racista imposta por Mussolini nas colonias e dentro da Itália, com o código antissemita de 1938: isto é, Mussolini era, sim, racista, não importa o quanto tenha oscilado na transformação disso em doutrina oficial do Estado. Você também usou argumentos malucos, que nada tinham a ver com o tópico. Na questão do partido, p.ex., você falou do monarquismo de Mussolini, etc., como se isso “refutasse” o que eu falei sobre a associação dos regimes fascistas com movimentos fascistas, sendo o partido (não necessariamente uma organização formal) o instrumento de mobilização popular. O fato de que TODOS os regimes fascistas “clássicos” europeus, da mesma época que a Era Vargas no Brasil, possuírem um regime de partido único não me parece indiferente, afinal, era comum a todos os regimes fascistas. Do mesmo modo, o pró-imperialismo fascista, o racismo e/ou clericalismo fascista, etc., enquanto que o protecionismo e as concessões seletivas aos trabalhadores já eram praticadas pela direita pré-fascista. É como se o conceito de fascismo do Manolo prescindisse completamente dos regimes e movimentos fascistas reais.

    Por ultimo, a questão do racismo que eu expus é a seguinte: as populações mestiças da América Latina eram frequentemente algo de estigmatização por teorias racistas e eugenistas, que atribuíam o atraso econômico destas sociedades a origens “bárbaras” e misturas “degenerescentes” entre povos diversos. As oligarquias que importavam, aplicavam e divulgavam estas teorias racistas se considerava próximas da Europa, descendente de “arianos” e portadores de uma missão civilizatória. Não é isso que Sarmiento, Nina Rodrigues e outros dizem? Os integralistas até tentaram organizar um movimento fascista de ideologia católica, ao invéz de arianista, e mesmo assim não deixavam de pregar o antissemitismo e um racismo velado e dissimulado contra a população de cor. E foi um completo fracasso. A extremadireita latinoamericana, posteriormente, rejeitaria o populismo e a mobilização popular, preferindo a aliança com o imperialismo e o golpismo, descartando completamente a mobilização popular.

  32. Matheus, consegui — muito sofridamente, confesso — chegar ao terceiro parágrafo disto que você chama de comentário. E não vou responder o que já respondi, porque tenho mais o que fazer. Não obstante, para que o debate possa prosseguir da forma mais transparente possível, proponho que você reúna tudo isto que escreveu em todos os artigos da série na forma de um artigo e envie-o ao PassaPalavra ([email protected]) para publicação. Parece que você tem bem mais a dizer sobre o assunto “fascismo” do que dão a entender os absurdos que você tem escrito até o momento, e talvez fosse interessante ver tudo isto exposto de forma coerente, pois infelizmente é da natureza dos comentários a fragmentação do raciocínio.

  33. Olá,

    Gostaria de mais informações sobre “Manolo” – Informações bibliográficas.

    Obrigado.

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